Questão de Ordem no Senado Federal

INDAGA SE O REQUERIMENTO ENVIADO A CCJ, SOBRE A INDICAÇÃO DE MEMBROS DE CPI, ESTA DE ACORDO COM O REGIMENTO INTERNO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Questão de Ordem
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO.:
  • INDAGA SE O REQUERIMENTO ENVIADO A CCJ, SOBRE A INDICAÇÃO DE MEMBROS DE CPI, ESTA DE ACORDO COM O REGIMENTO INTERNO.
Publicação
Publicação no DSF de 15/03/1996 - Página 4107
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, REQUERIMENTO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, RESPEITO, NORMAS, REGIMENTO INTERNO, REMESSA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Sr. Presidente, Srs. Senadores, em primeiro lugar quero registrar que, no que diz respeito à minha participação no episódio, confirmo todas as palavras que foram pronunciadas pelo Senador Antonio Carlos Valadares.

Em segundo lugar, não entendo essa ojeriza que o Governo Fernando Henrique Cardoso tem a CPI. Todos sabemos que este Governo foi filho de uma CPI.

Mas, Sr. Presidente e Srs. Senadores, a meu ver, o que está em discussão, neste momento grave por que passa a vida política nacional, é a própria importância do Congresso Nacional e do Senado da República no fortalecimento da democracia brasileira.

Por isso, eu gostaria de "relativizar", quando se diz que o Congresso tem culpa em tudo o que está acontecendo, porque o Congresso não é uma coisa amorfa, que está alheia à influência do Executivo. Uma série de questões que foram levantadas ainda não foram aprovadas por uma ação efetiva das Lideranças do Governo no Congresso Nacional, como por exemplo, a regulamentação das MPs.

No primeiro semestre do ano passado, estava em pauta no Senado da República o projeto do então Deputado Nelson Jobim, atual Ministro da Justiça, que limitava a reedição de MPs. E esse projeto não foi a voto em função da ação das Lideranças do Governo, que propuseram seu adiamento. Quando o Ministro Nelson Jobim era Deputado, interessava que o Congresso tomasse posição sobre as MPs. Agora ele é Ministro da Justiça, talvez não interesse tanto. Então, vamos "relativizar", quando se fala que é o Congresso.

Eu já disse algumas vezes que, no meu entendimento, as Lideranças do Governo estão ultrapassando uma linha que considero perigosa, que é a de defender legitimamente os interesses do Executivo no Congresso Nacional. Mas estamos ultrapassando essa linha, na medida em que, muitas vezes, esses interesses do Executivo, esses interesses do Governo - e o Governo é provisório e a instituição é permanente - estão afrontando as atribuições constitucionais do Congresso Nacional.

E aí vem a estratégia de, desrespeitando uma vontade do Senado da República, através de um requerimento de CPI - porque como já disse o Senador Pedro Simon, à medida que o Regimento do Senado, do Congresso e da Câmara prevê que o requerimento para instalação de uma CPI exige 27 assinaturas, está implícito que a CPI é instrumento também de garantia das minorias. À medida que as Lideranças do Governo se utilizam de um estratagema como esse de não indicar seus representantes para evitar a instalação da CPI, está desrespeitando uma vontade da Casa. E para ver que essa prática não é só no que diz respeito à CPI, diz-se que é porque vai causar quebra do sistema, etc - recomendo até aos Srs. Senadores que leiam o artigo do jornalista Aloysio Biondi, publicado hoje na Folha de S. Paulo, onde ele mostra exemplos da Coréia, da Itália, do Japão, dos Estados Unidos, de casos tão ou mais escabrosos do que esse e que deram como resultado a prisão de banqueiros, a destituição de dirigentes, de políticos, etc..

