Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE DECLARAÇÕES DO JORNALISTA ARNALDO JABOR EM NOTICIARIO DA REDE GLOBO, NA NOITE DE ONTEM. ESCLARECIMENTOS SOBRE O ASSUNTO TRATADO NA PRESENTE SESSÃO PELO SR. VALMIR CAMPELO, RELATIVAMENTE A BARGANHA POLITICO-ELEITORAL, A PROPOSITO DA ENTREVISTA DE S.EXA. AO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO. IMPRENSA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE DECLARAÇÕES DO JORNALISTA ARNALDO JABOR EM NOTICIARIO DA REDE GLOBO, NA NOITE DE ONTEM. ESCLARECIMENTOS SOBRE O ASSUNTO TRATADO NA PRESENTE SESSÃO PELO SR. VALMIR CAMPELO, RELATIVAMENTE A BARGANHA POLITICO-ELEITORAL, A PROPOSITO DA ENTREVISTA DE S.EXA. AO JORNAL O ESTADO DE S.PAULO.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/1996 - Página 9208
Assunto
Outros > LEGISLATIVO. IMPRENSA.
Indexação
  • CRITICA, AUTORITARISMO, PROJETO, LEI DE IMPRENSA.
  • DEFESA, CONGRESSO NACIONAL, CRITICA, NEGOCIAÇÃO, VOTO, DIVERGENCIA, ETICA, DEMOCRACIA, QUESTIONAMENTO, CONGRESSISTA, ASSINATURA, EMENDA, OPOSIÇÃO, VOTAÇÃO.
  • COMENTARIO, INEXATIDÃO, ENTREVISTA, ORADOR, IMPRENSA, REJEIÇÃO, ACUSAÇÃO, DESVALORIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, CRITICA, CONGRESSISTA, OMISSÃO, VOTAÇÃO, MATERIA, DEFESA, PRERROGATIVA, LEGISLATIVO.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PDT-SE. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, também gostaria de tecer alguns comentários sobre o episódio Arnaldo Jabor, até porque fui informado que, neste Plenário, antes de eu chegar, foi feito um paralelo entre as declarações do cineasta e outras de Parlamentares desta Casa. Alguns referiam-se diretamente a mim; outros, nas entrelinhas. Devemos ressaltar aspectos importantes nesse episódio.

Acredito que, em função das declarações do Sr. Arnaldo Jabor, o Congresso Nacional contra-ataca com a ameaça da agilização da draconiana Lei de Imprensa que está em discussão na Câmara dos Deputados. Lei esta que prevê, inclusive, detenção de jornalistas.

Em outra oportunidade, fiz pronunciamento, nesta Tribuna, referente à prisão de um profissional sergipano que cometeu o crime de transcrever uma entrevista do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Sergipe -, e que foi condenado a um ano e seis meses de prisão.

O primeiro aspecto a ser registrado é que, na minha opinião, não dá para voltarmos a brandir essa arma, mesmo porque, até onde eu saiba, o Sr. Arnaldo Jabor não é jornalista; é um cineasta, aliás muito mais talentoso como cineasta do que como analista político.

Segundo lugar: neste episódio me parece que se encaixa muito bem aquele ditado que existe no Nordeste, e que foi brilhantemente utilizado numa música de Geraldo Vandré, que diz que é "a volta do cipó de aroeira no ombro de quem mandou dar". Não é a primeira vez que o Sr. Arnaldo Jabor faz pronunciamentos ofensivos, se não à Instituição, mas pelo menos a uma parcela da Instituição cuja existência é necessária para uma democracia.

O Sr. Arnaldo Jabor tem-se revelado, tanto como articulista no jornal O Globo como comentarista na TV Globo, um bem-humorado porta-voz do Governo Fernando Henrique Cardoso, classificando as Oposições de trogloditas e atrasadas. Lembro-me de que, certa vez, ele escreveu uma crônica, mostrando uma santa aliança entre os bolcheviques, os esquerdistas, os atrasados e os arcaicos, citando inclusive o Presidente desta Casa, Senador José Sarney. E não me recordo de ter visto manifestações nesta Casa contra esta crônica.

Quando se fala em fisiologismo - aí eu gostaria de entrar na discussão da tentativa de comparação entre o que o Sr. Arnaldo Jabor disse e uma possível entrevista que eu teria dado. Tive, inclusive, conhecimento, ao chegar aqui na terça-feira, de um pronunciamento do Senador Valmir Campelo a respeito de uma entrevista, que eu teria dado e que, segundo ele, teria manchado toda a Instituição. A reportagem fôra publicada no sábado - eu não a lera - e o pronunciamento havia sido feito na segunda-feira. Cheguei na terça e considerei que voltar ao assunto seria "gastar muita vela com defunto ruim."

