Discurso no Senado Federal

SAUDAÇÕES AS MULHERES PELO TRANSCURSO DO DIA INTERNACIONAL DA MULHER. LAMENTANDO A PRISÃO DE DEOLINDA ALVES DE SOUZA, LIDER DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. ESTRANHEZA DIANTE DOS ARGUMENTOS GOVERNISTAS CONTRARIOS A CRIAÇÃO DA CPI DOS BANCOS.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.:
  • SAUDAÇÕES AS MULHERES PELO TRANSCURSO DO DIA INTERNACIONAL DA MULHER. LAMENTANDO A PRISÃO DE DEOLINDA ALVES DE SOUZA, LIDER DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. ESTRANHEZA DIANTE DOS ARGUMENTOS GOVERNISTAS CONTRARIOS A CRIAÇÃO DA CPI DOS BANCOS.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/1996 - Página 3824
Assunto
Outros > HOMENAGEM. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.
Indexação
  • HOMENAGEM, MULHER, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, CRITICA, PRISÃO, LIDER, SEM-TERRA, DEFESA, REFORMA AGRARIA.
  • CRITICA, IMPUNIDADE, FRAUDE, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, IMPROPRIEDADE, OPOSIÇÃO, BANCADA, GOVERNO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MOTIVO, ATRASO, REFORMA CONSTITUCIONAL, INSUFICIENCIA, EFEITO, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL.
  • ANALISE, NECESSIDADE, PRIORIDADE, ALCANCE, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS, SUGESTÃO, TRANSFORMAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
  • NECESSIDADE, AUMENTO, EFICACIA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), RETOMADA, PRERROGATIVA, CONGRESSO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, gostaria de saudar as companheiras, funcionárias, Senadoras, enfim, todas as mulheres pela passagem do Dia Internacional da Mulher. E lamentar, profundamente, que ainda, neste dia, continua presa, desde o dia 25 de janeiro, uma mulher - Diolinda Alves de Souza - juntamente com Filinto Procópio, Cláudio Cano e Laércio Barbosa, por ter cometido um crime, na visão das nossas classes dominantes e da nossa Justiça, defensora dos seus interesses. O crime de lutar pela terra e pela sua sobrevivência; o crime de tentar trabalhar e produzir mais alimentos para o nosso povo, para o nosso País. E, enquanto isso, outros que cometem crimes que, à luz de qualquer cidadão que tenha o mínimo de imparcialidade na sua análise, envolvem bilhões de dólares, que emitem dinheiro, e que deveriam estar na cadeia hoje, continuam livres, leves, soltos e fagueiros, usufruindo das benesses e dos lucros desses delitos.

Neste momento em que as consciências democráticas do nosso País estão bradando liberdade para os sem-terras e cadeia para os sem-vergonhas, para os sem-caracteres, para os ladrões do sistema financeiro, continuamos vendo aqueles que, talvez na falta de argumentos melhores para defender o Governo Fernando Henrique Cardoso - e naturalmente estão na sua função de líderes ou de membros de Partidos da base governista - encaminham a sua argumentação para, no meu entendimento, uma linha perigosa.

Gostaria também de registrar o meu estranhamento pela ojeriza que notamos hoje em parte da Bancada governista, particularmente do PSDB, à criação de qualquer CPI, principalmente se formos levar em consideração que o Governo Fernando Henrique Cardoso provém de uma delas. Se não tivesse havido a CPI do Collor, ele não teria sido deposto, o Sr. Itamar Franco não teria assumido e não teria indicado, como seu Ministro da Fazenda, o Sr. Fernando Henrique Cardoso. Possivelmente não teríamos o Plano Real e, muito provavelmente, a história hoje seria bastante diferente. Então, estranham-me muito os argumentos que são colocados contrariamente à criação da CPI.

Argumentam, como fizeram no ano passado com relação à instalação da CPI das Empreiteiras, ou seja, que a CPI atrasará as reformas, como se houvesse, em algum lugar da Constituição brasileira ou do Regimento desta Casa, o estabelecimento de que o Congresso, em um período, legisla e, em outro, fiscaliza. Tudo é realizado concomitantemente; e assim deve acontecer.

