Discurso no Senado Federal

ENCAMINHANDO A DISCUÇÃO DO SENADO AS PRINCIPAIS AÇÕES DO COMPONENTE INDIGENA DO PLANO AGROPECUARIO E FLORESTAL DE RONDONIA - PLANAFLORO.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • ENCAMINHANDO A DISCUÇÃO DO SENADO AS PRINCIPAIS AÇÕES DO COMPONENTE INDIGENA DO PLANO AGROPECUARIO E FLORESTAL DE RONDONIA - PLANAFLORO.
Publicação
Publicação no DSF de 26/04/1996 - Página 7185
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • ENCAMINHAMENTO, DISCUSSÃO, SENADO, ATIVIDADE, PROJETO AGROPECUARIO, PROJETO FLORESTAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), INCLUSÃO, DEMARCAÇÃO, FISCALIZAÇÃO, RESERVA INDIGENA, REFORÇO, PROGRAMA, SAUDE, ATENDIMENTO, INDIO.

O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em discursos anteriores referentes ao PLANAFLORO - Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia, discorri sobre a Missão do Banco Mundial que visitou Rondônia nos dias 21 e 22 de novembro, integrada por altos dirigentes, incluindo seis Diretores Executivos, um Secretario e o Coordenador Geral de Acompanhamento e Avaliação, da Secretaria Especial de Políticas Regionais do Ministério de Planejamento e Orçamento. A visita revestiu-se, muito mais, de um caráter político, que de uma missão técnica, mas, por certo, poderá trazer benefícios para a implementação do PLANAFLORO.

Em dias mais recentes, enfoquei a difícil missão do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, de conceder terras aos "sem terras", promovendo novos assentamentos, a regularização fundiária, à vista do que preceitua a Lei Complementar nº 52, que trata do Zoneamento Socio-econômico-ecológico. Uma árdua, difícil e desgastante tarefa, que os administradores locais da Superintendência Regional do INCRA, SR -17, estão se desdobrando para cumprir, com o mínimo de equívocos, em obediência ao Convênio do INCRA/Governo do Estado de Rondônia.

Hoje, Sr. Presidente e Srs. Senadores, encaminho à discussão desta Casa a questão indígena e, as principais ações do componente indígena do PLANAFLORO, que devem incluir:

a) a demarcação de cinco reservas indígenas com uma área total de 500.000 hectares;

b) a aviventação de trechos da demarcação de outras doze reservas;

c) a identificação de índios isolados e possível demarcação de mais quatorze áreas indígenas;

d) o fortalecimento de programas de saúde indígena, inclusive, com a criação de equipes volantes de saúde;

e) a fiscalização das áreas indígenas, inclusive com apoio da Polícia Florestal;

f) a criação de uma equipe conjunta FUNAI-Estado de Rondônia, para aprimorar o monitoramento dos problemas indígenas.

Antes de abordar, Sr. Presidente e Srs. Senadores, a questão indígena e o PLANAFLORO, na especificidade do Estado de Rondônia, faço uma digressão alusiva a seus aspectos mais gerais.

No Brasil, segundo a Fundação Nacional do Índio - FUNAI, existem 565 áreas indígenas, para uma população de 228.577 índios, que ocupam uma área de terras de aproximadamente 94 milhões de hectares, equivalentes à superfície dos Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, e Rio Grande do Norte, cobrindo 11% do Território Nacional,segundo dados estatísticos de relatório da FUNAI, de 1995.

O maior percentual dessas áreas está localizado na Amazônia. Dos 94 milhões (94.O36.047 hectares) de terras indígenas existentes no Brasil, 76.688.610 hectares estão em terras da Amazônia, assim distribuídos:

ESTADO  ÁREA (Hectares)  POPULAÇÃO

Amazonas  34.751.952    43.410

Pará   22.292.934    7.959

Roraima  12.816.338    27.485

Rondônia   3.836.231    4.242

Acre    1.899.701   8.508

Amapá   1.091.454    2.227

TOTAL   76.688.610    93.871 

Na Amazônia, encontravam-se 81,5% das áreas indígenas do País. Também na Amazônia, estão situadas as maiores áreas indígenas individualizadas, assim distribuídas:

