Discurso no Senado Federal

CRITICAS A BANCADA RURALISTA QUANDO DA VOTAÇÃO, NA CAMARA DOS DEPUTADOS, DA REFORMA DA PREVIDENCIA SOCIAL. QUEDA DA POPULARIDADE DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • CRITICAS A BANCADA RURALISTA QUANDO DA VOTAÇÃO, NA CAMARA DOS DEPUTADOS, DA REFORMA DA PREVIDENCIA SOCIAL. QUEDA DA POPULARIDADE DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Aparteantes
Bernardo Cabral.
Publicação
Publicação no DSF de 21/05/1996 - Página 8375
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DENUNCIA, IMPRENSA, FALTA, IDONEIDADE, VOTAÇÃO, BANCADA, DEFESA, PROPRIEDADE RURAL, TROCA, VOTO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, FAVORECIMENTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, BANCO DO BRASIL.
  • GRAVIDADE, DENUNCIA, ARTIGO DE IMPRENSA, FRAUDE, ARMAZENAGEM, GRÃO, PREJUIZO, UNIÃO FEDERAL, NECESSIDADE, POSIÇÃO, CONGRESSISTA, APURAÇÃO.
  • COMENTARIO, REDUÇÃO, POPULARIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EFEITO, CONCESSÃO, LOBBY, CONGRESSO NACIONAL, ADVERTENCIA, GOVERNO, PREJUIZO, CONFIANÇA, ETICA.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na sessão de sexta-feira, fiz ecoar, neste plenário, o clamor da grande imprensa brasileira contra o processo espúrio que marcou a votação da Reforma da Previdência, na semana passada, na Câmara Federal, mediante cenas de fisiologismo explícito por parte, segundo a imprensa, da chamada Bancada Ruralista e da Bancada do Estado de Minas Gerais.

Tem noticiado a imprensa que a Bancada Ruralista beneficiou-se, ou se teria beneficiado, na supressão de quatro artigos da medida provisória referente ao Banco do Brasil e que isto implicaria, na prática, um calote de R$3,5 bilhões àquele Banco oficial.

No entanto, Sr. Presidente, surge uma denúncia ainda mais grave feita pelo colunista José Casado, no Estado de S. Paulo, edição de sábado último.

Diz aquele jornalista que o artigo 8º da medida provisória tinha quatro linhas. Nelas, havia uma tornando insubstituíveis - ou "infungíveis", como especificava - os bens dados como lastro aos financiamentos públicos na armazenagem de produtos agrícolas. Ou seja, aquelas pessoas que, por delegação do Governo, armazenam grãos dados em garantia de financiamentos oficiais na vigência desse artigo 8º, de cunho moralizador, esses bens não podem ser substituídos.

Deixo ao Sr. José Casado a responsabilidade pelo que diz; apenas estou esperando esclarecimentos, inclusive, do Governo, Sr. Presidente.

A Bancada Ruralista, por intermédio de cinco Deputados citados nominalmente pelo jornalista - os Srs. Deputados Hugo Biehl, Werner Wanderer, Pedro Abrão, Abelardo Lupion, Nelson Marquezelli e Romel Anízio - teria negociado na tarde de quinta-feira, no Palácio do Planalto, com o Ministro de Assuntos Políticos Luiz Carlos Santos, a supressão desses artigos - um deles o oitavo - o que faria com que os bens armazenados deixassem de ser infungíveis e se tornassem substituíveis, como era antes da edição da medida provisória.

Qual o efeito disso na prática? Explica o jornalista José Casado:

      "Como produtor, Lupion - um dos Deputados citados - sabe que centenas de agricultores tomaram empréstimo no Banco do Brasil, guardaram a produção em armazéns credenciados pelo Governo e, no final, foram roubados. Ficaram sem o produto e com uma dívida bancária.

      Nesse ponto da explicação, Lupion poderia ter sido socorrido pelo colega ao lado, o Deputado Pedro Abrão, que mantém grandes negócios na armazenagens de grãos com financiamento público. Abrão talvez pudesse ter esclarecido que aquele artigo inibia um tipo de maracutaia muito freqüente na armazenagem.

      É assim: O armazenador privado, fiel depositário, recebe o produto - digamos, arroz do tipo 1. Pouco depois vende, substituindo-o por outro de qualidade inferior. Quando o Governo pede sua devolução na Justiça, alega-se que o produto era um bem fungível, ou seja, que não só podia ser como foi substituído, porque é um produto perecível. A Justiça vinha aceitando esse argumento, e o Governo vinha morrendo em bilhões.

      Abrão deve conhecer tais episódios, até porque são freqüentes em Goiás, onde a capacidade de armazenagem já supera 12 milhões de toneladas. Seu Estado ocupa lugar de destaque na história recente dos lucros privados, em operações de armazenagem privada com financiamento público, ruinosas para o Erário. Elas estão contadas em detalhes em volumosos processos no Tribunal de Contas da União.

      Aliás, no caso goiano, os auditores do TCU demonstraram o favorecimento de empresários como Pedro, Moisés e Vânia, em contratos de armazenagem superiores a US$3,5 milhões. Eles têm o sobrenome Abrão e marcada influência na política regional. Pedro é Deputado. Na tarde de quinta-feira, foi fotografado saindo na sala do Ministro Santos, no Palácio do Planalto".