Será que existe alguma reforma mais urgente para o nosso País do que a do sistema financeiro? Será que existe algo mais urgente do que a necessidade de o Congresso Nacional e a sociedade terem condições de controlar, de fiscalizar, de maneira mais efetiva, o que acontece num setor, que todos dizem que é muito sensível a modificações, mas que essa sensibilidade tão propalada, na maioria das vezes, é falsa? No meu entendimento, o que provoca a instabilidade é justamente a falta de confiança que alguns setores das diversas classes sociais no Brasil têm em relação à deficiência do Banco Central no processo de fiscalização desse sistema. Também, no meu modo de ver, causa instabilidade a cortina de fumaça que se procura jogar, na tentativa de se evitar a fiscalização.

Agora, há também um outro argumento, por parte daqueles que querem impedir a instalação da CPI, de que o requerimento de CPI exclusiva do Senado explicita que a investigação será limitada no tempo; só abrangerá o período de 1995. Seria necessário que se investigasse o que se passou em anos anteriores.

Ora, se esse é o problema, é muito fácil resolvê-lo. O nosso requerimento de convocação de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito não estabelece prazos para a investigação. Então, se o Governo entende que o problema está sendo a questão do prazo, faço a minha proposta: assinemos o nosso requerimento de convocação de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - faltam três Senadores para assiná-lo - e instala-se uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, cujo requerimento não estabelece o prazo de 1995, que está sendo tão questionado pela Liderança do Governo.

Aqui fica a proposta para as Lideranças do Governo analisarem, embora elas infelizmente não estejam aqui. Não sei se a TV Senado está transmitindo diretamente para Berlim, até porque não sei se foi para lá que eles foram. Sei apenas que foram para a Alemanha. Creio que não chegamos a tanto. Contudo, o registro fica nos Anais.

A minha preocupação maior, quando digo que estamos enveredando por uma linha perigosa, quando se está combatendo a criação dessa CPI, muitas vezes com a alegação de que é um artifício para dar palanque à Oposição, para dar vazão a narcisismos, com a alegação de que a tendência é acabar em pizza. Quer dizer, que não adianta convocar CPI porque a nossa tradição é de que ela só vai punir funcionários públicos, diretores do Banco Central e não vai atacar os verdadeiros responsáveis, que são os corruptores, as famílias poderosas deste País, o poder econômico etc. Temo que cheguemos a um tal grau de niilismo em relação às CPIs e, conseqüentemente, ao Congresso Nacional que, daqui a pouco, vamos chegar à conclusão de que este é dispensável. Quer dizer, já que uma CPI é um instrumento do Poder Legislativo para investigar, mas, por vários motivos, não serve, daqui a pouco vamos chegar à conclusão de que o Congresso Nacional é dispensável. É uma linha perigosa de argumentação, principalmente quando a vejo partir de pessoas que têm uma história de resistência democrática, de luta pelas prerrogativas do Congresso Nacional, pessoas que foram líderes desta Casa e que, de repente, passam a encarar o Congresso Nacional como um empecilho a um bom governo.

Essas reflexões têm a ver apenas com a questão da CPI. Se as histórias da CPI mostram uma certa ineficiência, ou melhor, uma insuficiência da sua ação, temos que reconhecer que isso acontece por nossa culpa. E, ao contrário de nos acomodarmos nessa situação e passarmos a entender que, como se chegou a esta situação, o instrumento é dispensável, temos é que trabalhar e lutar para que este quadro se reverta, porque não é só em relação à CPI, mas também, por exemplo, à medida provisória. Inúmeras vezes já vi nesta Casa Parlamentares bradarem contra a proliferação de medidas provisórias, por entenderem que isso é um absurdo, que o Executivo está legislando, está passando por cima do Congresso Nacional etc. Só que temos, no Senado, várias matérias tratando da questão das medidas provisórias.

Já entrou em pauta, no ano passado, um projeto do então Deputado Nelson Jobim, atual Ministro da Justiça, aprovado na Câmara, que regulamenta a questão das medidas provisórias. Esse projeto entrou na pauta, foi retirado, voltou, foi retirado de novo, formou-se uma comissão para analisá-lo, encaminhou-se ao Senador Josaphat Marinho para dar um parecer, S. Exª fez esse parecer e, no entanto, por comodismo ou pelo fato de as Lideranças do Governo nesta Casa estarem ultrapassando aquela linha que separa os interesses legítimos do Executivo e as prerrogativas permanentes do Congresso Nacional, até agora não votamos essas matérias. E não só essas; há outras emendas constitucionais tratando também disso.

