Discurso no Senado Federal

DEBATE SOBRE OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DA SEMANA. POSIÇÃO CONTRARIA DE S.EXA. A ATITUDE DOS FUNCIONARIOS PUBLICOS DE OCUPAR O PREDIO DO MINISTERIO DA FAZENDA, ONTEM, EM BRASILIA, E A INVASÃO DE ALGUMAS CENTRAIS DE ELETRICIDADE NOS ESTADOS.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. REFORMA AGRARIA. PRIVATIZAÇÃO.:
  • DEBATE SOBRE OS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DA SEMANA. POSIÇÃO CONTRARIA DE S.EXA. A ATITUDE DOS FUNCIONARIOS PUBLICOS DE OCUPAR O PREDIO DO MINISTERIO DA FAZENDA, ONTEM, EM BRASILIA, E A INVASÃO DE ALGUMAS CENTRAIS DE ELETRICIDADE NOS ESTADOS.
Aparteantes
Ademir Andrade, Eduardo Suplicy, Roberto Freire, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/1996 - Página 7908
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. REFORMA AGRARIA. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CONVITE, CONGRESSISTA, ANALISE, FATO, SEMANA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, CENTRAL UNICA DOS TRABALHADORES (CUT), GREVISTA, OCUPAÇÃO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), USINA HIDROELETRICA, APREENSÃO, EFEITO, RISCOS, DEMOCRACIA, APOIO, ORADOR, REIVINDICAÇÃO, REAJUSTAMENTO, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO.
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), INFERIORIDADE, REAJUSTAMENTO, SALARIO MINIMO.
  • ELOGIO, CAMARA DOS DEPUTADOS, FRANQUIA, PALAVRA, TRABALHADOR, SEM-TERRA, PLENARIO.
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, RITO SUMARIO, OPOSIÇÃO, BANCADA, DEFESA, PROPRIEDADE RURAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, GRAVIDADE, DECLARAÇÃO, FAZENDEIRO, PAGAMENTO, POLICIA MILITAR, ESTADO DO PARA (PA), MORTE, SEM-TERRA.
  • NECESSIDADE, RECONHECIMENTO, ESFORÇO, DEMOCRACIA, GOVERNO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, INTERFERENCIA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PROCESSO LEGISLATIVO.
  • COMENTARIO, SUSPENSÃO, LEILÃO, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MOTIVO, ALEGAÇÕES, ADQUIRENTE, POSSIBILIDADE, INADIMPLENCIA, EMPRESTIMO, EFEITO, DESVALORIZAÇÃO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, OBJETIVO, REBAIXAMENTO, PREÇO.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO, ATENDIMENTO, CLASSE POLITICA, PARALISAÇÃO, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, BANCO ESTADUAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que bom se voltássemos a ter, como na legislatura passada, as manhãs de sexta-feira para meditação.

Seria interessante que nós Parlamentares - sou um dos que gostariam de estar aqui neste dia - tivéssemos a sexta-feira como o dia da meditação.

Houve época em que nós discutíamos, analisávamos aqui o que se passava durante a semana, numa linguagem quase informal. Na verdade, isso era muito positivo, e penso que pode ser feito hoje. É essa a proposta que faço aos ilustres Parlamentares.

Eu, por exemplo, confesso a V. Exªs, com toda a sinceridade, que não sei sobre o que vou falar agora, porque há muitas questões à minha frente e, como considero todas importantes, não sei sobre qual falar.

Esta manchete, "Malan vira refém dos grevistas", e toda a matéria a que ontem assistimos pela televisão, somadas a esta outra, "CUT invade cinco centrais elétricas", são muito ruins. Eu me dirijo à CUT e aos trabalhadores públicos federais: a greve é um direito, sei que a reivindicação por melhores salários é um direito, mas isso não é a solução.

Eu me lembro do grande e doloroso erro do Governo Sarney - ele não teve culpa, mas aconteceu -, quando os trabalhadores invadiram a Usina Siderúrgica de Volta Redonda, no Rio de Janeiro, e lá morreram três. Invadir prédios públicos, invadir centrais elétricas, invadir o Ministério da Fazenda, deixar como refém o Ministro da Fazenda, isso para nós não soma. Não é bom para a CUT, não é bom para os funcionários, não é bom para a Oposição, não é bom para o Governo, mas, fundamentalmente, não é bom para a democracia.

Volto a repetir: é normal que os trabalhadores debatam o fato de terem ficado um ano sem aumento de salário, principalmente quando se analisa e se vê que as questões não são como o Governo diz. Qual a participação da folha de pagamento no Orçamento e quanto o Governo gasta com o pagamento de juros? Isso merece ser analisado.

Quando o Governo abre o Proer para o Econômico, para o Nacional, para a Caixa Econômica Federal - agora estão pedindo que socorra o Banespa -, quando se detecta que o rombo no Orçamento provém do pagamento de juros da dívida, dizer que não há dinheiro para o funcionalismo constitui, de fato, uma interrogação. Também no meio do funcionalismo há uma interrogação no momento em que a Câmara dos Deputados, bem ou mal - não sei -, dá um aumento de 40% aos seus funcionários enquanto o restante não ganha nada.

Há razão para o debate, mas não para a ação. Perdoem-me, mas o ato a que assisti pela televisão ontem - os funcionários tomando conta do prédio do Ministério da Fazenda e fazendo o Ministro de refém - não é bom. As fotografias que vi hoje não são boas. Com toda sinceridade, esse é um caminho que a nós não interessa. Ouvi no noticiário de uma rádio, hoje de manhã, alguém dizer que é por isso que o Presidente fala em Fujimori e em outras coisas mais.

