Discurso no Senado Federal

CUMPRIMENTOS AO NOVO MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, RAUL JUNGMANN, PELAS PRIMEIRAS INICIATIVAS. PREMENCIA DE UMA POLITICA AGRICOLA. PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • CUMPRIMENTOS AO NOVO MINISTRO DA REFORMA AGRARIA, RAUL JUNGMANN, PELAS PRIMEIRAS INICIATIVAS. PREMENCIA DE UMA POLITICA AGRICOLA. PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/1996 - Página 7455
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ELOGIO, RAUL JUNGMANN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF).
  • APOIO, ALTERAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), DESCENTRALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, PARCERIA, ESTADO, PAGAMENTO, DESAPROPRIAÇÃO, DINHEIRO, AUSENCIA, UTILIZAÇÃO, TITULO DA DIVIDA AGRARIA.
  • COMENTARIO, EXPERIENCIA, ESTADO DE GOIAS (GO), ASSENTAMENTO RURAL, REFORMA AGRARIA.
  • SOLICITAÇÃO, INCLUSÃO, AREA, REGIÃO NORDESTE, ESTADO DE GOIAS (GO), PRIORIDADE, REFORMA AGRARIA, OBJETIVO, CONTENÇÃO, MIGRAÇÃO, ENTORNO, DISTRITO FEDERAL (DF), PREVENÇÃO, AUMENTO, FAVELA, CAPITAL FEDERAL.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) -Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou acompanhando a mini-reforma presidencial. Hoje, toma posse o Ministro Raul Jungmann. Há poucos dias, tomou posse o Ministro Luiz Carlos Santos.

Sr. Presidente, fui um dos Senadores que mais solicitou que houvesse um interlocutor entre a classe política e a Presidência da República. Felizmente, foi nomeado um Ministro, para que ouça, com humildade, os nossos pronunciamentos, os nossos reclamos, e, às vezes, os avisos que esta Casa tem dado com antecedência, como o de que a agricultura está quebrada há anos, e especialmente com relação à reforma agrária.

Lembro-me muito bem do pronunciamento feito pelo Senador Bernardo Cabral exigindo uma tomada de posição imediata do Presidente da República, porque a questão da reforma agrária estava se transformando quase numa revolução interna no País. Iris Rezende também, em pronunciamento nesta Casa, disse que precisou acontecer Corumbiara, no Pará, para que a atenção da Presidência da República se voltasse para a reforma agrária.

O Ministro Raul Jungmann está assumindo hoje a missão desafiadora e fascinante de encaminhar soluções para a maior de nossas dívidas sociais, que é a reforma agrária. Cumpre reconhecer que seus primeiros passos, antes mesmo de assumir o Ministério, indicam um perfil adequado ao tamanho da tarefa.

Visitando o Presidente do Congresso, Senador José Sarney, e o Presidente do Supremo, Ministro Sepúlveda Pertence, S. Exª abriu espaços políticos para a compreensão e o êxito de sua missão, mas foi além das ações de gabinete, ao visitar, em Jataí, o assentamento Iris Rezende Machado, que é uma das experiências de reforma agrária mais amplamente vitoriosas no meu Estado de Goiás.

São também positivos os primeiros sinais das idéias do novo Ministro. S. Exª quer promover uma profunda mudança nos métodos de ação e na estrutura do INCRA, e promete descentralizar para o nível dos Estados a execução da reforma. As desapropriações seriam feitas em dinheiro, buscando-se com isso a redução das dificuldades no processo de posse das áreas de assentamento. É generalizada a convicção de que os Títulos da Dívida Agrária são um instrumento que estão fora da realidade. O proprietário perde a terra e embolsa um monte de papéis sem poder de troca no curto prazo e com o valor de face já defasado.

É de constatar, sem dúvida, que o raciocínio burocrático está em baixa nas primeiras ações da nova política fundiária. Resta torcer para que o estilo não seja apenas uma versão de aparências da primeira hora, e que o Ministro dê tempo integral fora dos vícios da burocracia de gabinete, para ficar à altura das esperanças do campo, dos sem-terra e de um país que levou séculos para começar a romper a acefalia no processo de ocupação correta de seu território. Somos a maior nação católica do planeta, mas a Igreja Católica tem pregado num deserto de incompreensões, persistindo um quadro de desigualdades em que 47% das propriedades são mantidas por apenas 1% da população.