           Mas quando cito que muitas vezes os Líderes do Governo estão, através de suas estratégias, desrespeitando a vontade da Casa, cito outro exemplo, mais prosaico, que não é a CPI: se os Srs. Senadores tiverem a curiosidade de pegar os avulsos da Casa, verão que lá existe uma Comissão que foi criada a partir de requerimento aprovado no plenário da Casa, um requerimento de autoria de um Senador do PSDB, Senador Lúcio Alcântara, que cria uma Comissão para começar a estudar as leis que vão regulamentar as mudanças na Constituição. Essa comissão, até hoje, não foi instalada, porque o Líder do PSDB não indicou os seus membros; um requerimento de autoria de um Senador do PSDB, que foi aprovado pelo Plenário da Casa, e que não teve a comissão instalada porque o Líder do PSDB não indicou. Isso é culpa do Senado? Isso é culpa do Congresso? Ou isso é culpa das Lideranças do Governo que não estão entendendo o papel que têm, no meu sentir, de defender legitimamente os interesses do Executivo, do Governo, mas sem ultrapassar as fronteiras das prerrogativas do Congresso Nacional?

Entendemos que essa posição das Lideranças do Governo está contribuindo para a desmoralização do Senado. É isso que dá margem a que um cidadão de segundo escalão se recuse a comparecer, a atender a um convite do Senado. É isso que faz com que os membros do primeiro escalão, ao comparecerem às comissões permanentes do Congresso, se recusem a responder a uma série de perguntas que consideramos importantes, como já foi citado aqui o exemplo da pergunta feita pelo Senador Eduardo Suplicy ao Dr. Gustavo Loyola, que não a respondeu - e que foi reforçada por mim - , a qual ele disse que responderia por escrito e, até hoje, pelo que saiba, não chegou.

São medidas como essa, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que vêm sendo tomadas pelos Líderes do Governo, que contribuem para o enfraquecimento da instituição Congresso Nacional e da instituição Senado da República.

Para concluir, gostaria de estender um convite a todos os Senadores, um convite que está sendo formulado pelas lideranças do PT, do PDT, do PSB e do PPS e pelo Senador Antonio Carlos Valadares, autor do requerimento, convidando diversas entidades da sociedade civil para uma reunião, amanhã, às 17h, na sala 07, da Ala Alexandre Costa do Senado Federal, para discutir uma estratégia relativa à questão da CPI e pressionar as Lideranças do Governo no sentido de que esta seja efetivamente instalada, como foi a vontade do Senado da República, de acordo com o requerimento que teve o número regimental de assinaturas. Já tivemos a confirmação de representantes da CUT, da CGT, da Força Sindical, da CNBB, da OAB e da ABI, que estarão presentes nessa reunião e estamos convocando todos os Senadores, particularmente aqueles que são signatários do requerimento.

O SR. PRESIDENTE (Gilberto Miranda) - Com a palavra o Senador José Fogaça.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Sr. Presidente, quero comunicar V. Exª que convoquei para hoje, às 18h, a primeira reunião da Subcomissão que visa elaborar uma proposta para a regulamentação do sistema financeiro. Portanto, atendendo à indicação de V. Exª, já marcamos o primeiro momento de trabalho da Comissão.

Sr. Presidente, eu talvez não trouxesse o comentário e a reflexão que pretendo fazer, caso não houvesse tantas intervenções a respeito dessa matéria. Mas parece-me que há uma reflexão que precisa ser feita. O que vou dizer é constrangedoramente simplório, não tem nenhuma eloqüência.

Grande parte das pessoas que estão aqui listadas, como convocadas para depor na Comissão, são pessoas que o mercado financeiro costuma chamar de insiders: são pessoas que estão por dentro das informações, detentoras de um volume significativo de informações e, portanto, pessoas cuja fala, cuja expressão, cuja manifestação gera efeitos, inevitavelmente. Então, são pessoas que, através da liberação ou não de informações, modificam tendências do próprio mercado. Nesse ambiente, que para muitos aqui é desconhecido, inclusive para mim que nunca tive, na minha vida, nenhuma atividade nem próxima disso, mas para a maioria das pessoas isso é desconhecido.

