Discurso no Senado Federal

DIFICULDADES NA FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DO PAIS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • DIFICULDADES NA FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DO PAIS.
Aparteantes
Ernandes Amorim, Lauro Campos, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 10/04/1996 - Página 5955
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DEPOIMENTO, COMISSÃO, PROGRAMA DE ESTIMULO A REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO AO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (PROER), COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, CONCLUSÃO, FALTA, PROBIDADE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ASSOCIAÇÃO NACIONAL, AUDITOR, INDEPENDENCIA, CONSELHO FEDERAL, CONTABILIDADE, COMISSÃO DE VALORES MOBILIARIOS, FISCALIZAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, LEGISLATIVO, PRIORIDADE, PRERROGATIVA, FISCALIZAÇÃO, ECONOMIA, FINANÇAS, PAIS.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acabamos de ouvir o discurso do Senador Jefferson Péres, legitimamente indignado com as matérias que têm sido publicadas sobre as mordomias do Senado. E ouvimos o Senador Nabor Júnior explicando que Senado, Câmara dos Deputados e Tribunal de Contas, que também faz parte da estrutura, consomem apenas 0,47% do Orçamento nacional.

Estou presidindo a Comissão do Proer e faço parte da Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa.

Sobre os assuntos Proer, Banespa, Banerj e todos os demais bancos, temos debatido muito e tivemos condição de ouvir o Ministro da Fazenda, que mostrou a necessidade de se aplicar bilhões de reais para não deixar ir à garra o sistema financeiro nacional.

Ouvimos depois os Diretores e o Presidente do Banco Central, que também mostraram a necessidade de se salvar o sistema, mesmo que custe a injeção de bilhões de reais. Não estamos falando de 0,47% do Orçamento: estamos falando de uma moeda nova em voga no sistema financeiro brasileiro: o bilhão. Que saudade eu tenho da época do milhão, quando Estados como o meu tinham os seus bancos fechados por 5 milhões! Hoje, ouvimos falar em 15 bilhões para o Banespa; 5,9 bilhões para o Banco Nacional; 4 e pouco bilhões para o Banco Econômico, e por aí afora.

Na ocasião em que os Diretores do Banco Central aqui depuseram, verificamos que a legislação era falha e que precisávamos modificá-la. Ouvimos também o Presidente da Associação dos Auditores Independentes, que demonstrou que, lamentavelmente, uma auditoria independente não tem condições de fazer a auditagem de toda a contabilidade de um banco, o que nos deixou pasmos.

Em seguida, Sr. Presidente e Srs. Senadores, ouvimos o Presidente do Conselho Federal de Contabilidade e verificamos que as normas adotadas por esse conselho já não se coadunam com os tempos modernos. Também nesse ponto é preciso modificar a legislação.

Posteriormente, ouvimos o Presidente da Comissão de Valores Mobiliários, o que fizemos esta manhã até às 14h. Verificamos que, a exemplo do Banco Central - que tem duzentos e poucos fiscais para fiscalizar cerca de sete ou oito mil unidades e que, desses duzentos e poucos fiscais, apenas cento e poucos estão nas ruas, o que daria cerca de trezentos dias para um fiscal voltar à instituição, se lá fosse -, a Comissão de Valores Mobiliários é uma instituição que não consegue cumprir as suas atribuições. Não consegue por quê? Porque, pior do que o Banco Central, ela só dispõe de vinte fiscais para fiscalizar cerca de seis mil instituições, o que quer dizer que, de quatrocentos em quatrocentos dias úteis, poderia um fiscal ir a uma dessas instituições.

Aí, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tive que declarar a minha estupefação. Realmente estou pasmo por ver que se trata de um assunto que envolve bilhões - não se está falando de carro de Senador, não se está falando de cadeira de Senador - e que a legislação já não serve e que os órgãos que deviam fazer a fiscalização faziam de conta. Ou seja, Srs. Senadores, o rei estava nu e ninguém tinha coragem de dizê-lo.

O sistema financeiro nacional não tem regras sérias, hoje, para fiscalizá-lo. Acredita-se na palavra do banqueiro, na Comissão de Valores Mobiliários, pois ele é quem diz qual é o seu balanço. Nós verificamos, através da audiência com os auditores independentes, que eles verificam o balanço ali declarado. E só. Depois, a Comissão de Valores Mobiliários assina em cruz o que o auditor fez.

O Banco Central do Brasil não faz diferente - e estamos falando aqui de dinheiro suficiente para resolver todo o problema da saúde, da educação, da recapagem de todas as nossas estradas federais, estaduais e até municipais; enfim, estamos falando de bilhões. Constrange-me que, em um país que tem a oitava ou décima economia do mundo, porque varia de autores, tenhamos, hoje, constatado que a nossa legislação é falha e que não temos como averiguar dados como esse.