Como o assunto surgiu de novo, quero registrar a minha posição. A instituição Congresso Nacional merecerá sempre a defesa da Bancada do Partido dos Trabalhadores e a defesa deste Parlamentar. Mas não confundam a defesa da instituição Congresso Nacional com a defesa cega e corporativa de comportamentos de Parlamentares. Não confundam, porque não terão a minha defesa, mesmo porque quem falou em fisiologismo não fomos nós. Uma nota oficial da Presidência da República diz: "não vamos mais barganhar questões regionais, para aprovar nossas reformas constitucionais". "Não vamos mais", isso está escrito na nota oficial da Presidência da República. Se "não vamos mais" significa que barganhamos antes; deixamos, agora, de fazê-lo.

Então, vamos deixar essa história de inocentes e anjos ofendidos, como se não houvesse barganha político-eleitoral nesta Casa e na Câmara dos Deputados. O próprio conceito de barganha é diferente.

Tive oportunidade de fazer um debate com o Deputado José Aníbal, Líder do PSDB na Câmara dos Deputados, quando da segunda votação da reforma da Previdência, na qual o Governo ganhou, e ele disse que não houve barganha, que foi um jeito legítimo dos parlamentares de Rondônia, se não me engano, conseguirem liberação de uma verba.

Ora, pergunto: o que tem a ver liberação de verba para Rondônia, ou para o Amapá, ou para Sergipe, ou para Bahia, ou para o Rio de Janeiro com votação de reforma da Previdência? A divergência é de conceito.

Alguns acham que Senadores ou Deputados mudarem seu voto em temas nacionais em função de barganhas regionais - que podem até, em tese, ser legítimas por defender seus Estados - alguns acham que isso é legítimo, que é da democracia e que, portanto, não é barganha. Eu não acho! É uma divergência de fundo, o que entendo como democracia. Considero legítimo o fato de Deputados e Senadores apresentarem emendas para o Orçamento de seus Estados, embora eu particularmente seja contra emendas individuais e não as que apresentei. Considero até legítimo tentarem aprovar verbas para seus Estados. Mas a partir do momento em que o Executivo utiliza a liberação de verbas para mudar o voto em relação a um tema que nada tem a ver com a liberação de verbas, estamos caindo na barganha, estamos caindo no fisiologismo. Essa é uma diferença ética de visão de democracia que os Srs. Senadores e os Srs. Deputados têm que respeitar.

Segundo, vamos continuar manifestando nosso estranhamento. E não o fazemos pela imprensa. Fazemos aqui. Já o fizemos diversas vezes, ou seja, manifestamos o nosso estranhamento pelo comportamento de parlamentares que assinam a emenda e daí a pouco mudam o voto. Na semana passada - os Srs. Senadores devem estar lembrados - fiz questão de pedir votação nominal para uma emenda do Senador Osmar Dias ao projeto do Sivam. E não venham dizer que aquela era assinatura de apoiamento! Não era emenda constitucional! Não precisava de 27 assinaturas para tramitar. Os Parlamentares que assinaram a emenda, segundo o Senador Osmar Dias, alegaram que o fizeram porque concordavam com ela. E eu fiz questão de pedir a votação nominal, porque 31 assinaram e 13 votaram.

Até concordo com a música do Raul Seixas, que diz que é melhor "ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo", mas realmente alguns estão exagerando.

E esse estranhamento, nós vamos manifestá-lo aqui e para a imprensa, sem admitir que essas colocações sejam interpretadas água levada ao moinho daqueles que querem destruir as Instituições e o Congresso Nacional. Não! Senão, deveríamos ter admitido que a CPI do Orçamento, que foi implementada para cortar na carne dos Parlamentares, viria comprometer as instituições e o Congresso Nacional. A prática mostrou que isso aconteceu.

Defender o Congresso Nacional enquanto instituição necessária e fundamental para a democracia não significa calar-se diante de práticas que se vêem nesta Casa. Rebatem assim: "prove, diga os nomes". Se eu tivesse provas, não iria citar os nomes aqui. Entraria na Justiça com uma representação pedindo a cassação do mandato. Se eu tivesse provas e nomes, não iria ficar fazendo pronunciamentos para a imprensa; iria direto pedir a cassação do mandato de fulano e sicrano por falta de decoro.

