Discurso no Senado Federal

SITUAÇÃO DE ABANDONO DOS MUNICIPIOS DO VALE DO TAPAJOS, NO ESTADO DO PARA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • SITUAÇÃO DE ABANDONO DOS MUNICIPIOS DO VALE DO TAPAJOS, NO ESTADO DO PARA.
Publicação
Publicação no DSF de 30/03/1996 - Página 5502
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, INICIATIVA, LIDERANÇA, SOCIEDADE CIVIL, DEFESA, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO SUDOESTE, ESTADO DO PARA (PA), DENUNCIA, ABANDONO, GOVERNO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, REGIÃO.
  • DETALHAMENTO, PROBLEMA, REGIÃO, REIVINDICAÇÃO, COMUNIDADE, INFORMAÇÃO, ORADOR, ENCAMINHAMENTO, DOCUMENTO, AUTORIDADE FEDERAL, AUTORIDADE ESTADUAL.
  • INFORMAÇÃO, ATUAÇÃO, BANCADA, CONGRESSISTA, ESTADO DO PARA (PA), APROVAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, OMISSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPROMISSO, CAMPANHA ELEITORAL.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero registrar, neste pronunciamento, o excelente trabalho de organização e de luta que vem sendo desenvolvido pelas lideranças empresariais, sindicais, comunitárias e de trabalhadores da região do Vale do Tapajós, no Estado do Pará, as quais batalham decididamente pela melhoria das condições de vida na região, relegada há muito tempo ao abandono. Pude constatar a garra e a coragem daquele povo em busca do progresso, quando estive pessoalmente em recente visita aos municípios da área.

Naquela ocasião, recebi o impressionante dossiê sobre as dificuldades sócio-econômicas daquela riquíssima região garimpeira e agrícola que, embora tenha produzido cerca de 500 toneladas de ouro bruto nos últimos 37 anos, jamais recebeu qualquer atenção por parte das administrações federais ou estaduais.

No documento, que tem o título "S.O.S. Tapajós" - e que peço que seja inserido nos Anais deste Senado -, foram listadas todas as incontáveis deficiências regionais. O quadro é alarmante. As seis cidades que integram aquela região - Aveiro, Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso, Rurópolis e Trairão - não contam com os mínimos equipamentos para o atendimento de seus habitantes. A carência é geral em todas as áreas: educação, saúde, energia, rodovias e no setor agropecuário.

A região conta com uma área de aproximadamente 230 mil quilômetros quadrados, pouco inferior à do Estado de São Paulo e muito maior do que a Inglaterra e concentra uma das maiores províncias minerais do mundo. Historicamente, além da extração do ouro, a região contribuiu muito para a Nação como líder inconteste que foi na produção da borracha natural. Infelizmente, essas riquezas do passado ou as do presente jamais foram revertidas em proveito das populações locais.

O Estado e a União, que sempre se beneficiaram das riquezas regionais, jamais investiram ali cifras condizentes com o que foi arrecadado. Vejamos, por exemplo, o caso da mineração. O Vale do Tapajós não conta sequer com um estabelecimento de ensino que prepare técnicos e operários especializados em mineração, para que o trabalho de exploração e manipulação de ouro e de outros metais preciosos seja mais eficiente e rentável.

Outro problema gravíssimo, que atinge tanto a mineração quanto a agricultura, é o da falta de regularização das áreas rurais. Sem documentos oficiais de posse, os agricultores estão impossibilitados de ter acesso às linhas de financiamento oferecidas. A situação é totalmente absurda, porque o dinheiro existe e está à disposição. Mas não pode ser obtido porque os produtores não têm documentos que comprovem a posse de suas terras.

Do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte, apenas 15% são destinados a microprodutores. Mesmo assim, apenas 2% do total desses microprodutores acabam sendo efetivamente beneficiados. O mesmo ocorre com a linha de crédito para a agricultura familiar - Pronaf -, que exige dos interessados a comprovação de pagamento de ITR dos últimos 5 anos, e o ITR, inexplicavelmente, chegou a valores estratosféricos nesses últimos anos, o que torna impossível o seu pagamento.