Hoje, com orgulho, ouvi o Presidente da Comissão de Valores Mobiliários dizer que acabaram de fazer o julgamento do Sr. Naji Nahas. Faz cinco anos que ocorreu aquele famoso golpe dado na Bolsa de Valores; só agora se resolveu o caso, e o foi em tempo recorde. Também a nossa Justiça é falha, no que se refere à punição dos crimes econômicos, que doem tão profundamente no bolso do brasileiro que, hoje, tem carência de recursos.

Por todas essas razões, volto a tocar no assunto que já tratei três vezes: nós, Parlamentares, temos que nos aprofundar na fiscalização e, mais ainda, temos que seguir a linha moderna dos Parlamentares e acompanhar o veio financeiro, porque só assim teremos condição de salvar algum recurso para investir naquilo que o povo necessita. Clama o povo brasileiro por criminosos econômicos na cadeia; os crimes se sucedem. Hoje, no depoimento do Presidente da Comissão de Valores Mobiliários, ouvi uma frase muito importante: "A crise que passou vai servir para colocarmos as barbas de molho, consertando as portas e as janelas que foram arrombadas. Mas a nossa preocupação é com a próxima crise". E realmente ele tem razão. A nossa preocupação, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é com a próxima crise, que deverá ser mais grandiosa do que essas que ocorreram no Nacional, no Econômico, no Banespa, no Banerj e no Banco do Brasil e - que Deus nos acuda! - em tantos outros.

Por isso, venho a esta tribuna hoje para dizer, mais uma vez, que nós, Senadores da República, Parlamentares brasileiros, temos que nos especializar cada vez mais, fiscalizar profundamente os procedimentos econômico-financeiros do País, acompanhando a política monetária e cambial. Através desse comportamento conseguiremos estancar e fazer profilaxia, porque senão vamos estar sempre como o cidadão que fecha a casa depois de arrombada a porta.

O Sr. Ernandes Amorim - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim - Fico até satisfeito quando ouço V. Exª dizer que faz parte do Proer e, ao mesmo tempo, entristeço-me quando acusa até a Justiça em questões que passam pelas mãos deste Congresso: o aperfeiçoamento e o cumprimento das leis e a fiscalização da área econômica do Governo Federal. Lamentavelmente, não sei qual o comportamento do seu voto em relação aos repasses aos bancos, o problema dos agricultores e da agricultura do País - que está falida, e o Governo nada fez porque está dando prioridade à questão do Econômico e Nacional -, o problema da saúde, cuja situação melhoraria com esses 6 bilhões. Entretanto, o Governo Federal tirou o dinheiro do povo para salvar um banco da família dele, ou de quem quer que seja. Nobre Senador, percebo que V. Exª, membro desta Casa e da Comissão, está preocupado com a recuperação desses bancos falidos pelo dinheiro público. Preocupo-me porque sinto que daqui a pouco não haverá mais preocupação com a saúde, com a agricultura. Espero que o seu voto, na Comissão, seja contra os repasses que estão sendo feitos para salvar bancos falidos. O que mais me assusta no Governo atual é que foram repassados 6 bilhões para o Banco Nacional por conta própria e, contudo, para repassar 200 milhões para o Econômico, o Governo quer buscar o aval desta Casa, quer que assumamos o compromisso de ser cúmplices nessa irregularidade. Espero que a comissão vote contra esse repasse, contra essa modalidade da economia atual, até porque o País está falido, o Plano Real está acabando, e, se o Presidente Fernando Henrique quiser se reeleger, terá que andar depressa, enquanto existe dinheiro, para socorrer bancos falidos.

O SR. NEY SUASSUNA - Nobre Senador Ernandes Amorim, para cada medida provisória que aqui chega, tem que ser constituída uma Comissão para analisar a sua admissibilidade e, depois, elaborar o projeto de conversão. Estamos presidindo uma dessas comissões mistas. Cabe a nós melhorar o máximo possível, e é o que estamos buscando fazer.

O Senado Federal já conseguiu muito em relação a essas duas medidas provisórias que foram publicadas. Conseguimos que os controladores tivessem seus bens relacionados e respondessem pelos crimes cometidos. Mas ainda precisamos de mais.

Quando venho à tribuna pedir que os Senadores se especializem cada vez mais no veio financeiro é exatamente para que possamos fazer a profilaxia. Hoje, por exemplo, há o caso do Banespa, em que se solicita o aval do Senado Federal para os R$7,5 bilhões; o dinheiro já está lá e cabe ao Senado apenas oficializar o que já foi feito.

Então, o que temos que fazer é andar na frente. E é este o alerta que faço aqui: temos que estar preocupados em andar sempre na frente e não permitir que, em casos como esses, sejamos levados a reboque. Temos que estar fazendo a profilaxia através da melhoria da legislação e intensidade da fiscalização, exatamente para evitar que fatos como esses voltem a ocorrer.