Isso que está acontecendo não nos interessa. É democracia? É democracia. É liberdade? É liberdade. Venham para a frente do Congresso, para a frente do Palácio. Vamos fazer justiça à Câmara: ontem, os sem-terra foram à Câmara dos Deputados e aquela Casa lhes franqueou a tribuna para debater, discutir, protestar, gritar. Ontem foi um dia histórico, porque, pela primeira vez, aqueles que comumente não têm vez, não têm hora, tiveram vez para ir à tribuna e falar na Câmara dos Deputados.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Pois não, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Pedro Simon, primeiro, quero cumprimentá-lo pelo convite que V. Exª fez aos Senadores para refletirem sobre os fatos mais importantes desta semana. V. Exª ressaltou o episódio ocorrido ontem, quando os servidores federais ocuparam, desde meio-dia e meia até a noite, o Ministério da Fazenda. Estávamos aqui votando o projeto do Deputado Hélio Bicudo quando recebemos a notícia da ocupação do edifício do Ministério da Fazenda por mais de 600 funcionários. Isso nos preocupou. Aqui havia apelos para que Senadores fossem lá. Eu para lá me dirigi logo após a votação, por volta das 19h30min. Os Deputados Ivan Valente, Maria Laura, Arlindo Chinaglia haviam conversado, às 15 horas, com o Ministro Pedro Malan, que disse que receberia os membros da Coordenação do movimento dos servidores, desde que desocupassem o prédio, na data de hoje. O chefe de gabinete deu essa informação aos coordenadores, mas eles não aceitaram isso. Queriam que o próprio Ministro Pedro Malan dialogasse com eles. Foi então que conversei com os seis membros da Coordenação dos servidores. Explicaram-me que estão solicitando a oportunidade de diálogo com as autoridades há muitos meses. Conversaram com o Ministro Bresser Pereira, que, há um mês e pouco, lhes disse que não havia como resolver a questão do reajuste salarial, que, pela primeira vez, com desrespeito ao que eles haviam acordado no ano passado, passa da data-base, que não foi observada. Passou-se um ano, houve inflação bem menor do que a anterior, e o Governo resolveu que para eles não haveria reajuste. Isso causou enorme frustração entre servidores, alguns dos quais viajaram 10, 20, 30 horas para participar do movimento. V. Exª pondera que a ocupação do Ministério da Fazenda não foi adequada. Por volta das 21 horas, conversei com o Ministro Pedro Malan e lhe propus que fizesse um gesto símbolo, recebendo os seis membros da Coordenação simplesmente para comunicar-lhes que os receberia hoje, desde que desocupassem o prédio. O Ministro Pedro Malan, depois de refletir, aceitou realizar esse gesto. Lembramos a S. Exª gestos que acontecem na história da humanidade, como V. Exª aqui por vezes lembra. Nem sempre Arafat e Rabin puderam paralisar a guerra, mas fizeram alguns gestos símbolos que foram de grande relevância. O Ministro Pedro Malan fez esse gesto. Concordou comigo e, por volta das 21h30min, os seis membros da Coordenação foram ao gabinete do Ministro Pedro Malan, que usou menos de dois minutos para dizer-lhes que nunca deixou de receber qualquer pessoa, fosse ela líder sindical, parlamentar ou representante de algum movimento, que lhe pedisse adequadamente uma audiência. Ele iria recebê-los hoje à tarde, logo que houvesse a notícia da desocupação do Ministério. Procedeu-se à desocupação após uma votação que foi feita em etapas em cada um dos andares ocupados. Em alguns lugares, a diferença foi de um voto entre resistir e manter a ocupação. Mas, num corredor ao fundo, a maioria resolveu, e foi de bom-senso a decisão. Demorou uma hora e meia para que todos descessem. Quando todos desceram, por volta das 23 horas, o Ministro Pedro Malan, pessoalmente, confirmou a mim próprio que receberia a Coordenação dos servidores hoje, às 15 horas. Quero transmitir a V. Exª essa informação e ressaltar que considero uma atitude de bom-senso a do Ministro Pedro Malan. Acabou-se por evitar qualquer episódio do tipo ocorrido na CSN algum tempo atrás. Quando há um esforço de diálogo, acaba-se resolvendo a situação. Espero que as partes cheguem ao entendimento. V. Exª expõe fatos importantes. Na hora de salvarem-se instituições financeiras, as coisas andam muito rápidas. Na hora de dizer aos funcionários que não vai haver ajustes por mais doze meses, quando para todos os demais segmentos há ajustes, quando o capital é remunerado de acordo com a TR - 24% ao ano -, há que se ter respeito pelos servidores. Se eles se indignam além da conta, então cabe a todos nós o esforço para a ponderação e o bom-senso.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço, mais do que o aparte, a oportuna análise feita por V. Exª, que participou dos acontecimentos. Também daqui levo meu respeito ao Ministro Malan. Creio que S. Exª agiu corretamente.

Eu não viria a esta tribuna apenas para fazer uma análise dessas manchetes, não fosse a minha preocupação com o futuro. Com relação ao que aconteceu ontem, temos que dar a nossa colaboração para que isso não seja o início de um processo, mas que seja algo que se analise e se encerre.

Volto a dizer: podemos ter a divergência que quisermos com este Governo, com o Senhor Fernando Henrique, com o seu Ministério, mas não há dúvidas de que eles não apenas são democratas mas também estão abertos ao debate e à discussão com quem quer que seja. Pelo amor de Deus!

Ainda agora, a manchete da imprensa é uma crítica ao Senhor Fernando Henrique porque recebeu os sem-terra dentro de seu gabinete. Foi a primeira vez que aconteceu isto: Sua Excelência os recebeu, debateu e discutiu o assunto.

O Betinho pode dizer - e acho que ele está certo - que o Projeto Comunidade Solidária não caminha como deveria. Tudo bem, mas não vamos caminhar por esse terreno. Isso estabelece a diferença entre uma democracia organizada e um regime que se dirige para a anarquia. Isso favorece aqueles que são inimigos da democracia. Isso permite que aqueles que estão de olho arregalado para bater no Congresso, na classe política, no Governo e na democracia venham à tona.

