Discurso no Senado Federal

ANIVERSARIO DE FALECIMENTO DO PROFESSOR PEDRO ALEIXO.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • ANIVERSARIO DE FALECIMENTO DO PROFESSOR PEDRO ALEIXO.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Lauro Campos, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/1996 - Página 4847
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, PEDRO ALEIXO, POLITICO, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).

            O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no início deste mês, assinalou-se o 21º aniversário de falecimento do ex-Deputado Pedro Aleixo.

            Falar de Pedro Aleixo é sentir sua valiosa presença em todos os recantos do velho Palácio Tiradentes, no Rio de Janeiro, e deste Palácio do Legislativo em Brasília - nos plenários, nas comissões e nos seus longos corredores.

            Figura exponencial entre os nossos vultos do passado, Pedro Aleixo reunia, na sua figura de homem simples, modesto e generoso, uma das mais lúcidas inteligências provindas das Minas Gerais.

            De rara coerência e fidelidade aos princípios da democracia, a que se manteve subjugado desde a sua juventude, foi eleito Deputado para a elaboração da Constituição de 1934 e, Presidente da Câmara em 1937, rompeu com o Presidente Getúlio Vargas por discordar do Estado Novo, que fechara o Congresso com intenções continuísta.

            Em 1943, foi um dos articuladores e signatários do histórico Manifesto dos Mineiros, que deu início à ruína da ditadura de então. Líder da oposição em 1963, participou da Revolução de 31 de março de 1964, convencido de que se fazia necessária para impedir a comunização do País.

            Em maio de 1969, já empossado Vice-Presidente da República, Pedro Aleixo foi incumbido pelo Presidente Costa e Silva de coordenar a elaboração da Emenda nº 1 à Constituição de 1967, por meio da qual, como se tornou do conhecimento público, Pedro Aleixo buscaria suspender o recesso do Congresso e criar as condições para a revogação do Ato Institucional nº 5.

            Esta a meta que compulsivamente perseguiu Pedro Aleixo, desde a deflagração do Movimento de 1964: o restabelecimento, o mais rápido possível, das nossas instituições políticas em bases democráticas, bandeira que desfraldou e empunhou em toda a sua vida pública.

            A partir daí, todo o País conhece a saga vivida por Pedro Aleixo. Impedido por doença o Presidente Costa e Silva, os Ministros militares de então assumiram o poder. Pelo Ato Institucional nº 12, de 31 de agosto de 1969, Pedro Aleixo foi impedido de substituir Costa e Silva na Presidência da República e pelo Ato Institucional nº 16, de 14 de outubro do mesmo ano, foi destituído da Vice-Presidência, alegando-se como motivo determinante dessa medida arbitrária a sua posição contrária ao Ato Institucional nº 5.

            Ainda ao tempo de Getúlio Vargas, após ter sido demitido da direção do Banco Hipotecário de Minas Gerais, por conta do Manifesto dos Mineiros, Pedro Aleixo não aceitou o convite para ser prefeito nomeado de Belo Horizonte.

            Em artigo que publiquei no Correio Braziliense, em março de 1975, dois dias após o falecimento de Pedro Aleixo, divulguei a informação de que, por intermédio de Rondon Pacheco, ele fora, em passado recente, sondado pelo governo militar para o Supremo Tribunal Federal, oferecimento que cordialmente recusou.

            Toda essas ações e atitudes, Sr. Presidente, sempre se inspiraram na fidelidade de Pedro Aleixo a uma linha de coerência que jamais foi desvirtuada.

            Como Líder do Governo Jânio Quadros, Líder da Oposição no Governo João Goulart e novamente Líder do Governo Castelo Branco, as posições a que Pedro Aleixo foi levado não surgiram de injunções políticas ou regionais, mas, como é sabido nos meios parlamentares, eram uma decorrência natural da sua competência, dedicação e lealdade, qualidades exalçadas pelos seus próprios adversários.

