Pronunciamento de Jefferson Peres em 17/05/1996
Discurso no Senado Federal
CONSIDERAÇÕES SOBRE O EDITORIAL DO JORNAL CORREIO BRAZILIENSE, EDIÇÃO DE HOJE, INTITULADO ETICA NA POLITICA.
- Autor
- Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
- Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA NACIONAL.:
- CONSIDERAÇÕES SOBRE O EDITORIAL DO JORNAL CORREIO BRAZILIENSE, EDIÇÃO DE HOJE, INTITULADO ETICA NA POLITICA.
- Publicação
- Publicação no DSF de 18/05/1996 - Página 8329
- Assunto
- Outros > POLITICA NACIONAL.
- Indexação
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- TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, EDITORIAL, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), RELAÇÃO, ETICA, POLITICA, BRASIL.
- CRITICA, GOVERNO, FORMA, OBTENÇÃO, APROVAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, TROCA, FAVORECIMENTO, PROPRIETARIO, LATIFUNDIO, EMPREITEIRO, CONGRESSISTA, AUTORIZAÇÃO, ACUMULAÇÃO, PROVENTOS, APOSENTADORIA, MANUTENÇÃO, PRIVILEGIO, CLASSE POLITICA, PAIS.
O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Correio Braziliense de hoje publica editorial que me permito ler, desta tribuna, para constar nos Anais desta Casa, sob o título "Ética na Política":
"As recentes negociações do governo federal com seus aliados parlamentares reproduzem cenas de fisiologismo explícito incompatíveis com os compromissos éticos assumidos no curso da campanha eleitoral.
Sabe-se que o governo, qualquer governo, em regime democrático, é obrigado a buscar apoio parlamentar para dar sustentação e viabilidade a seu programa. Essa busca de apoio implica inevitavelmente compartilhar espaços de poder com os parceiros. Até aí, nada de mais.
Se essa parceria se der em torno de idéias e compromissos explicitados ao público, a negociação terá sido legítima e expressará a essência do regime democrático, que prevê o predomínio da vontade da maioria.
Quando, porém, a maioria é construída de modo espúrio, pela simples atração mercantil de parceiros, tem-se grave distorção do processo democrático. O noticiário a respeito das articulações em curso, que visam à retomada do processo de reforma constitucional, remete a essa hipótese.
A pelo menos duas bancadas que integram sua base parlamentar - a ruralista e a de Minas Gerais -, os articuladores políticos do governo teriam prometido atender pleitos clientelistas em troca de votos.
Aos ruralistas, prometeram rever medida provisória que, entre outras coisas, prevê procedimentos para cobrança de débito junto ao Banco do Brasil. Aos mineiros, prometeram quitar débitos do Estado com uma empreiteira.
Os pleitos podem até ser procedentes - e não se está aqui analisando-os. O que é inconcebível é que sejam apresentados na surdina, como moeda de troca. Não é essa a política com "p" maiúsculo com que se comprometeu, no curso das eleições, o atual governo.
Se a medida provisória dos bancos não é boa, como dizem os ruralistas, deve ser derrubada sob esse argumento, depois de cabalmente demonstrada sua inadequação. Se é boa, como sustenta o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, deve ser preservada. Se o Estado deve a essa ou aquela empresa, não importa seu tamanho, deve quitar-se independentemente de pressão parlamentar. Não sendo assim, o que há é mero balcão de negócios.
A sensação do público, diante do noticiário, é de que o bem comum está sendo lesado e de que o governo capitula à pressão de homens públicos inescrupulosos. Sabe-se que o Congresso é uma instituição respeitável e indispensável ao regime democrático. Um não existe sem o outro.
Sabe-se também que há parlamentares da maior qualificação moral e intelectual, dentro e fora da base governista. É a esses personagens que, neste momento, cabe papel fundamental de impedir, pela vigilância e denúncia, que o conceito das instituições políticas naufrague."
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vejo, freqüentemente, colegas meus queixarem-se da imprensa, dizendo que esta é dura e injusta com o Congresso Nacional. Talvez seja.
A imprensa não é composta de juízes, a mídia não é Poder Judiciário; move-se por paixões, também; freqüentemente aumenta, raramente inventa. Mas presta, com todos os seus erros, um serviço inestimável à democracia.