Falo menos como Senador e mais como velho. O diabo diz que tem experiência mais por ser velho do que por ser diabo. Pois a minha velhice me demonstra isso. Conheço essas manchetes de longa data. Olho para elas e lembro-me de 54, de 61, de 64 e de 68 e vejo o AI-5.

Para V. Exª, podem essas manchetes não significar nada. A mim, assustam! Não gosto delas, porque, se continuarem, preconizam um rumo ruim. Podemos divergir, mas não devemos seguir esse rumo, nenhum de nós deve. Não deve o Vicentinho, da CUT, que é um belo companheiro, de grande capacidade, de grande competência, não devemos nós e não devem principalmente os funcionários público seguir esse rumo. Se eles estão mal - concordo que sim -, pior estão os que ganham o salário mínimo, que ganham R$112,00. Esse é o desgraçado, que não pode fazer greve, não grita, não protesta, porque não tem como chegar a Brasília com os R$112,00. Esse não faz greve, não protesta, não grita, porque o seu inimigo é o desemprego. Há 30 milhões de desempregados e os que estão trabalhando, se abrirem a boca, serão demitidos, serão colocados na rua!

Tenho respeito pelos funcionários públicos, mas eles, bem ou mal, não pertencem à "Índia brasileira", mas à "Bélgica". Podem estar lá na categoria mais baixa da "Bélgica", mas são da "Bélgica", enquanto a "Índia", dos que morrem de fome, dos que vivem na miséria, dos 30 milhões que passam fome, não tem nada, nem quem olhe por ela.

O Sr. Roberto Freire - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com o maior prazer.

O Sr. Roberto Freire - Já que V. Exª nos chamou para uma meditação sobre as manchetes, gostaria de lembrar - não sei se é apropriado - a decisão do Supremo sobre o mandado de segurança que alguns partidos de Oposição impetraram contra a Mesa da Câmara dos Deputados.

O SR. PEDRO SIMON - Alguns até festejaram!

O Sr. Roberto Freire - Exatamente. E essa é a minha preocupação. Alguns estão comentando que não houve nenhuma interferência indevida do Supremo no Poder Legislativo. Quero dar minha modesta opinião e dizer que houve interferência e profundamente preocupante. A Constituição estabelece, em seu art. 102, Inciso I, letra "d", que o Supremo é competente para julgar o mandado de segurança e o habeas data contra atos das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Mas que mandado de segurança? Quando a Mesa do Senado ou da Câmara é autoridade coatora. Por exemplo, se a Mesa do Senado, não no exercício do poder, mas como autoridade coatora, adotar qualquer medida pela qual qualquer funcionário ou cidadão se julgue ofendido, é evidente que cabe ao Supremo julgar o ato. Trata-se de controle jurisdicional. Mas julgar a ação do Poder Legislativo na aplicação do Regimento, na votação de matérias, evidentemente é interferir naquilo que vamos votar, exercendo o nosso poder. Deixamos de ser Poder.

O SR. PEDRO SIMON - O mais importante é que, a rigor, não foi uma decisão da Mesa da Câmara, foi uma decisão do Plenário. O Plenário votou.

O Sr. Roberto Freire - O problema é que se está aqui querendo, num certo silogismo, aplicar uma regra, que evidentemente é garantidora da democracia, para interferir na harmonia entre os Poderes na clara definição do Estado de Direito democrático. Se não houver uma reação do Congresso, nós perdemos a nossa soberania de aqui votar o que bem entendermos. Qualquer parlamentar - num grave equívoco da Oposição - que tenha chamado inúmeras vezes o Supremo para resolver problemas interna corporis estará entrando numa disputa de uma oposição sem limites. Imagino que o Governo não gostaria que Ministros estivessem interferindo no trabalho do Legislativo. O Supremo Tribunal Federal deve ser chamado, após a decisão do Congresso, com a promulgação e a sanção de uma lei, para o controle da jurisdicionalidade, da inconstitucionalidade e da legalidade. É evidente. É essa a harmonia entre os Poderes. Enquanto não for decidido, nos trâmites, nos procedimentos internos deste Congresso, o Supremo não tem nada a dizer. E toda vez que diz atenta contra a harmonia, contra a independência dos Poderes e a democracia, e ninguém pode ficar animado com isso. Era só para uma meditação também em relação a algumas manchetes.

O SR. PEDRO SIMON - Nobre Senador, creio ser muito importante a afirmativa de V. Exª. Também fiquei apreensivo com a decisão praticamente unânime do Supremo Tribunal Federal de interferir nos procedimentos do Congresso Nacional.

Há uma interrogação. Como diz V. Exª, pela Constituição, daqui para diante, o que nós decidirmos o Presidente da República pode ou não vetar e, vindo para cá, nós podemos ou não rejeitar. Mas agora há um fato novo: o que nós votamos, o Supremo pode dizer se está certo ou errado.

Então, na verdade, temos autonomia, mas não somos decisão definitiva. Tudo o que votarmos vai para o Presidente da República, e Sua Excelência pode vetar; se isso ocorrer, podemos derrubar o veto. Mas, de acordo com a decisão do Supremo, tudo o que votarmos pode ir para o Supremo, e o mais grave é que o Supremo pode anular e não vir mais para o Congresso. O veto do Presidente vem para cá, e o Congresso pode rejeitá-lo. Mas qualquer que seja a decisão do Supremo não poderá ser rejeitada pelo Congresso.

Essa é uma análise muito delicada que deve ser feita.

Antes de conceder um aparte a V. Exª, Senador Roberto Requião, gostaria que um fotógrafo da Casa tirasse uma foto minha, focalizando a Presidência do Senado. Posso ficar num canto, desde que se focalize a Presidência. Para nossa honra, trata-se da extraordinária Senadora Emilia Fernandes, que, pela sua competência e dignidade, vem honrando a Representação do Rio Grande do Sul.

