Discurso no Senado Federal

APOIO AO PROJETO DE CONSTRUÇÃO DA RODOVIA QUE LIGA O BRASIL AO PACIFICO, PRIORIZADA NO PLANO PLURIANUAL.

Autor
Gilberto Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • APOIO AO PROJETO DE CONSTRUÇÃO DA RODOVIA QUE LIGA O BRASIL AO PACIFICO, PRIORIZADA NO PLANO PLURIANUAL.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/1996 - Página 6922
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • EXPECTATIVA, LIGAÇÃO, TRANSPORTE TERRESTRE, BRASIL, OCEANO PACIFICO, INCLUSÃO, OBJETIVO, PLANO PLURIANUAL (PPA).
  • ELOGIO, INTEGRAÇÃO, BRASIL, AMERICA DO SUL, VANTAGENS, LIGAÇÃO, OCEANO PACIFICO, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO, ACESSO, MERCADO EXTERNO, ASIA, AMERICA DO NORTE, FAVORECIMENTO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • ANALISE, OBSTACULO, OBRA PUBLICA, LIGAÇÃO, OPINIÃO, ORADOR, PRIORIDADE, POLITICA DE TRANSPORTES.

O SR. GILBERTO MIRANDA (PMDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma série de fatos recentes nos fazem crer que estamos, agora sim, bem mais próximos do que nunca de estabelecer uma ligação por terra com o Oceano Pacífico. É indicador seguro desse avanço, por exemplo, a inclusão, como prioritário no Plano Plurianual (PPA), de um item intitulado Saída para o Pacífico, que prevê "a consolidação dos eixos de ligação com as fronteiras do Peru e Bolívia, que favorecerão a integração com esses países e o futuro acesso terrestre do Brasil a portos localizados no Pacífico".

Os investimentos estimados pelo PPA para esse item somam cento e dois milhões de dólares, cifra inexpressiva diante da grandeza dos trabalhos necessários e diante dos benefícios que a nação terá com essa ligação. De todo modo, é importante que o governo pense seriamente nesse projeto também com a finalidade de aproximar os Estados do Amazonas, Acre e Rondônia do resto do País.

Especificamente sobre estradas, diz o PPA: "Na área rodoviária, serão realizadas obras de construção e ou recuperação em trecho de trezentos e cinqüenta quilômetros de extensão da BR-317, que liga Rio Branco a Assis Brasil, na fronteira com o Peru. Deverá também ser construído trecho de noventa quilômetros de extensão ligando Abunã, em Rondônia, a Guajará Mirim, na fronteira com a Bolívia".

Com relação aos investimentos necessários em estradas, eu gostaria de transcrever trecho de artigo publicado no jornal O Globo, na edição de quatro de março do corrente, pelo presidente da Sociedade Nacional de Agricultura, Octávio Mello Alvarenga: "Nosso comércio com o Japão e mais recentemente com o emergente mercado chinês justifica uma visão mais objetiva para tais gastos, equivalentes a um copo d'água no regador que vai irrigar nossa exportação de grãos, minérios, madeira e, por outro lado, facilitar o ingresso de produtos oriundos do Japão, da China, da Indonésia e da Malásia".

A verdade é que nos últimos tempos, de uma forma inimaginável até para os mais otimistas, o Brasil vem se integrando rapidamente aos seus vizinhos sul-americanos. Prova disso é que num curto espaço de tempo foram multiplicadas várias vezes as transações comerciais com Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. Chegou a vez de intensificarmos nosso intercâmbio com Peru e Bolívia.

Felizmente, parece que já existe um consenso entre as elites políticas brasileiras de que é preciso, com urgência, estabelecer uma interligação com o Oceano Pacífico. O que se deve lamentar é que estamos fazendo isso muito lentamente. A consciência dessa necessidade se aprofunda na medida em que se sabe que a maioria do comércio mundial já é feito pelo Pacífico. Até a Idade Média, as transações de mercadorias se davam basicamente no Mar Mediterrâneo. Mas, com o desenvolvimento técnico das navegações, ganhou importância o Oceano Atlântico, que até bem pouco concentrava a maioria das rotas comerciais.

