Discurso no Senado Federal

BOAS-VINDAS AO SENADOR JOSE SERRA, AO ANALISAR A SUA EVOLUÇÃO POLITICA. FALTA DE RUMO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NO CAMPO ECONOMICO.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REGIMENTO INTERNO. :
  • BOAS-VINDAS AO SENADOR JOSE SERRA, AO ANALISAR A SUA EVOLUÇÃO POLITICA. FALTA DE RUMO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO NO CAMPO ECONOMICO.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Casildo Maldaner, Gilberto Miranda, José Serra, Romeu Tuma, Vilson Kleinübing.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/1996 - Página 9410
Assunto
Outros > HOMENAGEM. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, JOSE SERRA, SENADOR, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), RETORNO, SENADO, ANALISE, ATIVIDADE POLITICA.
  • ANALISE, AMPLIAÇÃO, PARTIDO POLITICO, APOIO, GOVERNO, FALTA, DEFINIÇÃO, DIRETRIZ.
  • ANALISE, PROCESSO ELEITORAL, PREFEITURA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, ELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • APREENSÃO, POSIÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).
  • SUGESTÃO, ALTERAÇÃO, METODOLOGIA, ESTABELECIMENTO, ORDEM DO DIA, SESSÃO, DELIBERAÇÃO, MOTIVO, PROBLEMA, FALTA, QUORUM.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de abordar o assunto que me traz à tribuna, também quero dar as boas-vindas ao Senador José Serra.

Não há dúvida alguma de que José Serra é um desses grandes nomes que se impõem ao respeito e à admiração deste País. S. Exª é uma unanimidade nacional com relação à sua competência, à sua garra, à sua vontade de acertar. Sou seu admirador profundo. S. Exª era, nos tempos do nosso velho MDB, uma das pessoas por quem eu tinha a maior admiração, o maior respeito. Fui antecessor de S. Exª na UNE, lá acompanhei sua presença, seu trabalho e seu exílio, e não tenho nenhuma dúvida em dizer que vejo em José Serra um dos grandes nomes deste País.

Nobre Senador, considero uma pena que V. Exª não tenha conseguido ficar mais tempo aqui no Senado porque, diferentemente da Câmara, é mais difícil porque são quinhentos e trinta Deputados, e o tempo é mais compacto. Aqui no Senado, V. Exª teria muito mais tempo para expor, para debater, para analisar, para aprofundar os seus conhecimentos e esclarecer os integrantes desta Casa.

Como candidato ao Senado, não tenho dúvidas de que V. Exª terá um grande desempenho e faço votos de que, eleito prefeito de São Paulo ou não, continue em sua brilhante trajetória.

Não nego que vejo com preocupação sua saída do Governo porque via em V. Exª um direcionamento. Perdoe-me a sinceridade, votei em Fernando Henrique Cardoso. Sempre fui um admirador de V. Exª, de Fernando Henrique Cardoso, de Mário Covas, de Franco Montoro, de José Richa, e, dentro do antigo MDB e do antigo PMDB, esses que terminaram saindo para fundar o PSDB eram aqueles com quem tinha uma maior integração, eram do meu partido em São Paulo. Sofri muito com a saída de V. Exªs. Eu era Governador do Rio Grande do Sul e tive a honra de receber a comitiva dos que estavam saindo enquanto faziam um apelo para que eu saísse junto. Respondi que no Rio Grande do Sul isso era muito difícil, tendo em vista que lá havia uma linha muito clara, ao contrário do que ocorria nos outros Estados do Brasil onde a legenda pouco importava, onde o que importava eram os homens. No Rio Grande do Sul, talvez as legendas importassem mais que os homens. O eleitorado gaúcho não perdoa as pessoas que saem de um partido por essa ou por aquela razão.

Acompanhei o destino do PSDB, com carinho, com respeito. Antes do Governo do Sr. Itamar Franco, quando quis o destino, acompanhei as démarches existentes e não nego, Senador José Serra, que senti-me angustiado quando de repente via que um grupo do PSDB entendia por bem aceitar o apelo, o chamamento do Presidente Collor para integrar seu Governo. Mas V. Exª era um homem que S. Exª fazia questão que estivesse no Ministério da Fazenda, e o Fernando Henrique Cardoso era o homem que S. Exª fazia questão que estivesse no Itamaraty.

Fui um daqueles que procurou o Senador Mário Covas, com quem conversei longamente, e não que o tenha influenciado - quem sou para isso -, até porque o Senador Mário Covas já tinha suas convicções, mas S. Exª próprio acreditava que seria difícil porque se considerava minoria na reunião da executiva que no dia seguinte iria realizar-se para decidir se o PSDB aceitava ou não o convite do PFL.

Vi com satisfação, com profunda satisfação, a decisão do PSDB de não participar do Governo Collor, porque acreditava que esse partido tinha um destino mais profundo, de mais significado.

Veio o impeachment. Dele participamos. Saiu o Presidente, entrou o Sr. Itamar Franco, e nesse Governo tivemos a oportunidade de ver uma manifestação de ação e de trabalho com muitas pessoas do PSDB. V. Exª nos bastidores, o Sr. Fernando Henrique Cardoso no Ministério, primeiro no Itamaraty, depois no Ministério da Fazenda e com seu Plano Real, dando os resultados que conhecemos.

E saiu a candidatura do Sr. Fernando Henrique Cardoso. Internamente, fui um dos que lutaram intensamente para que houvesse uma composição PSDB-PMDB, para que pudéssemos fazer um grande entendimento e, inclusive, recompor o antigo PMDB, de onde se escolheria um candidato.