Tenho muito carinho e respeito por V. Exª e é com muita alegria que estou sob o seu comando. Aliás, todos os Srs. Senadores, neste momento, estão sob a Presidência de uma extraordinária mulher da fronteira do Rio Grande do Sul.

Mas queria dizer a V. Exª que tenho direito a 20 minutos para o meu pronunciamento, o que deve ser cumprido. Repare que o Senador Eduardo Suplicy iria fazer um discurso e o fez num aparte, comunicando o que aconteceu ontem, e já foi embora; o Senador Roberto Freire, no aparte, trouxe um assunto novo, que não tinha nada a ver com o meu, mas muito importante, e já está indo embora. Então, gostaria que V. Exª entendesse que foram discursos incorporados ao meu. E, de certa forma, podem ser retirados da lista o Senador Suplicy, que já foi embora, o Senador Roberto Freire, que também já está indo, e não sei se o meu querido amigo Senador Roberto Requião ficará depois de proferir o seu aparte.

O Sr. Roberto Requião - V. Exª tem o meu compromisso de permanecer no plenário até o fim da sua intervenção.

O SR. PEDRO SIMON - Mas não falei nesse sentido, e sim para explicar à Mesa que tenho direito a 20 minutos, porque houve vários discursos que se estão somando ao meu.

O Sr. Roberto Requião - Evidentemente. Senador Pedro Simon, em primeiro lugar, eu me somo ao entendimento de V. Exª sobre o exagero do movimento dos funcionários ao invadir repartições públicas. Pedro Malan tornou-se, indevidamente, refém do movimento de funcionários públicos. Talvez até na circunstância isso tenha sido bom para o Brasil, pois há sempre a possibilidade de uma ou outra medida provisória não ter sido editada, de algum Proer não ter sido doado a um banqueiro. Mas esse é o lado irônico da minha argumentação. O fundamental é que não tem nenhum sentido a invasão de órgãos públicos por funcionários públicos. Amanhã, poderemos ter uma sessão do Senado interrompida pela reivindicação salarial de funcionários, com prejuízos seriíssimos para o País e para a democracia. Os Ministros e o Presidente da República, seguramente, não podem e não devem tornar-se reféns do funcionalismo. Mas, por outro lado, Senador Pedro Simon, nós, brasileiros, somos hoje reféns do tucanato transgênico, desses tucanos do bico dourado, extraordinariamente interessados em proteger os grandes banqueiros e o capital internacional. Somos reféns dessa tese de modernidade globalizante, que está ferindo fundo o indefeso povo brasileiro. Sessenta mil assentamentos nos promete mais uma vez o Governo Federal durante este ano, Senador Pedro Simon. Sessenta mil! E essa promessa é feita pelo amigo dos macacos, o novo Presidente do INCRA, que, quando no Ibama, entrou com uma ação contra a Pepsi-Cola para impedir que um macaco de circo, daqueles que trabalham no picadeiro pela manhã, pela tarde e pela noite, fosse estrela de um comercial. Inusitada medida! Macaco africano, criado no circo, sobrevivente da sua espécie exatamente por estar dentro do espetáculo circense. Esse rapaz pediu apoio para o meu ex-Procurador do Estado, que lhe sugeriu, de bate pronto, que procurasse a Coca-Cola, que era a interessada em tirar o comercial da Pepsi-Cola do ar. Talvez não tenhamos um grande Ministro da Reforma Agrária, mas, sem sombra de dúvida, os macacos africanos têm, no INCRA, no Ministério da Reforma Agrária, um defensor, que nos promete 60 mil assentamentos este ano. Senador Pedro Simon, dados do Ipard, o Instituto de Pesquisa do Paraná, mostram que, só no meu Estado, de 94 para cá, perdemos 55 mil unidades de produção agrícola, pequenas propriedades; meeiros e arrendatários abandonaram o campo e 10 mil propriedades estão à venda. Os 60 mil assentamentos do Presidente Fernando Henrique não resolvem o problema de reposição do êxodo rural, provocado pelo plano econômico do Governo, num pequeno Estado como o Paraná. E os tucanos do bico dourado, esses tucanos transgênicos piam no Planalto de forma diferente dos tucanos do plenário do Senado Federal. Ontem, neste plenário, tivemos derrotado o projeto que tentava segurar e dominar os ímpetos assassinos da Polícia Militar, pelo tucanato e pelas bases de apoio do Governo somadas. Enquanto isso, desempregados urbanos se somam a trabalhadores sem-terra, e a situação no campo é explosiva. Dizem-nos alguns dos mais conservadores: "A maioria não é de trabalhadores sem terra, são funileiros, marceneiros, mecânicos; são pessoas que têm ofício urbano". Mentira conservadora, Senador Pedro Simon! Todos os trabalhadores do Brasil têm origem rural, saíram do campo à busca de uma profissão mais confortável e mais bem remunerada. E quando um mecânico decide, como única possibilidade de sobrevivência, voltar às origens rurais de sua família, ocupar um pedaço de terra, jogar uma semente ao chão, criar um porco e uma galinha para sobreviver, ele está optando pelo trabalho mais duro que a espécie humana já engendrou no Planeta. Vai pegar no cabo do guatambu, capinar a terra com a enxada e virá-la com uma cortadeira. Trabalho duro e pesado que ele trocaria, com agrado, pelo bem remunerado, se possível, ofício de mecânico, funileiro ou pedreiro numa cidade. O campo e a situação social são explosivas, o aumento do salário mínimo é rigorosa e absolutamente ridículo, mas não faltam recursos para os banqueiros. E nós, brasileiros, somos reféns da globalização e da modernidade, que nada mais significam do que reengenharia, que é sinônimo de desemprego. Apreendi na escola que globalização e modernidade nada mais são do que sinônimo de empreguismo. A questão a ser discutida é a seguinte, Senador Pedro Simon: de um lado, os globalizantes e modernistas; do outro, aqueles que aprenderam, na escola, na família, no seu processo civilizatório, as funções claras de fraternidade e solidariedade, que se traduzem, politicamente, pela noção clara de soberania do Estado e de nacionalidade. Muito obrigado.