Temos tudo para uma economia agrícola eficiente, nela coexistindo os assentamentos, de caráter social, e as fazendas produtivas com as suas dimensões de escala e voltadas para o abastecimento e a exportação. Nosso modelo tem sido injusto tanto para a agricultura capitalista como para a agricultura social. O setor primário organizado padece com a falta de recursos, os juros altos, os preços mínimos injustos e as estruturas de transporte deficientes. Essa soma de ineficiências expulsa do campo as populações rurais, que engrossam as periferias das cidades, gerando doenças, desemprego e insegurança. É um quadro crítico em que as interdependências ajustam-se para semear o caos social.

O meu Estado de Goiás tem sido um excelente campo experimental para a convivência das estruturas capitalistas e das estruturas sociais no campo. Ao mesmo tempo em que crescemos para valer na produção de grãos, nos últimos 15 anos, consolidamos bons projetos de reforma agrária. O Governador Mauro Borges foi um dos pioneiros, ao implantar o combinado agrourbano de Arraias, no Norte do Estado, hoje Tocantins. Mas houve uma outra experiência anterior que retrata os bons resultados das coisas bem feitas, como assinalou o professor Joveny de Oliveira, coordenador de pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Goiás, em artigo publicado no último domingo pelo jornal "O Popular". Ele lembra o projeto criado por Bernardo Sayão, no vale do São Patrício, responsável pelo aparecimento de duas cidades de economia pujante, como são Ceres e Rialma. Outros exemplos de experiências consolidadas no Estado são os assentamentos de Aragaças e da cidade de Goiás.

O Sr. Ramez Tebet - Permite V. Exª um aparte?

O SR. MAURO MIRANDA - Tem V. Exª a palavra.

O Sr. Ramez Tebet -  Vejo com muita satisfação que V. Exª, também Senador pela nossa região, pelo nosso Centro-Oeste, aborda um assunto da maior importância, que é a reforma agrária. V. Exª está saudando a criação do Ministério da Reforma Agrária que muitos entendem desnecessário. No nosso entendimento, é indispensável que exista uma pasta governamental para tratar exclusivamente desse que é um grande drama social do nosso País. V. Exª, ao saudar a criação do Ministério, faz como que uma profissão de fé que endosso com relação ao atual ocupante, que é o Ministro que hoje se empossa. Empossa-se imbuído dos ideais de realmente promover uma política agrária neste País que seja justa, sem nenhuma fantasia, sem nenhuma ilusão, ou seja, uma política agrária baseada num cadastramento humano, daqueles que precisam e dependem da terra, e de um cadastramento material, onde sejam vistas quais as terras que estão improdutivas e as que são mais aptas para que se possa fazer esse casamento indispensável ao êxito de qualquer projeto de reforma agrária. V. Exª se aprofunda mais: traz, no seu pronunciamento, a experiência do seu Estado, a experiência de um governo que foi altamente decantado pelo povo e pelo que realizou em favor desse mesmo povo, qual seja, o governo do nosso companheiro de Senado Iris Rezende. S. Exª realizou assentamentos que efetivamente demonstram que, quando se quer, quando se faz com recursos e quando se faz adequadamente, os assentamentos tendem a ter o êxito que a Nação brasileira espera. Portanto, quero saudar a oportunidade do pronunciamento de V. Exª e pedir que aceite que, neste meu aparte, vá também a minha vontade e o meu coração de brasileiro, a fim de que esse assunto seja tratado da forma como deve ser, isto é, com muita seriedade e dentro daquilo que é possível realizar. V. Exª sabe ainda que isso envolve outros problemas. Agora mesmo, na tribuna, eu abordava o problema do desemprego, o problema urbano, que estão ligados ao problema rural. A matéria é muito complexa. E um homem com a vocação de V. Exª, oriundo do Centro-Oeste e com a experiência que tem, pode muito bem e tem competência para tratar do assunto como V. Exª está fazendo hoje dessa tribuna. Minhas congratulações a V. Exª.

