Discurso no Senado Federal

DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE SUA AUTORIA, QUE ESTABELECE NORMAS E DISCIPLINA A ROLAGEM DA DIVIDA DOS ESTADOS.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA. BANCOS.:
  • DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE SUA AUTORIA, QUE ESTABELECE NORMAS E DISCIPLINA A ROLAGEM DA DIVIDA DOS ESTADOS.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Freitas Neto, José Fogaça, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/1996 - Página 9212
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA. BANCOS.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), REFERENCIA, LEGISLAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS.
  • OBSERVAÇÃO, INCONSTITUCIONALIDADE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CRIAÇÃO, PROGRAMA DE ESTIMULO A REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO AO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (PROER), CRITICA, EMPRESTIMO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RECURSOS, TESOURO NACIONAL, DISCRIMINAÇÃO, AUXILIO FINANCEIRO, ESTADO DA PARAIBA (PB), ESTADO DO PIAUI (PI), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN).
  • CRITICA, DEMORA, GOVERNO, ATENDIMENTO, SOLICITAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DA PARAIBA (PB), AVAL, EMPRESTIMO EXTERNO.
  • ELOGIO, BANCADA, CONGRESSISTA, ESTADO DA PARAIBA (PB), MAIORIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), AUSENCIA, NEGOCIAÇÃO, VOTO, DEFESA, ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, PRORROGAÇÃO, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS.
  • INFORMAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO ESPECIAL, ESTUDO, SOLUÇÃO, DIVIDA INTERNA, BRASIL.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), ASSUNTO, AVAL, UNIÃO FEDERAL, EMPRESTIMO EXTERNO, ESTADOS.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no início desta legislatura apresentei ao Senado, depois de longa reflexão e de estudos procedidos, inclusive com a assistência da Assessoria, um projeto de resolução que dispunha sobre alterações na resolução em vigor, que estabelece normas destinadas a disciplinar a rolagem da dívida dos estados e municípios para com a União.

Como sabem os Srs. Senadores aqui presentes, essa matéria vem de há muito tempo, de acordo com atribuição específica do Senado, sendo tratada entre nós com o maior interesse, porque a situação pré-falimentar da maioria dos estados e municípios brasileiros é um fato incontestável.

Mirei-me no exemplo da Paraíba que, apesar de todos os esforços dos últimos governadores que têm ocupado o Palácio da Redenção, paga pelo serviço de sua dívida muito além do limite estabelecido naquela resolução, que é de 11% sobre a receita líquida do Estado.

Chegamos a pagar, no ano passado, cerca de 20% sobre a receita líquida, o que equivale a mais 9%, sacrificando, assim, não apenas as despesas de custeio, que poderão perfeitamente ser diminuídas, mas, sobretudo, as despesas com investimentos na área econômica e particularmente na área social, num estado que está inserido em uma região que é considerada a mais pobre do País, o Nordeste.

Deixou-se aqui no Senado de aprovar aquele projeto de resolução na sua íntegra - era Relator da matéria o Deputado Carlos Bezerra -, sob o argumento de que haveria um prejuízo para a União de alguns bilhões de cruzeiros. É verdade que esse prejuízo seria passageiro, porque o débito seria pago ao longo do tempo, pois apenas alongar-se-ia o seu prazo e estabelecer-se-ia um limite menor de percentual sob a receita líquida, para pagamento da dívida dos estados e municípios. Isto é, passaríamos a ter um prazo de trinta ou quarenta anos, e o percentual, ao invés de ser de 11%, passaria a ser de 7 ou de, no máximo, 9%. O fato é que continuaram as dificuldades.

O Governo Federal, para fazer face a essa situação, admitiu algumas ligeiras alterações no projeto de resolução, que foi aprovado de maneira a não satisfazer a solução do problema. No meu estado, por exemplo, apenas a nova resolução permitiu um decréscimo de cerca de 1 a 2% no percentual de pagamento da dívida da Paraíba à União e às suas entidades representativas da administração indireta, particularmente os bancos oficiais: Banco do Brasil, BNDES, Caixa Econômica e Banco do Nordeste.