            Sinto-me bastante honrado, nesta oportunidade, em lembrar que, então exercendo as funções de jornalista político em Brasília, mereci de Pedro Aleixo a sua amizade pessoal. Depois que lhe foi imposta a arbitrária destituição - acontecimento que, se não tivesse existido, teria alterado sobremodo o registro de tantos eventos lamentáveis que se sucederam -, meu apartamento era o modesto local escolhido por Pedro Aleixo e sua esposa para se hospedarem em Brasília quando vinham a esta Capital.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a figura de Pedro Aleixo sempre representou um modelo a ser seguido, a ser oferecido aos jovens como um exemplo de homem que, pelo estudo, reuniu excepcional bagagem cultural sem jamais dela jactar-se; um exemplo de coerência às idéias mais puras e de lealdade aos compromissos assumidos na sua vida profissional, de inexcedível advogado, e na sua trajetória política, de intemerata conduta pública.

            O Sr. Lauro Campos -  V. Exª. me concede um aparte?

            O SR. EDISON LOBÃO -  Tem V. Exª. a palavra.

            O Sr. Lauro Campos - Quero somar minha voz à de V. Exª, neste momento em que se presta uma homenagem ao Professor Pedro Aleixo. Vizinho meu em Belo Horizonte e tendo sido meu colega de turma, desde o ginásio, seu filho Maurício, Pedro Aleixo foi eleito paraninfo da minha turma. E não me formei por isso; não por causa da figura do homenageado, mas pela maneira com que os alunos encaminharam o processo de escolha. Então marquei minha formatura na secretaria para o dia 14 de dezembro, e qual não foi minha surpresa quando, nesse dia, me dando um tapa de luva, compareceu Pedro Aleixo a minha formatura individual. Anos mais tarde, aqui em Brasília, ele me procurou, como também ao jornalista Rubens de Azevedo Lima e outras pessoas, em companhia de seu filho, o Padre José Carlos Aleixo, no intuito de organizar o terceiro partido, o PDR, com o qual pretendia mover uma luta em uma trincheira mais avançada do que aquela em que o MDB então havia se instalado. Assim, ele me procurou para organizar e fazer parte da comissão provisória nacional do PDR e também ao jornalista Rubens de Azevedo Lima, tendo ambos aceitado na ocasião essa tentativa - que sabíamos inalcançável - de arregimentar mais de um milhão de assinaturas em, no mínimo, sete Estados. Mas, realmente, vencer essa muralha protetora do bipartidarismo, imposta pelos militares, seria realmente uma tarefa acima de qualquer possibilidade. Quando quase todos desapareceram, na ocasião em que ele entrou no ostracismo, ao não poder assumir a presidência da República, eu e mais um colega, o Juiz Dario Viotti, íamos praticamente toda noite visitar sua solidão. Foi depois que ele nada era que passei a conhecê-lo mais de perto e a admirar aquela personalidade tão cheia de predicados. Muito obrigado.

            O SR. EDISON LOBÃO - Agradeço o aparte de V. Exª e o testemunho que traz sobre a personalidade marcante de Pedro Aleixo. De certo modo, há alguma coincidência entre a posição de V. Exª e a minha. Depois que ele nada era, V. Exª passou a visitá-lo; e depois que ele nada era, passei a hospedá-lo.

            Pedro Aleixo tinha uma personalidade realmente forte, homem honrado, um intelectual, um grande jurista e um político extraordinário.

            O Sr. Romero Jucá - Permite-me V. Exª um aparte, Senador?

            O SR. EDISON LOBÃO - Ouço com prazer o Senador Romero Jucá.

            O Sr. Romero Jucá - Senador Edison Lobão, em nome da Liderança do PFL, gostaria também de associar a minha posição pessoal e a posição do Partido à homenagem que V. Exª presta a Pedro Aleixo, porque entendemos que V. Exª referencia um homem de bem, referencia um exemplo de retidão, de caráter e de seriedade, que é importante não só para o presente, mas para as futuras gerações de políticos brasileiros. Eu gostaria de dizer que a imagem e a história de Pedro Aleixo serão importantes para o futuro e para que, cada vez mais, se consolide a imagem pública da política brasileira, no sentido da retidão de caráter, do cumprimento das obrigações e no sentido de encarar a vida pública como uma missão a ser dotada de caminhos que nem sempre são os melhores, mas sempre serão os caminhos da honradez que Pedro Aleixo trilhou. Quero parabenizar V. Exª e fazer parte também dessa homenagem singela que é prestada agora.