Penso que V. Exª estava presente a uma reunião na casa do então Deputado pelo Ceará e hoje líder do PSDB aqui no Senado Federal. Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas e muitos parlamentares do PSDB e do PMDB compareceram a essa reunião, na qual foi discutida a possibilidade desse entendimento, que só não ocorreu porque nós do PMDB não podíamos dar a garantia de que venceríamos uma convenção de Orestes Quércia.

Nobre Senador José Serra, torci para que o entendimento entre o PSDB e o PFL, com todo respeito que tenho por este partido, não ocorresse. Eu achava que esse entendimento não se coadunaria com o momento que estávamos vivendo. Eu pensava que se tratava de forças diferentes, de políticas econômicas divergentes. Mas foi dito que aquela era a forma de ganhar as eleições, já que o PSDB precisava do tempo que o PFL dispunha na televisão e da liderança de pessoas como o Senador Antonio Carlos Magalhães, nosso líder do PFL no Nordeste, região em que o PSDB não tinha chances de vencer. Foi feito o entendimento, e a vitória foi consagradora ainda no primeiro turno de votação.

Agora, vejo a composição do Governo e as medidas por ele tomadas. Votei em Fernando Henrique Cardoso. Fui a primeira pessoa do PMDB que veio a esta tribuna dizer que, independente da pesquisa e da prévia que o PMDB faria, eu não votaria no candidato do PMDB, mas sim no candidato Fernando Henrique Cardoso. Desde o primeiro momento, defendi que o PMDB tinha que dar cobertura à candidatura, independente de obter ou não cargos. Assim achei que o PMDB tinha que dar cobertura à candidatura e torcer para que o Sr. Fernando Henrique desse certo.

Nesse momento, estamos vivendo horas difíceis, realmente, e ficarão mais difíceis porque temos pela frente uma campanha eleitoral. Então há as discussões em torno do Plano Real, as interrogações em torno do destino do Governo, as interrogações com relação à saúde, ao social, se é ou não verdade o que diz o Tribunal de Contas, se houve algum equívoco; as interrogações com relação ao desemprego, essas dúvidas dramáticas com relação às prefeituras, principalmente às do interior.

Essa situação é difícil, por exemplo, no meu Estado, onde o Governo sério, honrado, digno do Governador Antônio Britto, que fez, praticamente, tudo aquilo que se possa imaginar sob a orientação de V. Exª e do Presidente da República, no que tange a enxugar a máquina estatal, mas não está conseguindo pagar a folha de salários.

Essas dificuldades todas exigem uma orientação e uma determinação do Governo, que me parece mais firme no sentido de saber qual é essa orientação. O Presidente Fernando Henrique está à margem, porque, hoje, na verdade, o Governo é o partido de V. Exª, o PSDB, é o meu partido, o PMDB, é o partido do PFL, é o partido do Sr. Maluf, do PPB , é o antigo Partido Comunista, o Partido Popular Socialista, que tem, inclusive, o Ministro da Reforma Agrária como o seu titular.

A equipe que dá cobertura ao Governo é a mais ampla e imaginável. Até no Ministério da Cultura está um Ministro que veio do PT, embora se tenha desligado dele. E todos nós sabemos da sua dignidade, competência, seriedade e representatividade dentro do PT.

Então, se analisarmos com base nos números, no significado e no que há, nunca um Presidente da República teve tanta cobertura, uma base tão ampla, tão imensa como tem o Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Na verdade, meu querido líder, extraordinário Senador José Serra, o que sentimos é que está faltando um pouco no que tange a saber qual é o rumo.

Falava-se - embora sinceramente nunca tenha visto - na chamada tentativa da imprensa de colocar V. Exª de um lado e o Ministro Pedro Malan de outro. Honestamente, o que vi foram debates, discussões, diferenças e divergências absolutamente naturais. Nos últimos tempos, dificilmente tenho visto os Ministros do Planejamento e da Fazenda tratando-se com tanta elegância, com tanto respeito, em nível de opinião pública e de sociedade, como foi o caso da convivência de V. Exª com o Ministro da Fazenda.

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Pedro Simon?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª, Senador Casildo Maldaner.

O Sr. Casildo Maldaner - Gostaria, Senador Pedro Simon, de aproveitar este momento, em que V. Exª, da tribuna, reconhece na pessoa do Senador José Serra aquela identidade muito próxima a V. Exª, ao Rio Grande do Sul, ao PMDB de V. Exª, para fazer o mesmo em relação ao PMDB catarinense. Não só como Presidente do meu partido em Santa Catarina, quero dizer dessa identidade que também existe lá. V. Exª falou em José Richa e em tantos companheiros. Até pela vizinhança e pela convivência de muitos anos, Senador Pedro Simon, quero deixar este testemunho e registrar a alegria de vermos aqui esse grande político brasileiro, muito dedicado, um estudioso profundo das questões brasileiras. Neste momento, em que V. Exª está na tribuna, aproveito para também saudar o Senador José Serra. Sei que V. Exª está para analisar um tema e valeu-se da oportunidade da visita do Senador José Serra, a esta Casa, na tarde de hoje. Muito obrigado.

O SR. PEDRO SIMON - Não nego, Senador José Serra, que preocupo-me com a saída de V. Exª. O Presidente Fernando Henrique Cardoso tem razão quando dizia que precisava ter dois "Serra": um para ser o Ministro do Planejamento e o outro para ser candidato à Prefeito da cidade de São Paulo. Não podemos ser ingênuos e deixar de entender o significado dessa eleição em São Paulo. A rigor, o pleito naquele Estado antecipou a eleição presidencial. A eleição, em São Paulo, possui nível nacional, pois aí temos todos os ingredientes de uma eleição nacional.

O nobre Senador com sua personalidade, vida própria e suas idéias, quer queira, quer não, vai às urnas representar José Serra, o PSDB e o Senhor Fernando Henrique Cardoso. E o candidato da querida Luiza Erundina queira ou não, vai representar na eleição o Sr. Lula e o PT.

