Discurso no Senado Federal

DIA NACIONAL DO INDIO. DEFESA DE UMA NOVA POLITICA INDIGENISTA.

Autor
Marluce Pinto (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Maria Marluce Moreira Pinto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • DIA NACIONAL DO INDIO. DEFESA DE UMA NOVA POLITICA INDIGENISTA.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/1996 - Página 6636
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, INDIO, OPORTUNIDADE, DEFESA, ADAPTAÇÃO, POLITICA INDIGENISTA, GARANTIA, EXERCICIO, CIDADANIA, PRESERVAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA.

A SRª MARLUCE PINTO (PMDB-RR. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste 19 de abril, novamente comemoramos o Dia Nacional do Índio. A data representa não apenas o momento de exaltação do papel histórico de nossos índios no processo de construção da civilização brasileira. Também, não apenas representa a oportunidade para fazer um balanço dos sacrifícios impostos à comunidade, pela violência e desrespeito a sua vida, aos seus valores e à sua identidade cultural.

A data, mais que uma homenagem, deve servir, acima de tudo, para uma profunda reflexão sobre a mais adequada e justa política que permita aos silvícolas a garantia do pleno exercício da cidadania, do respeito ao seu habitat natural, do resguardo de seus valores morais, seus costumes e da manutenção e preservação de sua cultura.

Na realidade, a comunidade indígena brasileira, até bem pouco tempo, foi objeto de inúmeras violências, onde vimos reduzir-se o seu contingente populacional a número quase insignificante. A somatória de muitos fatos, como a impunidade praticada contra o silvícola por interesses escusos; a omissão das autoridades; a convivência com grupos marginais da população branca e o descaso governamental permitiu, infelizmente, a que chegássemos a esse processo de destruição de seu habitat e a degeneração de seus costumes.

A questão indígena não pode ser subordinada a discussões estéreis, emocionais e demagógicas, as quais, na verdade, serviram e ainda servem muito mais à promoção nacional e internacional de alguns "exploradores de sucesso" do que tem contribuído para a formulação de uma adequada e objetiva política indigenista no País. A formulação de uma política integrada e abrangente destinada à comunidade indígena, a meu ver, seria muito mais importante do que uma confusa política voltada quase que exclusivamente para a demarcação de reservas.

Fundamental, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é formular propostas destinadas a estabelecer diretrizes e ações corretas que permita ao índio o exercício pleno de sua cidadania; a possibilidade de seu acesso aos frutos do progresso econômico e social e a convivência, em alguns casos, com as comunidades não indígenas. Tudo isso de uma forma racional, de modo que sejam mantidos seus costumes; preservado seu habitat e resguardada sua cultura. A par das dificuldades que tudo isso possa representar, urge que assim o façamos, porque, caso contrário, estabeleceremos o isolacionismo "aparente" dos índios. Digo aparente na proporção que, como é sabido, grupos de interesses os mais diversos, hoje, se movimentam junto às comunidades indígenas com projetos os mais estranhos que violentam sua vida, seus conceitos, seus valores e sua cultura. Esse isolacionismo, a persistir, gerará dificuldades crescentes. Nossas comunidades índias, a maioria, já assimilou costumes e usos do branco; participam de benefícios do progresso e merecem participar de serviços indispensáveis como a educação, a saúde e os instrumentos destinados à melhoria de suas condições de vida. Apenas para ilustrar uma possibilidade, bem sabemos da vulnerabilidade do silvícola diante de doenças comuns ao homem branco, uma porta sempre aberta para uma epidemia, o que representa uma constatação da ampla necessidade de uma visão mais completa, abrangente e integral no trato com a questão indígena. Pouco se faz, Sr. Presidente, em relação à educação sanitária e alimentar de nossos índios.

Fundamentalmente é preciso ter como premissas básicas que o índio tem o direito não só à vida, à liberdade e à busca da felicidade. Nessa perspectiva, a política de valorização da cidadania indígena não só deve ter como preocupação permanente impedir agressões ao meio ambiente, ao seu espaço de sobrevivência e a preservação de seus costumes. Deve, também, garantir-lhe o acesso aos bens e serviços públicos básicos a uma existência com dignidade. Ademais, é crucial que se defina o modus operandi da convivência das comunidades indígenas com os seus irmãos caboclos, mestiços, mulatos e brancos, fisicamente próximos.

Precisamos, urgente, abraçar essa realidade. É crucial ter bastante claro e explícito que a política de governo em relação às comunidades indígenas não pode se restringir, apenas, em demarcar reservas. É preciso garantir, através da orientação sábia de indigenistas escrupulosos, preparados e dedicados, a execução de políticas que permitam aos silvícolas o direito ao exercício pleno de sua cidadania. Nossos índios clamam por melhores condições de vida. Não podemos relegá-los a uma condição à parte, discriminatória, não raras vezes em condições sub-humanas. Necessário é provermos, repito, apoio nas áreas de saúde, educação, saneamento básico, etc., de forma a garantir-lhes os instrumentos básicos para que tenham melhor organização em suas atividades produtivas dentro do marco de preservação de sua identidade e valores culturais. Não mais podemos desconhecer realidades objetivas. Em Roraima e no País, onde quer que existam índios, a grande maioria dessas comunidades vão-se integrando, social, econômica e politicamente ao resto da população, via rede de serviços dos Estados e via estímulo à sua participação política ampliada cada vez mais. Em Roraima, particularmente, há muito deixou de ser novidade a representatividade de índios no legislativo municipal. Lá os temos professores, educadores, funcionários públicos e vice-prefeito.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito mais poderia falar a respeito de nossos índios. Com eles convivo há longo tempo e conheço seus anseios e aspirações. Muito mais ainda poderia ser dito em relação aos interesses escusos, fortíssimos e que extrapolam nossas fronteiras para a manutenção da atual situação, notadamente em se tratando de nossa Amazônia. Sei, entretanto, que novas políticas, neste particular, devam ser desenvolvidas. Não apenas abrangentes e integradas quanto aos seus objetivos e propósitos, mas, também, que busquem ações conjuntas das três esferas de governo. Mais ainda, que definitivamente excluam quaisquer ingerências externas nas suas definições e na sua condução. Nossos índios não podem ser objeto de interesses de alguns que pretendem mantê-los como se mantém uma reserva ecológica, objeto de exibição, como se apenas fossem parte da fauna. Nossos índios são cidadãos brasileiros que exigem respeito à sua vida, à sua liberdade e à sua dignidade. O índio, como nós, é um nacional, membro de uma sociedade nacional, como assim também o é o fazendeiro, o professor, o médico, o aluno, etc., todos elementos radicados em solo brasileiro e cujos direitos não podem e não devem ser esquecidos, pois lembrados e cobrados são sempre seus deveres.

Era o que tinha a dizer, Senhor Presidente.

Obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/1996 - Página 6636