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, nobre Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - A preocupação que traz V. Exª, nobre Senador Ney Suassuna, diz respeito a um assunto da máxima gravidade. Realmente é de se estranhar que o Banco Central tenha assumido tanto poder como tem no Brasil. Um diretor do Banco Central resolve fixar uma taxa de câmbio, como, por exemplo, queria o Sr. Gustavo Franco, em que o dólar valeria R$0,50 - o que seria um arraso completo para a economia brasileira - e, depois de um ano, continua a repetir que ele estava certo, que a taxa de câmbio deveria ser essa. Isso reduziria as importações à metade dos preços atuais, que já tornaram a concorrência impossível aos brasileiros com uma avalanche de mercadorias importadas, subsidiadas pelo nosso Governo e pelo povo. É também de se estranhar muito - e V. Exª traz essa preocupação - que o Banco Central não tenha se armado dos instrumentos necessários para fazer a fiscalização e que, agora, confesse essa incompetência. Quantos diretores e presidentes de bancos, como aquele Sant'Anna do Banco Nacional, fabricaram dinheiro falso, produziram moeda escritural? Não há diferença alguma, a não ser materialmente, porque faz parte da base monetária em circulação. De modo que, então, falsificar papel-moeda ou falsificar moeda escritural é a mesma coisa! E o Banco Central diz que não tem como apurar, sequer verificar se esse tipo de moeda, a moeda escritural, está sendo fabricada ex nihil, sem os correspondentes depósitos bancários. Essa falsificação de dinheiro, numa situação de crise como esta, pode se alastrar diante da inépcia do Banco Central. De modo que realmente este é o momento em que ainda se pode pretender pôr cobro a essa situação, que se agravou com a postura do Banco Central, que não tinha sequer diretor de fiscalização e que confessa, por intermédio de seu Presidente e diretores, que não tem pessoal suficiente para exercer a fiscalização. Então quem sabe se não quiseram fiscalizar? Porque sabemos, há muitos anos, que existem diretores de banco que acabam se tornando diretores do Banco Central. Para ser mais claro: atualmente o Presidente Gustavo Loyola e o Diretor Francisco Lopes têm empresas de consultoria, uma se chama Macro não sei o quê e a outra é a empresa do Dr. Mailson da Nóbrega, da qual o Sr. Gustavo Loyola fazia parte. De modo que essa possibilidade de vazamento e de informações privilegiadas continua, bem como a falta de fiscalização, como se houvesse uma verdadeira estratégia em não administrar, em permitir que essas coisas aconteçam impunemente. É errando, muitas vezes, que se acerta. E, ao não demonstrarem a situação real do sistema bancário brasileiro, permitiram que se criasse o Proer, na madrugada de um sábado, para socorrer um banco em que um de seus diretores, um de seus presidentes havia fabricado dinheiro falso. De modo que a preocupação de V. Exª encontra o meu apoio e é da máxima importância.

O SR. NEY SUASSUNA - Então, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluo, dizendo que hoje foi mais um dia em que estive estupefato, ao verificar que a Comissão de Valores Mobiliários se fiava nos auditores, que se fiavam nos contadores dos bancos, que cumpriam o que os donos mandavam, e que o Banco Central também não tinha condições de fiscalizar. Enfim, corremos agora praticamente toda a cadeia, em que cada um esperava que o outro estivesse cumprindo o seu dever. Mas ninguém estava cumprindo o seu dever. E aí só vejo uma solução: nós, parlamentares, aprofundarmo-nos cada vez mais na área financeira e na fiscalização.

O Sr. Romeu Tuma - Permite-me um aparte, Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, Senador Romeu Tuma. O meu tempo já está se esgotando, mas concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Romeu Tuma - Desculpe interrompê-lo, mas gostaria apenas de dar um testemunho sobre o assunto que V. Exª aborda. A Comissão de Valores Mobiliários tem a obrigação de fiscalizar principalmente as aplicações em Bolsa e outros aspectos no terreno financeiro. Várias vezes, com inquérito aberto na Polícia Federal, precisávamos de subsídios para compor a prova, e sempre ouvíamos a alegação de que a fiscalização era feita em sigilo e não eram fornecidos os dados ou informações sobre punição, que, às vezes, acontecia com suspensões e multas. Isso nem mesmo às autoridades para provar a parte criminal. Considero importante que o Senado, realmente, entre nessa discussão, crie legislação própria para que isso não aconteça, ou interfira diretamente no processo.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado. Encerro, então, fazendo uma comunicação que me deixou extremamente surpreso: a Comissão de Valores Mobiliários não possui os dados sobre os bancos nem tampouco sobre as empresas financeiras, porque o Banco Central não as fornece em função do sigilo bancário. Quem é fiscal não recebe informações sequer para fiscalizar, o que mostra um descompasso tremendo. Cada um aguardava o outro, como se fosse um castelo de cartas que se desmonta e coloca a nu uma situação terrível, ou seja, que o grande público, o depositante, não tinha garantia alguma.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/1996 - Página 5955