Mas, o mais importante é que o candidato do PPB à Prefeitura, estará representando aquele que já é candidato à Presidência da República.

Não me parece que o Lula seja oficialmente candidato à Presidência da República. O PT terá um candidato, mas não significa que este seja o Sr. Lula. A cara da Erundina não é obrigatoriamente a cara do Lula. Agora, a cara do candidato à Prefeitura de São Paulo - de quem não recordo o nome, mas que parece uma pessoa ilustre, muito competente - é a do Maluf. Então, Paulo Maluf está jogando o seu destino na eleição de São Paulo, na Prefeitura. Ganhando o seu candidato, S. Exª já está na rua como candidato à Presidência da República; perdendo seu candidato, desaparece o Sr. Maluf, pelo menos como candidato à Presidência da República.

É correta a presença de V. Exª nessa disputa; seu gesto em aceitar o desafio e ser candidato é entendido; mais ainda, merece respeito quando concorda ser candidato numa situação desfavorável. V. Exª poderia ter saído candidato anteriormente, numa composição de seu partido com o PFL, que era a composição natural. Aliados ao Governo Federal, aliados ao Governo Estadual, seria natural que fossem aliados na obtenção da Prefeitura de São Paulo. Se assim fosse, se fosse um candidato do PSDB, do Governo Federal, do Governo Estadual, do PFL à prefeitura, esse não precisaria ser, obrigatoriamente, V. Exª.

Parece que a imprensa relevou que isso passaria pela cabeça de V. Exª. Mas, de repente, com a surpresa do apoio do PFL ao candidato do Sr. Paulo Maluf, o PSDB ficou numa posição isolada. Se V. Exª não fosse candidato poderia dar a entender que, primeiro, o PSDB estava assustado; segundo, que facilitaria o debate entre candidato malufista e candidato do PT, uma vez que o PSDB estaria fora da disputa.

Então, V. Exª, num gesto admirável, num gesto que evidencia a personalidade de um cidadão que concordou ser candidato, não numa hora fácil, quando seria um candidato com uma ampla composição, com um enorme tempo na televisão e com uma vitória, presumidamente mais tranqüila. Isso aconteceu quando o PFL, surpreendendo a todos, foi fazer um acordo com o Sr. Paulo Maluf - digo surpreendendo porque o PFL nasceu por causa do Sr. Maluf. O PFL existe porque é composto por homens do PDS que tinham um candidato à Presidência da República, mas não aceitavam o Sr. Paulo Maluf, queriam uma outra candidatura que não a dele. Quando o Sr. Paulo Maluf ganhou a candidatura à Presidência da República, um grupo saiu do PDS e criou o atual PFL.

No momento em que aconteceu o que ninguém imaginava, que o PFL de São Paulo apoiaria o Sr. Paulo Maluf, V. Exª teve a atitude de, sem discutir se iria ficar bem, se mal, se teria 10 ou 3 minutos, se ganharia ou não, aceitar esse desafio. Destaco esse gesto de V. Exª com o maior respeito, é um gesto admirável, uma atitude que tem que ser ressaltada porque é verdadeira.

Agora, sinto a saída de V. Exª porque estou vivendo uma fase muito difícil. Li tudo que V. Exª escreveu, que Fernando Henrique escreveu. Li muita coisa. Passei minha vida inteira lendo. Portanto, para esquecer é difícil.

Não sou ingênuo, não tenho a competência de V. Exª, Senador, sei que o mundo mudou. Quem não sabe? Não existe mais União Soviética; não há mais o Leste Europeu; não há mais Muro de Berlim; não há mais comunismo. Estamos vivendo um debate, uma discussão extraordinariamente competente e séria, responsável e necessária. Sabemos que não podemos pegar um livro de 30 anos e, com base nele, fazer um comentário no mundo de hoje. O mundo de hoje é outro.

Naquela época, havia a opção de ser do Primeiro Mundo, da Europa, pró-americano; ou comunista, da Rússia, dos chamados países não alinhados. Hoje isso mudou. Mas, em meio a todas essas mudanças, há muitas interrogações. Por exemplo, vejo muita gente debatendo e discutindo o fenômeno da globalização; porém, a globalização encerra muitas interrogações. Os americanos sabem o querem com a globalização; os russos e os japoneses também, mas nós brasileiros não sabemos. Em que pé vai nos pegar essa globalização? Quais são os objetivos que o Brasil visa com a globalização? E para quê? Para ficar de braços cruzados assistindo para aonde o mundo vai? Ou já sabemos, dentro da chamada globalização, quais os nossos planos, quais os esquemas do País?

Por isso, preocupo-me com a saída de V. Exª do Ministério. V. Exª é um homem em quem eu depositava a maior confiança e a maior credibilidade. Não nego. Por causa da vasta competência de V. Exª, a sua saída da equipe ministerial me preocupou.

Eu sei, também, da posição de V. Exª a favor da privatização da Vale do Rio Doce. O seu entendimento é pura e simplesmente privatizar a Vale do Rio Doce no seu conjunto total, global.

Concordo, nobre Senador Serra, em pegar a Vale do Rio Doce, que é um aglomerado de trinta empresas, e privatizar uma viação férrea, uma mina que já está funcionando, um porto. Vamos privatizar vinte ou vinte e cinco das empresas que a compõem. Mas não vamos privatizá-la no seu todo, nos seus títulos, na sua competência. Como diz Aureliano Chaves, privatizar a Vale do Rio Doce, é privatizar o subsolo, é entregar para alguém o nosso subsolo, é entregar para uma empresa estrangeira o subsolo brasileiro.

