Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 120 ANOS DO JORNAL A PROVINCIA DO PARA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 120 ANOS DO JORNAL A PROVINCIA DO PARA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/1996 - Página 4976
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, JORNAL, A PROVINCIA DO PARA, ESTADO DO PARA (PA).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a semana que transcorre é especial para o povo paraense, em particular para os jornalistas que militam na imprensa escrita em todo a Amazônia, e por que não dizer em todo o Brasil.

Com júbilo, o Pará comemora os 120 anos de fundação do Jornal A Província do Pará, transcorridos na última segunda-feira, 25 de março. Na verdade a festa é da imprensa brasileira, isto porque A Província, como é mais conhecida em toda a planície amazônica, é um dos cinco jornais mais antigos que circulam no Brasil atualmente.

Fundado em 1876, em pleno Império, com seus cento e vinte anos de existência, o matutino vem renovando a tradição de testemunhar o cotidiano da história paraense sendo, ao mesmo tempo e em muitas ocasiões, sujeito e objeto dessa mesma história, aliando a força e a ousadia próprias dos jovens à experiência peculiar dos que amadureceram atravessando, ao longo dos anos, adversidades sem conta, crises políticas, crises econômicas, motins, revoltas, incêndios...

Nem mesmo o fogo, criminosamente ateado no início do século por motivações políticas, conseguiu silenciar aquele jornal que, anos antes do sinistro, fora premiado no exterior com o mérito da modernidade jornalística.

A Província do Pará, fundada pelo líder do Partido Liberal paraense na época da Monarquia, o influente político Joaquim José de Assis, contou também com a participação efetiva do jovem Antonio Lemos, que viria futuramente a notabilizar-se como um dos maiores vultos políticos do Estado, tendo inclusive representado o povo paraense como Senador, já no período republicano. Além destes, participou ainda da fundação do jornal o mestre em artes gráficas Francisco Cerqueira.

Assim, no dia 25 de março de 1876 - data em que se comemorava o 52º aniversário do juramento da Constituição Política do Império - o pequeno Jornal foi às ruas, em formato tablóide, destacando abaixo do letreiro principal dois versos de Victor Hugo, com a seguinte tradução:

      "...É permitido, mesmo aos mais fracos,

      de ter uma boa intenção e de a dizer..."

Foi a partir de 2 de novembro de 1889, às vésperas da Proclamação da República, que A Província passou a circular sob a inteira responsabilidade de Antônio Lemos, posto que a viúva do Dr. Assis, falecido naquele ano, resolvera passar sua parte na sociedade para Lemos, que já adquirira anteriormente a parte de Francisco Cerqueira, falecido em 1880, de modo que recaiu unicamente sobre os ombros de Antônio Lemos a responsabilidade em continuar aquela obra.

Apesar da agitação política daqueles dias que testemunhavam a queda do Império e a instalação do regime republicano, A Província, por decisão de seu redator-chefe Antônio Lemos optava pela neutralidade política, de tal forma que logo abaixo de seu cabeçalho podia ser lida a seguinte expressão "Órgão neutro nas lides partidárias", como se a neutralidade fosse possível num tempo em que a política era movida, antes de tudo, pela paixão e muitas vezes pelo desatino...

Nessa época, o jornal passou a circular em formato grande e seu logotipo já era em estilo gótico, como se mantém até hoje. No expediente, apareciam os nomes do fundador, Joaquim José de Assis; do redator-chefe, Antônio Lemos; do secretário de redação, Marques de Carvalho e do Administrador, Frederico Rhossard.

A partir desse período o Jornal passou por radicais transformações. Até então a primeira página era reservada para anúncios, sendo que as notícias e comentários eram diagramadas nas duas páginas internas. Alterando esse costume, A Província passou a circular com notícias, comentários e colunas na primeira página, lançando na imprensa escrita brasileira uma paginação moderna e inovadora.