ESTADO

ÁREAS INDÍGENAS

SUP./HA

POPULAÇÃ0

Roraima

Yanomani

9.664.975

9.910

Roraima

Raposa Serra do Sol

1.678.800

1.000

Amazonas

Alto do Rio Negro

8.150.000

1.500

Amazonas

Médio Rio Negro

2.142.000

1.033

Amazonas

Rio Bia

1.180.200

650

Amazonas

Vale do Javari

8.338.000

1.500

Amazonas

Waimiri/Atroari

2.585.911

982

Pará

Tumucumaque

2.700.000

344

Pará

Trincheira Bacajá

1.655.000

218

Pará

Menkragnoti

4.914.255

470

Pará

Kaiapó

3.284.005

1.743

Pará

Baú

1.850.000

65

Rondônia

Uru-Eu-Wau-Wau

1.867.118

1.200

Conseqüentemente é, também, na Amazônia que se registram os maiores problemas entre índios e não-índios. Erigida em nova fronteira agrícola e mineraria do país, com a abertura de rodovias federais, como a Belém/Brasília, a Transamazônica, a Cuiabá/Porto Velho, a Manaus/Caracaraí/Rio Branco,com a implantação de grandes projetos, como a construção da Hidrelétrica de Tucuruí, a implantação do Projeto Carajás e a descoberta de garimpos como os de Serra Pelada, Bom Futuro e tantos outros, acorreram à Região, atendendo ao chamamento do Governo Federal, na década de 70, para ocupa-la , "...os homens sem terras para as terras sem homens", sob a inspiração do lema de "Integrar para não Entregar".

No que tange à inserção das áreas indígenas no Direito brasileiro, cumpre tecer considerações. Antes mesmo de ser descoberto o Brasil, suas terras já haviam sido divididas entre os reinos de Portugal e Espanha, por força do Tratado de Tordesilhas, assinado em 7 de junho de 1494, segundo o qual 370 léguas a partir de Cabo Verde, as terras do Oeste pertenceriam à Espanha e as do Leste a Portugal.

Assim, ao aportar no Brasil, Pedro Álvares Cabral tomou posse das terras, em nome do rei de Portugal, passando todo território brasileiro a integrar os bens do Império Luso, como propriedade pública da coroa. Juridicamente, desde a sua origem, essas terras poderiam ser classificadas como terras públicas.

Sucede que, aqui chegando os lusitanos, as terras já estavam habitadas. E seus primeiros habitantes eram os índios. Logo, essas terras eram suas. Por direito de ocupação, passaram a ser da Coroa portuguesa.

Historicamente, a primeira notícia que se tem de uma norma legal sobre áreas indígenas no Brasil-Colônia é a Lei de 30 de Julho de 1609, que declara os índios pessoas livres e confia sua tutela aos padres jesuítas.

A Carta-Régia, de 10 de setembro de 1611, representou sensível avanço nas relações entre índios e não índios, estabelecendo que:

"os gentios são senhores de suas fazendas como o são na terra sem lhes poderem ser tomadas nem sobre elas se lhes fazer moléstia por injustiça alguma; nem poderão ser mudadas contra suas vontades das capitanias e lugares que lhes forem ordenados, salvo quando eles livremente o quiserem fazer..."

A Constituição de 1934 foi a primeira a ter em seu texto um dispositivo sobre o tema, ao estabelecer:

"Art.l29 Será respeitada a posse de terra dos silvícolas que nelas se achem permanentemente localizados, sendo-lhes, no entanto vedado aliená-las."

A Constituição de 1967, em seu artigo 186, mantendo a mesma orientação das Constituições anteriores, ampliou a proteção constitucional, reconhecendo aos índios o direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes:

"Art.186 É assegurada aos silvícolas a posse permanente das terras que habitam e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes".

Em 1910, o governo criou o Serviço de Proteção ao Índio - SPI, que pelo Decreto nº 136, de 6 de abril de 1936, foi autorizado a impedir que as terras habitadas pelos silvícolas fossem tratadas como devolutas. Em 5 de dezembro de 1967, foi o Governo autorizado a criar a Fundação Nacional do Índio - FUNAI, que teve seus Estatutos aprovados pelo Presidente da República, passando, então, a gerir e proteger os índios e seu patrimônio. Finalmente, Senhor Presidente e Senhores Senadores, a Constituição de 1988, diferentemente das anteriores, reservou aos índios um capítulo inteiro, o VIII, com dois artigos, (231 e 232) e seus parágrafos, inseridos no título VIII, "Da Ordem Social".