Ouvi o seu sucessor, em sua primeira declaração - ninguém a pediu, ele fez questão de dizer - dizer que quer privatizar a Vale ainda este ano. V. Exª, em suas entrevistas, dizia que pretendia privatizar a Vale do Rio Doce "no decorrer do ano que vem". Ele fez questão de mostrar a primeira diferença com relação a V. Exª: ele quer privatizar a Vale este ano. O seu sucessor fez declarações à imprensa - perdoe-me, Senador José Serra - , até com uma certa deselegância. Penso que ele deveria ter esperado V. Exª entregar o cargo e falar sobre esse assunto só daqui a dez dias.

O Ministro Kandir fez questão de dizer abertamente que era favorável à privatização da Companhia Vale do Rio Doce já neste ano, que a Vale tem que ser privatizada ainda neste ano, enquanto toda a imprensa comentou que V. Exª pensa que esse é um assunto para ser discutido no ano que vem, ou pelo menos até o ano que vem.

Evidentemente, tenho todas as informações positivas do Sr. Kandir: que ele é um homem culto, que é gênio, que é uma pessoa fantástica, que tem todas as qualidades. Mas ele ocupou a posição que era de V. Exª no Governo Collor, no tempo da Ministra Zélia, na época do lançamento do Plano Collor, dizem que foi ele o autor da idéia do confisco do dinheiro brasileiro.

Tive a oportunidade de conversar, numa ocasião, com o Sr. Fidel Castro. Ele perguntava para uma pessoa, para outra e não conseguia entender como o Presidente Collor tinha confiscado o dinheiro das contas-correntes. "Contas-correntes?!", exclamou. "Eu fiz uma revolução, fechei tudo, fechei até o Congresso em Cuba e não tive coragem de mexer nas contas-correntes. E aqui no Brasil mexeram em conta-corrente?"

Esse é o Sr. Kandir: um homem de personalidade, um homem de autoridade, um homem de peso, um homem que representou o Plano Collor I e o Plano Collor II. Quais as modificações que teremos? O que vai mudar com a saída de V. Exª e com a presença do Sr. Kandir no Ministério?

O Sr. José Serra - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª com prazer, com a maior honra. Quero que V. Exª entenda, em primeiro lugar, que é com o maior carinho e afeto, ainda que divergindo em alguns pontos, que estou me referindo a V. Exª. Faço-o com o respeito que sempre tive e que continuo a ter por V. Exª

O Sr. José Serra - Nobre Senador Pedro Simon, gostaria realmente de agradecer a V. Exª as referências de natureza pessoal. Todos sabem que somos amigos pessoais há muitos anos. A respeito das outras questões de economia, de política, creio que teremos oportunidade de ter um debate profícuo sobre esses assuntos tanto neste plenário quanto pessoalmente. Quero dizer a V. Exª também que estou seguro de que o País não se decepcionará com o Ministro Antônio Kandir, que é um homem sério, competente e em quem tenho muita confiança. Peço a V. Exª, invocando a nossa amizade, que me permita ausentar do plenário agora, porque tenho compromissos para os quais estou atrasado e que são realmente impostergáveis. Aqui permaneci em função das palavras de V. Exª. Mas peço perdão por ter que me retirar neste momento. Receba o meu abraço. Muito obrigado.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço profundamente a manifestação de V. Exª

Retorno, Sr. Presidente, ao assunto que me trouxe à tribuna. Não houve quorum hoje. Falo isso porque V. Exª é autor dos estudos feitos para melhorar a organização administrativa desta Casa.

Na Ordem do Dia de hoje, constavam duas matérias: Projeto de Decreto Legislativo nº 191, que se refere a um Acordo de Cooperação Comercial, Econômica e Industrial com o Governo da Turquia, e o Projeto de Lei do Senado nº 134, que trata de reparação de natureza econômica devida aos aeronautas civis e militares impedidos de exercer a profissão.

Essa foi a Ordem do Dia de hoje, Sr. Presidente, terça-feira. Amanhã, quarta-feira, teremos na Ordem do Dia um projeto de lei da Câmara que institui a residência médico-veterinária e determina outras providências.

Esses são os três projetos que seriam votados nesta semana. Os dois primeiros projetos citados seriam votados hoje, mas não houve quorum. Se houver quorum, votaremos amanhã essas três matérias.

Sr. Presidente, tenho participado de algumas reuniões com Deputados e tenho ouvido queixas sobre os trabalhos naquela Casa do Congresso, onde as votações são feitas e ninguém sabe a matéria que está sendo votada, nem o que se vai votar no dia seguinte. No Senado, as coisas mudaram.

Veja, estamos no dia 04 de junho e já estão publicadas as matérias que serão votadas na Ordem do Dia dos dias 19, 21, 27, 28, ou seja, até o fim do mês.

Sr. Presidente, eu sei quais as matérias que serão votadas até o fim do mês. É um grande mérito. Felicito o Presidente José Sarney e a Mesa por essa providência que acho extremamente positiva.

Entretanto, essa ainda não é a idéia que defendo. Defendo que haja uma reunião ordinária do Senado Federal, com os 81 Senadores, quando a Mesa nos informará quais as matérias que precisam ser votadas e nós decidiremos como será a Ordem do Dia. Nessa reunião poderíamos decidir não apenas sobre essas matérias, Sr. Presidente, mas, por exemplo, se vamos ou não comprar automóvel; se vamos ou não fazer reformas gerais nisso ou naquilo; se vamos ou não construir um novo anexo. Entendo que essas decisões deveriam ser de todo o Plenário e não apenas da Mesa.

Enquanto não houver essa sessão ordinária mensal, que é a tese que defendo, volto a repetir o que tenho dito: a Mesa está cometendo um outro erro, se V. Exª me permite dizer isso. Para que fazer uma sessão hoje e uma sessão amanhã para votar três matérias sem nenhum significado? Porque quinta-feira é feriado? Por que não fazer votações em certos dias, tais como, segunda-feira, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e, se for o caso, até no domingo? Em vez de viajarmos toda semana, poderíamos viajar duas vezes por mês.

