Discurso no Senado Federal

MODERNIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO POLITICO-PARTIDARIA. FIDELIDADE PARTIDARIA. REPRESENTAÇÃO DOS ESTADOS NA CAMARA DOS DEPUTADOS.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA.:
  • MODERNIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO POLITICO-PARTIDARIA. FIDELIDADE PARTIDARIA. REPRESENTAÇÃO DOS ESTADOS NA CAMARA DOS DEPUTADOS.
Aparteantes
José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/1996 - Página 10053
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • NECESSIDADE, REFORMA CONSTITUCIONAL, SETOR, POLITICA, COMENTARIO, DEPOIMENTO, AUTORIDADE, COMISSÃO, SENADO, ASSUNTO.
  • ANALISE, PROPOSTA, ATUALIZAÇÃO, CODIGO ELEITORAL, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, LEGISLAÇÃO, PARTIDO POLITICO.
  • DEFESA, OBRIGATORIEDADE, VOTO, FIDELIDADE PARTIDARIA, VOTO PROPORCIONAL, REELEIÇÃO, DESINCOMPATIBILIZAÇÃO, CARGO ELETIVO, MANUTENÇÃO, REPRESENTAÇÃO, ESTADOS.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC). Pronuncia o seguinte discurso. 

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. O Congresso Nacional tem voltado a sua atenção, nos últimos dois anos, para a apreciação das chamadas reformas constitucionais, algumas das quais já foram aprovadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, como a que preconiza a modernização e abertura da nossa economia para torná-la mais dinâmica.

Estão em tramitação na Câmara dos Deputados as chamadas reformas sociais. Entre elas incluem-se as reformas da Previdência, da administração e, no campo econômico e tributário, a reforma tributária.

Mas até agora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não se tem ainda o arcabouço da reforma política, imprescindível à modernização do sistema democrático no Brasil.

O Senado Federal, antecipando-se aos projetos de reforma do Governo, nomeou uma comissão especial para analisar a questão. Essa comissão, sob a presidência do ilustre Senador Humberto Lucena, tem se reunido periodicamente para ouvir autoridades, ligadas à atividade política e alguns Juízes de Tribunais Superiores, visando conhecer a tendência dessas pessoas em relação à reforma política.

Embora não seja membro efetivo da Comissão, tenho participado de algumas reuniões, como as que ouviram o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Carlos Velloso, os Governadores Mário Covas, de São Paulo, Miguel Arraes, de Pernambuco, Antônio Britto, do Rio Grande do Sul, e Cristóvam Buarque, do Distrito Federal.

Recordo-me de que, entre os vários temas abordados por essas autoridades, merecem destaque os problemas relacionados à modernização da legislação partidária e eleitoral. O próprio Tribunal Superior Eleitoral já encaminhou, para apreciação do Congresso Nacional, anteprojeto de lei para atualizar o Código Eleitoral Brasileiro, publicado no Diário do Congresso Nacional, mas ainda não u encaminhado às comissões competentes. Trata-se de uma proposição da maior importância, porque visa corrigir algumas deficiências do Código anterior, e moderniza o sistema eleitoral brasileiro. Sua tramitação, no entanto, não tem recebido o apoio desejado da Justiça Eleitoral, dos partidos políticos, nem da sociedade em geral.

Outra proposta que também deve ser objeto da apreciação dessa Comissão Especial, presidida pelo Senador Humberto Lucena, é da nova Lei Orgânica dos Partidos Políticos, que precisam de maior autonomia no Brasil, para que sejam realmente instrumentos de promoção do sistema representativo e da democracia. Sem uma lei devidamente atualizada, essa tarefa será grandemente dificultada.

A Comissão tem também debatido temas controversos, mas nem por isso menos importantes, como os casos, por exemplo, da implantação do voto facultativo e da continuidade do voto obrigatório. As opiniões dos que depuseram na Comissão se dividiram: alguns defenderam a continuidade do voto obrigatório; outros, o voto facultativo, como ocorre nos Estados Unidos e em países da Europa.

Sou favorável à continuidade de voto obrigatório, porque o Brasil é um país que ainda não tem uma sociedade devidamente politizada, onde a democracia ainda é uma planta tenra, como disse Otávio Mangabeira*, no célebre discurso que pronunciou na Câmara dos Deputados, no Rio de Janeiro, logo que foi eleito, em 1945.

