Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 170 ANOS DE INSTALAÇÃO DO SENADO FEDERAL.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 170 ANOS DE INSTALAÇÃO DO SENADO FEDERAL.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/1996 - Página 7613
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, SENADO.
  • COMENTARIO, HISTORIA, CRIAÇÃO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, SENADO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, PROTEÇÃO, ESTADOS, FEDERAÇÃO.
  • ELOGIO, TRABALHO, JOSE SARNEY, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, MODERNIZAÇÃO, SENADO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz hoje ao plenário do Senado são as notícias veiculadas pela imprensa de diferentes jornais nacionais, nos últimos dias, a propósito da propalada operação de compra da Acesita, de participação do Banco Bozano Simonsen e outras instituições bancárias na Companhia Siderúrgica de Tubarão, na Usiminas, empresas que foram privatizadas há pouco tempo, mediante aquisição da participação acionária do Governo Federal com títulos conhecidos como moedas podres. Agora anuncia-se que os fundos de pensão ou alguns deles, à frente o Fundo de Pensão do Banco do Brasil, o Previ-BB, deverá adquirir a participação acionária desses bancos que compraram parte dessas empresas, que eram controladas pelo Governo Federal, com as chamadas moedas podres. Pois bem, o Previ-BB e outros fundos de pensão vão adquirir a participação desses bancos pagando com moeda boa, sadia, de boa qualidade.

É de estranhar-se essa operação, justamente pelo fato de que ela tem alguns aspectos que suscitam dúvidas e muitos debates. Em primeiro lugar, está o fato de que uma empresa que recentemente adquiriu essa siderúrgica de propriedade do Governo Federal com moeda podre vai vender sua participação, pouco tempo depois, em moeda boa, de qualidade, justamente através desses fundos de pensão. Há, portanto, um lucro que se estima, da ordem de 500 milhões, dessas instituições bancárias. Alguém poderia dizer que se trata de uma operação comum, normal, feita entre instituições que não pertencem ao Governo e, portanto, regidas pelas leis de mercado. A esses eu faria a ponderação de que os fundos de pensão, Previ-BB, que é o maior deles, e outros são instituições, no mínimo, paragovernamentais. Por que digo isso? Porque seu patrimônio é constituído de recursos do patrocinador, no caso do Previ-BB, o Banco do Brasil, e recursos dos empregados do Banco do Brasil, que são filiados a esse fundo, na proporção de dois para um. O presidente da Previ-BB é nomeado pelo Presidente do Banco do Brasil, que por sua vez é nomeado pelo Presidente da República, que representa a União, que é a acionista majoritária do Banco do Brasil; o diretor técnico desses fundos é nomeado pelo presidente ou pela diretoria dessas empresas controladas pela União, tipo Banco Central: Avalia, Real Grandeza, Sistel, outros fundos, e assim por diante.

Ora, e mais, quando esses fundos têm problemas, como já aconteceu, quando eles têm um grande déficit é o Governo que cobre esse déficit e coloca recursos para sanear esses fundos. Então, o Governo tem o direito, senão de tutelar ou interferir diretamente, de influir nessas operações realizadas por esses fundos, principalmente quando elas são feitas com empresas recentemente privatizadas. De alguma maneira poderíamos, exagerando no nosso argumento, até dizer que é uma espécie de reestatização, porque se esses fundos de pensão não são instituições do Governo, são instituições onde o Governo, por meio das empresas patrocinadoras dos fundos, tem grande influência e participação. Por isso mesmo os jornais noticiam que o Governo, que o Presidente Fernando Henrique Cardoso não está de acordo com essas operações. Chegou-se, inclusive, a noticiar que um dos dirigentes desses fundos teria dito que a siderurgia é assunto nacional estratégico, como se coubesse a esses dirigentes de Fundo anunciar que determinado setor da economia nacional é estratégico.