Ao mesmo tempo, a União resolveu, para compensar os estados diante da não-aprovação daquele projeto de resolução, abrir a possibilidade de empréstimos a curto prazo pela Caixa Econômica Federal, inclusive para pagamento de operações de ARO, isto é, de Antecipação de Receitas Orçamentárias em bancos oficiais e públicos e para permitir o financiamento das chamadas demissões voluntárias.

O meu Estado não aceitou o empréstimo da Caixa Econômica por ser de curtíssimo prazo e de juros bastante altos. Fizemos um esforço muito grande. O Governador José Maranhão, continuando o trabalho de saneamento financeiro iniciado na Paraíba pelo Governador Ronaldo Cunha Lima e pelo seu sucessor Cícero Lucena, conseguiu que o percentual de despesa com pessoal sobre a receita líquida do estado descesse para algo em torno de praticamente 60%, que é o limite estabelecido hoje pela Lei Rita Camata, em vigor desde algum tempo.

Com muito sacrifício tem o nosso Gevernador procurado conter ao máximo as despesas de custeio para sobrar um mínimo para cobrir alguns investimentos importantes, embora de pequena monta. Porque se sabe que no atual Governo Federal, como o Plano Real está em vigor, e a grande preocupação, aliás, meritória, do Presidente Fernando Henrique Cardoso é com o equilíbrio das contas públicas, estão praticamente proibidas as transferências tradicionais de recursos federais, através de convênios, para atendimento aos estados e municípios, o que não acontecia nos governos anteriores.

A Paraíba, por exemplo, está sobrecarregada não só com a folha de pagamento, embora, como eu disse, tenhamos conseguido diminuir o percentual da despesa de pessoal sobre a receita líquida, mas também com o pagamento da dívida, que continua alta e, portanto, é o que mais onera a situação financeira do estado.

Diante disso, estive, juntamente com os Senadores Ronaldo Cunha Lima e Ney Suassuna, em companhia do Governador José Targino Maranhão em recente audiência com o Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. O Sr. Governador do Estado fez uma exposição sobre a situação da Paraíba e terminou apresentando a Sua Excelência um documento, em nossa presença, no qual dava conta de tudo o que havia feito até agora para sanear a situação financeira do estado. E, ao mesmo tempo, pleiteava de Sua Excelência recomendações ao Sr. Ministro da Fazenda para que se estudasse a possibilidade de um aval da União para um empréstimo externo de longo prazo que daria ao estado condições de caminhar melhor no que tange à situação econômico-financeira, de vez que o empréstimo teria um prazo de carência razoável. Os juros internacionais são imensamente mais baratos e teríamos, então, condições de reequilibrar a situação da Paraíba, inclusive custeando alguns investimentos de fundamental importância para a infra-estrutura do estado, particularmente aqueles relacionados com a instalação da ZPE da Paraíba, a chamada Zona de Processamento de Exportação.

A ZPE foi criada ainda no Governo José Sarney e até agora não foi instalada por falta de recursos próprios do estado para terminar as obras de infra-estrutura, sem o que ela não poderá funcionar. A ZPE é fundamental para o Nordeste, pois essa região tem como vocação precípua justamente a indústria voltada para a exportação.

O Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso despachou ao Sr. Ministro da Fazenda a solicitação do Governo da Paraíba no tocante a esse aval da União, que, aliás já foi concedido, com o apoio do Senado. Tenho as provas no meu gabinete, aval a uma empresa estatal de São Paulo, recentemente, se não me engano na área de energia elétrica, e também ao Estado de Mato Grosso.

Então ficamos nessa expectativa. Depois estive com Sua Excelência o Senhor Presidente da República cobrando uma definição desse aval, e ele me remeteu para uma audiência com o Sr. Ministro da Fazenda, que mostrou-me as dificuldades de atendimento e disse-me que ia consultar o Senhor Presidente.

