Discurso no Senado Federal

DIFICULDADES POR QUE PASSA A AGRICULTURA BRASILEIRA, EM VIRTUDE DO PLANO REAL E DAS IMPORTAÇÕES DA ARGENTINA.

Autor
Lúdio Coelho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Lúdio Martins Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • DIFICULDADES POR QUE PASSA A AGRICULTURA BRASILEIRA, EM VIRTUDE DO PLANO REAL E DAS IMPORTAÇÕES DA ARGENTINA.
Aparteantes
Geraldo Melo.
Publicação
Publicação no DSF de 28/05/1996 - Página 8876
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, AGRICULTURA, AUSENCIA, POLITICA AGRICOLA, IMPEDIMENTO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO, PROTEÇÃO, PRODUTO AGROPECUARIO, REGULAMENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO, NECESSIDADE, SUBSIDIOS.
  • ANALISE, DISCRIMINAÇÃO, AGRICULTOR, RELAÇÃO, JUROS, FINANCIAMENTO, TRATOR, REDUÇÃO, AQUISIÇÃO, EQUIPAMENTO AGRICOLA, CALCARIO, EXPECTATIVA, INFERIORIDADE, SAFRA.

O SR. LÚDIO COELHO (PSDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Jornal de Brasília, de ontem, trouxe matérias com os seguintes títulos: "Política agrícola ameaça o Real" e "Plano Real perde a âncora verde".

Na Gazeta Mercantil de hoje, lê-se "A invasão dos alimentos argentinos ao nosso País"; "Preço do frango recua mais 5%"

Estamos tomando conhecimento de notícias que muito me preocupam. Quando assumi o cargo, aqui no Senado, no ano passado, na primeira reunião da bancada do PSDB com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, eu alertei Sua Excelência sobre as dificuldades por que estava passando a agricultura brasileira.

Quero alertar os companheiros do Senado e a Nação brasileira sobre um assunto muito importante para o nosso País. Hoje eu li em outro jornal que o preço de suínos baixou para 68 centavos de real o quilo em pé. Li uma outra matéria que informava que estamos, neste momento, importando carne de suínos da China. Tenho impressão de que deveríamos debruçar-nos nesse assunto da agricultura.

No ano passado, por falta de previsão da área técnica do Governo responsável por esse setor, não tomamos nenhuma providência e tivemos uma queda de safra da ordem de 12% da produção agrícola brasileira.

Todos aqueles que trabalham nessa área tinham conhecimento da diminuição da área plantada no mundo e de que haveria elevação de preços acentuada. Seria muito bom, se tivéssemos plantado a nossa safra normalmente. Se tivéssemos adubado o suficiente, o necessário, teríamos tido uma safra grande e iríamos gerar divisas importantes para a Nação brasileira, por meio da exportação dos excessos de produção interna; enfim, iríamos continuar prestando os serviços que a agricultura brasileira sempre prestou à Nação.

Falei há alguns dias e repetirei agora: foi da agricultura que conseguimos divisas; foi do café, da borracha, do algodão, da laranja, da soja que conseguimos divisas para industrializar a Nação brasileira. E agora não estamos dando o tratamento adequado à agricultura brasileira.

Tenho certeza de que o Presidente Fernando Henrique Cardoso não deseja destruir a agricultura brasileira, mas já estamos no fim de maio e não há nenhuma notícia de providências para a próxima safra.

Neste momento, as terras que necessitam de correção contra a acidez já deveriam estar cobertas com calcário, que, com algumas chuvas, o solo absorveria. Nenhuma providência existe nesse sentido.

Por isso, volto novamente a este assunto para alertar, principalmente o Poder Executivo, sobre a necessidade de se tomar alguma providência mais concreta. Precisamos fortalecer a nossa agricultura.

Hoje, nos Estados Unidos a agricultura é uma das atividades econômicas mais importantes. Na minha avaliação, é a área em que temos condições de concorrer com qualquer Nação do mundo.

A imprensa tem noticiado permanentemente que o Plano Real, que a busca do equilíbrio econômico que trouxe essa recessão desmantelou o setor de equipamento agrícola. Caiu a produção de equipamento agrícola, nesses últimos três anos, em mais de 50%.