O Congresso não sofreria tantas críticas, justas ou injustas, no entanto, se práticas como essas, denunciadas no editorial do Correio Braziliense, não se tivessem tornado corriqueiras no Parlamento brasileiro.
É inconcebível que o Governo, para aprovar uma reforma como a da Previdência, necessária ao País, tenha que barganhar votos com integrantes da chamada Bancada Ruralista, com a supressão de quatro pontos da Medida Provisória do Banco do Brasil, que se refere à cobrança de débito dos grandes proprietários rurais. Sim, porque as dívidas dos pequenos e médios já estão equacionadas, mediante a securitização.
O acordo beneficiará, portanto, apenas e exclusivamente, os grandes proprietários rurais, que, se não forem atendidos, passarão a votar contra o Governo, não importando que as medidas propostas por este consultem o interesse público. Isto não tem outro adjetivo: é, simplesmente, indecoroso.
Da mesma forma, integrantes da bancada mineira -acredito que não todos, porque Minas deu e continua dando grandes representantes ao Parlamento brasileiro - teriam negociado seus votos em troca de uma medida do governo que contemple uma grande empreiteira nacional com R$900 milhões. Desses, R$700 milhões seriam para pagar um suposto débito que a empresa alega ter com o Banco do Brasil - um contencioso que deveria ser remetido à Justiça e não resolvido pelo governo nos bastidores, mediante um acordo espúrio - e R$ 200 milhões iriam para o caixa da empreiteira para resolver seus notórios problemas financeiros. Não sei se a empresa é credora ou devedora, como alega o Banco do Brasil. Isso jamais poderá vir a ser resolvido, repito, ser um acordo quase clandestino, sem a devida transparência perante a sociedade.
Como se isso não bastasse, Sr. Presidente, a maioria dos Deputados na Câmara Federal, ao votar a reforma da Previdência, suprimiu um artigo que proibia a acumulação de proventos de aposentadoria com subsídios dos parlamentares. Não entro no mérito se isso é justo ou injusto, mas no momento em que estamos aprovando medidas que atingem os servidores públicos em geral, o Congresso deveria dar exemplo. Por que proibir acumulação de aposentadoria para os servidores públicos e mantê-la para nós Parlamentares? Eu falo de cátedra, Sr. Presidente, porque sou aposentado do Tribunal de Justiça do Amazonas, depois de 35 anos de serviço público - nele ingressei por concurso público - e acumulo essa aposentadoria com os meus subsídios de Senador, mas, tranqüilamente, votarei contra. Se estamos impondo sacrifícios aos servidores, temos também que estendê-los a nós; ou não teremos autoridade moral para impor medida alguma. Os Parlamentares devem ter isto em mente: ou abrimos mão de nossos privilégios ou não poderemos cortar o privilégio de ninguém.
A Câmara derrubou esse artigo, mas vou tentar restabelecê-lo no Senado. Se o Senado ratificar a decisão da Câmara, paciência! Mas, então, não reclamem dos ataques que sofremos. E não vamos, por isso em represália, aprovar essa lei de imprensa em tramitação que estipula multas draconianas que levariam à quebra financeira dos jornais e penas de prisão a jornalistas por crime de opinião. Se o Congresso adotar essa medida, estará simplesmente impondo uma mordaça à imprensa brasileira, para que ela não critique os nossos erros. Estaremos instituindo uma semiditadura neste País. Já fui criticado e atingido injustamente pela imprensa, mas não é por isso que vou tentar silenciá-la. É melhor que ela continue cometendo injustiças, mas, em meio a tantos erros de julgamento que comete, ela precisa estar de mãos desatadas para criticar os erros que o Congresso vem praticando secularmente e continua a praticar, sem tomar consciência de que a sociedade brasileira está mudando e que não aceita mais de seus representantes um comportamento tão discrepante dos padrões éticos vigentes num país que se pretende civilizado.
Sr. Presidente, peço a transcrição, nos Anais desta Casa, do editorial "Ética na política", publicado no Correio Braziliense de hoje, porque é um testemunho de que o Parlamento deste País continua, infelizmente, surdo aos reclamos da sociedade brasileira. É uma pena que isto aconteça.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.