Discurso no Senado Federal

DECLARAÇÃO DO GOVERNADOR TASSO JEREISSATI, SOBRE O ARQUIVAMENTO DA CPI DO SISTEMA FINANCEIRO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.:
  • DECLARAÇÃO DO GOVERNADOR TASSO JEREISSATI, SOBRE O ARQUIVAMENTO DA CPI DO SISTEMA FINANCEIRO.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/1996 - Página 4951
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, TASSO JEREISSATI, GOVERNADOR, ESTADO DO CEARA (CE), ASSUNTO, ARQUIVAMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, RELAÇÃO, UTILIZAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CESSÃO, CARGO PUBLICO, CONGRESSISTA, OPOSIÇÃO, APOIO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, GOVERNO.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também pretendo fazer alguns comentários sobre o assunto CPI, seguindo a mesma linha do Senador Eduardo Suplicy.

Inicialmente, gostaria de registrar que me surpreenderam profundamente as afirmações dos jornais, atribuídas ao Governador Tasso Jereissati, que ultimamente não tem sido muito feliz em suas declarações. Primeiro, foram aquelas feitas no Japão e, agora, falou que "houve fisiologismo, mas um fisiologismo circunstancial".

Em breve, chegaremos a uma situação em que fisiologismo circunstancial será perdoável.

Não sei qual é a diferença entre fisiologismo circunstancial e fisiologismo permanente, ou constante. Para mim, tudo é fisiologismo.

E diz aqui o Senador Eduardo Suplicy que o importante é S. Exª reconhecer que houve fisiologismo. Realmente. Mas essas afirmações depõem contra o Congresso Nacional e contra o Governo Federal, porque fisiologismo, assim como corrupção, é uma prática que não tem mão única; tem duas mãos.

Se houve comportamento fisiológico por parte de parlamentares que, porventura, tenham mudado os seus votos em relação à Previdência ou à CPI, isso deve ter-se dado em função de uma ação do Poder Executivo, de um Governo que, durante a sua campanha, fazia questão de registrar que estava inaugurando um novo tempo e um novo modo de se fazer política no País.

Lembro-me de que o então Senador Fernando Henrique Cardoso, por diversas vezes, fez declarações contrárias à utilização da máquina pública para se conseguir votos no Congresso Nacional.

A imprensa tem divulgado isso e as justificativas, até o momento, têm sido pouco convincentes. Agora vem o Governador do Ceará, Tasso Jereissati, confirmar que houve fisiologismo, que, no entanto, é perdoável por ser circunstancial.

Será que é este tipo de Governo e de Congresso que queremos: dos que não se submetem ao fisiologismo constante, mas ao circunstancial?

Isto é tão grave quanto a própria decisão, tomada na semana passada, de arquivamento de um direito da minoria. Houve aqui uma demonstração explícita de ditadura da maioria, o que é bastante diferente de uma democracia, que pressupõe prevaleça a vontade da maioria, mas com respeito aos direitos da minoria.