O SR. MAURO MIRANDA - Agradeço ao Senador Ramez Tebet a generosidade de suas palavras. Creio que são mais pela irmandade que nos une como senadores dessa região tão rica e tão importante para o Centro-Oeste.

Essa tradição goiana de sucesso me leva a dirigir uma sugestão ao Ministro da Reforma Agrária. Gostaria que S. Exª incluísse entre as novas áreas prioritárias de reforma agrária a região Nordeste do Estado de Goiás, com seus enormes potenciais e com sua posição estratégica em relação a Brasília. O Nordeste de Goiás é a principal porta de entrada para as correntes migratórias que vêm do Nordeste e do Norte do País. Esses irmãos que são expulsos pela miséria e vêm em busca de sonhos quase nunca concretizados acabam por multiplicar o quadro de exclusão social que hoje é o nervo exposto do chamado Entorno do Distrito Federal. Levar a reforma agrária para uma região em que as terras são fartas e baratas é abrir um novo pólo de desenvolvimento onde poderão florescer povoados autônomos e uma nova paisagem agroindustrial.

Dos vinte e dois municípios do Nordeste goiano, apenas três não estão incluídos no Programa de Comunidade Solidária dirigido por Dona Ruth Cardoso, e basta isso para tornar evidente que são áreas de elevado interesse social. São os municípios de Alto Paraíso, Alvorada, Buritinópolis, Cabeceiras, Campos Belos, Cavalcanti, Colinas, Damianópolis, Divinópolis, Flores, Guarani, Iaciara, Monte Alegre, Nova Roma, Posse, São Domingos, São João D'Aliança, Simolândia, Sítio D'Abadia, Teresina, Vila Boa e Mambaí. Todas essas comunidades ainda convivem com o clima de quebradeira derivado da falta de financiamentos e das dívidas anteriores submetidas a juros escorchantes.

Mais que uma sugestão, minha palavra é de apelo ao Ministro da Reforma Agrária. Sua decisão pode representar um marco para a sua gestão, em benefício não só de uma região de grandes potenciais, como para o reequilíbrio da paisagem social de Brasília nos próximos anos. A região já tem os suportes indispensáveis para abreviar os efeitos da reforma agrária. Dispõe de dois eixos rodoviários asfaltados, as cidades já têm serviços essenciais e seriam fortalecidas com o crescimento da renda e do emprego, e a vocação regional é agrícola. Teríamos no Nordeste goiano um novo pólo para atrair e organizar as migrações, e um redutor de pressões sobre o Distrito Federal, expectativa que deve interessar aos governos de Goiás e de Brasília, ao Congresso e ao próprio Governo Federal. É difícil imaginar como será o núcleo do poder com o crescimento da mendicância, com os equipamentos sociais insuficientes e com o desemprego crescente, numa cidade em que as oportunidades de trabalho são limitadas por sua vocação de capital da República.

Quero crer que não faltará ao Governo sensibilidade para entender que não estou propondo nenhum absurdo. Minha proposta tem identidade com os propósitos do Ministro de desenvolver uma reforma agrária descentralizada, com a parceria de Estados e municípios. No caso particular que estou trazendo a este Plenário, considero indispensável criar uma opção de dignidade e de cidadania para as famílias que vivem debaixo dos viadutos ou nas vizinhanças da estação rodoferroviária, numa perversidade social que ninguém podia imaginar quando Brasília foi fundada, há apenas 36 anos. O regime de ocupação desorganizada do solo urbano da cidade, sob a pressão das migrações, obrigou as administrações locais a quebrarem os princípios básicos do plano de Lúcio Costa. Os que queriam apenas um lote rural passaram a reivindicar um lote urbano, criando uma paisagem de barracos miseráveis em toda a periferia. É preciso romper o processo de favelização de Brasília, e a minha proposta, se atendida, pode ser um bom começo para corrigir esses desvios.

Era o que eu tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/1996 - Página 7455