Discurso no Senado Federal

SOLICITANDO APOIO DOS PARLAMENTARES A PROPOSIÇÃO DE AUTORIA DO DEPUTADO ANTONIO KANDIR, QUE REGULAMENTA O ARTIGO 192 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE TRATA DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

Autor
Bello Parga (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Luís Carlos Bello Parga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • SOLICITANDO APOIO DOS PARLAMENTARES A PROPOSIÇÃO DE AUTORIA DO DEPUTADO ANTONIO KANDIR, QUE REGULAMENTA O ARTIGO 192 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE TRATA DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/1996 - Página 5922
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • NECESSIDADE, REGULAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ASSUNTO, SUPERVISÃO, FISCALIZAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JUSTIFICAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ANTONIO KANDIR, DEPUTADO FEDERAL, APERFEIÇOAMENTO, FUNCIONAMENTO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

O SR. BELLO PARGA (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na tarde de hoje, quero trazer ao Plenário desta Casa um assunto de relevância em relação ao Sistema Financeiro Nacional.

No organismo constitucional brasileiro, há como que um ponto infeccionado, que vem comprometendo o funcionamento das instituições no tocante à regulamentação, à supervisão e à fiscalização do Sistema Financeiro Nacional. Trata-se da falta de regulamentação do art. 192 da Constituição. Parece-me que é um daqueles artigos da nossa Carta Magna que sofreu as conseqüências da condução política da Constituição de 1988.

Grande parte da falta da regulamentação desses artigos decorre do fato de que, no entrevero das opiniões, das idéias e das ideologias que procuravam se expressar e dominar o texto constitucional, uma parte ponderável daquilo que representava conflitos, mal se manifestava esse conflito, essas dissensões não eram resolvidas pelo voto, e foi deixado para a regulamentação posterior. E é essa falta de regulamentação que vem sendo nociva à condução do Sistema Financeiro Nacional.

No entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vejo motivo de satisfação e quero trazer aqui o anúncio de que esse ponto infeccionado pode ser curado. Isso porque já está em curso, na Câmara Federal, uma proposição do nobre Deputado Antônio Kandir, do PSDB de São Paulo, que procura resolver o problema à moda de corte: o corte no nó górdio da falta de regulamentação do art. 192.

Permito-me, portanto, Sr. Presidente, utilizar as palavras do próprio Deputado Antônio Kandir, posto que S. Exª preparou um trabalho para ser publicado no jornal O Estado de S. Paulo do dia 2 do corrente, sob o título de "Facilitando a reforma financeira".

O aludido parlamentar alinha o seu pensamento e o faz de uma maneira lógica, clara e, no meu entender, muito convincente. Passo a ler o texto do Deputado Antônio Kandir:

      Com o episódio do Banco Nacional, a definição de novas regras e instrumentos para regular, supervisionar e fiscalizar o funcionamento do sistema financeiro deixou, felizmente, de ser assunto exclusivo de acadêmicos e especialistas. Ganhou o interesse da opinião pública e, assim, entrou na pauta dos assuntos urgentes do Congresso e do Executivo.

      A definição dessas novas regras e desses instrumentos depende da regulamentação do art. 192 da Constituição, que trata do sistema financeiro. Ocorre que, nos últimos sete anos, fracassaram todas as tentativas de regulamentá-lo. Incompetência do Congresso? Não. A verdade é que a exigência de regulamentação por lei complementar, cuja aprovação demanda maioria absoluta, e por uma só e única lei complementar, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, torna a regulamentação do art. 192 extremamente improvável, senão impossível.

Faço aqui um parêntese, Sr. Presidente, a fim de chamar a atenção dos nobres pares - cito os Senadores Bernardo Cabral e Josaphat Marinho, grandes juristas e constitucionalistas - para as razões do Deputado Antônio Kandir:

      "A exigência de que matéria tão complexa e sensível seja regulamentada num só diploma legal, e por quorum qualificado, faz de qualquer divergência pontual obstáculo suficiente para bloquear a conclusão do processo.

      Quem perde com isso? Perde o País, que há anos "espera Godot", como os personagens de Beckett, sem dispor de legislação adequada ao mundo real de exigências, desafios e problemas de um sistema financeiro cada vez mais complexo e dinâmico.

      A redação atual do artigo 192 nos deixa na situação de lidar com essa realidade amarrados a uma camisa-de-força, quando o melhor seria ter uma legislação flexível o suficiente para ajustá-la às exigências, desafios e problemas que o sistema apresentar em seu processo de transformação. Alguns já podem ser identificados. Outros surgirão no futuro. Mais uma razão para estabelecer uma legislação flexível, ao mesmo tempo bem focada e rigorosa.