E já se vão mais de dois meses sem que tenhamos uma decisão definitiva sobre o assunto. Enquanto isso, Sr. Presidente, todos sabemos que o Governo, através do Proer, começou a gastar bilhões e bilhões de reais para socorrer bancos praticamente falidos ou pré-falidos, no caso, o Banco Nacional, o Banco Econômico, o Banco Mercantil e outros bancos que estão obtendo recursos públicos oriundos ora do Banco Central, ora do Tesouro Nacional, para atendimento daquilo que o Governo costuma chamar de saneamento do sistema financeiro nacional.

É importante salientar, como eu já disse nesta Casa, que esta Medida Provisória que instituiu o Proer é flagrantemente inconstitucional, uma vez que a Carta Magna estabelece que uma lei complementar definirá o sistema financeiro nacional. Portanto, sendo matéria de lei complementar, não se poderia tratar desse assunto em Medida Provisória.

Entretanto, está aí a medida provisória, que até agora não foi aprovada pelo Congresso, mas, dada a generosidade que existe em matéria de edição e reedição de medidas provisórias, o fato é que ela tem sido reeditada freqüentemente, continuando em vigor.

Por conta do Proer tivemos recentemente também o atendimento emergencial para salvar outros bancos, a exemplo, o Banco do Estado de São Paulo. Tivemos aqui no Senado um debate muito longo e muito polêmico a respeito do Banespa, que teve como solução um empréstimo do Governo Federal, com recursos do Tesouro Nacional, no valor de R$7,5 bilhões, ao Estado de São Paulo, que, assim, pôde saldar uma dívida com o Banespa, e este, por sua vez, pôde acertar suas contas com o Banco Central.

Nós, do Nordeste, particularmente da Bancada da Paraíba, tivemos inclusive dúvidas sobre tomarmos uma posição favorável àquele empréstimo. Em homenagem ao Senador Mário Covas - por quem tenho o maior respeito e em cuja administração confio, apesar de não pertencer ao meu Partido, mas o conheço há muito tempo -, permaneci em plenário prestigiando a aprovação daquela matéria, embora tivesse votado com restrições em função das explicações que já dei a respeito daquilo que significa o Proer e suas implicações na vida econômica e financeira do País.

O fato é que se abriu um precedente muito grave neste País: o empréstimo do Tesouro Nacional ao Estado de São Paulo, o estado mais rico da Federação, justamente em um País em que, há poucos anos, o Governo de Fernando Collor, através do Banco Central, decretou a liquidação extrajudicial dos bancos oficiais dos Estados da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Piauí. Está ali o Senador Freitas Neto que era, na ocasião, Governador do Estado do Piauí.

Sabe-se do sacrifício que fizemos para, depois de dois ou três anos de Governo do ex-Presidente Fernando Collor, conseguir reabrir o Banco do Estado do Paraíba e o Banco do Estado do Piauí, apesar de todos os esforços, o Banco do Estado do Rio Grande do Norte não teve condições de ser reaberto. Não obtivemos nenhuma generosidade do Governo Federal.

Sr. Presidente, a proclamada iliquidez dos bancos nordestinos a que me referi, Paraíba, Rio Grande do Norte e do Piauí, estava muitíssimo aquém da iliquidez, por exemplo, do Banespa, do Banerj, do Banco Nacional, do Banco Econômico e de outros estabelecimentos de crédito que não foram liquidados extrajudicialmente, tiveram apenas processos de intervenção decretado pelo Banco Central.

Vejam, Srªs e Srs. Senadores, a diferença de tratamento, a discriminação por parte do Banco Central entre instituições financeiras, sejam públicas ou particulares, em razão de sua localização. Caso se encontrem em grandes estados, em regiões importantes, como é o caso dos Estados de São Paulo, do Rio de Janeiro, da Bahia, então o tratamento é um, mas se estão localizadas em estados pequenos, como os nossos do Nordeste, o tratamento é outro, inteiramente diferente.