Precisamos manter o voto obrigatório por algum tempo, a fim de politizar a nossa população e evitar que se transforme num instrumento mercantilizado. Se o voto for facultativo, só as pessoas de posses poderão trazer os eleitores da zona rural, para que possam votar, sensibilizando-os por meio de pagamento.

O voto facultativo provoca o desinteresse do eleitor. No dia da eleição, em vez de contribuir para melhorar o nível da representação popular nas Casas do Congresso Nacional, no Governo Federal, nos governos estaduais e nos municipais, muitos eleitores desinteressados darão preferência à praia, ao futebol e a outras atividades.

De modo que ainda dependemos do voto obrigatório, porque o voto facultativo padece de alguns vícios que, no momento, não temos absolumente condições de experimentar.

O Sr. José Eduardo Dutra - Senador Nabor Júnior, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NABOR JÚNIOR - Com muito prazer, Senador José Eduardo Dutra.

O Sr. José Eduardo Dutra - Senador Nabor Júnior, concordo plenamente com V. Exª quando faz referência à necessidade do fortalecimento dos partidos políticos na democracia brasileira. Acredito, porém, para que isso venha a acontecer, que é fundamental, entre outras coisas, acabarmos com a facilidade com que parlamentares mudam de partido político neste País. Infelizmente, no Brasil, os políticos trocam de partido como trocam de camisa. É só fazer um levantamento da composição da Câmara dos Deputados, ou mesmo do Senado, quando parlamentares mudaram de partido até mesmo antes da posse. Enquanto continuar a facilidade para esse troca-troca de legendas, nunca teremos partidos fortes neste País. Esse troca-troca acontece, inclusive, em função de que para cada eleição se tem uma legislação diferente, estabelecendo-se os prazos para definir tempo de televisão etc.; geralmente, nas vésperas desses prazos, acontece uma maior migração de parlamentares entre partidos, não em decorrência de divergências ideológicas ou filosóficas com o seu partido de origem, mas em função de um alto grau de fisiologismo que existe nesse momento. Apenas para dar uma contribuição ao pronunciamento de V. Exª, acredito que essa restrição tem que acontecer. Sei que é difícil de ser aprovada, até porque são os próprios parlamentares que vão impor restrição a eles mesmos. Na minha opinião, se não chegarmos a uma situação que iniba esse troca-troca, nunca vamos chegar ao fortalecimento dos partidos, que é o anseio da democracia brasileira e, com certeza, é o meu e o de V. Exª. Muito obrigado.

O SR. NABOR JÚNIOR - Agradeço a participação de V. Exª no meu modesto pronunciamento.

Havia relacionado esse tópico para mencioná-lo, inclusive porque tem sido objeto de discussões e de opiniões divergentes pelas pessoas que depuseram na Comissão Especial presidida pelo Senador Humberto Lucena.

Considero o instituto da fidelidade partidária imprescindível ao fortalecimento dos partidos políticos. Infelizmente, no período da Revisão Constitucional, esse tema foi objeto de apreciação e, por poucos votos, não foi aprovado; inclusive, votei favoravelmente.

Não é admissível que os partidos políticos ofereçam legenda e invistam nos candidatos, cujos gastos geralmente são feitos de maneira coletiva, e após se elegeram Vereador, Deputado Estadual, Deputado Federal, Senador, Prefeito, Governador troquem de partido com a maior simplicidade, sem dar a menor satisfação a seus eleitores, aos eleitores do partido. Em última análise, o mandato não é do eleito, mas do partido e dos eleitores. Essa prática tem sido muito freqüente, inclusive, lamento dizer, no meu Estado. Há Deputados que, nos últimos oito anos, já mudaram cinco vezes de partido. Onde está a ideologia? Hoje, o cidadão é filiado a um partido de esquerda; amanhã, num partido de centro-esquerda; e depois, a um partido de direita. Onde está a ideologia desse partido e onde está a ideologia desse cidadão? Certamente esse candidato não representa mais aqueles eleitores que o elegeram, por ocasião da eleição. Penso que o instituto da fidelidade partidária é necessário para o fortalecimento dos partidos, e conseqüentemente da democracia brasileira.

Tem-se discutido, na Comissão Especial da Reforma Política, o voto proporcional ou voto distrital. É um assunto polêmico, com duas correntes divergentes - a que defende o voto distrital puro e a que defende o voto distrital misto. Há, ainda, uma terceira corrente, a do voto proporcional, que também tem alguns defensores, entre os quais me incluo. Embora fosse favorável ao voto distrital na Assembléia Nacional Constituinte, hoje penso que o mesmo é impraticável no País, pela dificuldade de estabelecimento dos distritos, para adoção tanto do sistema de voto distrital puro quanto do misto, principalmente nos Estados pequenos. Alguns dos depoentes, que lá compareceram, manifestaram e reafirmaram posições diferentes .