Por exemplo, nesta semana vim de Porto Alegre e, amanhã à tarde, voltarei. Vou gastar mais tempo no avião do que aqui no Senado Federal.

Estou dando um exemplo típico, Sr. Presidente. Se observar a Ordem do Dia de hoje e a de amanhã, V. Exª verá que há apenas três projetos em pauta, os quais poderiam ter sido votados na sexta-feira da semana passada, se tivesse havido sessão deliberativa, ou na segunda-feira ou na sexta-feira da próxima semana. Isso evitaria o que está havendo aqui: hoje, terça-feira, não houve quorum, amanhã provavelmente também não haverá. Os Parlamentares vêm, ficam aqui dois dias e depois vão embora.

Volto a repetir, Sr. Presidente: se fizéssemos uma sessão em que toda a pauta fosse votada, seria muito mais produtivo. Todos sabemos, por exemplo, que na quarta-feira e na quinta-feira da Semana Santa não há quorum, como também não há na primeira semana de novembro por causa do Dia de Finados e do Dia de Todos os Santos. Então sugeri que nessas semanas não viéssemos, mas, em compensação, nas seguintes trabalharíamos segunda, terça, quarta, quinta, sexta e sábado, se necessário. Alguém me respondeu que no sábado ninguém trabalha. Isso não importa. Mesmo que ninguém trabalhasse no sábado, Senadores trabalhariam.

Só estou dizendo isso por causa do exemplo claro que estamos tendo neste momento: nós viemos aqui hoje, e não houve quorum. É natural que não haja quorum. O Parlamentar que recebeu essa Ordem do Dia na semana passada, deve ter pensado: na Ordem do Dia de terça-feira será votado um convênio com o Governo da Turquia, mas qual é o significado dessa votação? Zero. Também será votada matéria de interesse dos aeronautas. Qual é a importância política disso? Zero. Por que o Parlamentar viria aqui e perderia uma semana em Brasília por causa disso?

Volto a repetir: a racionalidade nos mostra que, ao fazer a Ordem do Dia, a Mesa deve pensar nisso. É claro que ela não pode, de repente, incluir todos os projetos na pauta de três dias, para que depois fiquemos um tempão fora. Não é isso que estou defendendo, Sr. Presidente. O que estou defendendo é uma semana de seis dias: segunda-feira, terça-feira, quarta-feira, quinta-feira, sexta-feira e sábado. Assim, evitaria o que sempre ocorre quando a semana é de três dias: as Comissões especiais não podem reunir-se por falta de quorum.

Se a semana for de pauta cheia, inclusive sábado, as comissões poderão reunir-se porque haverá quorum.

Faço esse apelo, a fim de colaborar com o Presidente Sarney, a quem quero fazer justiça. O Presidente Sarney disse, e é verdade, aqui não tem ficado projeto engavetado na Mesa. O mesmo não acontece na Câmara dos Deputados. Aqui o projeto pode ficar engavetado na comissão, como já aconteceu. O projeto da reforma agrária, de autoria de um Senador, ficou não sei quanto tempo mas na comissão. O Presidente Sarney poderia cobrar celeridade da Comissão, mas não é responsabilidade dele.

Faço justiça ao Presidente José Sarney, porque os projetos que chegam à sua mesa imediatamente são colocados na pauta de votação.

A assessoria do Presidente diz que, às vezes, na hora da votação, um Senador pede adiamento e o final do prazo cai em véspera de feriado. Por exemplo, vamos dizer que tenham pedido adiamento da votação desse item referente à Aeronáutica e que o término do prazo seja hoje. Nesses casos, o Secretário-Geral da Mesa poderia sugerir aos Senadores que pedissem adiamento por um prazo tal que o final dele não caísse em véspera de feriado ou numa sexta-feira.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - V. Exª concede-me um aparte, nobre Senador Pedro Simon?

O SR. PEDRO SIMON - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Primeiro gostaria de dizer a V. Exª que hoje há quorum, há 49 Senadores na Casa, conforme o painel.

O SR. PEDRO SIMON - Mas não estavam presentes no início da Ordem do Dia e por isso não houve votação.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Mas os Senadores não foram chamados regimentalmente, o que é obrigatório.

O SR. PEDRO SIMON - O Presidente disse que não haveria Ordem do Dia porque não havia quorum.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Gostaria de dizer, Senador Pedro Simon, que a Presidência da Câmara dos Deputados não engaveta projetos. Desculpe-me V. Exª, mas cabia-me fazer essa ressalva.

O SR. PEDRO SIMON - Nobre Senador, não tenho o objetivo de analisar o que está acontecendo na Câmara dos Deputados no sentido de engavetar ou não projetos. Também não me passa pela cabeça dizer que o ilustre Presidente daquela Casa, pelo qual tenho o maior respeito, engaveta projetos. O que queria dizer é que a Câmara dos Deputados continua a funcionar como funcionava o Senado, quer dizer, não há a determinação da Ordem do Dia.

Em uma das reuniões levei, deliberadamente, uma Ordem do Dia daqui, e até o Líder do PMDB ignorava que aqui no Senado nós recebemos a Ordem do dia do mês inteiro. Assim, todos sabemos que em uma sexta-feira, que é dia de sessão não deliberativa, não adianta os Líderes se reunirem, não adianta o Plenário discutir, porque nenhuma matéria poderá ser votada, pois não haverá quorum. Nesta semana, por exemplo, quinta-feira é feriado e sexta-feira, dia 6, como está aqui escrito, haverá sessão não deliberativa. Sabemos que não haverá votação.