O SR. PEDRO SIMON - Veja, Srª Presidente, que agora não foi um aparte, mas um pronunciamento importante que fez o Senador Roberto Requião.

Para fazer justiça, Senador Roberto Requião, quero dizer a V. Exª que os tucanos - manchete do Correio Braziliense de hoje - estão abandonando a rota do Planalto, estão defendendo que um salário mínimo de R$112,00, como quer o Governo, não está certo.

Vejam V. Exªs que até os tucanos estão reconhecendo esse fato. E dizem que, pela primeira vez, se rebelam contra o Presidente da República para dizer que um salário mínimo de R$112,00 não é justo. Trata-se da Bancada mais fiel, pois é a Bancada do partido do Governo. Vamos fazer justiça: é a socialdemocracia que o está reconhecendo e não dá para ser socialdemocrata com um salário mínimo de R$112,00.

O Sr. Roberto Requião - São os remanescentes do tucanato do bico vermelho com sentimento social, e do bico verde e amarelo com sentimento nacional.

O SR. PEDRO SIMON - Concordo, mas vamos estimulá-los.

O Sr. Roberto Requião - Mas são poucos, Senador. São aves em extinção.

O SR. PEDRO SIMON - Discordo de V. Exª: não são aves em extinção. Conheço o PSDB. Posso citar nomes se V. Exª quiser. Não sei se V. Exª vai concordar - acredito que sim -, mas há um, do seu Estado, que está hoje em Itaipu e que é uma das figuras mais extraordinárias que conheci, pela dignidade e pela luta. Outro é o meu amigo Mário Covas. Posso divergir de S. Exª com relação a alguns pontos de vista, mas não há dúvida de que se trata de um homem de linha reta. Se dependesse de mim, não teria sido o Collor o Presidente da República, e sim o Mário Covas. Quando Governador do Rio Grande do Sul, fiz um esforço dramático junto ao Dr. Ulysses para que retirasse sua candidatura e apoiasse o Mário Covas. Eu lhe disse: "Dr. Ulysses, o senhor não tem mais chance de ser Presidente, o senhor está com 3%, mas pode ser o maior cabo eleitoral. Ao invés de ser Presidente da República, o senhor pode ser um estadista, o grande homem da república, se retirar sua candidatura e apoiar Mário Covas à Presidência da República". Infelizmente não deu. A meu ver, há tucanos que temos que respeitar.

Os jornais de hoje estão fantásticos. Peço aos senhores que leiam o debate entre o Ministro Motta, o Líder do PFL na Câmara, o Líder do PSDB na Câmara, o Chefe da Casa Civil. O debate é uma Torre de Babel. A guerra está entre o PSDB, PFL, PTB. É algo dramático, mas o Senhor Fernando Henrique precisa coordenar. Na verdade, acho que a aliança que o Presidente fez é exagerada. O que aconteceu ontem nesta Casa foi prova disso. Tínhamos conhecimento de que na segunda-feira o Senhor Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Jobim anunciariam um plano de abertura aos direitos e à liberdade, e que pediriam ao Congresso para votar a lei do Hélio Bicudo. Essa informação foi-nos dada pelo próprio Deputado Hélio Bicudo. A Bancada, então, veio para votar, porque pretendia fazê-lo antes de o Presidente falar à Nação, o que vai acontecer na segunda-feira. A votação não aconteceu. Como vêem, as alianças são as mais variadas.

O Presidente do Supremo Tribunal Federal - eu nunca tinha visto isso - respondeu, com elegância, a uma manifestação, também elegante, da Primeira-Dama. Ela disse que a reforma agrária depende muito da Justiça, ao que o Presidente do Supremo respondeu: "mas se a medida provisória é usada para tanta coisa, até para comprar um carro para o Vice-Presidente, por que o Presidente não a usa para instituir o rito sumário?"

O Presidente fala em instituir o rito sumário mediante a edição de medida provisória, mas há mais de 100 Deputados da chamada Bancada Ruralista que votariam contrariamente a essa proposta. Por essa razão, o Governo não pode editar a medida provisória que institui o rito sumário.

O Sr. Roberto Requião - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª.

O Sr. Roberto Requião - Senador Pedro Simon, no entanto, quando foi para votar o Proer e o Sivam, o Presidente, além de ter feito o pronunciamento...

O SR. PEDRO SIMON - O Presidente sabe que votarei contrariamente ao Proer. No momento de se votar a medida provisória que dispõe sobre o Proer, votarei contra, repito. A mim, que vou votar contra o Proer, ninguém respeitou, mas a Bancada Ruralista, que vai votar contra a medida provisória do rito sumário, foi respeitada: o Presidente está com medo do resultado da votação, razão pela qual não vai editar a medida provisória do rito sumário.

O Sr. Roberto Requião - Senador Pedro Simon, só para restabelecer a verdade dos fatos, digo que o Presidente da República, quando quer aprovar medida que favorece o setor financeiro do Brasil, joga tudo: os Líderes recebem telefonemas, são convocados ao Palácio do Planalto. Agora houve dois fatos: o tucano do bico dourado anunciou, no Planalto, a medida provisória que reforça a política de direitos humanos, mas no plenário do Senado a voz do Presidente não chegou, nenhum Líder foi chamado, ninguém foi convocado. Assistimos a uma farsa: houve um discurso, feito para o mundo, com a intenção de limpar a imagem do Presidente Fernando Henrique Cardoso. No entanto, esse discurso não se transformou em ação política no plenário do Senado Federal.

O SR. PEDRO SIMON - E veja V. Exª que o PT e o Partido Socialista fizeram um apelo no sentido de que, pelo menos, a votação fosse transferida para a próxima semana, a fim de que pudéssemos ouvir a palavra do Presidente.