No entanto, diferentemente de outros ambientes e outras áreas produtivas do País, a área financeira tem uma característica: nela, a informação não é um meio, como nos outros sistemas, mas um fato; a informação é poder, é dinheiro. A informação muda vidas, tira vidas dentro do mercado financeiro.

A questão em que os Senadores deveriam pensar, Sr. Presidente, é a seguinte: estamos convocando insiders para darem depoimentos extremamente delicados, que têm uma peculiaridade típica do inside information, que é a informação que tem peso, que muda decisões de quem conhece o mercado.

Podemos imaginar, Sr. Presidente, que algumas dessas pessoas virão aqui prestar depoimento e liberarão informações que têm esse conteúdo de inside information inadvertidamente? Não. Elas gostariam ou poderiam vir caso houvesse garantia de reserva, ou seja, manutenção garantida do sigilo da informação.

E aí há uma pergunta que os Senadores devem fazer a si mesmos, porque, se não a fizerem, não estarão sendo responsáveis consigo próprios, nem com o País; se queremos saber, se é necessário termos informações que estão dentro do mercado financeiro, cabe uma pergunta para nós mesmos: que garantias somos capazes de dar a esses depoentes que estamos convocando quanto à preservação do sigilo, ou seja, quanto à garantia de reserva, à manutenção da reserva da informação?

Em primeiro lugar, não há nenhum instrumento regimental para punir um Senador que resolva quebrar o sigilo ou a reserva da informação. Logo, isso significa uma ausência real de garantia.

O SR. PRESIDENTE (Gilberto Miranda) - Falta de decoro, Senador.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Mas isso não está regulamentado, Sr. Presidente.

Por outro lado, também não criamos mecanismos pelos quais esse tipo de depoimento possa ser dado em reuniões fechadas, dentro de um padrão de segurança, reconhecido e comprovado através do tempo, para as informações que estão sendo dadas.

Por isso, Sr. Presidente, nunca houve na história do Congresso e na história da Comissão de Assuntos Econômicos depoentes que trouxessem esse tipo de informação. Queremos inaugurar algo que nunca aconteceu.

E tenha certeza V. Exª de que, mesmo em uma CPI, essas informações, que são informação de quem está por dentro do mercado, serão também recusadas. Podemos alegar que queremos saber a verdade, mas, nessa área, a verdade não é apenas verdade, lídima, pura, impoluta; nessa área, verdade é poder, é dinheiro. A verdade muda milhões de dólares de um bolso para outro pela via dos computadores, porque verdade é informação, Sr. Presidente.

           Ou os Senadores entendem isso e passam a agir na estrutura interna da Casa, de modo que se possa ter esse tipo de procedimento, ou então vamos aceitar, talvez com menos indignação, porque aí, conscientes de que não estamos preparados, que essas pessoas se recusem. E aqueles que não se recusarem, que vierem depor, como sei que os Ministros e o Presidente do Banco Central vão fazer, tenha a certeza V. Exª, quando se tratar de informação "insider", ele não dará a informação. E esse foi o cuidado que tecnicamente, sabiamente, teve o Presidente do Banco Central quanto à pergunta do Senador Eduardo Suplicy: "Vou lhe mandar por escrito", porque o Senador Eduardo Suplicy ficará detentor de um poder que, nesse sistema, pode ser traumático, e é preciso que só ele saiba, porque se alguém ficar sabendo ele será responsável política e publicamente. Correta a posição do Presidente do Banco Central, e nada impede que o Senador Eduardo Suplicy detenha essa informação e a mantenha em segredo reservadamente, para fins da sua atuação parlamentar.

Desse modo, quero apenas, concluindo, tentar associar essa questão com a nossa Subcomissão, que V. Exª, inteligentemente, juntamente com as Lideranças da Casa, resolveu instalar na nossa Comissão. Pensarmos e refletirmos sobre o que poderemos ter, como podemos funcionar e o que podemos garantir na audiência a esses depoimentos. Tenho certeza, Sr. Presidente, que se trabalharmos nessa direção, teremos mais eficácia nas convocações e menos indignação nos nossos discursos.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/03/1996 - Página 4107