Na Câmara não é assim, eles não têm nada. Não recebem a Ordem do Dia com antecedência. Não estou referindo-me ao atual Presidente, pelo amor de Deus. Estou dizendo que é a tradição que vem de lá; sempre foi eito assim. Se V. Exª for à Câmara hoje e perguntar qual é a ordem do dia de amanhã, ninguém saberá. Viajei com o Deputado Jair Soares, e eu lhe disse que soube que na Câmara não haveria votação. S. Exª ficou espantado e me disse que o avisaram que iriam abrir o painel. Quer dizer, a informação que eles têm é a de que vão abrir painel. Se o painel foi aberto e se eles não estiverem presentes, receberão falta.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Senador Pedro Simon, adiantamos os trabalhos abrindo o painel e discutindo as matérias. Hoje mesmo não se perdeu tempo. Podíamos ter apreciado várias matérias, já que temos aqui organização, discutiríamos, encerraríamos a discussão e só ficava faltando a votação. Ganhava-se tempo também. Não é problema de se ter a terça e a quarta-feira, seria útil. Não concluía a votação, mas adiantava os trabalhos.

O SR. PEDRO SIMON - Perdoe-me V. Exª, mas penso que o que estou fazendo hoje nesta sessão podia ter feito na sexta-feira. Não precisava ter vindo hoje. Não sou contra vir. Se depender de mim, viremos 30 dias por mês, mas 30 dias com pauta para discussão. O que não posso entender é que na sexta-feira não tenha votação. Consta da pauta de terça-feira matéria que podia ter sido posta na sexta-feira. É essa a minha questão. O dia de hoje é claro que não estamos perdendo, por amor de Deus, mas perdemos a sexta-feira e também a segunda-feira passada

É claro que não estamos perdendo o dia de hoje, mas perdemos a sexta-feira; poderíamos ter ficado aqui na sexta-feira ou na segunda-feira passadas.

Em vez de apenas três sessões deliberativas, poderia haver seis sessões deliberativas por semana. Se necessário, poderia haver seis sessões deliberativas por semana durante todos os meses.

Todos sabem que a próxima quinta-feira será feriado nacional de Corpus Christi e que os dias 1 e 2 de novembro são feriados de Finados e Dia de Todos os Santos. Todos sabiam que, durante a Semana Santa, não haveria sessão. Essas são datas conhecidas por todos.

Pode-se evitar vir até aqui num dia e voltar no seguinte. Quando houvesse feriado, não haveria sessão na véspera dele. Quando não houver feriado, haverá sessões na segunda-feira, na terça-feira, na quarta-feira, na quinta-feira, na sexta-feira e no sábado. Não sei se estou dizendo algo ridículo, mas isso me parece muito racional. Sinceramente, penso que esse é o exemplo que se deve seguir.

Estávamos ontem aqui. Três projetos estavam incluídos na Ordem do Dia e poderiam ter sido votados na quinta-feira ou na sexta-feira passadas, mas os mesmos serão votados somente na próxima semana. Mesmo assim, reconheço que estamos muito avançados em relação à Câmara dos Deputados. As nossas votações estão muito adiantadas, comparando com a Legislatura passada, na qual não recebíamos os roteiros das sessões. Numa quinta-feira, num final de tarde, convocava-se uma sessão extraordinária para ser realizada às 20 horas. Dessa forma, num final de sessão, foi votado o Projeto Sivam. Não foi, Sr. Presidente? Eu era Líder do Governo e não fiquei sabendo.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy) - À noitinha.

O SR. PEDRO SIMON - À noitinha.

O Sr. Gilberto Miranda - Não mudou nada agora.

O SR. PEDRO SIMON - Não, mas o Sivam foi votado num dia em que V. Exª não estava.

O Sr. Gilberto Miranda - Votado em regime de urgência urgentíssima.

O SR. PEDRO SIMON - O que mudou é que V. Exª não estava aqui para votar. Devia estar aqui para votar.

O Sr. Gilberto Miranda - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Pois não.

O Sr. Gilberto Miranda - Lamento, mas, se V. Exª acompanhasse o que acontece na Casa, a tramitação dos requerimentos de autorização, V. Exª não estaria falando isso. Eu pedi autorização para me ausentar do País, a fim de tratar de assunto pertinente à Comissão de Assuntos Econômicos - a regulamentação do art. 192 da Constituição. O Senador José Fogaça, do seu Estado, é o Relator dessa matéria. Pedi autorização ao Senado na quinta-feira, e o Senado votou a autorização. Eu estava nos Estados Unidos quando soube, pela imprensa, que a matéria seria colocada em pauta em regime de urgência urgentíssima. Imediatamente, telefonei para o Líder do nosso Partido, depois, para o Líder do Governo, Senador Elcio Alvares, e também para o Ministro Luís Carlos Santos, e disse que, mais uma vez, estava se cometendo um erro, porque estava se decidindo às pressas, não devia ter urgência urgentíssima. O Líder do Governo disse-me que ainda pensava em pedir a dispensa de interstício, para votar o projeto no mesmo dia. Então quero deixar claro a V. Exª e ao Plenário que eu estava no exterior tratando de assunto da Comissão. As passagens e todas as despesas foram pagas por mim mesmo, o Senado não pagou nada. Eu trouxe muito material, que foi entregue ao Senador José Fogaça. Entretanto, enquanto eu estava fora, os Srs. Líderes assinaram o pedido de urgência urgentíssima. Todos aqueles que criticaram o que aconteceu no passado assinaram a urgência urgentíssima. Isso é só uma explicação para V. Exª.

O SR. PEDRO SIMON - Quero fazer justiça a V. Exª e retificar: V. Exª tem razão.