Considero seriíssima - perdoem-me a sinceridade - a notícia publicada pelo Jornal a Folha de S.Paulo. O Jornal, mediante reportagem do seu correspondente em Marabá, Irineu Machado, dá conhecimento de que um fazendeiro confessou que deu muito dinheiro - muito mais do que os R$100 mil de que estão falando - para a Brigada do Pará executar a matança. Disse que o compromisso é de matar mais e que estão bravos porque mataram poucos. Gastaram tanto dinheiro para matar tão poucos. É a notícia mais séria que já vi.

Penso que o Governo tem a obrigação de chamar o Sr. Irineu Machado, jornalista da Folha, para saber quem é esse cidadão e para trazer o seu depoimento. Não se trata de uma testemunha, de uma pessoa que viu, que sabe ou que não sabe; trata-se de alguém que agiu e participou.

O fazendeiro pediu para não ser identificado, razão pela qual o Jornal lhe omitiu o nome, mas segundo a notícia - que imagino ser verdadeira:

      "Um fazendeiro do leste do Pará disse à Agência Folha que contribuiu em dinheiro para o pagamento da propina à Polícia Militar para matar trabalhadores sem terra em Eldorado de Carajás (PA).

      O fazendeiro só concordou em falar desde que seu nome não fosse divulgado, e a conversa não fosse gravada.

      Ele disse que "pessoas estão sendo mortas" para evitar que digam a verdade. Ele chegou a marcar uma audiência com o juiz de Marabá, Francisco Chagas, onde prestaria depoimento.

      Segundo ele, a coleta de dinheiro entre fazendeiros para pagar a PM "realmente aconteceu".

      "Só não entendo por que fizeram tudo isso e só mataram 19, e não uns cem de uma vez", disse.

      Ele disse que "essa era a única maneira que os fazendeiros tinham de se defender da ameaça dos invasores". Nós iríamos recorrer a quem? Não temos a quem recorrer", disse.

      Ele não disse quanto pagou ou quanto foi arrecadado. "Foi muito mais que R$100 mil".

      Os fazendeiros teriam pago R$100 mil ao Coronel Mário Pantoja, da PM de Marabá, que comandou a ação da PM no conflito.

      O motivo das mortes seria ´queima de arquivo`".

Ora, Srª Presidente, não me lembro de uma notícia tão séria como essa. Na verdade, na verdade, quem está falando é o cidadão que participou. Não se trata de dizer: "vi o fulano dar dinheiro, sei que foi o fulano." Não. A afirmativa é outra: "dei dinheiro, muito mais de 100, para matar muita gente, mas infelizmente só mataram 19. Deviam ter matado, no mínimo, 100."

O Sr. Ademir Andrade - Permite-me um aparte, Senador?

O SR. PEDRO SIMON  - Agora sim, V. Exª tem todo o tempo.

O Sr. Ademir Andrade - Não assisti ao começo do seu pronunciamento, mas imagino que, no início, V. Exª tenha feito referência à questão da invasão dos funcionários públicos ao Ministério da Fazenda ontem, bem como a algumas sedes ou locais do nosso País. Vi, de início, o Senador Roberto Requião - imagino que V. Exª também - tecer algumas considerações sobre o assunto, de certa forma, uma condenação ao fato...

O SR. PEDRO SIMON - O Senador Suplicy também falou, prestou esclarecimentos sobre o que aconteceu.

O Sr. Ademir Andrade - Sobre a invasão. Pergunto a homens experientes, como V. Exªs, o que se pode fazer num momento de dificuldades? Refiro-me aos trabalhadores rurais sem terra que fecharam uma estrada e aos funcionários públicos que invadiram ontem o Ministério da Fazenda. Veja bem V. Exª: o aumento salarial dos funcionários públicos deveria ter saído em janeiro. Recorremos inclusive ao Supremo Tribunal Federal, que não se manifestou sobre a questão. Nós, Parlamentares, não podemos ter a iniciativa de dar aumento, porque isso é prerrogativa do Presidente da República. Esses funcionários entraram em greve e ninguém os ouviu, ninguém sequer os recebeu. O que podem fazer esses funcionários? Que alternativa têm eles para resolver o seu problema? Será que é errado terem invadido o Ministério da Fazenda? Há um ponto positivo nisso, Senador Pedro Simon: com um diálogo, com uma conversa, resolveu-se o problema e eles se retiraram. A troco de quê? A troco de uma audiência que deve estar se realizando agora. Os trabalhadores rurais sem terra fecharam a estrada depois de esperarem dois anos e quatro meses - dois anos e quatro meses - pela solução do seu problema, e tudo que eles queriam era um transporte para levá-los até Marabá e alimentação para agüentarem mais dois ou três dias até proceder-se uma negociação. Lá, houve a ordem de retirá-los de qualquer maneira. Ontem houve um diálogo e não foi preciso força policial para que os funcionários se retirassem do Ministério. Mas será que haveria outro caminho? Pergunto ao Senador Roberto Requião e a V. Exª: que alternativas têm esses funcionários para verem resolvido seu problema, meu Deus?! Será que não é certo o que fizeram? Será que não é correto o que fizeram? Temos um Governo que se omite até a discutir e a dialogar, um Governo que não recebe, que não conversa! Que alternativa resta ao movimento dos funcionários senão uma atitude como a que foi tomada ontem por eles, em vários lugares do País? Era nesse sentido que eu gostaria que V. Exªs ponderassem a respeito da atitude desses funcionários.

O SR. PEDRO SIMON - Meu querido Líder, falo não como o fez ontem um parlamentar referindo-se a V. Exª, mas com o carinho e a admiração - dos quais V. Exª tem conhecimento - que tenho por V. Exª, pela sua coragem, pelo seu dinamismo.

V. Exª não estava presente quando eu disse que pedia licença para falar pela minha experiência. Posso dizer que V. Exª ainda não tinha nascido e eu já estava nessa luta. Felizmente, V. Exª nasceu mais tarde; gostaria de estar na idade de V. Exª e viver daqui para diante, pois foram muito difíceis as lutas que vivemos.