No que se refere ao transporte, as duas Estradas Federais que cruzam a região - a BR-230 (Transamazônica) e a BR-163 (Santarém-Cuiabá) - encontram-se em péssimas condições de tráfego, o que acaba causando, todo ano, perda de grande parte da produção agrícola regional. Produção que, por sinal, não é pequena, já que, por exemplo, a área plantada de arroz chega a 50 mil hectares e a de milho 40 mil hectares. Isso sem falar nas terras onde se cultiva cacau, banana, mandioca e feijão. Ou no rebanho de gado, que chega a meio milhão de cabeças apenas nesses seis Municípios.

Embora o Pará seja o quinto Estado brasileiro na produção de energia elétrica, o sudoeste paraense vive nas trevas. A precária matriz energética termodiesel que atende Itaituba, Aveira e Rurópolis, encontra-se totalmente sucateada e saturada. Mas a situação é ainda mais caótica nos demais Municípios da região, onde não há qualquer fornecimento de energia elétrica, seja na áreas urbanas, seja nas rurais. Quem pode ter o seu motor tem energia, quem não o tem evidentemente fica sem ela.

O mesmo ocorre em relação ao fornecimento de água. Embora Itaituba, Aveiro e Jacareacanga encontrem-se às margens do rio Tapajós e apesar de Rurópolis, Novo Progresso e Trairão possuírem grandes mananciais, não se tem água tratada. As pessoas têm que tirar a água diretamente dos rios sem nenhum tipo de tratamento, o que agrava ainda mais os tratamentos sentido na área de saúde.

No Vale do Tapajós são muito elevados os índices de mortalidade infantil, fetal, materna ou geral. São taxas que só encontram paralelo nas registradas nos países mais subdesenvolvidos do planeta. Ali são muito altos os índices de morte por doenças controladas pelo saneamento básico como as diarréias e hepatites infecciosas; de doenças controláveis por tratamento médico e por acompanhamento, como tuberculose e hanseníase; e por doenças preveníveis, como a malária e a leishmaniose.

Para encerrar esse quadro dantesco de abandono por parte dos Poderes Públicos, vejamos alguns índices da educação. A taxa de evasão escolar naquela região é da ordem de 25% no ensino de 1º grau, e de 22% no de 2º grau - esses são dados fornecidos pela regional de educação do Governo do Estado do Pará. Os considerados analfabetos, entre os que têm mais de 15 anos, chegam a 35%. Indicador totalmente inaceitável, às vésperas do ano 2000.

Diante dessa situação, marcada pelo total abandono a que foram relegados, os moradores daquela região cobram, agora, providências urgentes das autoridades estaduais e federais. Tendo realizado um grande ato público em Itaituba, que teve uma enorme repercussão sendo noticiado, inclusive, pelo Jornal Nacional da TV Globo.

No que se refere à educação, por exemplo, os habitantes do Vale dos Tapajós querem ensino de pré-escola nos estabelecimentos públicos, merenda escolar constante, treinamento para professores, cursos profissionalizantes e a implantação de um campus universitário.

No que toca à saúde, exige um combate sistemático das endemias, saneamento básico, qualificação de recursos humanos para áreas e cotas regulares de medicamentos.

No que tange à agropecuária, cobram programas permanentes de assistência técnica, acesso ao crédito rural, regularização fundiária imediata, cadastramento de todos os sem-terra nos municípios e a melhoria das estradas para que a produção local possa ser escoada.

Querem, ainda, a criação de uma vara criminal e a indicação de juízes, bem como fornecimento de energia elétrica e expansão da rede de telefonia.

Ao registrar, aqui, esse documento dos Municípios do Vale dos Tapajós, questiono-me como pode uma região tão rica estar relegada a um abandono tão grande por parte das autoridades brasileiras. A grande pergunta é: como pode uma terra tão rica ser tão carente de instrumentos os mais elementares para o exercício da cidadania?

Para que suas reivindicações não ficassem registradas apenas neste discurso, encaminhei ofícios para as autoridades do Governo Federal e do Governo Estadual, responsáveis por cada área-problema, incluindo o Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, e o Governador do Pará, Almir Gabriel, para os quais revelei todas as preocupações que me surgiram diante das imensas necessidades daquele povo.