Até 1897 Antônio Lemos trabalhou como único proprietário do jornal. A partir de então, passou a constar no expediente o nome de Pedro Chermont, como redator-gerente, posteriormente substituído por Antônio Chermont. As mudanças na direção eram acompanhadas pela modernização do jornal, já então impresso em oito colunas, num padrão fora do comum para a época, graças à moderna rotativa Marinoni, importada da Europa.

A sociedade entre Lemos e Chermont, contudo, pelas artes da vida pública de ambos não sobreviveu durante muito tempo. As divergências políticas que levaram ao rompimento dos dois no ano de 1900 acabaram refletindo no jornal, que deixou de circular, atingido pela crise entre os sócios.

Essa primeira interrupção na vida de A Província não durou muito, pois Antônio Lemos, já então intendente (prefeito) de Belém, acabou derrotando politicamente os Chermont, aliados de Lauro Sodré, a partir da eleição de seu correligionário Augusto Montenegro para o governo do Estado, dando início à oligarquia Lemista.

Ao voltar a circular, em 1º de maio de 1901, A Província encontrava-se novamente sob a propriedade exclusiva de Antônio Lemos, já que este comprara as cotas de seus antigos sócios e transformara o jornal no veículo de divulgação de suas idéias e projetos políticos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, chamo a atenção de V. Exªs para o papel fundamental que A Província sempre desempenhou na vida paraense, visto que em suas páginas encontra-se um acervo vivo da história política deste País nos últimos 120 anos.

À medida em que crescia o prestígio político de Antônio Lemos, ampliava-se também a influência de A Província no cotidiano do povo paraense. Como intendente de Belém, Lemos transformou a cidade, mudando-lhe o traçado urbano e imprimindo-lhe aspectos comparáveis às grandes metrópoles européias.

Belém de então era, segundo muitos, a terceira capital do Brasil, superada apenas pelo Rio de Janeiro e por São Paulo. Tanto que em visita ao intendente do Rio, Dr. Pereira Passos, responsável por uma verdadeira revolução urbanística na Capital Federal daqueles anos, recebeu Antônio Lemos do gestor carioca a seguinte saudação: - "Estou começando a fazer na minha cidade o que V. Exª já fez na sua..."

Todo este pendor de homem público que notabilizava Antônio Lemos, não poderia deixar de refletir em seu jornal. A Província passou a ser mais que um jornal. Transformou-se no referencial para a intelectualidade amazônida, de tal modo que sua redação, abrigo dos maiores nomes das letras paraenses, era denominada entre os íntimos da casa como o cenáculo. A toda essa grandeza acompanhava a modernidade e o avanço tecnológico então permitido.

A Província do Pará, nesse período, tida como um dos mais modernos jornais do País, possuía equipamentos gráficos de última geração, todos importados da Europa, funcionando nas instalações do grandioso prédio onde hoje está abrigado o também centenário Instituto de Educação do Pará-IEP, na Praça da República, no centro da Cidade das Mangueiras.

Todo esse apogeu, no entanto, teve o seu ocaso.

Nas primeiras décadas da República, a luta política no Pará, como em todo o Brasil, era travada entre o limiar do idealismo e do ódio...

Temendo que Lemos recuperasse seu poder - ele que em junho de 1911 renunciara à intendência de Belém a pedido de Augusto Montenegro, cuja intenção era alçá-lo ao Governo do Estado em fevereiro do ano seguinte -, os lauristas, partidários de Lauro Sodré, passaram a hostilizar feroz e publicamente a figura de Antônio Lemos.

As agressões promovidas pelos partidários de Lauro Sodré visavam justificar um conflito popular em que ocorresse confronto entre lemistas e lauristas, plano esse arquitetado com um único objetivo: destruir as dependências do jornal A Província do Pará, fragilizando, assim, a influência política de Antônio Lemos junto ao povo de sua terra.

Desse modo, na noite de 29 de agosto de 1912, simulando um atentado contra a vida de Antônio Lemos, os lauristas invadiram o casarão da Praça da República e, em questão de minutos, fizeram tombar sob o fogo todo o prédio de A Província do Pará.