A Constituição de 1988, abriga em seu texto, uma questão das mais polêmica que tem dividido as opiniões de indigenistas, políticos, juristas, magistrados, enfim, a sociedade brasileira. Trata-se da interpretação dada ao parágrafo 1º, do Artigo 231, que assim define as terras indígenas:

"Art. 231 ......

Parágrafo 1º  São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições".

A conceituação constitucional de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios , é clara. Não deixa margem à dúvidas. Com efeito, a amplitude do conceito acha-se no art. 231, parágrafo 1º, fundado em quatro condições, todas necessárias e nenhuma suficiente sozinha, a saber:

1ª serem por eles habitadas em caráter permanente;

2ª serem por eles utilizadas para as suas atividades produtivas;

3ª serem imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar;

4ª serem necessárias à sua reprodução física e cultural, tudo segundo seus usos, costumes e tradições.

A aplicação concreta do conceito , no campo, é que tem gerado controvérsias no mundo Jurídico, tornando-se objeto de intermináveis demandas, quer na esfera administrativa, quer na Judicial.

Para resolver a questão, entendemos que primeiro deve-se distinguir a posse indígena, da posse civil e, modernamente, da posse agrária. O fundamento básico da posse civil é a propriedade, e da agrária, a atividade rural. A posse indígena fundamenta-se na tradicionalidade da ocupação.

Ora, Sr. Presidente e Srs. Senadores, a tradicionalidade da ocupação Indígena, segundo preceito constitucional, pressupõe a satisfação das quatro condições, de forma cumulativa.

Uma outra questão merecedora de abordagem é da demarcação administrativa das áreas indígenas. Esta obedece ao rito processual estabelecido pelo Decreto 22, de 4 de fevereiro de 1991. Editado com base no disposto pelo Art. 231, da Constituição, e no Art. 22, inciso IX, da Lei 6.001/73, (Estatuto do Índio), em verdade, o decreto 22 é muito mais abrangente. Além de dispor sobre o processo demarcatório, trata, ainda da criação ou ampliação de áreas indígenas, sua identificação e declaração de posse permanente, para , a partir daí,dispor sobre a sua demarcação. A FUNAI, estabeleceu um procedimento validado pelo Ministro da Justiça, que consiste na identificação, declaração de posse permanente e demarcação dessas áreas indígenas.

Um ponto de discórdia, na questão da demarcatória, reside no tratamento diferenciado a índios e não-índios, em flagrante desrespeito ao principio da igualdade de direitos estabelecidos no art. 5º, da Constituição. Enquanto que aos índios é assegurado o direito de participar do processo demarcatório em todas as suas fases, aos não-índios essa participação é mera faculdade, cuja conveniência depende de julgamento do grupo técnico da Fundação Nacional do Índio, encarregado do trabalho demarcatório.

Garantido por todas as Constituições, o direito de propriedade deve ser respeitado, da mesma forma que os direitos indígenas. É o principio da igualdade de direitos.Não pode a União, Senhor Presidente e Senhores Senadores, através de seus prepostos do Poder Executivo, por meras portarias e decretos, desconhecer o direito de propriedade, que é sagrado, declarando determinadas áreas como de posse permanente indígena, sem conceder aos seus titulares o direito ao contraditório, à defesa de seus interesses. Seria a negação do texto constitucional. Ou, até mais do que isso. A abolição desse direito.

Concluindo, Sr. Presidente e Srs., a digressão que me permiti, afirmo que:

Compete à União demarcar, proteger e fazer respeitar as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. É dever do Estado e direito das populações indígenas. Assim estabelece a Constituição. Não devem, porém,os trabalhos demarcatórios ser efetuados ao arrepio da lei, afrontando direitos fundamentais garantidos pela Constituição. Não são da competência exclusiva do Poder Executivo ações e iniciativas dessa natureza, cabendo ao Legislativo, no âmbito de suas prerrogativas, o controle e a fiscalização de tais atos e, ao Judiciário, a coibição de desvios ou abusos de poder eventualmente ocorridos nos processos demarcatórios.