O fato é que conseguimos reabrir o Banco do Estado da Paraíba a duras penas, e o fizemos seguindo rigorosamente as determinações do Banco Central. A liquidação extrajudicial foi suspensa, e permaneceram nos seus quadros apenas trezentos dos mil e duzentos servidores. Novecentos foram indenizados pelo estado com pequeno empréstimo concedido pelo Banco Central e, de mais de quarenta agências, passamos a ter apenas cinco, e, agora, talvez cheguemos a dez.

É importante destacar que o Banco do Estado da Paraíba é agora um banco exemplar, que fechou o seu balanço, em 1995, com um lucro de R$8 milhões, o que foi altamente significativo para um estabelecimento oficial de um pequeno estado. Aquele banco está cumprindo rigorosamente os seus objetivos.

Não precisamos de socorro do Governo Federal para o banco. Quando se votou aqui um empréstimo para o Estado de São Paulo para salvar o Banespa, imediatamente se divulgou que o Governo Federal iria baixar uma nova Medida Provisória - isto está em uso - para efeito de regular também empréstimos semelhantes, para que os demais estados pudessem socorrer os seus bancos oficiais.

A Paraíba não precisa disso. O que queremos é, diante das medidas austeras tomadas pelo Governo do Estado, diante do saneamento das nossas finanças e da reorganização da nossa economia, o aval do Estado para um financiamento de longo prazo no mercado financeiro internacional.

Entretanto, Sr. Presidente, para surpresa minha, depois de todos esses entendimentos com o Senhor Presidente da República e com o Sr. Ministro da Fazenda, noticiou-se hoje na imprensa que o Banco Central estabeleceu que a União não vai mais avalizar os estados.

O Sr. Freitas Neto - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Freitas Neto - Senador Humberto Lucena, sou Relator de um projeto de autoria de V. Exª, assinado por seus Colegas da Bancada da Paraíba, Senadores Ronaldo Cunha Lima e Ney Suassuna, que trata da rolagem da dívida, em função da Lei nº 8.727, aprovada em novembro de 1993, que autorizou a rolagem da dívida dos estados naquela oportunidade. No caso da Paraíba, do Piauí e do Rio Grande do Norte, a legislação citada possibilitou, inclusive, a rolagem da dívida dos estados com esses bancos no sentido de se reabrir os bancos da Paraíba e do Piauí, com todos os sacrifícios que V. Exª relembra neste momento, visto que participou da resolução desse problema como Presidente do Congresso Nacional naquela oportunidade. Fui designado Relator pela Comissão de Assuntos Econômicos do projeto de sua autoria, o qual altera dispositivo da citada lei, e o Senador Carlos Bezerra foi Relator de três Projetos de Resolução de autoria dos Senadores Pedro Simon, Esperidião Amin e V. Exª. Houve muitos debates na Comissão de Assuntos Econômicos, inclusive audiência com governadores, com secretários de planejamento e secretários de fazenda estaduais, e, já no final do ano, aprovamos uma resolução. Naquele momento, foi anunciado que havia um acordo dos Governadores com o Governo Federal no sentido de se alongar o perfil da dívida desses estados, de tal maneira que eles pudessem arcar com os encargos financeiros. Contudo, o que vejo hoje é uma reclamação generalizada de que os estados estariam pagando valores acima do que ficara estipulado. Estou mandando estudar a questão. Com a modificação na resolução, foi possível aquele empréstimo de emergência concedido pela Caixa Econômica Federal a alguns estados, no final do ano. Mas, em função do empréstimo concedido agora ao Governo do Estado de São Paulo e do anúncio, em toda a imprensa, de que o Governo Federal estaria disposto a atender aos demais estados, nas mesmas condições em que o empréstimo foi feito com o Estado de São Paulo. Estou pensando em apresentar um substitutivo ao projeto de V. Exª exatamente nesse sentido, o que, portanto, iria substituir a Lei nº 8.727 - repito - , nas mesmas condições que acabamos de autorizar para o Estado de São Paulo. Isso facilitará bastante a vida de alguns estados brasileiros, principalmente daqueles que têm dívida contratual, a qual não representa o grande problema em matéria de dívida pública no País. Obrigado pelo aparte, nobre Senador Humberto Lucena.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Eu é que lhe agradeço, nobre Senador Freitas Neto.