            O SR. EDISON LOBÃO - Recolho com alegria o aparte de V. Exª, que, neste momento, fala em nome da Liderança do PFL, que vem se juntar, portanto, a este pronunciamento que faço no tarde de hoje, em homenagem à memória de um grande brasileiro, que foi, sem dúvida alguma, Pedro Aleixo.

            O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. EDISON LOBÃO - Ouço com prazer V. Exª.

            O Sr. Bernardo Cabral - Eminente Senador Edison Lobão, a grande verdade é que dificilmente os contemporâneos fazem justiça ao homem público. Geralmente são os seus pósteros que, à distância do tempo, quando a poeira da maldade assenta, uma plêiade ou de historiadores ou de Parlamentares, como V. Exª agora, à frente dessa homenagem, relembra alguém como a figura de Pedro Aleixo. Quero dar meu depoimento pessoal. Quando cheguei à Câmara dos Deputados, em 1967, mal havia entrado na casa dos trinta anos de idade, Pedro Aleixo era o Presidente do Congresso. Naquela altura, como sabe V. Exª, o Vice-Presidente presidia o Congresso. Convivi muito com ele. Meu filho era garotinho, ele chamava o Júlio de meu secretário. Aconselhou-me muito. Quando o Ato Institucional nº 5 foi editado e meu nome levado à cassação e à perda de dez anos de direitos políticos, o único voto contrário foi o do Vice-Presidente Pedro Aleixo. Tomei conhecimento disso porque um ajudante-de-ordens do Chefe da Casa Militar, numa carta e, mais tarde, em um depoimento ao filho de Pedro Aleixo, nosso Padre Aleixo, que está fazendo um trabalho sobre essa época, esteve conversando comigo sobre esse tempo em que Pedro Aleixo dizia ter medo do Ato Institucional nº 5 não no que diz respeito à grande autoridade, mas no que diz respeito ao guarda da esquina, que poderia exagerar naquilo que fizesse. Passado o tempo, ainda pouco ouvi o Senador Lauro Campos, absolutamente independente para dar o seu depoimento, dizendo que no ostracismo o procurou, como tantos outros. Eu mesmo vejo com alegria essa atitude espontânea de V. Exª de trazer para a tribuna do Senado a homenagem a um homem público que foi, sobretudo, um grande político, o maior jurista e possuidor de uma qualidade excepcional: a lealdade a seus amigos. Quero associar-me à homenagem que V. Exª, muito oportuna e merecidamente, presta à memória de Pedro Aleixo.

            O SR. EDISON LOBÃO - Recebo com muita honra as palavras de V. Exª, que ficarão transcritas nos Anais do Senado Federal como mais um testemunho sobre a personalidade desse homem extraordinário que foi Pedro Aleixo.

            Esse episódio do AI-5 - e ele conversava muito comigo, quase todos os dias tomávamos café da manhã juntos - foi um episódio curioso e ainda pouco explicado para a história da política brasileira. Costa e Silva, que editou o Ato Institucional nº 5, na verdade, não queria fazê-lo. Depois de ter conversado com Pedro Aleixo sobre o assunto e de ter recebido as suas ponderações contrárias à edição do AI-5, pediu a seu Vice-Presidente que, na reunião do Conselho de Segurança Nacional, exibisse as suas razões contra a edição do AI-5, e Pedro Aleixo falou durante vinte e cinco minutos, num libelo, contra a tentativa de se editar ali o Ato Institucional nº 5.

