Discurso no Senado Federal

CRITICAS AS PROPOSTAS DO CONGRESSO NACIONAL DE ENDURECIMENTO DA AÇÃO DA IMPRENSA. INCIDENTE EM SERGIPE, DEMONSTRANDO O COOPERATIVISMO NO PODER JUDICIARIO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA.:
  • CRITICAS AS PROPOSTAS DO CONGRESSO NACIONAL DE ENDURECIMENTO DA AÇÃO DA IMPRENSA. INCIDENTE EM SERGIPE, DEMONSTRANDO O COOPERATIVISMO NO PODER JUDICIARIO.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/1996 - Página 7524
Assunto
Outros > IMPRENSA.
Indexação
  • CRITICA, PROPOSTA, CONGRESSO NACIONAL, REDUÇÃO, LIBERDADE DE IMPRENSA.
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, ESTADO DE SERGIPE (SE), ABERTURA, PRECEDENCIA, PERIGO, LIBERDADE DE IMPRENSA, LEI DE IMPRENSA, DEMONSTRAÇÃO, COOPERATIVISMO, JUDICIARIO.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Como líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, já ouvi nesta Casa e na Câmara dos Deputados manifestações de Parlamentares, relativas a propostas de endurecimento no que se refere à ação da imprensa, em função de notícias levianas que algumas vezes por ela são divulgadas.

Preocupam-me essas manifestações sobretudo porque esse endurecimento poderia ser interpretado ou aplicado não nas grandes capitais ou nos grandes centros, mas principalmente no interior do Brasil. Faço essa introdução em função de um episódio ocorrido no Estado de Sergipe que, a meu ver, pode abrir um precedente muito perigoso em relação à liberdade de imprensa e que demonstra, de maneira muito cristalina, o corporativismo que existe no nosso Poder Judiciário.

Em 1993, o Dr. Clóvis Barbosa, Presidente da OAB-Seção Sergipe, convocou entrevista coletiva, mediante a qual fez acusações sérias contra o Juiz de Direito Dr. José Alves Neto - não confundir com o homônimo Senador de Sergipe. Disse ele que o Dr. José Alves Neto havia feito negociata com o Banco do Estado de Sergipe: ele se manifestaria contrariamente a uma ação popular que estava sendo interposta por diversas entidades da sociedade sergipana contra o Banco do Estado de Sergipe no episódio da emissão das Letras do Tesouro do Estado, que eram avalizadas pelo BANESE.

Essa entrevista do Dr. Clóvis Barbosa, Presidente da OAB, foi publicada por toda a imprensa do Estado e reproduzida no Boletim do Sindicato dos Bancários de Sergipe. O Dr. José Alves Neto, Juiz de Direito, entrou com duas ações: uma, contra o Sindicato dos Bancários de Sergipe, pelo fato de o Sindicato ter transcrito a entrevista do Presidente da OAB, e pediu indenização por danos morais; a outra, contra o Jornalista Sílvio Monteiro, responsável pelo boletim do Sindicato.

Após a tramitação dessas ações veio o resultado: o Jornalista Sílvio Monteiro foi condenado a um ano e três meses de prisão pelo fato de o boletim pelo qual é responsável ter transcrito a entrevista.

Ora, se a moda pega, vamos ter uma situação bastante difícil neste País. Se isso tivesse valido, por exemplo, para a entrevista do Sr. Pedro Collor, o Sr. Fernando Collor teria continuado o seu mandato de falcatruas, e os jornalistas da Veja, se não me engano, que fizeram a entrevista, estariam presos. Se isso tivesse valido em relação à entrevista do Sr. José Carlos, que denunciou o escândalo do Orçamento, os jornalistas também estariam presos, e os anões do Orçamento teriam continuado, lépidos e fagueiros, transitando pelos corredores do Congresso Nacional.

O engraçado é que os órgãos de imprensa do meu Estado publicaram, à época, a entrevista do Presidente da OAB. E o Juiz entrou com uma ação contra o Sindicato e contra o Jornalista do Sindicato. Um outro juiz condenou esse Jornalista a um ano e três meses de prisão, mas como era réu primário teve a pena convertida a um ano e três meses de serviços prestados à comunidade.

O pior é que a denúncia feita pelo Presidente da OAB tinha fundamento. O Dr. José Alves havia contraído um empréstimo no BANESE para fazer uma plantação de melancia. Segundo se diz, houve problema com a plantação. E, para não pagar a dívida do BANESE, ele teria solicitado a indenização ao PROAGRO. Essa indenização é paga caso seja comprovado o fato de que quem a contratou não tinha condições de pagar. Para até instrumentalizar o Sindicato dos Bancários nessa ação, no ano passado, porque havia denúncia de que o Ministério da Agricultura e o Banco Central, através de suas comissões técnicas, tinham negado a indenização do Proagro e que o Banco do Estado de Sergipe, apesar disso, havia abatido a dívida do Sr. José Alves Neto, fiz um requerimento de informação ao Ministério da Agricultura e ao Banco Central. Eles, em resposta a esse requerimento, confirmaram que as comissões técnicas do Ministério da Agricultura e do Banco Central tinham concluído que não cabia a indenização para o Sr. José Alves Neto, Juiz de Direito.

Apesar disso, o Banco do Estado de Sergipe, desrespeitando a orientação do Ministério da Agricultura e do Banco Central, perdoou essa dívida.

Esse fato, esse episódio, ou essas informações comprovam que tinham fundamento as denúncias do Dr. Cláudio Barbosa.

Agora, o fato mais gritante, que deve merecer o repúdio do Parlamento, deve merecer o repúdio da sociedade e o repúdio da Imprensa, é o fato de que o jornalista que publicou a entrevista - mesmo que não tivesse fundamento, era uma entrevista coletiva dada pelo Presidente da OAB, seccional de Sergipe e que foi publicada por todos os órgãos de Imprensa do meu Estado - foi condenado a 1 ano e 3 meses de prisão, o jornalista Ciro Monteiro, do Sindicato dos Bancários.

Claro que recorreram dessa decisão, mas de qualquer forma demonstra o quanto é corporativa a nossa Justiça. Porque não tenho dúvida de que se não fosse uma ação promovida por um juiz, não teria tido uma sentença esdrúxula e absurda como essa. O engraçado foi que o juiz não processou o Presidente da OAB. Talvez porque sabia que seria mais difícil de ganhar essa ação. Processou o Sindicato dos Bancários e o jornalista do Sindicato.

São fatos como este, Sr. Presidente, que ocorrem no interior do nosso Brasil, que mostram que a nossa democracia ainda tem que caminhar muito para que possa ser classificada como tal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/1996 - Página 7524