Gostaria apenas que V. Exª, ao fazer o seu substitutivo, procurasse refletir sobre a situação dos estados mais pobres, como os nossos, fazendo incluir, no seu texto, a necessidade, em alguns casos, sobretudo nos empréstimos internacionais, do aval da União, sem o qual os estados endividados não terão como contrair esses financiamentos no plano internacional. Evidentemente, esses avais só seriam dados depois de um estudo da situação econômica do estado, do saneamento financeiro, do pagamento dos seus compromissos com a União, etc.

Passo a ler matéria publicada hoje, 30/05/96, no Correio Braziliense, sob o título "União Não Vai Avalisar os Estados".

      "O Banco Central delimitou o grau de liberdade dos estados e municípios que vão buscar no mercado financeiro internacional dinheiro para a rolagem de suas dívidas internas.

      Por meio da Circular nº 2.280, o BC deixou claro que a União não participa como avalista desta operação e exige para a aprovação dos empréstimos que tanto o tomador, no caso estados municípios e suas empresas, quanto o credor, o banco internacional, apresentem a classificação de risco de operações fornecidas por entidades do mercado financeiro internacional.

      Estas exigências, no entanto, não são necessárias no caso de financiamentos diretos com instituições oficiais de crédito ou organismos multilaterais como o Banco Mundial(Bird) e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

      A decisão do BC foi necessária porque nos últimos anos os empréstimos sem aval da União eram tomados no exterior sem qualquer cautela por parte do governo. Ou seja, mesmo que o financiamento não tivesse a União como avalista, a conta acaba sendo apresentada ao Tesouro pelo próprios bancos estrangeiros.

      VANTAGEM

      Agora não. O contrato entre as partes deve ter uma cláusula que explicita que a União não é avalista. Além disso, os empréstimos só serão aprovados quando se tratar de um financiamento vantajoso. Ou seja, o BC exige que o novo empréstimo seja de maior prazo e encargos menores que os incidentes sobre a dívida interna do estado ou município.

      Na prática, a circular trata de critérios que devem ser observados para a aprovação de empréstimos sem aval da União que envolva dinheiro, já que os financiamentos de máquinas e equipamentos continuam livres. "Nestes empréstimos não significa ingresso de dinheiro, mas de bens e equipamentos", ponderou o técnico do Tesouro Nacional, Antônio Bronzeado.

      A circular, portanto, disciplina as cláusulas dos novos contratos, inclusive para evitar o acúmulo de nova inadimplência por parte dos estados e municípios. Os estados estão obrigados a apresentar um certificado de que a instituição com a qual estão negociando tem classificação favorável no mundo internacional.

      Trata-se de medida de cautela para impedir a contratação de empréstimos com bancos de "fundo de quintal". As instituições financeiras internacionais, por sua vez, também devem se certificar para quem estão emprestando dinheiro, porque a União não pagará conta atrasada de governador ou prefeito."

Enfim, Sr. Presidente, Srs. Senadores, essa é mais uma medida draconiana do Governo Federal, por intermédio do Banco Central, para evitar que estados e municípios, sobretudo aqueles que estão financeiramente em situação mais difícil, consigam um financiamento no mercado internacional.

Eu faço daqui um apelo ao Senhor Presidente da República, ao Sr. Ministro da Fazenda e ao Sr. Presidente do Banco Central para que reexaminem a situação do estados, caso a caso, e procurem, naturalmente, adequar uma decisão como essa de negativa de aval da União a empréstimos de estados e municípios, procurando homenagear aqueles estados que, como a Paraíba, estão procurando, com a adoção de medidas austeras, medidas sérias, ficar numa situação cada vez melhor do ponto de vista financeiro.

Como afirmei, o Governador José Targino Maranhão continua o trabalho iniciado pelo Governador Ronaldo Cunha Lima, e temos a imensa satisfação de dizer hoje que a Paraíba, apesar das grandes dificuldades em que se encontra, de não poder custear grandes investimentos no estado, pelo menos está numa situação muito melhor em termos de folha de pessoal e de adimplência dos seus compromissos do que a maioria dos estados brasileiros.