Estima-se que no ano 2.000 apenas seis por cento da população mundial estará concentrada na Europa, contra dois terços no continente asiático, banhado pelo Pacífico. Pelo Oceano Pacífico, chega-se à China, a mais populosa nação da terra ou, como querem os economistas, o maior mercado consumidor do mundo. Com crescimento médio anual de dez por cento nos últimos anos, a China é hoje o maior canteiro de obras do Planeta.

O Oceano Pacífico banha também o Japão, segunda maior economia mundial. Pelo Pacífico, tem-se acesso aos chamados tigres asiáticos -- Coréia do Sul, Formosa, Malásia, Tailândia, Hong Kong e Cingapura --, nações cujo avanço econômico vem ocorrendo num ritmo vertiginoso. Por aquele Oceano, chega-se ainda aos grandes mercados da Indonésia e das Filipinas, países muito populosos. Enfim, pelo Pacífico, ficamos bem mais próximos da costa oeste dos Estados Unidos e do Canadá.

Foi pensando nesses mercados que políticos brasileiros de visão e alguns empresários mais arrojados começaram a lutar em busca de uma saída para nossa produção através daquele Oceano. A idéia não é nova mas só recentemente se cristalizaram as condições necessárias para que o processo fosse desencadeado. Para se ter uma idéia de quanto estamos atrasados nesse ponto, basta lembrar que esta cidade, Brasília, foi fundada há apenas 35 anos pelo estadista Juscelino Kubitscheck. Ou seja: faz pouco mais de três décadas que começamos efetivamente uma arrancada em direção ao Oeste. Por quatro séculos e meio este País viveu agarrado às praias do Atlântico.

Nesses trinta e cinco anos que vêm desde a fundação de Brasília, vimos explodir a agricultura nos cerrados e assistimos à ocupação -- de forma desordenada e irracional por vezes -- de grandes áreas de floresta amazônica e do Pantanal. Também o avanço da fronteira agrícola brasileira fez com que se aprofundasse a consciência a respeito da falta de uma estrada para o Pacífico. Assim, essa ligação acabou se transformando, nos últimos anos, num imperativo incontornável.

Para que isso ocorresse foi preciso também que passássemos por uma mudança cultural profunda. Até os anos 60, o Brasil viveu praticamente de costas para a América do Sul e de frente para os Estados Unidos e a Europa. Foi preciso que quase todo o continente se visse dominado por ditaduras militares de direita para que percebêssemos o nosso destino comum. Além disso, disputas inócuas com a Argentina por uma pretensa liderança regional arrastaram-se por décadas. Vivemos como rivais por um tempo excessivamente longo.

Felizmente, com a implantação do Mercosul, essas diferenças foram superadas. Envolvido pela onda da globalização, o Sul da América, como outras regiões do Globo, sentiu que só poderia crescer na medida em que se constituísse num bloco econômico. Em poucos anos -- de 1990 para cá -- vimos desencadear-se uma acelerada integração econômica. A integração cultural já começa e virá rapidamente devido às semelhanças entre as línguas espanhola e portuguesa e as culturas brasileira e hispano-americana.

Um fato que em geral passa despercebido, quando se fala na saída para o Pacífico, é que essa ligação, no sentido, inverso, representará também um escoadouro -- pelo Atlântico -- para a produção de peruanos, bolivianos e chilenos. Esses três países vizinhos terão condições não só de levar suas mercadorias aos portos brasileiros do Atlântico, mas também de vendê-las aqui. Parece lógico, portanto, concluir que essa ligação rodoviária será decisiva no sentido da criação de um futuro mercado sul-americano. Mais do que isso, será fundamental para que se desencadeie, finalmente, um processo de integração de toda a América do Sul.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não podemos esquecer-nos, por momento algum, que os obstáculos à consecução dessa idéia são muitos. Além das dificuldades econômicas enfrentadas nas últimas décadas por todos os países da região, deve-se somar uma imensa gama de outras dificuldades. O maior obstáculo é, sem dúvida, a falta de financiamento bancário para as obras.

