Discurso no Senado Federal

DENUNCIANDO MAIS UMA ILEGALIDADE PRATICADA PELO GOVERNADOR DO ACRE, SR. ORLEIR CAMELI, PUBLICADA NO JORNAL A GAZETA DO ACRE, A RESPEITO DO ASFALTAMENTO DA BR-364, TRECHO ENTRE TARAUACA E CRUZEIRO DO SUL.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DE ALAGOAS (AL), GOVERNO ESTADUAL.:
  • DENUNCIANDO MAIS UMA ILEGALIDADE PRATICADA PELO GOVERNADOR DO ACRE, SR. ORLEIR CAMELI, PUBLICADA NO JORNAL A GAZETA DO ACRE, A RESPEITO DO ASFALTAMENTO DA BR-364, TRECHO ENTRE TARAUACA E CRUZEIRO DO SUL.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/1996 - Página 9653
Assunto
Outros > ESTADO DE ALAGOAS (AL), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • DENUNCIA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, A GAZETA DO ACRE, ESTADO DO ACRE (AC), REFERENCIA, IRREGULARIDADE, ASFALTAMENTO, TRECHO, RODOVIA, LIGAÇÃO, MUNICIPIO, TARAUACA (AC), CRUZEIRO DO SUL (AC), RESPONSABILIDADE, ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inúmeras vezes, da tribuna desta Casa, tenho dito que a Amazônia oferece grandes desafios, mas também grandes problemas, que, se não resolvidos, prejudicarão o que houver de positivo nesses desafios.

Um dos problemas é a ausência de um projeto de desenvolvimento para a região, que, acima de tudo, dê perspectiva de vida para as populações que ali habitam, sob pena de se tornar realidade o que noticia um dos grandes jornais de circulação do País, a Folha de S.Paulo, informando que as transações financeiras na cidade de Xapuri superam sua economia, porque o volume de cheques que ali circula, e também em outros municípios da Amazônia, é superior à receita desses municípios. O jornal atribui essa anomalia dos bancos aos narcodólares, resultado do narcotráfico nos municípios da Amazônia, principalmente aqueles que fazem fronteira com Peru e Bolívia.

A situação de miséria da nossa população pode levar uma grande maioria a um caminho muito perigoso, e isso pode fugir ao controle das autoridades, caso providências enérgicas não sejam tomadas. No caso em pauta, é fundamental que essas populações, sem nenhuma alternativa, disponham de meios de sobrevivência, sob pena de a região tornar-se uma terra arrasada, terra de ninguém.

Há outro problema para o qual é fundamental a atenção das autoridades federais; digo autoridades federais porque, juntamente com os Senadores Nabor Júnior e Flaviano Melo, assinamos um documento em que sugeríamos ao Ministro da Justiça uma intervenção no Estado do Acre. No momento que assinamos aquele documento, pesamos cada passo da nossa atitude, no sentido de que estávamos fazendo um pedido que poderia parecer um ato de autoritarismo. Na verdade, era um pedido de socorro, porque o Acre vem sendo manchete nos jornais a todo o tempo, nas principais emissoras de televisão, nos grandes jornais, sempre num espaço onde são noticiados inúmeros escândalos - escândalos praticados pela autoridade maior do nosso Estado. Quem não se lembra do caso do Boeing que foi apreendido no Aeroporto de São Paulo e do contrabando que vinha dentro desse avião? Ninguém se esqueceu dos processos que ainda estão na Procuradoria da República, onde inúmeras irregularidades do Governador Orleir Cameli estão arroladas, como o desvio de dinheiro público para a sua empresa e de sua família, como a retirada ilegal de madeira em terras indígenas, como a utilização de vários CPFs. Enfim, são infinitas as irregularidades que têm pautado a vida dessa autoridade do meu Estado, num período de menos de dois anos de governo.

Agora, Sr. Presidente, tenho a infelicidade - não me sinto bem cumprindo esse papel - de ver meu Estado envolvido num outro escândalo, o da utilização incorreta dos recursos públicos para a construção de estradas - no caso a BR-364. Todos nós, principalmente os Parlamentares do Norte, sabemos o quão obstinado tem sido o Governador Orleir Cameli pela construção de estradas. Os mais desavisados poderiam pensar que se tratava de uma iniciativa de um governante preocupado com os destinos de uma população isolada, que não tem como se comunicar, de municípios sem a mínima possibilidade de comunicação, situação de vários municípios do Vale do Juruá.

O jornal Gazeta do Acre, página 20, denuncia que a empresa Emsa, que está fazendo as obras de asfaltamento da BR-364, trecho que liga Tarauacá-Cruzeiro do Sul, é nada mais, nada menos do que um biombo da empresa Marmud Cameli, de propriedade do Governador Orleir Cameli.

Vejam o que diz o jornal: "O Governo do Estado do Acre está construindo uma rodovia federal com a concessão do Ministério dos Transportes, cujo valor é de aproximadamente R$100 milhões".

Fazendo uma ressalva, Sr. Presidente, gostaria de lembrar que a última vez que tivemos em nosso Estado uma obra com esse porte de recursos tratava-se do Canal da Maternidade que, eivada de erros e de corrupções, levou ao assassinato do Governador Edmundo Pinto.

Neste momento, teríamos um aporte de recursos para uma obra muito importante; o asfaltamento da estrada, que precisa ser feita para que aquelas populações não sejam penalizadas. No entanto, sob o manto daquelas populações empobrecidas e isoladas, não se pode praticar as arbitrariedades - tais como o desvio de dinheiro público - que estão sendo denunciadas pelos jornais do meu Estado.