As demarcações de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e realizadas obediência ao rito do decreto 22/91 são nulas. É que esse decreto foi editado em 1991, quando todos os dispositivos legais que delegaram ao Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange à ação normativa, como é o caso, já haviam sido revogados, ex. vi do disposto no art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais e Transitórias.

As portarias da FUNAI e do Ministério da Justiça identificando áreas indígenas ou declarando-as como de posse permanente dos índios são inconstitucionais, por desrespeitarem os princípios da igualdade de direitos, do contraditório e do devido processo legal; violentarem os direitos de ir e vir, de propriedade e do livre exercício do trabalho e invadirem competência privativa dos Estados e do Congresso Nacional.

Na caracterização de uma área de terras como tradicionalmente ocupada pelos índios, deverão estar presentes os quatro requisitos exigidos pelo parágrafo 1º, do art. 231 da Constituição, de forma cumulativa. Isoladamente, nenhum deles é suficiente para essa configuração.

Os comentários até aqui feitos, Sr. Presidente e Srs. Senadores, não traduzem uma preocupação de proprietários de áreas legítimas no meu Estado, mas essa problemática ganha em expressão de relevância mormente nos Estados do Amazonas, Pará e Roraima, que detêm, 69.861.224 hectares, ou seja, 74,2% da área indígena brasileira.

Retomo o fio de meu discurso, Senhor Presidente e Senhores Senadores, passando a enfocar a situação específica das áreas indígenas de Rondônia, de suas populações e de como o PLANAFLORO está buscando melhorar a situação da proteção dessas áreas e dessas populações.

A Fundação Nacional do Índio - FUNAI, através da 6ª Diretoria Regional, em um documento "Projeto de Apoio às Comunidades Indígenas da Área de Influência da Rodovia Cuiabá/Porto Velho, 198O/85", e mediante os "Dados das Áreas Indígenas", passava uma informação de que o total das áreas indígenas de Rondônia, era de 4.524.142 hectares, que correspondia a 18,9%. da área total do Estado, ou seja, de 23.851.280 hectares. O total da área indígena distribuía-se entre 16 áreas; destacando-se a Área dos Uru.-Eu-Wau-Wau, com 1.867.118 hectares e a área Posto Indígena Aripuanã, com 748.200 hectares. As demais áreas ou postos indígenas eram de dimensões bem mais modestas, variando entre o limite superior de 279.906 hectares para a Área Indígena dos Pacaás Novos, e as menores, com 46.300, hectares para a Área dos Kaxarari, e 47.868 hectares para a Área Indígena do Ribeirão.

Em informação mais recente do PLANAFLORO, setembro de 1995, a situação das Áreas Indígenas do Estado de Rondônia, havia sido aumentada para 5.282.919 hectares, o que equivale, em termos percentuais, a 22,1%. Esse aumento deveu-se, em maior expressão, à nova área atribuída a Área Indígena de Aripuanã, que anteriormente figurava com 748.200 hectares, tendo passado a figurar no documento do PLANAFLORO, de setembro de 1995, com 1.614.366 hectares, ressalvados outros pequenos ajustamentos entre um período e outro.

No que diz respeito à população indígena que estava protegida nas áreas e postos indígenas, o número para o documento 1980-1989, era de 3.051 índios em 1980 e 4.819 indivíduos em 1898. Essa população aumentara para 1995, através de dados fornecidos pela FUNAI, Departamento de Saúde, de Brasília, para 7.799 silvícolas. Isso está a indicar, no primeiro período, um crescimento vegetativo de 57,9% e, no período de 1980-1995, um crescimento de 155,6%.

É preciso, contudo, que se faça uma observação que estas populações não são da área territorial do Estado de Rondônia, visto que a 6ª Diretoria Regional está organizada em Administrações Regionais - ADR, que incluem, na ADR de Porto Velho/Ji Paraná, índios do Estado do Amazonas, próximos de Lábrea; incluem também as populações indígenas assistidas pela ADR de Vilhena, localizado já nos limites de Rondônia e Mato Grosso, que conta com uma população de 2.109 índios, e todos devem ser recenseados como do Estado do Mato Grosso.