            Ficou absolutamente sozinho. Nenhum membro do Conselho de Segurança Nacional, militares ou civis, nenhum deles acompanhou Pedro Aleixo e o próprio Presidente da República, que não desejava o AI-5. Costa e Silva ainda fez uma tentativa curiosa: pediu ao secretário do Conselho de Segurança Nacional que pusesse a fita, objeto da gravação do discurso de Pedro Aleixo, para que os ministros que sentaram mais ao fundo da sala pudessem ouvir melhor as palavras do Vice-Presidente da República. É claro que os ministros todos haviam escutado muito bem as palavras do Vice-Presidente, mas ele queria repetir aqueles argumentos ainda no seu desespero pessoal para não editar o AI-5. E assim foi repetida a gravação. Posta em votação, todos os ministros votaram a favor do AI-5, inclusive os ministros civis, alguns dos quais deputados e senadores.

            Daí por diante, exatamente em razão disso, Pedro Aleixo caiu em desgraça com os militares. O Secretário do Conselho de Segurança Nacional, um general, tomou a si a incumbência de enviar uma carta a todos os oficiais-generais das Forças Armadas, encaminhando o discurso de Pedro Aleixo e procurando insinuar que o Vice-Presidente da República estava traindo a revolução, na medida em que não desejava a edição do AI-5.

            Essa é a bela história desse grande brasileiro e político que foi Pedro Aleixo.

            Vejo aqui o Senador Josaphat Marinho e lembro-me de que, quando eu era jornalista, S. Exª, por muitas vezes, quando foi Presidente da grande Comissão que elaborou a Constituição de 1967, comentou comigo a respeito. Josaphat Marinho escreveu um capítulo sobre os direitos e garantias individuais para aquela Constituição. Pedro Aleixo elogiava muito esse trabalho, o qual considerava extraordinário. Naquela época, o Relator era o Senador Konder Reis, que ficou encarregado de examinar a proposta de Josaphat Marinho; tanto quanto sei, grande parte dessa proposta foi introduzida na Constituição de 1967, que era uma boa Carta Constitucional.

            Esse homem militou na política brasileira naquela fase intensa. Tempos depois, obstinado em reabrir o Congresso Nacional, que estava compulsoriamente colocado em recesso, e em retomar o caminho da democracia, ele convenceu Costa e Silva a fazer uma grande emenda constitucional, conhecida como a Emenda nº 1 de 1969. Costa e Silva encarregou o Ministro da Justiça, Gama e Silva, de fazê-la. Gama e Silva não desejou fazê-la, e, então, Pedro Aleixo tomou a si esse encargo.

            Certa vez, Pedro Aleixo mandou-me uma carta, que tenho nos meus arquivos, em que comentava uma observação do Presidente Costa e Silva a respeito de um artigo que ele, Pedro Aleixo, havia redigido e que possibilitava a revogação do AI-5.

            Pedro Aleixo escrevera: "Ouvido o Conselho de Segurança Nacional, o Presidente da República decretará a revogação do AI-5".

            Costa e Silva o chamou e disse: "Dr. Pedro, retire essa parte que diz "ouvido o Conselho de Segurança Nacional", porque, se tivermos que ouvir o Conselho de Segurança Nacional, vai ocorrer aquilo que acontecia no circo romano, em que todos apontavam o dedo para baixo".

            Então, foi retirada essa parte do artigo, que ficou redigido simplesmente assim: "O Presidente da República revogará o AI-5". E assim foi feito muito tempo depois, com essa possibilidade, sem ouvir o Conselho de Segurança Nacional.

            Artigo do Padre e Professor José Carlos Brandi Aleixo, publicado, entre outros jornais, pelo Correio Braziliense e pelo O Estado de Minas Gerais, ambos aos 3 do corrente mês, acompanhados de judiciosos comentários, dá uma síntese notável do difícil caminho percorrido na vida pública pelo Dr. Pedro Aleixo. Acredito que esse artigo e os comentários, pela sua substância e pelo brilhantismo de sua redação, devem ser perenizados em nossos Anais, em uma modesta homenagem que podemos prestar à memória do grande brasileiro Pedro Aleixo.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/1996 - Página 4847