Eu votei contra a urgência urgentíssima; um grupo de Senadores o fez. V. Exª tem tanta razão, que um dos argumentos que usei no meu pronunciamento se identifica com o que estou falando agora.

Se nós e o Presidente José Sarney, que não está presente, havíamos decidido que a pauta seria publicada com antecedência, por que, de repente, um projeto da importância do Sivam foi votado com urgência urgentíssima? V. Exª tem razão: é um erro grave que o Senado cometeu, que os Líderes e a Mesa do Senado cometeram.

Embora tenha votado contra a urgência urgentíssima, sou obrigado a reconhecer que V. Exª tem razão e peço-lhe desculpas. Essa é uma daquelas exceções, que, na verdade, não constitui mais a tradição. Concorda V. Exª?

Lembro-me, como se fosse hoje, de que chegou ao Senado, numa sexta-feira, proposta de concessão de R$500 milhões para a Embraer. Tudo tinha de ser feito naquela sexta-feira; às 18h, reuniram-se todos. Foi algo fantástico. O projeto, aprovado na Câmara - não sei quanto tempo tramitou naquela Casa -, chegou ao Senado, não passou por nenhuma comissão, foi direto para o Presidente. Não houve nenhuma publicação, e foram dados R$500 milhões para a Embraer, porque isso era necessário à empresa.

Em tese, isso não está mais acontecendo. V. Exª salientou, e faço justiça: é verdade; não devia ter acontecido com o Projeto Sivam, mas aconteceu. No entanto, a regra é de que isso não mais ocorra.

Aqui, está publicado. Deixe-me esclarecer. Está errado e não deveria ter acontecido. Mas, pelo menos, foi num dia que havia sessão deliberativa, com Ordem do Dia. Naquele dia, como vai ser o de amanhã, por exemplo, havia sido marcada uma sessão com Ordem do Dia.

Na Câmara dos Deputados, convoca-se uma reunião extraordinária a qualquer hora e coloca-se em votação a qualquer hora. Basta os líderes determinarem; eles se reúnem, assinam e vota-se a urgência urgentíssima a qualquer hora. É exatamente o que acontece naquela Casa. Ou se vota como se quer, a hora que se quer, ou não se vota nunca, quando não se quer, e o projeto fica na gaveta.

Caso típico: aprovamos no Senado Federal um projeto do Senador Itamar Franco, que estabelecia a quarentena para os diretores do Banco Central. Enviamos três ofícios à Mesa da Câmara dos Deputados - V. Exª sabe disso -, fazendo um apelo no sentido de que a matéria fosse colocada na Ordem do Dia a fim de ser votada. Mas, não tem jeito. Até agora não entrou na pauta da Ordem do Dia.

O Sr. Vilson Kleinübing - Permite V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Vilson Kleinübing - Aproveito o discurso de V. Exª para registrar uma estranheza. Primeiro, V. Exª reclamava de não haver matéria para votar; depois, reclamava da urgência para votar, que os líderes votaram a urgência para um projeto que estava há dois anos no Senado. Sobre a questão das datas de votação, aproveito o discurso de V. Exª para fazer uma colocação.

O SR. PEDRO SIMON - V. Exª não estava ouvindo o meu discurso? Só ouviu esta parte?

O Sr. Vilson Kleinübing - Só esta parte.

O SR. PEDRO SIMON - Então, está explicado.

O Sr. Vilson Kleinübing - Nobre Senador, quero dizer a V. Exª que já apresentei à Mesa do Senado, àquela comissão que estava tratando da reforma administrativa e do Regimento Interno, uma proposta. Por que temos que ficar quatro semanas por mês aqui? Por que não fazemos votações de segunda à sexta-feira? Votação de matérias necessárias, urgentes. Porque do que o Brasil menos precisa hoje é de leis. Mas, se é para votar, vamos votar de segunda à sexta-feira, durante três semanas, e assim teremos condições de ficar uma semana em nossos Estados.

O SR. PEDRO SIMON - V. Exª não ouviu o meu discurso. É exatamente disso que eu falava.

O Sr. Vilson Kleinübing - Só para acrescentar: para que isso funcione, teríamos que diminuir o número de passagens, uma vez que só vamos viajar uma vez por mês para nossos Estados; ao invés de termos quatro passagens por mês, teríamos apenas uma.

O SR. PEDRO SIMON - Não fale isso. Vá devagar. Se falar em tirar passagem, obviamente essa reforma administrativa não passará. Por enquanto, não estou tocando na passagem. V. Exª atrapalhou tudo. O meu projeto não fala em passagem. Agora que V. Exª fez referência a isso, não passará mesmo.

O Sr. Vilson Kleinübing - Senador, não é que eu queira atrapalhar, mas já apresentei essa proposta, por escrito, à Mesa; ela é do conhecimento da Mesa.

O SR. PEDRO SIMON - É por isso que o meu projeto não passa. Os Senadores já estão pensando que vão perder a passagem.

De acordo com meu projeto, poderemos viajar uma vez por mês. Permaneceremos 15 dias aqui, e depois poderemos viajar aos nossos Estados.

O Sr. Vilson kleinübing - Ou três semanas aqui e uma semana em nosso Estados.

O SR. PEDRO SIMON - Isso mesmo. O que V. Exª propõe é racional. Eu só acho que a Ordem do Dia é que vai dizer. Por exemplo, na Semana Santa, normalmente não se deve vir, pois sabemos que não se vota nada; da mesma forma, na semana do Dia de Finados. Assim, ou se vota antes ou depois dessa semana com feriados.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - As lideranças também têm trabalho em seus Estados, tanto V. Exª sabe disso, porque foi governador, como o Senador Kleinübing.