Para todos eles, estou encaminhando cópia das reivindicações setorizadas e solicitando que se sensibilizem ante o sofrimento de centenas de milhares pessoas, no sentido de serem providenciados atendimentos urgentes para os seus problemas prioritários e que sejam planejadas outras soluções a médio prazo, onde o Orçamento deste ano realmente não permite resolver.

Entretanto, através deste discurso, faço um apelo em reforço aos expedientes dirigidos a Sua Excelência, o Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso, bem como aos Ministros dos Transportes, da Saúde, da Educação, da Justiça, da Infra-Estrutura e outros Srs. Ministros, no sentido de que ao receberem o dossiê S.O.S Tapajós dediquem ao mesmo uma leitura atenta, em função da gravidade dos problemas ali relatados, e que possam colocar seu empenho pessoal em busca do solucionamento dos mesmos.

Quero dizer, Sr. Presidente, que no Orçamento de 1996, embora ainda não aprovado por este Congresso Nacional, mas já aprovado no relatório final da Comissão Mista de Orçamento desta Casa, nós, com muita luta e com muito sacrifício, conseguimos colocar R$15 milhões destinados à conservação da Rodovia Transamazônica; conseguimos colocar mais R$7 milhões para socorro a pontos críticos da mesma rodovia e da Santarém/Cuiabá; conseguimos colocar ainda mais R$8 milhões, destinados à conservação da Rodovia Santarém-Cuiabá. Dos recursos ainda de 1995, diga-se de passagem, conseguimos garantir R$8 milhões para asfaltar o trecho que vai de Santarém a Rurópolis.

Nada veio do Executivo. Foi a Bancada do Estado do Pará que, com unidade, com sacrifício, conseguiu fazer o Relator corrigir as injustiças cometidas pelo Presidente da República, pelo Poder Executivo, que não destinou praticamente nada ao Estado do Pará no que se refere à infra-estrutura.

Por último, também com muito sacrifício e com muito esforço, a Bancada do Pará conseguiu colocar R$14 milhões para iniciar o Linhão da Hidrelétrica de Tucuruí para o oeste do Pará, em direção a Altamira e, no futuro, chegando até Itaituba e na região do Tapajós - a que fizemos referência neste nosso pronunciamento.

Portanto, não foi o Presidente da República. Sua Excelência se esqueceu completamente de seus compromissos. Em sua campanha, prometeu asfaltar a Transamazônica, a Satarém-Cuiabá, levar energia da Hidrelétrica de Tucuruí ao Baixo-Amazonas, mas o que fez no ano passado foi vetar os recursos destinados a essas obras.

A Bancada do Pará conseguiu repor e até ampliar esses recursos. No que se refere à energia, não conseguimos repor nada. Havia R$8 milhões que foram totalmente cortados. Este ano, Sua Excelência não destinou nenhum centavo para a energia e nós conseguimos colocar R$14 milhões. Para a Transamazônica, o Presidente destinou R$2 milhões, que aumentamos para R$15 milhões; para Santarém-Cuiabá, colocou R$3 milhões e aumentamos para R$ 8 milhões.

O Presidente da República prometeu ao Governador Almir Gabriel R$2 bilhões durante seu governo, o que representaria a soma de R$500 milhões por ano ao Estado do Pará para obras de infra-estrutura, o Presidente não cumpriu absolutamente nada. Nós é que estamos, com o esforço da Bancada do Pará, conseguindo algo, embora ainda insignificante para a contribuição dada pelo Pará ao Brasil.

Para que se tenha uma idéia, o Pará exporta, por ano, R$2 bilhões em madeira, minérios de toda a espécie, pescados e produtos agrícolas, o que representa uma soma considerável, mas o nosso Estado tem um orçamento anual de apenas R$1,1 bilhão. Exportamos, praticamente, duas vezes mais do que tudo o que tem o Governador para administrar em um ano de Governo. Estamos recebendo esses valores insignificantes para resolvermos nossos problemas de infra-estrutura básica.

Registro este nosso pronunciamento sobre as condições da Região do Tapajós e apelo à Mesa para que conste nos Anais desta Casa o documento que tem o título SOS Tapajós.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/03/1996 - Página 5502