Afirmei, meu querido Senador, que eles têm toda razão em todas as questões. Mas tenho medo desse tipo de manchetes:

      "Malan vira refém de grevistas"

      "CUT invade cinco centrais elétricas"

Manchetes como essas, meu querido Senador, foram as de 1954, que levaram o Dr. Getúlio Vargas ao suicídio; foram as de 1961, quando os militares quase tomaram conta do Poder; foram as de 1964, quando deram o golpe; foram as de 1968, que culminaram no AI-5.

Quero dizer a V. Exª que os defendo, que dou razão e dou força aos manifestantes, mas esse estilo, meu querido Senador, é o estilo em que a esquerda, em que o povo sempre paga a conta. É isso que eu quero dizer. Penso que as questões são justas, mas o apelo que fiz - este foi o sentido do meu pronunciamento - foi no sentido de nos reunirmos para ver como ajudar.

Vamos falar sinceramente: por que tiveram de chegar a isso? Não fomos nós os culpados por não tê-los ajudado? Por que não coordenamos, não participamos, não estivemos presentes? Estou fazendo o mea-culpa, talvez eu tenha sido um dos culpados; talvez eu pudesse ter marcado essa reunião, já que foi tão fácil fazê-lo. Por que nós, as Lideranças do Senado, não fomos lá, conversamos com o Ministro Malan e marcamos essa reunião? Se meia dúzia de líderes sindicais conseguiram a reunião, será que não teríamos conseguido?

O que eu quero dizer é que esse tipo de ação, como as ocorridas em Rondônia, no Pará e, ontem, em Brasília e outros locais do País, provocam manchetes como essas, que conduzem a fatos negativos; pode-se chegar até à fujimorização. Há várias maneiras de se conseguir o desenvolvimento econômico de um país; o Pinochet usou aquela; mas não quero a do Pinochet! Esse tipo de conversa não é bom.

Perdoe-me a sinceridade, mas falo rescaldado, cansado, a esta altura, de ter que começar um filme todo de novo. Com esta experiência, digo que devemos tomar cuidado. Não é à toa. V. Exª acredita que essas duas manchetes estão nesses jornais para defender os trabalhadores? V. Exª acredita nisso? V. Exª acredita que esses dois jornais são solidários com os funcionários públicos e, por isso, publicaram essas manchetes na primeira página? Não. Conheço esse tipo de manchete.

Por isso, peço a V. Exª que me perdoe a sinceridade. Talvez em 1954 V. Exª ainda não tivesse nascido. Conheço essas manchetes desde 1954. Elas vêm - uma, outra e mais outra.

Repare V. Exª que o Jornal Nacional, da TV Globo, durante quatro minutos, endeusou o Sr. Fujimori e ridicularizou o Presidente José Sarney, mostrando uma fotografia sua quando era Presidente da República, recebendo o Sr. Stroessner, que era Presidente do Paraguai! Tinha que receber. O noticiário também buscou e exibiu uma fotografia do Ministro Sepúlveda Pertence, Presidente do Supremo Tribunal, quando era diretor da UNE! E, como dirigente da UNE, na década de 60, recebeu Fidel Castro! Tudo isso esse canal de televisão fez para mostrar que o Ministro Sepúlveda Pertence recebeu Fidel Castro e que o Presidente José Sarney recebeu Stroessner e não quiseram receber o Sr. Fujimori, o "grande estadista" Fujimori, que fechou o Congresso, fechou o Supremo, para moralizar, para dignificar o País. Isso ocupou quase cinco minutos do Jornal Nacional. Esse tipo de manchete assusta-me.

Quero crer que esclareci a V. Exª a colocação que fiz. Não critiquei, dizendo "que barbaridade!". Não fiz nada disso. Analisei o estilo das manchetes, mostrando a preocupação que tenho a esse respeito, porque sei o que há por trás disso.

Para encerrar, Srª Presidente, vou falar sobre outra manchete:

      "Governo suspende o leilão do Meridional"

Quando o Ministro telefonou a V. Exª e a mim comunicando a suspensão, fiquei feliz - que bom! Defendemos que o Meridional não deva ser privatizado. Nós, do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Paraná, entendemos que o Meridional pode se transformar, por exemplo, no grande banco do Mercosul; posteriormente, pode ser inclusive privatizado, vendido para empresários da Argentina, do Uruguai, do Paraguai e do Brasil. Mas não deve, a esta altura, ser entregue, por exemplo, ao Banco de Boston. Portanto, fiquei feliz com a notícia de que o leilão havia sido suspenso.

Como um grupo de muitos Parlamentares - nós, V. Exª, eu - assinaram um pedido de suspensão da privatização e como o Prefeito Tarso Genro e um grupo de Parlamentares foi falar com o Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira pedindo isso, pensei que a suspensão tinha sido referente ao nosso pedido - seu, meu, do Collares, do Jair, do Tarso, de todo mundo.

Mas, pelo que estou vendo, a razão não foi essa. O motivo da suspensão foi que os quatro grupos interessados estão dizendo que existe a quantia de R$1,2 bilhão, referente a empréstimos que o Banco Meridional teria feito, e que o seu retorno seria difícil. A informação que leio é de que não existe nada com relação a escândalo; mas diz respeito a um dinheiro que, pelos critérios do Banco de Boston, seria difícil de retornar.

Isso é ruim, esses 30 dias de suspensão. Estou sentindo que aqueles que desejam comprar um banco que está firme, que está sólido, que está dando lucro, querem dinheiro do Proer, ridicularizando o Banco, pois, com essa notícia e com essa suspensão, se o mesmo for a leilão daqui a 30 dias, valerá um bocado menos do que se fosse a leilão agora.