Espalhando terror pelas pacatas ruas da cidade, naquela mesma noite, os lauristas, insatisfeitos com a destruição do jornal, que era seu principal objetivo, sentiram-se fortalecidos para intentar de fato contra a vida de Antônio Lemos, incendiando sua residência. Encontrando-o, na manhã seguinte, refugiado na casa de um vizinho, dali o retiraram à força e o arrastaram pelas ruas, na maior humilhação já sofrida por um homem público no Estado do Pará.

A cidade entrou em pânico, pois o que se deu foi uma batalha campal travada entre os partidários de Antônio Lemos e Lauro Sodré.

Aquele episódio encerrou uma fase da vida política do Pará. Chegava ao fim a "era Lemos". Interrompia-se, novamente, depois de 40 anos de circulação, a trajetória do jornal A Província do Pará, coincidindo com a ascensão política de Lauro Sodré, outro grande nome da história paraense.

O tempo, remédio para todos os males, incumbiu-se de cicatrizar essas feridas. Hoje, os nomes de Antônio Lemos e Lauro Sodré estão imortalizados na denominação de dois dos mais belos monumentos arquitetônicos da Amazônia, perpetuados ambos um ao lado do outro em pleno centro histórico da capital paraense.

No Palácio Lauro Sodré, onde até poucos anos funcionou a sede do Governo do Estado do Pará, funciona atualmente o Museu do Estado, estando ali inumados os despojos de seu patrono. No Palácio Antônio Lemos, onde se encontram os restos mortais do fundados de A Província do Pará, funciona a sede da Prefeitura Municipal de Belém e o Museu Histórico da Cidade de Belém.

A vida do jornal, todavia, estava intimamente ligada à luta política na qual o Pará de então se debatia nos primeiros anos da República...

Em 06 de julho de 1920, como Fênix, A Província ressurgiu das cinzas pelas mãos de Pedro Geyselar Chermont de Miranda, tradicional político lemista, que desde a destruição do matutino, alimentara, e agora conseguira, concretizar o sonho de reeditar o jornal que a insensatez destruiu. O fez, naquela ocasião, exatamente para combater seus algozes. Resgatada, A Província assumiu as feições de tribuna popular contra Lauro Sodré.

Novamente no centro da guerra política, nessa nova fase, o jornal não sobreviveu por muito tempo. Eram escassos os recursos financeiros, e as estruturas políticas da época não permitiam nenhum espaço para a oposição, a não ser à custa de sangue e destruição.

Desse modo, em 27 de julho de 1926, envolta em dificuldades financeiras e refém da ferrenha retaliação política, mais uma vez A Província interrompia o seu percurso, deixando de ser apregoada nas ruas pelos 21 anos seguintes.

Srªs e Srs. Senadores, em 1947, precisamente ao amanhecer do dia 9 de fevereiro, A Província do Pará voltava a ser anunciada nas sonolentas ruas de Belém, dessa vez conduzida pela inigualável capacidade empreendedora de Assis Chateaubriand, o mentor dos Diários Associados. Permitiu-se, desse modo, às novas gerações paraenses, a possibilidade de ter de novo nas mãos o mais tradicional jornal da planície.

Sob a direção de Frederico Barata, que ficou à frente do jornal até sua morte, em 6 de maio de 1962, A Província contou com a colaboração dos diretores João Calmon, Alfredo Sade, Carlos Castelo Branco e Almeida Castro, dentre tantos outros colaboradores.

Sucederam-se as administrações do saudoso Milton Trindade, cuja lembrança como Senador pelo Pará permanece viva nesta Casa, e do Dr. Roberto Jares Martins; este último substituído que foi após o seu precoce desaparecimento pelo atual Diretor-Superintendente, dileto companheiro, Arthêmio Guimarães, herdeiro das elevadas tradições dos grandes homens que sempre estiveram a frente do mais antigo jornal do norte brasileiro, dividindo responsabilidade com Rubens Oneti (diretor comercial), Therezinha Siqueira (diretora administrativo-financeira) e Ribamar Fonseca (diretor de redação).