Nunca é demais repetir - e já o fizemos, por diversas vezes, na discussão da matéria na semana passada - que a Comissão Parlamentar de Inquérito é um direito constitucional da minoria de 1/3 das Casas, em conjunto, ou individualmente, por meio de requerimento subscrito. Daí 1/3 de parlamentares criarem a comissão parlamentar de inquérito.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Nobre Senador José Eduardo Dutra, V. Exª enfoca um assunto que traz outro à tona. O Governador Tasso Jereissati, investindo-se de porta-voz do Presidente da República no Japão, tachou todos aqueles que promoveram a criação da CPI de terem cometido um ato de irresponsabilidade e de terem sido levianos. S. Exª, talvez, com essa acusação infundada e intempestiva, apenas para agradar ao Presidente da República, estivesse antecipando o seu outro ato de irresponsabilidade política, ao esclarecer, em entrevista concedida no Recife, que reformas políticas, como a da Previdência ou o sepultamento de uma CPI como a dos bancos, só poderiam ocorrer fazendo uso da máquina do Governo, ou de um fisiologismo que S. Exª, lá no Ceará, condena de araque. O Presidente da República se esqueceu - como V. Exª acentuou - de todas aquelas promessas feitas durante a campanha eleitoral, quando obteve uma votação notável, elegendo-se para Primeiro Magistrado desta Nação. Então, trata-se somente do modo de se falar: "faça o que digo, mas não faça o que faço". Aprendemos isso no nosso Nordeste. As palavras, de repente, são esquecidas, jogadas no esquecimento. E vêm os conselhos através da televisão, mas, na prática, fazem justamente o contrário. Daí, devido à inconstância de determinados políticos, a opinião pública, sempre que é procurada para responder a alguma pesquisa, declara que a classe política não merece confiança, que os políticos agem sempre de má-fé, procurando enganar o eleitor. Mas quem o engana? São as oposições? Aqueles que desejam impor um ritmo de seriedade à coisa pública? Não. Quem está enganando a Nação e a população são aqueles que, a pretexto de uma pretensa estabilidade monetária, derrubaram a CPI dos Bancos. Agem com irresponsabilidade aqueles que, utilizando-se da máquina administrativa, praticam o fisiologismo de forma desbragada, como ocorreu na semana passada, com a aprovação da reforma da Previdência e com a derrubada do requerimento da CPI. V. Exª tem toda razão quando diz ser preocupante essa postura do Governo democrático do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Em face da possibilidade de ser aprovada a CPI numa segunda instância - como havia sido em plenário -, acenaram com o recurso do fisiologismo e com as declarações ameaçadoras de que o País poderia utilizar-se do exemplo do Peru, aplicando o regime de Fujimori. Quem saberia dizer se isso aconteceria? Penso que o Exército brasileiro está com as "barbas de molho", cansado de sempre ser chamado por aqueles que desejam continuar no poder para dar golpe de estado. O Exército está consciente do seu papel de instrumento de salvaguarda da nossa Constituição e das instituições democráticas. Creio que o Ministro Sérgio Motta deveria ter outro nome - S. Exª me perdoe -, mas deveria ser Sérgio "Ditadura", porque S. Exª pregou abertamente, para que toda a Nação lesse nos jornais, ouvisse no rádio e visse na televisão que cometeu uma atitude que poderia condená-lo e até destituí-lo do Ministério: S. Exª pregou abertamente uma conspiração contra as instituições democráticas. De modo que, Senador José Eduardo Dutra, somos responsáveis; irresponsáveis são S. Exªs. Muito obrigado.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Muito obrigado, Senador Antonio Carlos Valadares.

Por falar em opinião pública, o que o Governo gosta muito de registrar, as pesquisas mostram que a maioria absoluta, pelo menos daquele universo pesquisado, que foi a cidade de São Paulo - com certeza, se a pesquisa se estender ao resto do Brasil, não teríamos resultado diferente -, as pesquisas mostram que a maioria absoluta da população quer a CPI. Mesmo setores que apóiam o Governo Fernando Henrique Cardoso, que o consideram um bom Governo, querem a CPI, porque entendem aquilo que já dissemos por diversas vezes aqui: não queremos a comissão parlamentar de inquérito para atacar o Governo; entendemos que a CPI é uma atribuição do Poder Legislativo e que, particularmente, nessa questão dos bancos, é necessária uma investigação mais aprofundada.

A postura do Sr. Cláudio Mauch, hoje, em seu depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, demonstrou mais uma vez que a única forma de as autoridades econômicas do Governo prestarem os esclarecimentos necessários, é uma CPI. Durante as Comissões Permanentes do Senado, e isso se deu não apenas com o Sr. Cláudio Mauch, mas com o Sr. Gustavo Loyola e o Ministro José Serra, os depoentes vêm aqui e não respondem as perguntas. E isso ficou demonstrado hoje, na Comissão de Assuntos Econômicos, particularmente com relação às perguntas feitas pelos Senadores Eduardo Suplicy e Roberto Requião, quando as perguntas não foram respondidas, porque talvez não considerem as Comissões Permanentes com autoridade suficiente para inquiri-los.