Mas a realidade política desta Casa, que é incentivada pela prática do Presidente da República, Senhor Fernando Henrique Cardoso - ou pelo menos foi até a semana passada, porque o Presidente mesmo diz "não vamos mais negociar" - não pode ser confundida com críticas à Instituição.

Já fiz questão de registrar aqui uma série de momentos, uma série de episódios, em que Parlamentares, Lideranças do Governo e Lideranças de Partidos de Oposição, quando sofrem ataque da imprensa, vêm para cá bramando como paladinos da defesa da instituição do Congresso Nacional. No entanto, não se dispõem a votar matérias que estão relacionadas diretamente às prerrogativas e à defesa do Congresso Nacional.

Há muitos exemplos. Sobre as medidas provisórias, há um projeto do Deputado Nelson Jobim em tramitação nesta Casa desde que cheguei aqui. O projeto entrou na pauta em maio do ano passado, se não me engano, e de lá para cá tem sofrido excessivos adiamentos. Agora há uma comissão para estudar a matéria que espero que dê bom resultado. É um exemplo claro e concreto de que o Congresso Nacional não se faz respeitar, porque não vota questões que estão relacionadas com prerrogativas suas.

Está aí o exemplo - nunca é demais citar - do nosso projeto de autorização legislativa para a privatização da Companhia do Vale do Rio Doce. O Senado não quer votar esse projeto. Ao fazer isso, será que não está havendo um enfraquecimento do Senado? Não está dando, ao Executivo e à imprensa, margem a dizerem que este Congresso não serve para nada?

Portanto, a defesa da prerrogativa do Congresso, a defesa da instituição Senado da República e Congresso Nacional não pode dar-se apenas por meio pronunciamentos nesta Casa para reclamar quando um cineasta qualquer faz ataques. Essa defesa dá-se a partir de decisões que esta Casa toma, a partir de votações que faz relacionadas a projetos que envolvam prerrogativas democráticas do Poder Legislativo deste País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, conversando com alguns Senadores em particular, disse-lhes que o que a imprensa publicou sobre minhas declarações não era bem o que eu havia dito. Perguntaram-me por que não mandei uma carta desmentindo. A imprensa divulgou há pouco tempo em uma coluna que, na discussão do projeto do Dr. Hélio Bicudo, eu quase me havia engalfinhado com o Senador Jader Barbalho. Ninguém presenciou isso, nem eu. Portanto, não vi necessidade de mandar correspondência para o jornalista que publicou o fato. A imprensa têm publicado outras notícias, mas não pauto minha atuação no que a imprensa divulga ou deixa de divulgar.

Não pretendia voltar a esse assunto, porque entendia que seria gastar muita vela com defunto ruim, mas não aceito acusação daqueles que não assumiram a defesa das prerrogativas do Poder Legislativo em outras ocasiões em que ele esteve mais ameaçado, que não assumiram a defesa contra os ataques do Sr. Arnaldo Jabor em outros episódios em que ele atacou figuras e setores importantes da instituição. Da mesma forma, ao atacar-se um Congressista individualmente ou um setor de Congressistas que pertencem àquilo que se classifica como Oposição, respinga-se na instituição, porque não vejo a instituição Congresso Nacional funcionando sem uma Oposição atuante.

E, volto a registrar, o Sr. Arnaldo Jabor vem há muito tempo se apresentando como porta-voz bem humorado, com mais talento do que o oficial, diga-se de passagem, porque efetivamente é um articulista talentoso, das vontades do Executivo em ataques a Oposição. Parece que agora ele exagerou. Dizem que ele teve um encontro com o Presidente da República antes de Sua Excelência viajar. São especulações, como são especulações os comentários de que o próprio Presidente da República chegou em algum momento a atacar a instituição do Congresso Nacional. Não sei se atacou ou não. Fica no campo das especulações.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fiz questão de explicitar a nossa posição sobre isso, porque não aceito a acusação de cumplicidade com aqueles que propõem uma "fujimorização" ou uma desvalorização do Congresso Nacional. A nossa atuação nesta Casa - e não me refiro somente aos discursos mas também à ação legislativa - demonstra que queremos que esta Casa Legislativa se fortaleça enquanto Poder independente importante para a democracia. Infelizmente, a maioria não tem permitido que resultados de votações nesta Casa reforcem essas prerrogativas do Poder Legislativo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/1996 - Página 9208