O jornal diz que essa obra deveria ser construída pela Etesco, empreiteira que ganhou a licitação, mas essa empresa sub-rogou para a Emsa, uma outra empresa com sede no Estado de Goiás. A Emsa simplesmente é um biombo, através do qual se esconde a empresa do Governador, a Marmud Cameli. Desses recursos, que são da ordem de R$47 milhões para o trecho em questão, o Governador Orleir Cameli, segundo denúncias do jornal, está usando, através da sua empresa privada, o que é proibido pela lei, pela Constituição, que um governante não pode ter relações - me desculpem a palavra - promíscuas entre suas empresas privadas e a instituição pública em que está à frente.

No caso, a denúncia do jornal, página 20 da Gazeta do Acre, está baseada no relatório de um funcionário de máquinas pesadas que, por estar insatisfeito com o tratamento que vinha recebendo da empresa, denunciou que embaixo dos adesivos da empresa Emsa estava o nome da empresa Marmud Cameli. E que mais do as máquinas - não eram apenas as máquinas - também os ex-funcionários demitidos pela empresa Marmud Cameli estavam sendo recontratados através dessa farsa que é a empresa Emsa.

Sr. Presidente, isto é muito grave. O meu Estado precisa de estradas, precisa de um projeto de desenvolvimento. Mas necessita, acima de tudo, de pessoas que, à frente de funções públicas, como é o caso do Governo do Estado, assumam com responsabilidade e principalmente com honestidade a direção daquele Estado. O que o Governador Orleir Cameli está fazendo com essas operações é um verdadeiro assalto aos cofres públicos.

Nesse sentido quero colocar aqui uma proposta muito clara: que o Governo Federal assuma a responsabilidade da realização das estradas pois, do contrário, estará sendo conivente com o assalto que está sendo praticado aos recursos do Ministério dos Transportes, que, tenho certeza, foram liberados para a construção da estrada e não para o enriquecimento ilícito da família e da empresa do Sr. Orleir Cameli.

Gostaria de ressaltar que este processo está sendo acompanhado pela Polícia Federal. Neste sentido estarei encaminhando ofício ao Sr. Ministro da Justiça solicitando a S. Exª que aumente o efetivo de policiais federais no meu Estado, que melhore as condições de trabalho daquela representação da Polícia Federal, pois, apesar da boa vontade do superintendente, do seu esforço juntamente com a sua equipe, não é possível fazer frente aos inúmeros desafios, quer seja por esse problema agora do tráfico que está sendo denunciado pela Folha de S. Paulo, quer seja pelas irregularidades praticadas por autoridades, como no caso o Governador, ou até mesmo a incapacidade que a Polícia Federal tem tido no que se refere à recaptura dos assassinos do Chico Mendes.

Sr. Presidente, uma outra proposta é que o Governo Federal procure investigar com o maior rigor todas as denúncias, porque já fizemos nossa parte. Encaminhamos os processos à Procuradoria da República, e até hoje estamos aguardando as devidas punições para aqueles que estão cometendo essas barbaridades. Infelizmente há morosidade no processo que não compete a nós do Legislativo qualquer tipo de ação. Resta-nos cobrar e esperar. Eu gostaria inclusive de sugerir - já o fiz com o Senador Nabor Júnior e também estendo o convite ao Senador Flaviano Melo - que façamos uma reunião da Bancada do Estado do Acre no Senado para que tomemos as devidas providências, naquilo que nos couber, no sentido de investigarmos até as últimas conseqüências dessa denúncia que é muito grave, envolve recursos públicos e a vida das pessoas em um Estado sofrido, sem perspectivas, com uma população que, em sua grande maioria, é de desempregados, sem nenhuma assistência na área da saúde ou da educação, com todas as mazelas de um Estado da região Norte. Com as dificuldades de um Estado pequeno, dependente do Governo Federal, o Governador Orleir Cameli se dá ao luxo de utilizar os recursos públicos para benefício pessoal.

Sr. Presidente, para concluir meu discurso, eu gostaria de relembrar uma frase que li de autoria do Prefeito de Bogotá. Diz o seguinte: "O problema da violência em Bogotá é essencialmente cultural, uma questão de falta de vergonha coletiva." Em meu Estado não chegamos a isso, graças a Deus. Não se trata de falta de vergonha coletiva, pois lá temos pessoas honestas, trabalhadoras, pessoas que estão, inclusive, apesar das circunstâncias, dando um demonstração de que o Acre não é só problema, mas também solução. Temos uma questão a ser resolvida que é a falta de compromisso que, no entanto, não é coletivo, mas de grupos, e esses precisam pagar pelos crimes que estão cometendo.

Reitero minha proposta de que o Governo Federal assuma a construção da estrada BR-364, para que ela não sirva de manto para encobrir as falcatruas que vêm sendo praticadas pelo Governo do Estado. E mais, que a nossa Bancada, aqui, no Senado, tome todas as medidas necessárias junto ao Ministério da Justiça, junto à Procuradoria da República, junto ao Presidente da República para que se dê um basta nessa situação.

Se fosse no Estado de São Paulo onde essas atrocidades estivessem sendo cometidas com certeza muitas forças já teriam se levantado para protestar contra o que ali ocorre. Mas, em se tratando de um Estado pequeno, em se tratando de um Estado da Região Norte na Amazônia poucos são os que se preocupam com o que ali está ocorrendo. Está ocorrendo uma verdadeira barbaridade, está ocorrendo um desrespeito com a sociedade acreana e com o povo brasileiro. Afinal de contas o Acre faz parte da Federação. Então, que o Governo Federal assuma a responsabilidade que tem.

Estarei assinando uma carta ao Presidente da República na qual colocarei todas as minhas preocupações do descaso que o Acre está sendo vítima - descaso porque ali não temos mais governo, o que temos, na verdade, é um grupo que resolveu fazer do Estado um balcão de negócios.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/1996 - Página 9653