Então, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, chegamos à conclusão de que não só a questão da CPI como a questão mais ampla das prerrogativas do Congresso Nacional estão realmente nas nossas mãos, nas mãos e nas mentes de cada um dos Srs. Parlamentares, Senadores e Deputados, independente de filiação partidária, independente de fazer parte ou não da base governista.

Agora, o que não podemos, no meu entendimento, é continuar avalizando a posição de que é mais fácil investirmos na mesmice, deixando o barco correr, como vem acontecendo, do que tomarmos medidas que possibilitem a retomada de prerrogativas do Congresso Nacional cortadas na época da ditadura.

A luta por sua retomada e para que fossem inseridas na Constituição foi árdua, mas, como tantas leis neste País, não entraram em moda, não "pegaram", ou seja, estão escritas no papel, na Constituição, mas, na prática, não existem no mundo real.

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador José Eduardo Dutra?

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Concedo o aparte, com muito prazer, ao Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - Nobre Senador José Eduardo Dutra, através da manifestação de V. Exª e de outros oradores que o precederam, inclusive do Senador Roberto Requião, percebemos que a reação do Governo e de suas Bancadas no sentido de impedir a abertura da CPI e a apuração de determinados fatos que se revelam claramente perigosos, claramente suspeitos no sistema financeiro brasileiro é que o Governo parece que tem certeza, está confessando que, se perfurarmos o solo do chamado equilíbrio, da chamada estabilização, vamos encontrar lama, podridão, porque, se o subsolo em que se assenta essa estabilização, se esse plano que aí está fosse sólido, se o Governo tivesse certeza de que não haveria nada que pudesse provocar abalos, com certeza ele seria o primeiro a concordar e apoiar esse exame, porque saberia que disso resultaria apenas o esclarecimento de que ele realmente não precisou usar artifícios, não precisou usar o Banco Central e outros instrumentos como forma de engenharia para arquitetar o seu plano. Tenho a impressão de que o próprio depoimento do Presidente do Banco Central mostra que houve uma engenharia muito bem-feita não apenas na fase de instalação do Plano Real, mas principalmente agora. Por exemplo, impediram durante meses que soubéssemos o que estava acontecendo com o sistema bancário: 26 bancos em situação de insolvência ou semi-insolvência. Tudo isso foi empurrado com a barriga para que nós não soubéssemos a respeito. Segundo eles, para não dar instabilidade ao processo de estabilização imposto ao Brasil. De repente, vemos que, através dessa engenharia, inventa-se o Proer, socorre-se com mais de R$5.000.000.000,00 o Banco Nacional, que contribuiu com R$520.000,00 para a campanha do Presidente da República, num momento em que o próprio Banco já se encontrava em péssima situação, imprimindo dinheiro falso. No entanto, contribuiu com essa quantia para a campanha do Presidente. A situação do Banco Nacional, há muito tempo, já era conhecida por todos e só veio à tona depois que o Proer e outros recursos puderam vir socorrer esse Banco. De modo que, é necessário que se abra essa CPI. O Governo deveria estar tranqüilo, se não há motivo, se as estruturas não foram montadas sobre a podridão - numa parte podre como esta parte podre dos bancos que, agora, está sendo estatizada e socializada. Então, se o Banco tem certeza de que nada tem a temer, que os alicerces dessa estabilização estão sólidos, o Governo, também, deveria pleitear essa CPI e não combatê-la. Ao combatê-la, ele se torna suspeito, e se torna suspeito de que as bases em que ele montou o Plano de Estabilização e o seu prosseguimento são bases altamente suspeitas. Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Jefferson Péres) - Senador José Eduardo Dutra, solicito que conclua o seu pronunciamento, porque há oradores inscritos e seu tempo está-se esgotando.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Já concluo, Sr. Presidente.

Muito obrigado ao aparte do Senador Lauro Campos.

Concluindo, Sr. Presidente, volto a conclamar às Lideranças do Governo a indicarem, o mais rápido possível, os seus representantes para a Comissão Parlamentar de Inquérito.

Fico feliz com a informação do Senador Romero Jucá, Vice-Líder do PFL, de que, na próxima terça-feira, haverá uma reunião da Bancada para discutir a questão. Espero que a decisão seja no sentido de indicar os membros; espero também que os Líderes do Governo, que estão na Alemanha, desembarquem no Brasil imbuídos do espírito de Rosa Luxemburg e não de Adolf Hitler.

Muito obrigado. Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/1996 - Página 3824