Espero, portanto, que o Senhor Presidente da República e o Sr. Ministro da Fazenda revejam a conduta do Governo Federal em relação aos estados e municípios brasileiros.

O SR. Ney Suassuna - Permite V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Ney Suassuna - Nobre Senador Humberto Lucena, antes de mais nada, gostaria de me solidarizar com o discurso de V. Exª, exatamente batendo na mesma tecla. Há estados e estados. Com toda certeza, essa medida draconiana não teria acontecido antes de terem resolvido a situação de São Paulo. Estados pequenos que têm pouco acesso à imprensa, que têm pouco peso político, têm muito mais dificuldade do que os estados mais bem cotados da República. São Paulo conseguiu, só para um item, R$17 bilhões. Há estados, como Tocantins, que há oito meses pleiteiam alguma solução e não conseguiram, ou há estados como Alagoas, cujo Governador tenta conseguir um aval - não é dinheiro do Governo - e não consegue. Essa medida vai dificultar, com toda certeza, a solução pretendida pelo Estado de Alagoas. O nosso estado, a Paraíba, certamente, é o "florão de tropa" dessa ação. E, a exemplo de outros estados, tem feito da austeridade o seu dístico, tem lutado de todas as formas, baixando de 17,5% para um valor em torno de 5% o percentual sobre a sua receita de encargos com administração. E tem baixado o valor gasto com a folha que, neste mês, vai ficar em 54% Então, a Paraíba está cortando a carne, está cortando o que não pode. Tem que haver um prêmio para os estados que assim procedem e tem que haver, ao mesmo tempo, uma igualdade no tratamento dos estados. É óbvio que o Banco Central e o Departamento do Tesouro têm essa preocupação, mas é preciso fazer justiça. Na hora em que se dá a um Estado cerca de 17 bilhões de reais, por que não resolver o problema de outros Estados pequenos, com contas pequenas, que todas somadas não chegam a 1 bilhão de reais, e que, com certeza, estão fazendo esforço e dando até exemplo de parcimônia e de austeridade? Parabéns pelo pronunciamento, Senador Humberto Lucena.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Muito obrigado a V. Exª, Senador Ney Suassuna, que tem sido um parlamentar atuante nesta Casa, em benefício da solução dos problemas do nosso Estado, particularmente no que diz respeito à sua situação econômico-financeira.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao terminar, desejo dizer que o nosso Estado tem atuado no plano federal nas duas Casas do Congresso Nacional, por intermédio de sua bancada, da qual a maioria expressiva é do PMDB. O meu partido tem três Senadores e, dos doze Deputados Federais, tem sete.

Temos atuado de maneira altiva, de maneira digna. Jamais utilizamos a nossa força de apoio parlamentar para barganhar qualquer coisa com o Governo Federal, inclusive porque não é do nosso estilo, não é da nossa história nos conduzirmos dessa maneira na vida pública.

Aproveito a oportunidade para retificar o noticiário recente da imprensa, no sentido de que alguns Deputados do PMDB da Paraíba - uns dois ou três dos sete que temos lá -, que divergiram num ponto da reforma da Previdência, teriam assim se conduzido em face do não-cumprimento por parte do Governo Federal do compromisso assumido conosco no sentido de liberar uma verba de 20 a 30 milhões de reais, destinada ao custeio da construção do canal de Curemas a São Gonçalo, que vai ampliar a área de irrigação do sertão nordestino.

Isso nunca aconteceu. O compromisso de liberar essa verba para o Estado da Paraíba, como compensação ao prejuízo que o Estado sofreu com o Fundo de Emergência, foi assumido com o Governador Antonio Mariz - de saudosa memória -logo após a posse do Presidente Fernando Henrique Cardoso, em visita que fizemos ao Senhor Presidente da República, acompanhando o Governador, coletivamente, todos os Senadores e Deputados da bancada do PMDB da Paraíba no Congresso Nacional.