Deveríamos meditar sobre esse assunto e ajudar o Presidente da República a encontrar um caminho adequado para resolver esse problema. Tenho conversado com alguns companheiros sobre isso e chego a pensar que talvez o baixíssimo preço dos produtos agrícolas faça com que não se dê o devido valor à agricultura. Qualquer família média, se computar o preço do arroz, feijão, carne de boi, porco ou frango e o óleo, verificará que não gasta 150,00 reais por mês, não gasta nada, porque esses produtos estão muito baratos, não estão valendo nada.

Às vezes penso que eles não estão dando importância a esse outro setor porque esses produtos estão pesando muito pouco no custo de vida da população. As camadas populacionais que ganham menos, os trabalhadores mais humildes compram com 45,00 reais uma cesta básica com esses produtos essenciais e passam o mês.

Creio que o Senado Federal tem o dever de examinar cuidadosamente esse assunto para trazer alguma proposta concreta.

O Sr. Geraldo Melo - Senador, V. Exª me permite um aparte?

O SR. LÚDIO COELHO - Com prazer, Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo - Evidentemente que, de todos nós, o grande professor nessa matéria é V. Exª. Concordo que o Senado poderia debruçar-se sobre esse assunto e oferecer algumas sugestões. Quando isso acontecer, gostaria de ter a oportunidade de fazer uma reflexão. Acredito que um dos problemas com o qual estamos nos defrontando resulta do fato de que nos transformamos em importadores de subsídios. Dar subsídio ao produtor brasileiro virou palavrão. Já faz algum tempo que não se pode nem ao menos falar nesse assunto, e muito mais depois dessas desastradas intervenções de pessoas que querem substituir os partidos por bancadas ruralistas e coisas do tipo. Isso gerou um ambiente de hostilidade desnecessária, dificultando uma discussão objetiva dos problemas. Quando fizemos a grande abertura da economia nacional nos últimos dois anos, não discutimos algumas contrapartidas a que o Brasil tem direito na sua relação bilateral com países e grupos de países. Estamos sendo advertidos pela Organização Mundial do Comércio em algumas situações, inclusive porque elevamos demasiadamente a alíquota sobre automóveis. No entanto, não estamos fazendo o mesmo àqueles que - como a Comunidade Econômica Européia e os Estados Unidos - dão enormes subsídios aos concorrentes dos produtores rurais brasileiros. Contei, há algum tempo, a seguinte história: enquanto a televisão mostrava que um produtor do Paraná estava dando cenouras de sua plantação porque não obtinha preço para o seu produto, a minha mulher chegou do supermercado trazendo cenoura francesa. Na realidade, a cenoura francesa estava com uma veste tão rica de subsídios que se tornava mais barato receber em minha cozinha cenoura proveniente da França em lugar de comprá-la de nossos produtores. Acredito que a questão dos subsídios que são pagos lá fora é da nossa intolerância absoluta em discutir essa questão. Esse é um ponto que precisa entrar na pauta das preocupações, quando essa sugestão de V. Exª começar a produzir os resultados que têm que produzir dentro do interesse do Brasil.

O SR. LÚDIO COELHO - Muito obrigado, Senador Geraldo Melo. V. Exª colocou com muita propriedade esse assunto. O mundo inteiro subsidia a agricultura. Não tenho nem coragem de falar em subsídio, mas tenho coragem de verbalizar que, talvez, devêssemos tirar um pouco desses recursos que são destinados à salvação da rede bancária que trabalhou inadequadamente com o dinheiro da população. Vejo o Governo brasileiro muito preocupado com o depositante. Parece que o dinheiro do depositante é mais sagrado do que o do agricultor, que trabalha no dia-a-dia. Quando uma cooperativa quebra, o Poder Central não dá recursos para essa cooperativa atender aos agricultores que lhes forneceram o fruto do seu trabalho.

Está na hora de se deixar de ter vergonha de ser agricultor. No Mercado Comum Europeu, o povo da cidade tem consciência da importância da agricultura, daqueles que produzem comida para o sustento da população. Aqui, estão levando para um lado em que o agricultor parece marginal. Ele é desconsiderado. Chegou-se ao ponto de se estar colocando nas carroças e nos caminhõezinhos uns papéis onde está escrito: "Sou agricultor, sim". E eu sou um desses: sou um agricultor, sim.

O Senador Geraldo Melo está dizendo da sobretaxa que criaram contra a importação de automóveis. Estamos importando, por incrível que pareça, carne de porco da China. Vi no jornal de hoje que o preço da carcaça de suínos caiu para 0,68 centavos de real o quilo.