O documento do PLANAFLORO, "Situação Atual das Unidades de Conservação e Áreas Indígenas no Estado de Rondônia", de setembro de 1995, informa no ANEXO Nº 01, a Categoria da Área Indígena (Área ou Posto), a ADR/Município, o Decreto de Criação, Área total, Estudo de Alternativas Econômicas, Processo Demarcatório e de Reaviventação. É importante anotar que, da área total dos 5.282.919 hectares, um total de 5.087.919 já está demarcado, ou seja 96,3%. Desse total 4.849.202 hectares já haviam sido demarcados com outros recursos anteriores ao PLANAFLORO, e apenas 238.717 o foram, com os recursos do PLANAFLORO.

A população anotada nos documentos do PLANAFLORO e da FUNAI, indica que a população indígena do Estado de Rondônia é de 4.312 silvícolas. Relacionando-se a população com a área de reservas indígenas (5.282.919 hectares · 4.312 índios) = 1.225 hectares/silvícolas.

Essas informações sobre a evolução da população indígena da 6ª Diretoria Regional da FUNAI demonstram, Senhor Presidente e Senhores Senadores, em termos numéricos, que no Estado de Rondônia, os índios não estão sendos mortos ou dizimados pelos não-índios, visto como o crescimento vegetativo dessa população é de 155,6%. Tal informação é analisada por médicos do Departamento de Saúde da FUNAI, que alinham suas explicações para o fenômeno.

De uma maneira geral, nos últimos 20 anos, a população indígena no Brasil, está em franco crescimento. É preciso contudo, chamar a atenção para três tipos de situação:

a) índios com contacto mais antigo; entenda-se um período igual ou superior aos 100 anos essas populações indígenas já se tornaram mais resistente às doenças dos não-índios e já estão protegidas por esquemas de vacinação preventiva;

b) índios com contacto mais recente, menos de 20 a 30 anos, como por exemplo os Yanomâmis e os índios do Vale do Javari. (etnias Marubo, Mayoruna e Matis, nos municípios de São Paulo de Olivença, Atalaia do Norte, Jataí), esses agrupamentos estão sendo submetidos à uma depopulação violenta. Entre os Yanômamis, por exemplo, estão ocorrendo perdas da ordem de 40% de sua população.

c) populações ainda não conhecidas, não contactadas, que são as mais ameaçadas.

Muitos estudiosos e, principalmente, muitos empresários da mineração e da indústria madeireira, são contundentes na observação de que as preocupações dos Estados Unidos com os povos indígenas na Amazônia não teriam legitimidade, posto que os norte-americanos teriam "exterminado" os índios dos EUA, sugerindo que, em assim sendo, não teriam os "verdes americanos", os ambientalistas dos EUA, de comentar e propor medidas de proteção aos índios brasileiros.

O embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Sr.Melvyn Levitsky, em artigo publicado no Correio Brasiliense de 10 de setembro de 1994, informava que : " ... gostaria de salientar que hoje existem 1,5 milhões de índios nos Estados Unidos, representando "500 tribos, um número seis vezes maior do que os índios no Brasil". "Existe de fato", continua o embaixador dos EUA," mais índio morando hoje nos Estados Unidos do que quando Colombo chegou ao Novo Mundo".

Os Anexos nº 02, 03 e 04 apresentam estatísticas das Áreas Administrativas da FUNAI, de Porto Velho/Ji Paraná (Anexo nº O2); Área Administrativa de Cacoal (Anexo nº O3) e Área Administrativa de Guajará Mirim (Anexo nº O4). Em cada Anexo, as tabelas informam os Postos Indígenas, as etnias, os municípios e a população para cada Posto Indígena. Globalizando as informações, a FUNAI informa que em 1994 a população indígena era de 4.312 indivíduos, distribuídos em 28 Postos Indígenas, com mais de 17 etnias. As informações coletadas sobre as populações são possíveis e confiáveis, graças ao estreito contacto com as comunidades. A FUNAI, em Rondônia, está implantando e operacionalizando em todos os Postos das administrações Regionais, o "Modelo de Atenção Integral à Saúde do índio".

