Discurso no Senado Federal

APRESENTANDO A CASA PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO QUE SUSTA OS DECRETOS 1.498 E 1.499, DE 24 DE MAIO DE 1995, QUE REAVALIA AS ANISTIAS CONCEDIDAS PELA LEI 1.878, DE 11 DE MAIO DE 1994.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • APRESENTANDO A CASA PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO QUE SUSTA OS DECRETOS 1.498 E 1.499, DE 24 DE MAIO DE 1995, QUE REAVALIA AS ANISTIAS CONCEDIDAS PELA LEI 1.878, DE 11 DE MAIO DE 1994.
Publicação
Publicação no DSF de 07/05/1996 - Página 7592
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO, SUSPENSÃO, DECRETO FEDERAL, AUTORIA, FERNANDO COLLOR DE MELLO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DETERMINAÇÃO, PARALISAÇÃO, PROGRAMA, READMISSÃO, FUNCIONARIO PUBLICO.

A SRª EMILIA FERNANDES (PTB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nestes últimos tempos muito se tem debatido sobre o momento histórico vivido pelo País. Sem dúvida, o momento está a exigir de todos, tanto do lado do Governo, quanto dos Parlamentares, dos trabalhadores em geral, da sociedade como um todo - professores, estudantes -, uma reflexão e um debate mais profundos sobre determinados temas que há alguns anos nem todos debatiam, temas do ponto de vista social, político, econômico, sindical, trabalhista, previdenciário.

E tudo isso faz com que, no meu entendimento, o próprio Congresso Nacional assuma uma nova postura, de desafio, de renovação e, acima de tudo, é importante que tenha presente no dia a dia suas reais atribuições, atribuições essas que no nosso entendimento estão a exigir que não sejamos apenas homologadores de decisões ou de proposições. Esse contexto está a exigir, sim, que este espaço decisório de Poder representativo do povo seja um Poder questionador, fiscalizador, apresentador de sugestões para contribuir com o Governo, quer seja para aprimorar ou até mesmo para corrigir equívocos. Mas esse Poder, acima de tudo, deve ser aquele que ouve o povo, por intermédio das suas entidades representativas e de todos os segmentos da sociedade.

Portanto, com base nessas prerrogativas que entendo sejam de todos nós, estou dando entrada na Casa, protocolado com a data de hoje, a um Projeto de Decreto Legislativo que susta os Decretos nºs 1.498 e 1.499, de 24 de maio de 1995, que reavaliam as anistias concedidas pela Lei nº 8.878, de 11 de maio de 1994.

Há mais de um ano, desde maio de 95 - já que essa Lei não está vigorando - venho debatendo essa questão relacionada aos funcionários demitidos, sem justa causa, na grande maioria, no ano de 1993, no Governo de Fernando Collor.

Para surpresa nossa, em maio de 95, o Presidente da República, a pretexto de apurar eventuais irregularidades nos processos de anistia, determinados pela Lei 8.878, de 11 de maio de 1994, já citada, baixou os Decretos nºs 1.498 e 1.499, de 24 de maio de 1995, determinando a suspensão do programa de readmissão e a revisão de todos os processos já conhecidos, inclusive quanto ao mérito, exorbitando de seu poder regulamentar.

É importante notar que, ao julgar novamente o mérito, as comissões criadas pelos Decretos acima citados, em nosso entendimento, carecem de legalidade por criarem uma nova instância recursal não prevista em lei, posto que a Lei 8.878/94, em seu art. 5º e parágrafos, institui duas instâncias de julgamento: as Subcomissões Setoriais e a Comissão Especial de Anistia.

Então, como ato inferior à lei, o regulamento não pode contrariá-la ou ir além do que ela permite. No que o regulamento infringir ou extravasar da lei é írrito, nulo, conforme depoimentos de juristas que se posicionaram e se pronunciaram a respeito.

Portanto, os decretos, na avaliação que fizemos, ferem o princípio constitucional da reserva legal, segundo o qual "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", princípio inscrito no art. 5º, inciso II, de nossa Carta Magna.

O Excelentíssimo Senhor Presidente da República, ainda, ao editar os decretos em questão, no nosso entendimento, exorbitou do poder regulamentar, ferindo o princípio constitucional de fiel execução da lei, segundo o qual o regulamento de uma lei deve se restringir ao seu texto, não sendo permitido acrescentar nem subtrair direitos, sob pena de ilegalidade e inconstitucionalidade.

O decreto, na hierarquia das normas, é ato inferior à lei e, como tal, não pode contrariá-la, nem restringir seu alcance, como no presente caso. Daí a legalidade e a constitucionalidade deste decreto legislativo, que se destina a sustar o referido decreto, violador do direito à anistia dos trabalhadores e servidores públicos. Isso ocorre quando não se respeita a decisão da Comissão Setorial de Anistia que, a teor do do Art. 5º da Lei nº 8.878/94, apresenta caráter definitivo quando não houver recurso. Esse preceito impede a ação intentada pela administração, para a qual, à luz do Direito Positivo, só resta o recurso à Justiça, sob pena de se violar direito constituído.

Queremos que os Srs. Senadores também levem em consideração outro argumento.

Se há algum processo de anistia irregular, este deve ser anulado individualmente pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República e nunca de forma coletiva, como pretende o decreto presidencial. Isso, além de abuso de autoridade, é uma violência contra todos aqueles trabalhadores, que, de forma legal e legítima, tiveram seu processo minuciosamente examinado e deferido pelas Subcomissões Setoriais e pela Comissão Especial de Anistia.

É previsão constitucional que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada" (Art. 5º, XXXVI).

Se nem a lei pode contrariar esse trinômio, que tem por finalidade garantir a segurança do direito no tempo, como condição precípua à estabilidade das relações sociais, muito menos poderá um decreto, norma que lhe é inferior, a ela subordinada.

Inadmissível é afrontar-se o direito adquirido dos trabalhadores anistiados pelas Comissões instituídas pela Lei nº 8.878/94 e Decreto nº 1.153/94, posto que tal direito advém de ato jurídico perfeito "consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou" (art. 6º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil).

Neste diapasão, ensina Hely Lopes Meirelles que "exauridos os meios de impugnação administrativa, torna-se irretratável, administrativamente, a última decisão" (op. cit., pág. 635).

Assim, por medida de justiça, é fundamental que o Congresso, com fundamento no inciso V do art. 49 da Constituição, torne sem efeito o referido decreto, como única forma de respeitar o comando da lei e o direito desses trabalhadores a uma vida digna e decente, impossível de ser alcançada sem seu retorno imediato ao trabalho, do qual foram afastados arbitrária, ilegal e ilegitimamente.

Portanto, Srs. Senadores, confiante no espírito público de cada um de nossos pares nesta Casa, espero a aprovação deste Decreto Legislativo que nenhuma outra pretensão possui senão a de fazer justiça aos trabalhadores demitidos, perseguidos e considerados injustiçados e que estavam com seus processos em vias de readmissão.

Dessa forma, fazemos um apelo a cada Senador, a fim de que analise com profundidade a repercussão que esse prejuízo tem trazido a inúmeros trabalhadores brasileiros dos mais diferentes setores e busque, por intermédio desta Casa, reparar - não diria a injustiça, embora entenda que até poderia ser utilizada essa palavra -, esse equívoco do próprio Governo Federal.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/05/1996 - Página 7592