Contando atualmente com 179 colaboradores diretos, entre jornalistas da mais distinta competência, destacando-se o articulista político Rubens Silva, o colunista Edwaldo Martins e muitos outros, além do pessoal gráfico e pessoal administrativo; A Província do Pará circula em todo o Estado, principalmente na região do oeste paraense, bem como nas principais capitais brasileiras, editando também, todos os dias, uma página completa dedicada aos principais fatos jornalísticos ocorridos no vizinho Estado do Amapá; além disso, mantém ainda sucursais nesta capital federal e nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Campo Grande, Goiânia, Fortaleza, Florianópolis, Vitória, Recife, Porto Alegre, Blumenau, Manaus e Salvador.

Com uma tiragem diária de 18 mil exemplares circulando de terça a sábado e 22 mil exemplares aos domingos e feriados, A Província é o único jornal paraense, e um dos poucos no País, que, por acordo trabalhista, garante aos seus funcionários o descanso semanal aos domingos, motivo pelo qual a edição das segundas-feiras chega aos leitores sempre com vinte e quatro horas de antecedência, junto com a edição domingueira.

Atualmente instalado à Travessa Campos Sales, no centro comercial de Belém, o jornal conjuga o tradicionalismo das linhas arquitetônicas de sua sede, com a modernidade de seus equipamentos.

Operando com um avançado parque gráfico, onde se destacam a rotativa Goss e o moderno laboratório fotográfico, dentre outros equipamentos que permitem ao jornal uma impressão totalmente informatizada, o jornal utiliza-se de moderno sistema off-set, com paginação colorida (policromia) nas capas de cada caderno.

Para manter-se na vanguarda da modernidade, A Província inaugurou também, na última segunda-feira, data comemorativa de seus 120 anos, um avançado sistema de informática em sua redação, possibilitando ao jornal, entre outras coisas, conectar-se com a rede mundial de dados e informações através da Internet, assegurando, dessa maneira, maior agilidade nas informações, racionalidade e eficiência nas atividades cotidianas do pessoal que atua naquele setor, investimento este que com certeza se traduzirá no aperfeiçoamento gráfico e editorial, cuja qualidade é destacada dentre os grandes jornais do País.

Face às exigências de um tempo onde a informação é quase instantânea, obrigando aos veículos de comunicação de massa que acompanhem esse dinamismo, os atuais diretores de A Província do Pará ampliaram o alcance daquele complexo de comunicações a partir da implantação, em 1991, da Rádio Província FM, que hoje opera com transmissores de 5 quilohertz, destacando-se, entre as rádios de freqüência modulada que operam no Estado, por sua programação musical especificamente voltada para o segmento das FM.

Foi exatamente esta visão de futuro, modernidade, ousadia e desprendimento, desde Joaquim José de Assis e Antônio Lemos, em 1876, até Arthêmio Guimarães, nos nossos dias, que permitiu ao jornal A Província do Pará, ser o que ele é hoje: um verdadeiro patrimônio do povo e da imprensa brasileira.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao encerrar este pronunciamento que já se faz longo, porém ainda distante de completar a magnitude do que representa a imprensa deste País os 120 do jornal A Província do Pará, não poderia deixar de render homenagem especial a todos os colaboradores que fazem de A Província motivo de orgulho para o povo paraense. Nesse sentido, congratulo-me com cada funcionário daquela empresa, através da lembrança do grande jornalista Carlos Roque, um dos guardiões do patrimônio e das tradições históricas do Estado do Pará, cujas informações contidas em seus memoráveis registros permitiu-nos discorrer aqui sobre um fragmento da história viva da terra paraense.

Saúdo, portanto, Sr. Presidente, os 120 anos de existência de A Província do Pará, solicitando à Mesa deste Senado Federal que faça oficiar à diretoria daquele jornal, dando conta do registro feito por este Senador, como uma homenagem que traduz o reconhecimento e o orgulho do povo paraense.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/1996 - Página 4976