O Sr. Geraldo Melo - Permite-me, nobre Senador, uma nova intervenção?

O SR. LÚDIO COELHO - Ouço V. Exª.

O Sr. Geraldo Melo - Estamos importando álcool porque as nossas destilarias de álcool não estão produzindo. Apenas para evitar mal-entendidos, eu não sou favorável a dar subsídios aqui, mas sou favorável a que tenhamos barreiras de proteção ao produtor brasileiro contra os produtos que recebem subsídio lá fora.

O SR. LÚDIO COELHO - Perfeito. Estamos pagando subsídios dados pelas nações desenvolvidas aos agricultores de seus países. O agricultor brasileiro está enfrentando um problema enorme: as nossas ferrovias estão caindo aos pedaços; navegação, não existe - praticamente não temos nenhum rio navegável -; as nossas rodovias estão em péssimas condições; no entanto, o agricultor tem que produzir. Nos Estados Unidos, com 200 milhas, o agricultor americano coloca o seu produto agrícola dentro do navio - no mar, nos canais ou nos rios. Aqui, transportamos o produto agrícola do norte do Mato Grosso, de Tocantins, até dois mil e quinhentos quilômetros, para chegar ao Porto de Paranaguá.

Quero também transmitir aos meus companheiros do Senado o que está acontecendo. Hoje, mais de 50% da produção de arroz do Uruguai está sendo feita por brasileiros, que se estão transferindo do Brasil para serem produtores no Uruguai, porque, nesses países do Mercosul, os juros são em torno de 6 ou 7% ao ano, sem correção. Penso que essa abertura da economia brasileira precisa de atenção especial nossa, sob pena de sacrificarmos enormemente determinados setores da economia brasileira, sem benefícios para a Nação. Se sacrificarmos determinados setores em benefício da coletividade, não há problema. Mas receio que estejamos praticando um erro com relação ao setor agrícola.

Um dia desses, ouvi uma colocação de um agricultor, na minha casa, em Campo Grande. Disse-me ele: "Senador, tenho a impressão de que somos como uma plantinha que era muito viçosa e agora está morrendo por falta d`água. Estamos secando".

Hoje, li em um jornal - não me lembro se foi a Gazeta - que o Movimento dos Sem-Terra adquiriu cinqüenta tratores fortes, superdimensionados, a juros excepcionais. Estou de pleno acordo. Penso que o assentamento dos Sem-Terra precisa ser acompanhado de assistência técnica e de equipamentos.

Mas fico pensando até onde iremos neste direcionamento. Fornecemos tratores em condições excepcionais aos Sem-Terra e o agricultor, o pequeno produtor brasileiro não tem condições de comprar trator. Haja vista a enorme queda na venda de tratores, pois o agricultor não está comprando nada.

Quando mandei a minha declaração de bens para o Senado, achei interessante. Sou conceituado como grande agricultor. No entanto, na relação de máquinas de minha propriedade, observei que havia equipamentos velhos. O técnico da minha fazenda disse: "Sr. Lúdio, a nossa sorte este ano é que não temos trator novo". Perguntei-lhe por que, e ele respondeu: "Esse pessoal que comprou trator quebrou, Sr. Lúdio". Esses tratores foram comprados com dinheiro do Finame e custaram até 40%, 50%, 70% ao ano. Não sobrou nada.

Estou contando estas histórias, porque descobri que às sextas e às segundas-feiras, aqui, no Senado, é tranqüilo, podemos conversar um pouco. Precisamos meditar sobre essas coisas. O pessoal da área executiva não aceita discussão. Tentei conversar com eles no ano passado, mas eles não aceitam. Então, colhemos 12% menos.

Recebi projeções sobre a safra a ser plantada em outubro e novembro, tempo da chuva, muito pessimistas. Muitas pessoas, no ano passado, e inclusive eu, plantamos sem adubo. Não tivemos condições de adubar nossas terras. Este ano os exames de solo estão sendo feitos e grandes quantidades de terras agricultáveis deste nosso País estão muito ácidas. A colocação do calcário deve ser feita com bastante antecedência para que as eventuais chuvas dissolvam-no e ele forme a reação capaz de neutralizar a acidez do solo. Até agora nenhuma tonelada de calcário foi financiada. Não existe nenhum programa nesse sentido.

Estou fazendo estas considerações aos meus companheiros senadores e à Nação brasileira para que possamos meditar e ajudar um pouco a encontrar um caminho.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/05/1996 - Página 8876