Nada tenho contra suspender-se o leilão agora. No entanto, não se deveria suspendê-lo agora, debaixo de uma manchete, a pedido dos que vão comprar o Banco, para, daqui a 30 dias, vendê-lo por muito menos. Que bom que o Governo adiou o leilão por 30 dias, mas que o adie para uma outra oportunidade. Se sair daqui a 30 dias, vai entrar dinheiro do Proer, vai ser mais barato e alguma coisa vai acontecer. Isso não está me parecendo bom. Quem pediu a suspensão foram os quatro grupos que estavam preocupados com a compra, atingindo os técnicos em economia de Boston, que vieram, olharam e disseram que havia R$1,2 bilhão de créditos fornecidos a pessoas do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, dos quais não se sabe a garantia do retorno. Pelo amor de Deus! Na minha vida, dinheiro da Caixa Econômica Estadual, da Caixa Econômica Federal, do Banco Meridional, do Banco do Rio Grande do Sul, do Banco do Brasil, crédito de banco estadual algum, de banco estatal algum ... Os funcionários, olhando para as minhas contas, iriam dizer: "Olha, esse eu não sei se paga". E há muitas pessoas que podem estar assim.

No entanto, esse é um tipo de situação que não me parece permitir que se compare o Banco Meridional com o Banco Nacional ou outro qualquer. Preocupa-me essa tentativa de atingir a honorabilidade de uma instituição.

O Banco Meridional é considerado aquele que está em melhor situação, pelo qual se tem mais respeito e mais credibilidade - isso é reconhecido por todos -, mas de repente, não mais que de repente, o Banco de Boston se interessa em comprá-lo e diz: "Ora, um bilhão e duzentos foram bem emprestados, mas não se tem a garantia do retorno". Aliás, quero esclarecer que já se queria privatizar o Banco Meridional desde o Governo anterior, mas consegui, através de determinação do Presidente Itamar, que o Sr. Fernando Henrique, Ministro da Fazenda à época, suspendesse a privatização.

O Sr. Fernando Henrique não aceitou o nosso apelo. Mas, de repente, vêm os quatro compradores, pedem para adiar e Sua Excelência o faz.

Quero saber como as coisas vão ficar.

Manchete como essa, minha querida Presidente, é para baixar preço, é para baixar cotação.

Acho que, nessa altura, se aconteceu isso, o melhor que o Governo tem a fazer é suspender, in tempore, a privatização.

É o apelo que faço ao Governo. Se ele adiou por 30 dias, atendendo ao apelo do Banco de Boston, que adie por mais tempo, atendendo ao apelo de toda a classe política do Rio Grande do Sul, a fim de que possamos conseguir uma opção que não seja entregar o Banco Meridional. O Banco sonhado por nós para o Cone Sul, para o Mercosul, ser entregue ao Banco de Boston?

O Sr. Roberto Requião - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com o maior prazer.

O Sr. Roberto Requião - Senador Pedro Simon, fui chamado à colação pelo Senador Ademir Andrade, a respeito da questão da invasão do Ministério da Fazenda. Em primeiro lugar, minhas credenciais: como Governador do Estado do Paraná, fui objeto de cinco pedidos de intervenção federal, porque me recusei a utilizar as forças policiais nas questões sociais. Fui objeto, pelo mesmo motivo, de um pedido de cassação de mandato, que foi efetivado e derrubado no Supremo Tribunal Federal. No entanto, quando um sem-terra ocupa uma área para poder sobreviver, ele está em estado de necessidade absoluta e, de certa forma, está reclamando a intervenção da União ou do Estado nacional, na solução do seu problema. O mesmo acontece com o conflito trabalhista numa fábrica: quanto menos polícia, melhor! No entanto, não posso, de forma alguma, concordar com a invasão do Ministério da Fazenda, que pode ser o prenúncio da invasão do Palácio do Planalto. No Ministério da Fazenda funciona um Poder da República, que não pode ser paralisado por uma pequena reivindicação corporativa, porque dele depende o funcionamento do País. Deixo clara a minha solidariedade, Senador Ademir Andrade, aos funcionários na sua reivindicação, mas fosse eu Ministro da Fazenda, nesse problema, teria posto na rua todos os invasores, através de um processo disciplinar duro, porque o mínimo de ordem e respeito às autoridades tem que prevalecer na República. É rigorosa e absolutamente inadmissível a invasão de uma repartição pública, paralisando o País. Essa invasão, amanhã, poderia se dar no Congresso Nacional, que seria impedido de funcionar, ou ainda no Palácio do Planalto, impedindo o Presidente da República de trabalhar. Falta dureza a esse tucanato do bico dourado em momentos como esse, da mesma forma que lhe falta sensibilidade social e política ao praticar a política globalizante, perseguir funcionários públicos, optar por um Estado minimalista e pela entrega do patrimônio nacional, historicamente acumulado, ao capital privado e às multinacionais. A medida correta do Ministro Pedro Malan e do Governo Federal seria pôr na rua, sem maiores considerações, os anarquistas que invadiram o Ministério da Fazenda.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço a V. Exª pelo aparte.

Sr. Presidente, encerro dizendo que eu gostaria de poder conceder um aparte à nobre Senadora Emilia Fernandes, se S. Exª não estivesse no exercício da Presidência. Mas tenho certeza de que a Senadora, como também o Senador José Fogaça, que não se encontra presente, são solidários em relação ao que foi dito aqui por mim. Digo isso porque nós, do Rio Grande do Sul, temos debatido esta matéria.

Por isso, com tranqüilidade, falo em nome da Bancada do Rio Grande do Sul no Senado, que solicitou a suspensão do Meridional por um longo período, e que viu ser suspenso por 30 dias, a pedido de quem quer comprar. E, para que não desmoralizem o Meridional, solicitamos que isso não seja feito daqui a 30 dias.

Agradeço a sua tolerância e manifesto a minha alegria de estar falando sob a Presidência de V. Exª, nobre Senadora Emilia Fernandes.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/1996 - Página 7908