A participação das Organizações Não-Governamentais - ONGs, representativas da causa indígena, se faz sentir no FORUM das ONGS, de Rondônia. Especificamente das seguintes organizações, Articulação dos Povos Indígenas de Rondônia e Norte de Mato Grosso (APIR); Associação de Preservação Ambiental e Recuperação das Áreas Indígenas (APARAI), Associação do Povo Karitiana; Comissão de Apoio Indigenista ao Povo Nambiquara (AWARU); Organização Metareilá do Povo Indígena Suruí, Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Tenho a certeza, Senhor Presidente e Senhores Senadores, de que o papel dessas Organizações Não-Governamentais de Rondônia, na condução do PLANAFLORO está-se revelando de grande valia, seja pela sua representatividade e vascularização no interior do Estado, seja pelo bom conceito que elas desfrutam junto ao Banco Mundial, agente financiador do PLANAFLORO. Assim, ousaria sugerir ao Governo de Rondônia, e de modo todo particular, ao Secretário Geral do PLANAFLORO, um tratamento justo, o reconhecimento e a cobrança da atuação dessas expressões da sociedade, na execução e implementação das políticas do Projeto.

Rondônia, Sr. Presidente e Srs. Senadores, engloba uma População indígena de 4.312 índios, distribuídos em 28 Postos Indígenas , 17 grupos étnicos, e numa área de reserva total de 5.282.919 hectares. Com tais características, e com a sempre reconhecida limitação dos recursos humanos, materiais e financeiros, imagine-se o quão difícil deva ser intermediar as relações entre índios e não índios, mormente quando os nossos irmãos da floresta são detentores de extensas áreas de terras 22% da área geográfica do Estado. Já foi referido, que cada indivíduo , detém, em média, para si, 1.225 hectares, enquanto que os não índios assentados nos Projetos do INCRA, recebiam nos primeiros anos, 100 hectares, depois 50 hectares e, ultimamente, estão recebendo apenas 30 a 40 hectares de terras.

Essa convivência, Sr. Presidente, torna-se ainda mais difícil, quando se tem áreas indígenas inseridas em ambientes já densamente povoados, como é o caso da área do Posto Sete de Setembro, do Grupo Indígena Suruí, que dispõe de uma área demarcada de 110.160 hectares, para uma população de 343 indígenas. Isso leva-os a um convívio intenso com os produtores rurais do Projeto do INCRA, Gy Paraná, de Cacoal. Outra não é a situação da Reserva Indígena de Lage, onde estão localizados os índios do Grupo Pacaás Novos, em uma área de 107.321 hectares, povoada com 274 silvícolas. Essa Reserva fica situada à margem da rodovia que liga Porto Velho/Abunã/Guajará Mirim, e os índios estão em contacto com os não-índios há cerca de 80 a 100 anos, desde os primórdios da construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré.

Muito mais difícil, Sr. Presidente e Srs. Senadores, e complexa é a situação de proteção do agrupamento dos Uru-Eu-Wau-Wau, que detêm uma área de 1.867.118 hectares, e que constituem a maior comunidade indígenas de Rondônia, visto ser integrada por 1.200 índios.

A situação da Reserva dos Uru-Eu-Wau-Wau é de constante ameaça, face à estrada federal, BR-429 , que, saindo de Presidente Médici, situada sobre o eixo da Porto Velho/Cuiabá e passando por Alvorada d'Oeste, alcança Costa Marques, no Vale do Guaporé.

Essa estrada, se como é inegável, encontra justificativas de natureza geopolítica, de integração do Vale do Rio Guaporé com o centro nervoso de Rondônia, que é a BR-364; se veio atender aos reclamos da população do Município de Costa Marques (17.l62 habitantes no Censo Demográfico de 1991), que aspiravam ver-se resgatados do isolamento em que viviam, colocou, por outro lado, sob a exploração agropecuária, extensas áreas de solos mineralogicamente pobres, e, certas áreas de ecossistemas frágeis, que estão mapeados como Zonas 4, 5 e 6 , da Lei do Zoneamento Socio-econômico-ecológico. Ao longo dessa estrada, Senhor Presidente, estão sendo abertas extensas fazendas de pecuária. O próprio INCRA criou e desenvolveu em suas margens um Projeto de Assentamento, o PA Bom Princípio com uma área de 84.548 hectares, onde ficaram assentadas 1.354 famílias.

O traçado da BR-429 é uma ameaça constante à integridade da Reserva dos Uru-Eu-Wau-Wau, porque quase tangencia o setor leste da Reserva, passando a uns 10 ou 15 quilômetros da área.