      Foi para desatar essa camisa-de-força, e abrir espaço para que se façam as mudanças necessárias para aumentar a segurança e credibilidade do sistema financeiro, que apresentei à Câmara emenda constitucional, mudando a redação do art. 192, com modificações também nos art. 163 e 164. O objetivo fundamental da mudança é deixar no texto constitucional apenas os parâmetros gerais relativos ao sistema financeiro, permitindo que a regulamentação específica se possa fazer topicamente, por leis ordinárias, cuja aprovação exige apenas maioria simples.

      Afora essa mudança geral na concepção do art. 192, a emenda trata de reorientar o foco do texto constitucional, fazendo-se incidir sobre questões que se revelaram cruciais nos últimos anos e demandam regulamentação. Antes, porém, cuida de limpar o texto constitucional de algumas impropriedades. Dentre elas, a proibição de que os juros reais ultrapassem 12% ao ano e a obrigação de que o Tesouro e empresas estatais apliquem suas disponibilidades em instituições oficiais de crédito. No primeiro caso, trata-se de eliminar o voluntarismo absurdo de querer engessar um preço-chave da economia, fixando em lei um limite máximo para sua variação. No segundo, de eliminar monopólio dos bancos públicos e permitir ao Tesouro e às estatais a necessária liberdade para gerir de modo eficiente suas disponibilidades de caixa.

      Quanto à reorientação de foco promovida pela emenda, vejamos exemplos.

      A emenda define expressamente que a função principal do Banco Central é resguardar o valor da moeda, especificando sua finalidade e o âmbito de atuação. Isso é fundamental porque, hoje, o BC está incumbido de coisas demais para fazê-las todas com qualidade desejada. Abre-se, assim, espaço para que, na regulamentação, se defina uma nova divisão de funções que permita ao BC se concentrar em sua função principal, transferindo para outros órgãos funções laterais, como, por exemplo, a regulação e fiscalização de consórcios.

      Estabelece a fixação de mandatos para as diretorias do Banco Central, da Comissão de Valores Mobiliários e da Superintendência de Seguros Privados, de modo a colocá-las ao abrigo das pressões políticas e oferecer-lhes um horizonte seguro de trabalho. Pelas regras atuais, passível de demissão a qualquer hora, a diretoria do Banco Central, em especial, tem apresentado rotatividade incompatível com o planejamento de longo prazo de suas atividades - O Brasil está entre os recordistas no número de presidentes do BC nos últimos dez ou 15 anos, o que certamente não contribui para a estabilidade monetária.

      Prevê a existência de comissão de acompanhamento das atividades desses órgãos pelo Legislativo e registra a necessidade de mecanismo institucional para entrosar as políticas monetária e cambial com as demais políticas econômicas. Assim, ao mesmo tempo em que fortalece a autoridade monetária, com a fixação de mandatos e definição de sua função principal, a emenda cria condições para que o Congresso e a sociedade tenham maior informação e controle sobre a atuação do BC, e marca a necessidade de se estabelecer mecanismos institucionais voltados a evitar que o BC maneje a política monetária e cambial em olímpica divergência com as diretrizes das demais políticas relevantes para a estabilidade de preços e o crescimento econômico.

      Prevê que se integrem as atividades das instituições e dos órgãos incumbidos da fiscalização dos vários segmentos do sistema financeiro, medida necessária para dar maior eficácia à fiscalização diante da crescente interpenetração desses segmentos (bancário, de mercado de capitais, de seguros e previdência).

      Inscreve na Constituição a proibição, antes constante apenas de norma do BC, de que bancos financiem seus controladores e prevê exigência de alocação prévia de recursos fiscais ou indicação de fonte autorizada em operações de interesse do governo, ambas as providências visando impedir que se repita a dilapidação de bancos públicos por razões políticas.

      Ao reorientar o fato do art. 192 e torná-lo passível de regulamentação por lei ordinária, a emenda abre caminho para passarmos sem demora à solução concreta de problemas que se têm acumulado, sem resposta eficaz. Importa notar que a emenda de modo algum colide com o trabalho de regulamentação do art. 192, que já se vem desenvolvendo na Câmara. Ao contrário, permite que esse trabalho, sob a forma de várias leis ordinárias, alcance de fato seu intento de aprimorar a segurança e credibilidade do sistema financeiro nacional, condição necessária para que a estabilidade se consolide e o País possa crescer em bases sustentáveis e percentuais expressivos."

Assim conclui, Sr. Presidente, o Deputado Antônio Kandir.

Na oportunidade, saúdo a iniciativa daquele Deputado e, ao mesmo tempo, conclamo meus pares no Senado para que dêem apoio a essa emenda à Constituição Federal, do nobre Deputado de São Paulo, para que se elimine do organismo constitucional brasileiro esse ponto infeccionado, que é a falta de regulamentação do art. 192.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, e agradeço a V. Exª por ter-me concedido a palavra.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/1996 - Página 5922