Por fim, Sr. Presidente, desejo dizer que estou concluindo também, com vistas ao Senador Freitas Neto, um estudo com a assessoria do Senado, visando a novo projeto de lei que vai dispor sobre a securitização das dívidas dos Estados e dos Municípios. Isso está em moda. Conseguimos securitizar a dívida externa - no pagamento da dívida, os juros são pagos por bônus - e as dívidas dos agricultores com o Banco do Brasil. Por que não securitizar também as dívidas dos Estados e dos Municípios? Dentro de pouco tempo, apresentaremos uma proposição ao Congresso Nacional nesse sentido.

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Casildo Maldaner - Senador Humberto Lucena, na medida em que o tempo passa, na medida em que convivemos com V. Exª, aprendemos a admirá-lo cada vez mais, pela sinceridade com que expõe os temas nesta Casa, em particular esse caso da Paraíba e os de outros tantos Estados, que V. Exª vem discutindo há muito tempo. Sempre trata dos assuntos com muita sinceridade, muita humildade, apresenta até as particularidades, procurando minuciosamente traçar o quadro de cada caso. Isso me comove. Quando o Governo baixou a medida, dando a entender que não conversará mais sobre esses temas, supreendeu-nos, porque, depois de resolvidas algumas questões em que estava interessado diretamente, como o caso do Banco Nacional, do Econômico e do Estado de São Paulo, resolveu agir dessa forma. Isso nos preocupa. Penso que não poderia dizer isso. V. Exª apela para que o Governo trate com igualdade todos os Estados da Federação e, por isso, merece a solidariedade de todos nós nesta Casa.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Fico muito grato a V. Exª pelas palavras que muito me sensibilizam, nobre Senador.

Devo dizer que, enquanto Estados e Municípios sofrem tanto e vivem nessa situação, sobretudo os pequenos, que são em maior número, para os grandes há sempre uma exceção, como foi o caso do empréstimo do Tesouro Nacional de 7,500 bilhões de reais ao Estado de São Paulo. Enquanto isso, a União aumenta diariamente a sua dívida mobiliária.

Sabe V. Exª que nossa dívida mobiliária beira os 200 bilhões de dólares. Refiro-me àquela dívida que é rolada diariamente porque o Governo Federal ainda não tem os recursos fiscais necessários para bancar todas as suas despesas. Como tem a sua dívida pública interna, não tendo recursos do Tesouro para pagá-la, emite diariamente alguns títulos e os coloca no mercado com juros cada vez mais altos para atrair as pessoas que queiram comprá-los, sobretudo os banqueiros. Isso vai virando uma bola-de-neve. Vai acumulando dívida sobre dívida.

Quanto a dívida da União, que aumenta diariamente, a única providência que podemos tomar é denunciar o fato e pedir ao Governo que busque uma solução.

Recentemente consegui aprovar aqui um requerimento para criar uma comissão especial temporária, para debruçar-se sobre a dívida pública interna da União, dos Estados e dos Municípios e procurar alternativas para a sua solução. Este é o nó górdio da economia brasileira: ou resolvemos o problema da dívida pública interna, ou não resolvemos o problema da inflação. O da dívida externa está praticamente equacionado porque, como todos sabem, ela foi renegociada e será paga a longuíssimo prazo. A dívida pública interna continua a ser o nosso grande desafio.

Por fim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desejo dizer a V. Exªs que estamos atentos para continuar lutando pelo fortalecimento dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Do jeito que são conduzidos os fatos no Brasil, dentro de pouco tempo deixaremos de ser uma república federativa para sermos uma república unitária, porque, cada dia mais, o Governo Federal manipula os interesses dos Estados e dos Municípios.

Ultimamente, segundo informou a imprensa, foi criado uma espécie de FMI interno no Brasil, isto é, há uma inspeção permanente nos Estados, por parte do Governo Federal, para verificar o equilíbrio das contas e se tudo vai bem ou não.