Por outro lado, Sr. Presidente, as riquezas florestais da Reserva, com a ocorrência de mogno (cada metro cúbico vale cerca de US$700), de cerejeira, de ipê, exercem enorme atratividade sobre os madeireiros, fazendeiros e colonos, que ali vão para se suprirem de madeira de qualidade, abundantes e de graça.

É muito importante ponderar que, apesar de reconhecido e, identificado, o agrupamento indígena (estudos etno-históricos, sociológicos, cartográficos e fundiários), com a tramitação na estreita órbita do Ministério da Justiça, ao qual é subordinada a Fundação Nacional do Índio - FUNAI, concluído com a homologação presidencial e o registro das áreas nos Cartórios de Registro de Imóveis e no DPU- Departamento de Patrimônio da União, ainda resta um longo e difícil caminho a percorrer.

Quero referir-me ao problema que representa assegurar a intangibilidade da área de Reserva Indígena, ante a cobiça dos não-índios, em busca de riquezas minerais ou madeireiras. Os recursos humanos que delas se ocupam vigilantes e guardas-florestais existentes são em número insuficiente para o resguardo e proteção de áreas imensas, na imensidão Amazônica. Recordo-me, Senhor Presidente, de uma situação particular, a do Projeto Tucumã, no Estado do Pará, de propriedade e administração da Empresa Andrade Gutierrez, que, possuidora de uma gleba de 450 mil hectares, iniciou e implantou um assentamento qualificado como empresa de colonização particular. A Andrade Gutierrez, construiu com os seus equipamentos sete pistas de pouso, na gleba, duas pistas maiores para bimotores e outras cinco para monomotores. Ao lado das pistas, delimitações da área com "Picadões" de 30 a 50 metros de largura. A área era sobrevoada com frequência semanal e os vigilantes percorriam a gleba nas suas extremas. Valiam-se, ainda, de "olheiros" ou informantes, que traziam notícias frescas e de fontes seguras  .

Pois bem, Sr. Presidente e Srs. Senadores, foi impossível à Andrade Gutierrez, proteger a área livre de invasões, primeiro de garimpeiros de ouro, depois das incursões freqüentes, de madeireiros. Assim, fico a me perguntar, como as áreas de Reservas Indígenas poderão ser protegidas, na prática?

Pautado, Sr. Presidente e Srs. Senadores, pelos princípios do desenvolvimento sustentável, o PLANAFLORO foi concebido segundo o potencial de desenvolvimento sustentado de cada zona agroecológica. Dentre os quatro grandes componentes do PLANAFLORO, destaco o da Conservação, Manejo e Proteção Ambiental, que tem programado absorver 28% do total dos custos, incluindo zoneamento da terra; mapeamento e regularização; estabelecimento, manejo e proteção das unidades de conservação; RESERVAS INDÍGENAS; manejo florestal sustentável; reservas extrativistas; assistência técnica e estudos.

Na questão indígena, propõem-se "Alternativas Econômicas para as Populações Indígenas", buscando beneficiar 2.300 indígenas mediante a exploração racional dos produtos da floresta, considerando sua renovação e auto sustentabilidade, visando a desenvolver um modelo para outras comunidades não contempladas, e envolver progressivamente populações de ribeirinhos e seringueiros extrativistas.

Tenho a certeza de que para o que se pretende em Rondônia com recursos do PLANAFLORO muito aproveitável poderá ser a experiência do "Plano de Manejo Florestal da Área Indígena XIKRIN do Rio Cateté, no Estado do Pará". O projeto de apoio à exploração sustentável dos recursos florestais da área indígena XIKRIN do Cateté, foi elaborado sob coordenação técnica do Instituto Socio-ambiental, de São Paulo, tendo contado com a participação de pesquisadores (engenheiros florestais, biólogos, antropólogos, peritos em sensoreamento remoto, agrônomos, técnicos em informática) da Universidade de São Paulo, Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz. É importante, Senhor Presidente, informar que os trabalhos de campo, inventário a 100%, e estudo de mercado, contaram com a participação de membros da comunidade indígena, indicados pelo Conselho dos Homens dos XIKRINS.