O problema da reeleição, igualmente objeto de apreciação da Comissão, também é um tema que tem despertado muito interesse, principalmente dos detentores de cargo executivo. Eu, particularmente, sou favorável à reeleição em todos os níveis - para Presidente da República, Governador de Estado e Prefeitos municipais -, mas desde que essas autoridades se desincompatibilizem seis meses antes das eleições, a fim de concorrem em igualdade de condições com aqueles candidatos que não são detentores de cargo executivo.

Pela experiência brasileira sabemos que, se permitirmos a reeleição para detentores de cargo executivo sem a desincompatibilização, essas autoridades vão usar o poder econômico e a máquina do Estado para se reelegerem.

Em alguns países, como nos Estados Unidos, é permitida a reeleição sem o afastamento do cargo e sem a desincompatibilização, mas acredito que, no Brasil, não chegamos ainda ao estágio de desenvolvimento político que nos assegure a convicção de que um detentor de cargo executivo, que vai pleitear a sua reeleição, não se utilize da máquina administrativa.

A história da política brasileira tem demonstrado isso, e todos sabemos que governadores se envolvem em eleição de prefeitos, que o Presidente da República se envolve em eleição de Governador e até de Prefeito. Imaginem, então, se for candidato, buscando sua reeleição! Aí é que a máquina vai ser utilizada.

Além disso, temos que combater o poder econômico, não só daqueles que o utilizam, porque são pessoas dotadas de certos recursos, - e muitos, hoje, representam suas corporações no Congresso, nas Assembléias Legislativas, etc. - mas também das autoridades no uso e no abuso da máquina administrativa do Município, do Estado ou da própria União.

Tem sido discutido - e é um assunto muito complexo e polêmico - o problema da representação dos Estados, na Câmara dos Deputados.

Os grandes Estados, como S.Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, têm manifestado posições favoráveis a modificação no critério de fixação do número de Deputados Federais por Estado. É preciso aqui que se atente para um aspecto importante da questão. Estes Estados têm apresentado, inclusive, propostas - como no caso do período da Assembléia Revisora - de reduzir a representação dos pequenos Estados para três ou quatro Deputados, e aumentar a representação dos grandes Estados, alegando que a representação na Câmara dos Deputados reflete a população de cada Estado. No Senado, a representação do Estado é da Federação; tanto que cada Estado, grande ou pequeno, elege três Senadores para esta Casa; na Câmara, varia em função do número de habitantes. Mas é preciso levar em conta que, se concordarmos com essa tese dos grandes Estados, os pequenos Estados vão ser massacrados pela influência do poder econômico dos grandes, que ainda vão ter a hegemonia política na Câmara dos Deputados.

Estamos vendo que, quando se constitui um novo Governo a nível federal, a maioria dos Ministros é dos grandes Estados, dos Estados do Sul, Centro-Oeste e, raramente, Sr. Presidente, Srs. Senadores, de um pequeno Estado; quando muito tem-se um Ministro representante do Nordeste, jamais um Ministro representantes de Estado do Norte.

Então, se formos aceitar essa proposta de revisão do número de Deputados Federais em função da população, para que Estados como São Paulo passem a ter 120 ou 150 Deputados; Minas Gerais, 100 ou 110; Rio de Janeiro, 70 ou 80; Rio Grande do Sul, 50 ou 60; e os pequenos Estados com apenas 3, que seria o mínimo proposto, iríamos ter, além da influência nas áreas político-administrativa e econômica, uma hegemonia na Câmara dos Deputados. Seria praticamente a eliminação da representação dos pequenos Estados. De modo que considero o tema da maior importância, e comporta outro pronunciamento numa oportunidade posterior.

Mas é preciso que se ressalte, aqui, Sr. Presidente, Srs. Senadores, a decisão adotada pela Presidência do Senado de constituir essa Comissão Especial, para se antecipar na apreciação de matéria tão importante, que é a reforma política no nosso País, a fim de que tenhamos, realmente, partidos valorizados e representação popular também devidamente respaldada numa nova legislação eleitoral e partidária. E para que os partidos sejam fortes, há necessidade de se implementar, o quanto antes, a chamada reforma partidária, além dessas reformas sociais e econômicas, que estão tramitando no Congresso Nacional.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/1996 - Página 10053