Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO REAJUSTE DO SALARIO MINIMO. POSTURA DUBIA DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, QUANDO DE SUA VISITA A ARGENTINA.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.:
  • CRITICAS AO REAJUSTE DO SALARIO MINIMO. POSTURA DUBIA DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, QUANDO DE SUA VISITA A ARGENTINA.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/1996 - Página 7562
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO, REAJUSTAMENTO, SALARIO MINIMO, SIMULTANEIDADE, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA, CONGRESSO NACIONAL, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, DISCUSSÃO, PROTESTO, FUNCIONARIO PUBLICO, REIVINDICAÇÃO, MELHORIA, NIVEL, SALARIO, PAIS.
  • CRITICA, ESCOLHA, RAUL JUNGMANN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF).
  • RECLAMAÇÃO, ATUAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, ABERTURA, PONTE, LIGAÇÃO, ESTADO DO PARANA (PR), PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA.
  • DEFESA, VOTAÇÃO, APROVAÇÃO, EMPRESTIMO, BANCO MUNDIAL, VIABILIDADE, DESENVOLVIMENTO URBANO, ESTADO DO PARANA (PR), SIMULTANEIDADE, DISCORDANCIA, POLITICA, GOVERNO, AUTORIZAÇÃO, CONCESSÃO, EMPRESTIMO EXTERNO, EMPRESTIMO INTERNO.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta sexta-feira, com quorum mínimo para que haja sessão, estamos aqui, no plenário do Senado Federal.

A Câmara e o Senado estão praticamente parados, e esta paralisia antecede, necessariamente, uma convocação extraordinária do Congresso pelo Presidente da República durante o próximo recesso para que as mensagens do Governo e as emendas constitucionais sejam votadas.

O que há por trás disso, Sr. Presidente? Nada mais do que uma manobra clara do Governo da República para evitar que se concretize o protesto do Congresso Nacional contra o absurdo aumento do salário mínimo no Brasil. De doze reais foi o aumento do salário mínimo. O aumento dos funcionários públicos inexiste.

Como, então, fazer com que o Congresso Nacional se cale e aceite, passivamente, esse absurdo?

Pelo velho método da convocação e da desconvocação. O salário dos Parlamentares ficará intocado, mas cada um de nós receberá uma gratificação de convocação e desconvocação de R$8 mil, totalizando R$16 mil, sem desconto do Imposto de Renda. Essa gratificação servirá para que os Parlamentares equilibrem as suas finanças e o protesto duro contra o arrocho salarial absurdo dos funcionários públicos e do povo brasileiro não seja expresso na indignação das tribunas.

Uma vez mais verificamos que a convocação, no recesso, é uma farsa, porque estamos sem pauta de votação, parados há uma semana e logo seremos convocados para dar "agilidade" à votação de matérias no Congresso Nacional, na Câmara e no Senado.

No entanto, Sr. Presidente, gostaria de me referir a alguns exotismos do Governo Federal.

No Paraná, 12 mil sem-terra mantêm a ocupação da fazenda Giacometti Marudim. Sem-terra e trabalhadores urbanos desempregados, agricultores sem terra e trabalhadores urbanos de origem agrícola, sem emprego e sem salário, se somam numa mistura explosiva na luta pela sobrevivência. Ocupam um pedaço de terra para lançar a ela uma semente, criar um porco, uma galinha e viabilizar, com o seu trabalho, o sustento de suas famílias. Trabalhadores urbanos, dizem os conservadores, se somam aos sem-terra e nada têm a ver com a tradição agrícola, nada têm a ver com o trabalho duro da agricultura. Trabalho duro sim, o mais duro trabalho que o homem já viveu na sua aventura no Planeta Terra.

É evidente que se um trabalhador urbano, com origens agrícolas, conseguisse se manter com a sua profissão urbana de pedreiro, de funileiro, de mecânico e de eletricista jamais voltaria a ocupar um pedaço de terra, empunhar o cabo de um guatambu e, com a enxada e a cortadeira, viabilizar a semeadura. Preferiria o trabalhador urbano, de origens agrícolas, sem a menor sombra de dúvida, viver ou sobreviver com dois salários mínimos que conseguisse numa cidade grande cidade ou numa cidade do interior.

O Senhor Presidente da República fala em reforma agrária, mas recordo-me que, há alguns meses, visitando o Paraná, apontou uma brincadeira do governo daquele Estado, chamada Vila Rural, como a solução da reforma agrária no Brasil, o que demonstra com clareza que não sabe o que é reforma agrária e que não tem intenção alguma de fazê-la.

Agora, Sr. Presidente, temos um Ministério da Reforma Agrária e, à frente dele, o Sr. Jungmann. Se não me engano, se não me falha a memória, esse Sr. Jungmann, há um mês ou um mês e meio, quando Presidente do Ibama, era autor de uma iniciativa judicial para evitar que um macaco de circo participasse de uma propaganda de refrigerante. Muito mais ligado ao interesse dos macacos do que ao interesse do agricultor sem terra; muito mais ligado a uma visão distorcida do que é a manutenção do equilíbrio ecológico do que ao fato concreto da necessidade de trabalho de diversificação da produção agrícola.