O SR. PEDRO SIMON - Eu quero agradeço a V. Exª, Senador Kleinübing, que, sem ter assistido ao meu pronunciamento, diz exatamente o que estou dizendo. Pensamos da mesma maneira.

O Sr. Vilson Kleinübing - Como V. Exª deve ter notado, eu estava passando pelo plenário e me interessei pelo assunto, exatamente porque fiz essa proposta à Mesa, não com o objetivo de constar da pauta, porque não estou tão preocupado em produzir leis. Na minha opinião, devemos modificar esse conceito de que só se trabalha estando presente, batendo o ponto. Trabalhar é coisa completamente diferente disso. Ao contrário, precisamos de uma pauta menor e mais enxuta, com menos bobagens, como os requerimentos de ausência, e de mais trabalho nas comissões. Como estou a fazer um aparte, e V. Exª está com tanta vontade de falar, que até fez um aparte ao meu aparte, eu agradeço a V. Exª o aparte.

O SR. PEDRO SIMON - Realmente, não fui feliz e peço desculpas. O que eu queria dizer era exatamente o contrário. V. Exª está abordando, agora no final, assunto da maior importância. Eu queria apenas antecipar quão importante era a sua afirmativa. Defendo a mesma tese de V. Exª. O problema não é votarmos leis, Ordem do Dia; o Senado tem condições de fazer o grande debate nacional e promover as grandes discussões. Mas falar para valer!

Hoje, tive a oportunidade de dizer isso à Senadora Benedita da Silva, no momento em que ela falava sobre um fato ocorrido no Rio de Janeiro. Foi um absurdo o que aconteceu, mas não era razão para vir aqui fazer um discurso. Vem ela, faz um discurso, depois eu, em seguida V. Exª, quando o que devemos fazer é discutir aquela questão. E como vermos essas questões? É difícil na Câmara porque lá são mais de quinhentos Deputados, mas aqui no Senado é possível. Tenho feito propostas nesse sentido. Por exemplo, as sessões de sexta-feira e algumas outras reuniões podem ser transformadas em reuniões quase que informais. Vem um orador para a tribuna, conversamos, debatemos, a fim de estabelecermos propostas.

Sr. Presidente, muito mais que o discurso, muito mais que o projeto de lei, muito mais que a manchete do jornal, o Senado deve aproveitar essa chance que temos. Bem ou mal, é o único lugar do Brasil onde isso é possível, fazendo alguma coisa ou fazendo nada. Aqui gente importante como V. Exª se reúne durante três horas, portanto, com chances de assim fazer. Nós já temos que estar aqui em Brasília, ganhamos para isso, moramos na cidade. O que nos impede de, com profundidade e seriedade, debatermos? A questão não é fazer um discurso bonitinho, publicar, mandar para a minha base e achar que está resolvido, que minha parte já está feita. Eu não acho correto.

Eu me considero responsável pelo que aconteceu no Rio de Janeiro. Eu, Pedro Simon, considero-me responsável pela minha omissão! Essa história de dizer que é responsabilidade do Ministro Jatene, que é responsabilidade do Governo, não! Nós também somos responsáveis. O que este Senado tem feito em termos de saúde? Debatido, analisado, discutido, aprofundado a questão? E não é apenas saúde. Há 40 milhões de pessoas que vivem à margem de tudo!

Então, penso que o caminho é o debate, as discussões, o fato de sentarmos, colaborarmos, falarmos anonimamente. Não é a Lei Pedro Simon, nem a lei Kleinübing, nem o discurso Kleinübing, não! Somos nós, no conjunto.

Eu não fui feliz na maneira de falar, mas o que eu quis dizer é que V. Exª abordou o problema com rara inteligência, o que eu considero da maior importância. Tem razão V. Exª: não é mais uma lei ou menos uma lei, porque leis o Brasil tem demais! Agora, de trabalho coletivo, de participação no sentido de ajudar...

Imaginem os senhores se aqui não há pessoas competentes o suficiente para irem ao Senhor Fernando Henrique Cardoso e dizerem: olha, Senhor Presidente, acho que essa matéria deve assim, ou assado. Acredito que essa seja até uma obrigação nossa. Em vez de falarmos, criticarmos, poderíamos assim fazer. E temos condições para isso.

V. Exª tem toda razão. Poderíamos aproveitar muito do nosso tempo em costurar aquilo que se chamam as saídas para este País.

O Sr. Vilson Kleinübing- Obrigado, Senador Pedro Simon, era exatamente isso que gostaria de assinalar. Poderíamos eleger temas importantes. Os Líderes escolheriam, por exemplo, dívida pública nacional. Naquela sessão, todos daríamos a nossa contribuição, com informações e debates a respeito. Poderíamos transformar o Senado numa casa de debates, produzindo pelo menos a tentativa do consenso em torno de algumas idéias, para, depois, facilitar as votações, tornando-as muito mais otimizadas em termos de trabalho. Era a observação que eu queria fazer. Quanto à pauta, se o Regimento pudesse eliminar certas matérias que votamos aqui, se pudesse haver resolução da Mesa, facilitaria muito o nosso trabalho. Obrigado por ter-me concedido o aparte.

O SR. PEDRO SIMON - Muito obrigado, fico contente em ver que pensamos da mesma maneira em mais uma questão.

O Sr. Romeu Tuma - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Romeu Tuma - Senador Pedro Simon, hoje, conversava com alguns Senadores sobre o assunto. Julgo oportuno o tema que V. Exª traz ao debate nesta Casa. Tratam-se de audiências públicas que, provavelmente, dentro da tese do Senador Vilson Kleinübing, poderíamos realizar, de vez em quando, para discutir os grandes temas que têm afligido alguns Senadores nesta Casa.

O SR. PEDRO SIMON - Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy) - Senador Pedro Simon, o tempo de V. Exª está esgotado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/1996 - Página 9410