Tenho certeza de que essa questão da CPI não vai parar por aqui, não só pelo nosso mandado de segurança, ao qual daremos entrada na próxima quinta-feira, como também as iniciativas da Câmara dos Deputados e a possibilidade de uma CPI mista do Congresso Nacional. Mais cedo ou mais tarde, mostrar-se-á necessária, até para a própria liderança do Governo, uma CPI. Não tenho dúvida de que a CPI será uma espécie de Fred Krueger para o Governo Fernando Henrique Cardoso. Ficará tal qual um cadáver insepulto, tal qual um zumbi rondando e voltando às atividades, até porque sabemos que surgirão novos fatos envolvendo o Sistema Financeiro. Sabemos que o Governo continuará socorrendo bancos falidos. Não sei qual será o próximo. O mercado está dizendo, murmurando quem vai ser o próximo. Não vou dizer, porque senão vão considerar que estamos contribuindo para a instabilidade do Sistema Financeiro ou para a instabilidade desse ou daquele banco. Mas o burburinho do mercado já começa a se fazer ouvir e, com certeza, o Governo vai-se utilizar mais uma vez de recursos para socorrer esses bancos. Não sei até quando se justificará a utilização de recursos que, embora o Governo diga que não são públicos - é lógico que não são do Tesouro. Não é preciso ser economista para saber que esses recursos que são injetados no Proer mais cedo ou mais tarde acabarão aumentando a dívida interna brasileira e terão efeitos sobre os juros, sobre a indústria, sobre o comércio. Então, não dá para dizer que não são recursos públicos; a não ser que entendamos recursos públicos apenas sob o sentido estrito de recursos do Tesouro...

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador José Eduardo Dutra, V. Exª tem algum conhecimento de que existe por aí afora algum Proer para socorrer bancos? Isso porque procurei fazer uma pesquisa e não encontrei esse "jeitinho brasileiro" de salvar bancos falidos. V. Exª, nas pesquisas que faz seu partido, que tem realmente um assessoramento extraordinário, chegou a alguma conclusão? É possível que nos Estados Unidos, na Inglaterra, no Japão, na Índia, na China, seja lá onde for, em alguma parte do mundo, exista esse instrumento milagroso de colocar em funcionamento instituições falidas, por intermédio da ajuda do Governo? Esses recursos, que representam uma grande sangria para o desenvolvimento nacional, podem ser empregados, como o próprio Gustavo Loyola aqui afirmou, na abertura de linhas de crédito para financiamento da indústria, do comércio e da agricultura. Então, pergunto a V. Exª, já que estamos nesse diálogo em favor da CPI, já que estamos juntos nesta luta, se há realmente algum Proer fora do Brasil.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA - Senador Antonio Carlos Valadares, já tive oportunidade de dizer aqui no plenário deste Senado um ditado popular que diz o seguinte: "Tudo aquilo que só existe no Brasil e não existe em outros países ou é jabuticaba, ou é besteira". E penso que estamos diante de um episódio semelhante.

As informações que temos dão-nos conta justamente do contrário. Há o exemplo recente do banco Daiwa, nos Estados Unidos, um dos maiores bancos daquele País que, em função de irregularidades, foi multado em 300 milhões de dólares. Aqui se faz o contrário. Deve ser o clima tropical!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para concluir, eu gostaria de registrar mais uma vez que acreditamos que o Supremo Tribunal Federal, como órgão, como instância guardiã da nossa Constituição vai acatar o nosso mandado de segurança, no sentido de garantir a continuidade dos trabalhos da comissão parlamentar de inquérito que foi criada e instalada nesta Casa e vai corrigir esse flagrante desrespeito à Constituição que infelizmente o Plenário do Senado Federal cometeu na semana passada.

Acreditamos que isso vai acontecer, até porque continuamos acreditando no estado de direito, na Constituição e na democracia brasileira.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/1996 - Página 4951