O Sr. Jungmann, ao que me consta, procurou um dos meus antigos assessores no Paraná, meu ex-Procurador-Geral do Estado, e solicitou-lhe subsídios para dar consistência ao seu protesto judicial: evitar que um macaco de circo, desses que se exibem pela manhã, à tarde e à noite no picadeiro, de origem africana - não é um animal natural de terras brasileiras-, fosse utilizado em uma propaganda de refrigerante. O meu Procurador, com ironia, sugeriu-lhe que procurasse um advogado da Coca-Cola, concorrente da fábrica de refrigerantes Pepsi-Cola, porque ela estaria muito mais interessada em tirar a propaganda do ar. Certamente os macacos terão a proteção do INCRA - tenho minhas dúvidas quanto aos agricultores sem terra e muitas dúvidas quanto ao futuro da reforma agrária.

Vilas rurais, ridículas vilas rurais de 5.000m² são consagradas pela palavra do Senhor Presidente da República como a solução da reforma agrária no Brasil e, logo mais adiante, Sua Excelência nomeia o protetor dos macacos Ministro da Reforma Agrária! Vejo alguma coisa de ridículo e inconsistente nesse processo todo.

O Presidente vai à Argentina. Lá, habilmente, desvia a atenção da opinião pública e da imprensa, no que diz respeito ao escândalo dos bancos, e lança a tese da reeleição. Volta ao Brasil e diz que essa tese o irrita. É um homem de temperamento variável e de opiniões rapidamente mutáveis.

Na Argentina, o Senhor Presidente da República anuncia, com garbo e circunstância, junto com o Presidente Menem, a abertura da ponte entre o Paraná e o Estado de Missiones, entre o Brasil e a Argentina. Uma ponte tratada por Sua Excelência e pelo Presidente Menem há três anos; uma ponte importante para o Paraná, para o Porto de Paranaguá. Tão importante que, depois de ter sido acordada entre o Brasil e a Argentina, para evitar mais delongas, como Governador do Paraná, eu a construí, sem recursos da Argentina ou do Brasil, com a autorização legislativa e com os recursos do Estado do Paraná.

Essa ponte está construída há dois anos. O Paraná a construiu sobre o rio Santo Antônio, entre as cidades brasileira e argentina de Capanema e Andresito. E mais: construiu a aduana e a gendarmaria.

Há dois anos o Governo Federal a ignora. A ponte está fechada porque não se criou ainda uma unidade aduaneira. Mas o Senhor Presidente, naqueles entusiasmos a que é dado no exterior, garantiu à imprensa argentina que a ponte teria sido aberta no dia 20 do mês passado. Os argentinos ainda acreditam no Presidente da República. Os seus homens ocuparam a gendarmaria e a aduana, o que é comum, esperando que o Brasil fizesse o mesmo. Mas o Senhor Presidente da República, até agora, não assinou o decreto criando a aduana e não designou os funcionários da Receita Federal que ali deveriam operar. E a ponte, hoje, é objeto de protestos, de passeatas e a causa da indignação de brasileiros e argentinos da fronteira. Mas Sua Excelência ainda não arranjou tempo para cumprir a promessa que fez no território argentino. A abertura da ponte ainda é uma incógnita.

Sr. Presidente, a austeridade é o tema do Governo. Há massacre dos trabalhadores e um aumento ridículo do salário mínimo. Mas, quando se trata de acordos políticos, a coisa muda de forma extraordinária.

Estamos votando - e votarei a favor porque sou paranaense - um empréstimo do Banco Mundial para o Estado do Paraná, num programa que foi de minha iniciativa, quando Governador.

Tínhamos o Programa Estadual de Desenvolvimento Urbano para viabilizar cidades médias e potencialmente médias. O programa se encerrou e criei um outro, denominado Paraná Urbano, que é a continuação desse projeto. Recebemos aqui o nihil obstat das autoridades federais para conceder o financiamento.

Vou examinar a situação financeira do meu Estado. Deixei-o com extraordinário equilíbrio econômico e financeiro. Bom equilíbrio econômico ele ainda tem; mas a folha de pagamento que deixei, entre 58% e 60% da receita líquida corrente, saltou, na média dos três primeiros meses deste ano, para 76,5%.

Se levarmos em consideração que essa média é alterada por uma receita atípica nos outros meses, que é a receita de janeiro, que recebe o impacto das vendas de Natal, o Paraná deve estar com o peso de sua folha de pagamento ao redor de 80%.

Portanto, uma administração completamente inviável. Mas a recomendação do Governo Federal é de que os empréstimos sejam concedidos. Como, se as nossas prefeituras estão rigorosamente sem recursos?

Na condição de Senador pelo Paraná, votarei a favor do empréstimo, mas não posso deixar de registrar o paradoxo da autorização das autoridades monetárias e fazendárias para a concessão do mesmo. Mais do que isso: este mês, o Paraná, muito mais generoso que o Presidente da República, concedeu substanciais e merecidos aumentos a alguns setores do funcionalismo público. A nossa folha salta de 80% para qualquer coisa ao redor de 85%. Somando-se a isso o custeio e algumas pequenas despesas de um dos menores endividamentos do País, teremos qualquer coisa acima de 100%. Mas o Governo Federal autoriza e manda ao Senado o pedido da concessão do financiamento. Vamos concedê-lo. Eu, como paranaense, não teria condições de negá-lo às Prefeituras do meu Estado, que repassam esses recursos em investimentos na melhoria das condições de vida da população.

Fica, no entanto, o registro do exotismo do Governo Federal, dos paradoxos das suas medidas; para mim, fica a dúvida que pode ser traduzida por aquela velha pergunta do quadro humorístico da televisão: "não será o macaco a estar certo?"


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/1996 - Página 7562