Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO VETO PRESIDENCIAL APOSTO AO PROJETO DE ANISTIA DAS MULTAS IMPOSTAS AO SINDICATO DE PETROLEIROS PELO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • CRITICAS AO VETO PRESIDENCIAL APOSTO AO PROJETO DE ANISTIA DAS MULTAS IMPOSTAS AO SINDICATO DE PETROLEIROS PELO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.
Publicação
Publicação no DSF de 03/04/1996 - Página 5730
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VETO (VET), PROJETO DE LEI, ANISTIA, MULTA, TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST), SINDICATO, PETROLEIRO.
  • COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, ANISTIA, APROVAÇÃO, REGIME DE URGENCIA, APOIO, LIDERANÇA, GOVERNO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SENADO, INCOERENCIA, VETO (VET).
  • NECESSIDADE, CONGRESSISTA, DERRUBADA, VETO (VET), CRITICA, OBEDIENCIA, LEGISLATIVO, EXECUTIVO.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o pronunciamento que faço na tarde de hoje provavelmente será por mim repetido na semana que vem, na presença dos Líderes da base governista. No entanto, eu não poderia deixar de fazê-lo agora em função da oportunidade do fato.

Estamos acompanhando - nós, a imprensa e a sociedade - a atuação do Congresso Nacional ao longo do período deste Governo. Constatamos que, até o momento, esta Casa não aprovou nenhum projeto que não fosse do interesse ou que, pelo menos, não tivesse a anuência do Presidente da República.

Surpreendemo-nos, ontem à tarde, ao tomarmos conhecimento do veto do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao Projeto de Anistia das multas impostas ao Sindicato de Petroleiros pelo Tribunal Superior do Trabalho. Surpreendemo-nos não apenas pelo fato de este Congresso, até agora, só ter aprovado aquilo que o Governo quer ou pelo menos aquilo de que o Governo não discorda, mas porque - esta é a maior surpresa - o projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados, em regime de urgência. O requerimento de urgência, assinado por todas as Lideranças dessa Casa e aprovado por unanimidade, foi articulado pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Sr. Deputado Luís Eduardo Magalhães, responsável pela coleta de assinaturas das Lideranças do Governo.

O projeto foi a voto na Câmara dos Deputados, com encaminhamento favorável de todas as Lideranças e de todos os Partidos dessa Casa, e foi aprovado. Chegou ao Senado. Mantivemos contato com as diversas Lideranças dos Partidos no Senado, esclarecendo o fato de que ele havia sido aprovado por todos os Partidos na Câmara. Conseguimos, também nesta Casa, um requerimento de urgência, assinado por todos os Partidos - eu disse todos os Partidos desta Casa. O projeto, submetido a voto, foi aprovado, com o voto favorável de todos os Líderes partidários. Houve votos contrários de apenas quatro Senadores do PFL, que fizeram questão de registrá-los.

Ora, Sr. Presidente e Srs. Senadores, não conheço - é possível até que os Senadores mais antigos tenham conhecimento - nenhum projeto que tenha sido aprovado em regime de urgência por todos os Partidos nas duas Casas, com manifestação favorável das Lideranças do Governo também nas duas Casas, e esse projeto é vetado pelo Presidente da República. Aí ficamos em dúvida. Recuso-me a acreditar que os Líderes partidários estavam apenas fazendo mise-en-scène; recuso-me a acreditar que os Líderes dos diversos Partidos assinaram o requerimento de urgência e votaram a favor apenas para fazer média com a base petroleira, até porque a base é muito pequena e distribuída em vários Estados do Brasil - inclusive, boa parte desses Líderes não tem base nesses Estados; recuso-me a acreditar nisso. Recuso-me a acreditar também que não houvesse um nada-consta, por parte do Palácio do Planalto, em relação a esse projeto. Sinceramente, penso que há alguma coisa errada nesse contato entre o Palácio do Planalto e as suas Lideranças no Senado e na Câmara! Existe algum curto-circuito, ou então há algum "espírito santo de orelha" dando conselhos para o Presidente da República!

A justificação do veto é um conjunto de falácias. Aliás, é até sintomático que esse veto tenha sido assinado no dia 1º de abril, porque o texto da sua justificação é bastante condizente com a data em que foi assinado.

Vejamos, em um dos parágrafos diz o seguinte:

      "Considerar "legítima" a insurreição das entidades sindicais contra a decisão do egrégio TST, como faz o presente projeto de lei, viola a idéia básica que preside o princípio do Estado de Direito, a idéia de respeito e de observância das normas de Direito positivo e das decisões judiciais."

Ora, em nenhum momento a aprovação desse projeto significa que estivéssemos aqui considerando legítima a insurreição contra a deliberação do TST. Diversos Parlamentares fizeram questão de registrar que votavam a favor do projeto, mas que isso não poderia ser encarado como um incentivo à desobediência civil ou um desrespeito à decisão do TST. Votavam a favor, porque entendiam a especificidade daquela situação da greve dos petroleiros. Uma greve que aconteceu pelo não-cumprimento de um acordo feito pelo ex-Presidente da República. Inclusive devemos registrar que o atual Presidente da Petrobrás é o mesmo do Governo anterior.

Essa multa era absurda porque impagável, já que cada Sindicato de Petroleiro, no Brasil, está devendo R$2,1 milhões, e nenhum deles tem patrimônio suficiente para quitar essa dívida. Isso é uma realidade. Portanto, em função dessa especificidade, estávamos aprovando essa anistia. O absurdo, que também temos que registrar, é que foi imposta uma multa de R$100 mil por dia para cada sindicato, quando nenhum Sindicato de Petroleiros tem uma arrecadação mensal nesse valor.