Sr. Presidente, a denúncia é da maior gravidade. Envolve Deputados. Não sei se são procedentes, não me arvoro em acusador, mas está assinada por um jornalista respeitado neste País. Segundo ele, teria havido uma barganha dos ruralistas com o Governo Federal, com a supressão, além dos outros três, deste artigo que implica, Senador Bernardo Cabral, restabelecer-se o regime anterior, na armazenagem de grãos, o que já representou realmente um prejuízo vultoso para o Tesouro Nacional.

Aliás, o último Presidente da CONAB saiu atirando e denunciando que teria sido demitido por pressão de ruralistas envolvidos nesses negócios escusos.

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Jefferson Péres?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo-lhe o aparte, Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Jefferson Péres, o problema que V. Exª alinha, ao comentar o artigo dado a lume em O Estado de S. Paulo, representa sem dúvida uma pirataria política, o que é próprio de quem pensa que o País é feudo de paixões ou de maquinações paroquiais. Está na hora de o Governo sair desse contorcionismo político. Ainda há pouco, o Senador Antonio Carlos Magalhães disse que iria pedir a transcrição nos Anais de um artigo dado à estampa no domingo último, pelo Deputado Federal Roberto Campos, que tem, realmente, essa terminação: "Está na hora de o Presidente deixar de ser bonzinho". No instante em que se exclui, se retira de uma medida provisória um artigo que é altamente moralizador e não há um esclarecimento necessário, convincente, vai haver, sem dúvida alguma, reflexos na figura do Presidente da República, que, por todos é sabido, por seu mais ferrenho opositor, é um homem sério, decente, que não tem tido, pelo menos até agora, qualquer envolvimento em trapalhadas dessa natureza. No entanto, o que V. Exª declara, registra, no que faz muito bem, traz ao conhecimento da Casa sem emitir juízo de valor, é uma circunstância das mais graves porque, ainda recentemente, alguns companheiros nossos do Senado estiveram sendo alinhados, enumerados - e não somos nós dois, ainda bem - como integrantes da Bancada Ruralista. Essas coisas precisam ser esclarecidas. Eu queria apenas juntar este adminículo para cumprimentar V. Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Obrigado, Senador Bernardo Cabral. V. Exª fala com autoridade, porque jamais teve seu mandato, este e o de Deputado Federal, maculado por práticas desse tipo.

Sr. Presidente, insisto no tema, porque não podemos bancar avestruzes. Não podemos, Senadores como eu e outros, simplesmente chegar ao nosso eleitorado, em nosso Estado e dizer: "Não fazemos isso; não praticamos coisas desse tipo". Ora, Sr. Presidente, isso não basta. Se não denunciarmos, se não ajudarmos a denunciar, não pedirmos explicações, não protestarmos contra essas práticas antiéticas, estaremos sendo coniventes, estaremos pecando por omissão, estaremos nos curvando ao corporativismo do Parlamento, que é notório, estaremos sendo cúmplices disso também. Sei que isso é incômodo; sei que tem conseqüências; sei que esses protestos, essa inconformação com procedimentos que já se vão tornando corriqueiros no Parlamento geram contra nós incompreensões e até hostilidades surdas, mas reais. Não me importa.

Não fui eleito para me acumpliciar com isso e não vou fazê-lo nunca, Sr. Presidente. Sou do Partido do Presidente da República, e isso pode gerar incompreensões, lá, entre meus colegas, no Planalto, isso pouco me importa. Também não estou aqui para ser agradável. Estou sendo fiel aos postulados e ao programa do PSDB, um Partido que nasceu sob o signo da ética, e o Presidente foi eleito também sob esse signo. Se ele não entender que eu é que estou defendendo o Governo e não os que o fazem ceder a coisas assim, paciência; meu distanciamento do Presidente vai continuar e vai até se aprofundar.

Os jornais registraram no final de semana - e já foi comentado aqui - uma queda na popularidade do Presidente. Entendo que isso se deveu a vários fatores. Em primeiro lugar ao fim da chamada lua-de-mel, o que é natural; há um processo de desgaste natural do poder, uma frustração de expectativas, com uma dívida social enorme, que o Governo não pode combater com medidas eficazes a curto prazo, porque exigem medidas de longo prazo até.

Sr. Presidente, não tenho dúvidas também de que contribuiu para essa queda de popularidade a concessão que o Governo tem feito sistematicamente às pressões fisiológicas do Congresso Nacional. Para um Presidente que foi eleito sob o signo da ética na política, ceder pode ser fatal para ele, porque a sua credibilidade é afetada de forma irreversível.

Entendo que o Presidente da República deveria repelir chantagens desse tipo, pois não há outro nome senão "chantagem", Sua Excelência tem tomado medidas impopulares e, diga-se de passagem, com grande coragem, quando não cede à demagogia e evita, por exemplo, aumentos salariais que explodiriam as contas públicas. É doloroso e duro tomar essa atitude, mas é impossível fazer a sociedade, e principalmente os atingidos aceitarem isso quando tomam conhecimento de que o Governo Federal negocia coisas que custam bilhões ao erário.

Estou, portanto, em nome do verdadeiro PSDB, da alma do PSDB nacional, fazendo um apelo para que o Presidente da República dê esclarecimentos públicos quanto a isso, repila essa verdadeira coação que sofre por parte dessa banda podre do Congresso, com a qual não podemos e não iremos jamais compactuar, custe isso o que nos custar, inclusive dentro do Senado Federal.

Muito obrigado. Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/05/1996 - Página 8375