Não digo que a União não deva preocupar-se com os Estados e Municípios, mas não pode haver um grau de interferência tão grande, porque, do contrário, é melhor acabarmos com a federação e passarmos a ser uma república unitária e - quem sabe - instituirmos o parlamentarismo. Eu, que, na Assembléia Nacional Constituinte, apresentei emenda instituindo o sistema presidencialista, hoje estou muito inclinado para o sistema parlamentarista, justamente em virtude do autoritarismo que cada vez mais vai tomando conta daqueles que estão à frente do Governo Federal no Brasil.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Humberto Lucena, V. Exª permite-me um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. José Fogaça - Senador Humberto Lucena, quero cumprimentar V. Exª, que, com sabedoria, conhecimento de causa e vivência profunda de longos anos de parlamento, traz à tona e ao debate um dos assuntos mais delicados do Plano Real. Eu diria que talvez seja esse o nó górdio do Plano Real. Os planos de estabilização do mundo têm dois relógios, que são diariamente acompanhados, passo a passo, pelos investidores e pelas corporações financeiras internacionais: um, que é o relógio da balança comercial, o equilíbrio de importações e exportações, e um outro, que é o da dívida pública interna. Até porque o grande fato gerador da crise dos anos 70 e 80, que foi a dívida externa do País, esta já se reduziu, está sendo paga, sob controle, com juros baixíssimos, de 6% ao ano, enquanto a dívida interna no Brasil tem juros que ultrapassam níveis de 30% ao ano, numa inflação de 19%. V. Exª toca no ponto crucial, neste relógio do Plano Real, que é a dívida pública interna. Os ataques especulativos em cima do Banco Central dos países que tentaram estabelecer políticas sérias de estabilização se deram justamente quando os níveis de endividamento mobiliário interno e a defasagem das balanças comerciais apresentavam o grau mais agudo e descontrolado. O caso do México foi tipicamente este: quando as grandes corporações, os grandes investidores, os detentores desse dinheiro volátil que circula pelo mundo, perceberam que o México não tinha mais como responder, no dia a dia, pela rolagem dos seus títulos, fizeram um intenso ataque especulativo em cima da economia mexicana e praticamente destruíram, derrubaram o plano mexicano de estabilização, que já tinha mais de dois anos razoavelmente bem sucedido. No caso do Brasil, nós, brasileiros, não sabemos e o Governo brasileiro também não sabe qual será o momento preciso, exato, angular, em que se vai quebrar essa confiança internacional e se estabelecer o ataque especulativo através da venda e do desfazimento por parte dos detentores desses títulos e daqueles que têm investimentos no Brasil. Isso, para nós, é o ponto de tensão emocional diária que vive cada brasileiro, ou pelo menos aqueles que como nós, como V. Exª, têm a preocupação de cuidar disso, de observar e prestar atenção nessas coisas. Vejo, nobre Senador Humberto Lucena, que o Plano Real, por enquanto, ainda pode contar com esse processo de endividamento, porque até agora não está suscitando nem provocando distúrbio ou desconfiança, mas isso tem um limite e me parece que esse limite está muito próximo. V. Exª chama a atenção com responsabilidade para aquele que é o relógio mais delicado, seguramente, do Plano Real. E não sei até quando essa confiança e essa estabilidade vão continuar. Muito obrigado, Senador Humberto Lucena.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Eu é que agradeço, nobre Senador José Fogaça, sobretudo por ser V. Exª um especialista no assunto, um Senador que sempre se preocupa com os assuntos pertinentes à economia e às finanças do País. Eu gostaria que V. Exª viesse a fazer parte, pelo PMDB, da comissão a que me referi, que foi criada por minha iniciativa nesta Casa, destinada a analisar, em profundidade, a dívida pública interna do País e propor alternativas para a sua solução. V. Exª diz muito bem: este é o grande risco que corre o Plano Real, porque, apesar de todos os êxitos proclamados, principalmente no que tange ao combate à inflação, sabe V. Exª que, no atual Governo, o aumento do endividamento público interno do País, sobretudo por parte da União, foi incomensurável, e não se viu até agora nenhuma providência concreta para resolver definitivamente o problema.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/1996 - Página 9212