Segunda argumentação:

      "A sanção do presente projeto poderia, outrossim, comprometer a idéia de harmonia entre Poderes, retirando toda e qualquer eficácia de decisão judicial tomada por Tribunal Superior no estrito exercício de competência que lhe é reconhecida constitucionalmente."

Ora, esta Casa já aprovou anistias que entravam em confronto com decisões definitivas de Tribunais Superiores. Esta anistia foi sancionada pelo Presidente da República. Será que aquela não provocava esse confronto entre Poderes?

A justificação do veto termina com um terceiro argumento, que é uma pérola de cinismo. Diz o seguinte, depois de fazer uma razoável modificação:

      "Todavia, não está o Executivo indiferente à possibilidade de inviabilização da atividade sindical no âmbito da categoria dos petroleiros em face do elevado valor das multas aplicadas (...).

      Assim sendo, determinei que os setores competentes do Governo envidem esforços com vistas a concluir projeto de lei que ofereça disciplina adequada ao tema."

Ora, qualquer projeto relativo a esse tema vai ficar valendo daí para frente, não vai ter qualquer efeito retroativo, não vai contribuir para diminuir as multas dos petroleiros, não vai evitar o fechamento do Sindicato dos Petroleiros em todo Brasil - porque é isso que vai acontecer caso a multa seja cobrada. Aliás, antes que a multa seja cobrada, diversos sindicatos já estão pensando em fechar suas portas, porque as suas arrecadações estão bloqueadas na Justiça, e eles não têm como manter seus funcionários, nem está podendo manter a sua sede em funcionamento.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sabemos em que conjuntura aconteceu essa greve dos petroleiros; sabemos que em função daquele mesmo momento está-se discutindo a quebra do monopólio estatal do petróleo e que se formou toda uma cadeia de denúncias na tentativa de jogar a sociedade contra os petroleiros para justificar a quebra desse monopólio.

No entanto, o Tribunal de Contas da União, ao fazer uma auditoria, constatou que as atividades essenciais da Petrobrás estavam mantidas; constatou que os petroleiros continuavam produzindo em quantidade suficiente para abastecer a população com gás de cozinha e gasolina; constatou que o que aconteceu naquele período foi uma manipulação por parte das distribuidoras, que estavam escondendo seus produtos para poder também contribuir para essa guerra ideológica contra o monopólio.

Isso foi constatado, na ocasião, pela Prefeitura de Santos, que descobriu depósitos com botijões de gás mantidos em segredo pelas distribuidoras. A Prefeitura de Santos, utilizando-se de uma de suas prerrogativas, fez com que elas começassem a distribuir aquele material. Inclusive, qualquer pessoa com uma noção mínima de como funciona um processo de paralisação e de retomada do funcionamento de uma refinaria veria o absurdo, pois, mal a greve acabou, no dia seguinte, a distribuição se normalizou. Ora, sabemos que um processo de paralisação de refinaria e a sua posterior retomada levam, no mínimo, uma semana. Mas, num passe de mágica, a Petrobrás, que não estava produzindo GLP nem gasolina, assim que encerrou a greve, voltou a produzir quase instantaneamente, numa demonstração de que, na verdade, ela já havia produzido, mas, com o fim da greve, acabou o boicote das distribuidoras.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a "bola" agora está novamente com o Congresso Nacional. Caso o Congresso Nacional, que aprova o projeto nas suas duas Casas em requerimento de urgência, assinado por todos os Partidos, projeto votado, no mérito, por todos os partidos, não for capaz de derrubar esse veto do Presidente da República, sinceramente estamos muito mal! O Congresso está sendo chamado à responsabilidade quanto a esse aspecto.

Queremos registrar - porque não acreditamos nas versões que têm sido veiculadas agora de que não havia uma consulta ao Presidente da República - que, há um mês, o Presidente da República, através do seu porta-voz, afirmou claramente que veria com bons olhos uma alternativa política que solucionasse a questão das multas dos Sindicatos de Petroleiros. Disse que não poderia se envolver, porque se tratava de uma questão judiciária, mas, que se houvesse uma alternativa política, Sua Excelência veria com bons olhos. Ora, essa alternativa política é exatamente o projeto de anistia das multas, que volto a registrar pela enésima vez, aprovada nesta Casa e na Câmara dos Deputados por todos os Partidos.

Queremos registrar também a repercussão negativa que esse episódio poderá ter sobre a imagem do Brasil no exterior, se chegarmos ao ponto de sedes e patrimônios inteiros de Sindicatos de Petroleiros serem leiloados, provocando a sua inviabilização.

Registramos que a Organização Internacional do Trabalho, que é um órgão tripartite com representantes de governos, patrões e empregados, censurou a atitude do Governo Federal por ocasião da greve dos petroleiros.

Lamentamos, portanto, profundamente, que o Presidente da República - não sei se mal aconselhado - tenha vetado esse projeto. Esperamos, entretanto, que os mesmos Líderes que assinaram o requerimento de urgência, os mesmos Líderes que votaram favoravelmente ao projeto, se disponham agora a viabilizar a derrubada desse veto pelo Congresso Nacional, sob pena de mais uma vez se confirmar a profunda subserviência que o Poder Legislativo está tendo em relação ao Poder Executivo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/04/1996 - Página 5730