Há quem ache que os organismos internacionais que poderiam emprestar recursos para a abertura e melhoramento das estradas não o fazem por pressão do governo dos Estados Unidos. Essa pressão teria origem na crença de que a abertura de estradas na Região Amazônica -- e eu me refiro especificamente ao caso da BR-364, no Acre -- significaria a destruição da floresta amazônica e dos povos indígenas.

É claro que um País com a lastimável folha corrida em relação a crimes ecológicos que possuem Estados Unidos -- a nação que mais polui na Terra hoje em dia! -- não tem autoridade moral para fazer essa previsão. Nunca é demais lembrar que os Estados Unidos destruíram a maioria de suas florestas. E que lá os brancos de origem européia dizimaram os povos autóctones.

Parece-nos óbvio, no entanto, que os motivos não são "ecológicos" ou "humanitários". A verdadeira motivação é econômica, porque, a partir do momento em que passarem a ser embarcados nos portos do Pacífico, os produtos brasileiros -- em especial os saídos das regiões Norte e Centro-Oeste -- estarão chegando mais baratos ao Japão e a todo o imenso mercado asiático, necessitado de grãos e de carne. Estima-se que o custo do transporte das nossas mercadorias para aqueles centros caia em 100 dólares por tonelada, porque a rota será encurtada em quatro mil milhas náuticas.

De uns tempos para cá, começaram a sair na imprensa brasileira dezenas de reportagens sobre a saída para o Pacífico. Mas, infelizmente, de um modo geral, mostram que ainda falta muito para que essa ligação se efetue -- através da Bolívia ou do Peru --, seja desembocando em portos chilenos, seja em portos peruanos. Isso se dá por que tanto no Brasil quanto nos países vizinhos muitas dessas estradas -- já usadas hoje, embora de forma precária -- não passam de picadas abertas no meio do mato. Quando já definitivamente implantadas, encontram-se mal conservadas ou precisando de melhorias.

Para completar o quadro de dificuldades, é preciso considerar ainda que no meio do caminho estão os Andes, esse paredão de milhares de metros de altura que sempre nos separou de nossos vizinhos do Oeste.

No entanto, as mesmas reportagens sobre viagens por terra ao Pacífico -- feitas por jornalistas ou por grupos de empresários -- mostram que já se trabalha dos dois lados dos Andes. Empresários de visão, de ambos os lados, se movimentam porque sabem que o futuro está por chegar.

É impossível tentar dimensionar o quanto o Brasil perde a cada ano pela falta de uma estrada que nos conecte com o Oceano Pacífico. As perdas certamente ascendem a bilhões de dólares. O que o País deixa de ganhar pela falta de uma boa estrada justificaria plenamente maciço investimento de recursos oficiais.

O que se sabe, hoje, é que grande parte da produção de alimentos do Centro-Oeste e do Norte do País apodrece nos armazéns por falta de escoamento. Não temos sequer estradas que levem esses produtos aos portos do Atlântico, a dois ou três mil quilômetros de distância. Isso é totalmente absurdo. Se temos que transportar a produção do Centro-Oeste por terra por mais de mil quilômetros, que seja para os portos do Pacífico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apesar das grandes dificuldades com que nos deparamos ainda, seja no âmbito interno -- com a falta de recursos e mesmo de maior empenho por parte do governo --, seja pelas injunções internacionais, estamos otimistas. Acreditamos que os sul-americanos vão acabar abrindo esse caminho. E bem mais breve do que se poderia pensar.

Eu acredito que a abertura dessa interligação deveria ser a prioridade número um do nosso Ministério dos Transportes. Se temos uma boa chance de multiplicarmos várias vezes a produção brasileira de alimentos, ela só se concretizará quando tivermos acesso mais fácil ao Oceano Pacífico. 

Era o que tinha a dizer.

Muito Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/1996 - Página 6922