Está havendo um oligopólio, a formação de um cartel, em que poucos grupos estão controlando a Siderurgia Nacional. Tanto isso é verdade - não é a primeira vez que trato deste assunto aqui -, que, no CADE, há 14 processos de acusação de oligopólio ou de monopólio em decorrência de processos de privatização. Quase todos esses processos estão relacionados à siderurgia; alguns estão relacionados à indústria petroquímica. Percebemos que há um risco enorme na maneira como está sendo conduzido esse processo de privatização no Brasil.

Quero solidarizar-me com essa disposição de o Governo impedir que essas operações se concretizem, porque elas contrariam e, de certa maneira, até enfraquecem essa política de privatização do Governo, uma vez que há apenas uma forma de vender com moedas podres e, logo em seguida, de comprar via Fundo de Pensão, pagando moeda sadia que tem liquidez. Portanto, esse é um grande negócio para os que compram e vendem dessa forma.

Se essa operação se desse exclusivamente entre empresas privadas e se não houvesse a interferência de fundos, que, de uma maneira ou de outra têm uma relação muito próxima com o Governo, isso seria perfeitamente normal e aceitável. Mas o Governo está conduzindo o processo de privatização, sendo muitas vezes questionado. Muitas vezes suscitam-se dúvidas que nos deixam perplexos. Perguntamo-nos se essa é a melhor forma de modernizar a nossa economia. Às vezes, muitos de nós, votamos essas matérias sem uma convicção muito segura de que esse é o melhor caminho, e, ao nos depararmos com um processo como esse, ficamos pelo menos com o direito de aumentarmos nossa dúvida em relação a essa política de privatização, ao processo de privatização tal como ele está sendo conduzido.

Vou ler uma nota que foi publicada no jornal O Estado de S. Paulo, para não tomar muito tempo dos Senhores e concluir meu pronunciamento, porque ela é muito simples e sugestiva, do jornalista Hélio Gaspari. Ele tem uma coluna que se chama "Eremildo, o idiota", em que ele deu o seguinte título:

      "Liberalismo com farofa deu em reestatização".

      Eremildo é um idiota. Está procurando a baronesa Thatcher para informá-la de que começou no Brasil um criativo processo de reestatização. O idiota acredita que se a ex-primeira-ministra inglesa o ouvir fará nova revolução intelectual na Inglaterra.

      Ele percebeu que a Caraíba Metais, desestatizada no governo Sarney, é hoje parte de um conglomerado onde se juntaram outras três mineradoras: Paranapanema, Eluma e Paraibuna - outra operação patrocinada por fundo de pensão, realizada em dezembro do ano passado. As quatro são controladas por fundos de pensão de estatais. Assim, onde havia uma empresa com a chave do cofre do Estado, há agora quatro.

      Na semana passada, Eremildo soube que o Banco Bozano vendeu sua participação na Usiminas para a Acesita, controlada por outro consórcio de fundos de pensão de estatais. O banco ficou sem os seus papéis podres, e os fundos ficarão com uma empresa saneada.

      Eremildo acha que a baronesa precisa saber que um dos maiores agentes de capitalização do mercado brasileiro é o fundo de pensão Previ, que agrupa os funcionários de uma casa quebrada, o Banco do Brasil. A Srª Thatcher acha que fez muito privatizando 60% das estatais do setor industrial inglês e transformando 25% da população em acionistas das novas companhias. Fez tudo isso, mas não teve a idéia do caminho de volta.

      O idiota crê que a baronesa teria uma boa plataforma para retonar à política, se conhecesse a reestatização brasileira. As estatais saem do Estado, algumas são levadas pelos novos donos ao BNDES, tomam um banho, e voltam para baixo da anágua da viúva por meio dos fundos de pensão de estatais, entidades paracapitalistas inquebráveis, porque, ao fim, mandam a conta para Brasília."

Era este, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que eu queria trazer para o conhecimento, o debate e a discussão do Senado.

Queria também dizer que faz muito bem o Governo, o Presidente Fernando Henrique, se determinar o cancelamento dessas operações, porque elas desacreditam, elas trazem a desconfiança sobre a natureza e a lógica do processo de privatização no Brasil.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/1996 - Página 7613