O Plano de Manejo proposto será executado na área indígena XIKRIN do Rio Cateté, do subgrupo Kayapó, de filiação linguística Jê, com 519 indivíduos, habitantes da margem esquerda do rio Cateté, município de Parauapebas, Estado do Pará. Trata-se de uma reserva de 439.150 hectares, fisicamente demarcada desde 1981, homologada por decreto do Presidente da República nº 384 de 24 de dezembro de 1991, registrada no cartório da comarca de Paraupebas, Estado do Pará, com certidão nº 02/94, na Delegacia do Patrimônio da União, Pará.

Ao chamarmos a atenção, Sr. Presidente, Srs. Senadores, a o que já vem sendo feito no Pará, por meio do Convênio XIKRIN/Companhia Vale do Rio Doce - CRVD/FUNAI, alertamos para o que poderá servir de trabalho comparativo para as propostas que o PLANAFLORO pretende, e, certamente, fará em Rondônia.

A proposta que se desenvolve na área XIKRIN do Rio Cateté vem tendo um forte e decidido apoio da Presidência da FUNAI, que vê nesse tipo de proposta não somente a retirada das populações indígenas do isolamento, da letargia e da extrema dependência dos recursos sabidamente escassos de que a União dispõe. Com grande possibilidade de acerto, esse tipo novo de enfoque dado pela atual administração da FUNAI, poderá também induzir uma garantia maior, uma proteção mais efetiva da imensidão das áreas indígenas de Rondônia e da Amazônia.

Sr. Presidente e Srs. Senadores!

É importante chamar a atenção para o Pedido de Investigação do PLANAFLORO apresentado ao Painel de Inspeção do Banco Mundial pelo Fórum das Organizações Não Governamentais e Movimentos Sociais que atuam em Rondônia, em julho de 1995.

Diz o documento do Fórum das ONGs:

"1. No âmbito do PLANAFLORO, não foi elaborado um "plano de desenvolvimento"dos povos indígenas, conforme estipulado na OD 4.20 do Banco Mundial. Na elaboração do PLANAFLORO, houve muitas deficiências em termos de consultas diretas nas aldeias e às organizações indígenas, visando sua "participação informada".

2. O problema descrito acima tem-se manifestado na ausência de atividades específicas, no desenho original do PLANAFLORO, que deveriam constar num "plano de desenvolvimento de povos indígenas", tais como: alternativas econômicas, infra-estrutura produtiva, preservação cultural e linguística, nutrição, educação, etc..

3. Os recursos financeiros alocados para o subcomponente "Apoio às Comunidades Indígenas" foram claramente subdimensionados no orçamento do PLANAFLORO. Vale observar que o orçamento para o subcomponente indígena do PLANAFLORO totaliza US$ 3,9 milhões (1,7% do valor total do projeto), enquanto os recursos para o sub-componente de transporte rodoviário e fluvial somam US$ 56,9 milhões (24,9% do orçamento total do PLANAFLORO). Os recursos alocados para o sub-componente indígena são insuficientes para as atividades inicialmente previstas no PLANAFLORO (demarcação, aviventação, saúde indígena, etc.) e, evidentemente, não atendem outras demandas das populações locais (educação, projetos econômicos, etc.). Estima-se que os US$ 3,9 milhões do subcomponente indígena do PLANAFLORO serão esgotados ainda neste ano de 1995, implicando a paralização das atividades a partir de 1996".

Sr. Presidente, empresto minha solidariedade ao Fórum das Organizações Não-Governamentais, no que diz respeito a insuficiência dos recursos para o subcomponente indígena, mormente nas questões mais essenciais, quais sejam, a saúde, educação e criação de alternativas econômicas, que venham a liberar as comunidades indígenas da forte dependência do Governo Federal. A não ser assim, Senhor Presidente e Senhores Senadores, de que serve manter sob reservas indígenas 5.282.919 hectares, ou seja, 22% da área territorial do estado, se os silvícolas que ali vivem - 4.312 índios - não têm como ser protegidos, promovidos e assistidos?

Concluo, solicitando, ao Banco Mundial que faça, com urgência, uma revisão da alocação dos recursos para o subcomponente indígena do PLANAFLORO, e que o Governo do Estado de Rondônia a FUNAI e, a sociedade, sejam alertados para os compromissos com os irmãos da floresta.

Muito obrigado. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/04/1996 - Página 7185