Discurso no Senado Federal

ANALISE DO RELATORIO DE 1995, DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO AS POSIÇÕES DO BRASIL E DA PARAIBA, NO CONCERNENTE AO DESENVOLVIMENTO HUMANO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • ANALISE DO RELATORIO DE 1995, DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO AS POSIÇÕES DO BRASIL E DA PARAIBA, NO CONCERNENTE AO DESENVOLVIMENTO HUMANO.
Aparteantes
José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/1996 - Página 10166
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • POSIÇÃO, BRASIL, AMBITO INTERNACIONAL, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), DESENVOLVIMENTO SOCIAL, LEVANTAMENTO DE DADOS, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, ESTADOS, PAIS.
  • NECESSIDADE, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA, EDUCAÇÃO, REDUÇÃO, ANALFABETISMO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, antes de iniciar minha oração, agradeço ao Senador Jefferson Péres a permuta que fez comigo, permitindo que eu falasse em primeiro lugar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje os jornais trazem mais dados do relatório de 1995 que versa sobre o desenvolvimento humano, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Nele, o Brasil piorou de situação , como informa a ONU, ficando em 63º lugar no ranking dos países com maior desenvolvimento humano; ficou atrás da Argentina (30º), do Uruguai (32º), do Chile (33º), da Venezuela (47º), do México (53º) e da Colômbia (57º). Só ganhou do Equador, Suriname, Paraguai, Peru, Guiana, Bolívia e Guiana Francesa.

O Canadá é o primeiro país colocado.

E aí o grande público pergunta: - Mas como é possível que uma nação que ocupa a 10ª posição na economia mundial, possa ter um índice da ONU que a coloca em 63º lugar?

É que, neste relatório, o que se mede é a mortalidade infantil, o que se mede é a qualidade de vida: água, ar (poluição), conservação do solo e, principalmente, educação.

Por esta razão, tivemos condições de averiguar que durante um ano uma equipe do PNUD e do IPEA recolheu dados em 25 Estados brasileiros e no Distrito Federal, montando também um ranking estadual. Por ele, vemos que o Brasil está composto não mais da "belíndia" - de uma parte da Bélgica e uma parte da Índia -, mas de três subpaíses com desenvolvimento humano bastante desigual.

Diz a reportagem:

      "Tocantins não foi incluído na pesquisa porque não havia dados sobre a expectativa de vida da população no Estado.

      O Rio Grande do Sul encabeça a lista do subpaís com um alto desenvolvimento humano". É o primeiro Estado brasileiro nesse ranking.

      "Também fazem parte desse grupo, nesta ordem, Distrito Federal, São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Paraná, Mato Grosso do Sul e Espírito santo.

      Sete dos oito Estados do subpaís com alto desenvolvimento humano apresentaram IDH superior à média da América Latina". A única exceção foi o Espírito Santo, que ficou abaixo.

      "O IDH do Rio Grande do Sul é equivalente ao da República Tcheca e ao do Brunei (sudeste da Ásia).

      São Paulo tem desenvolvimento humano semelhante ao México e à Polônia. E o Rio de Janeiro pode ser comparado à Colômbia e à Tailândia.

      Há um grupo intermediário de Estados formado por Amazonas, Amapá, Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, Roraima e Rondônia que têm um índice semelhante ao do Leste Europeu.

      Minas Gerais foi o único Estado do Sudeste que não entrou nesse grupo de alto desenvolvimento humano. Segundo Eduardo Guimarães, o coordenador técnico do relatório, o problema é o norte do Estado.

      O subpaís mais atrasado é formado pelo Pará, Acre e os nove Estados nordestinos".

Para tristeza minha, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de todos esses Estados, a última colocação é do meu Estado, a Paraíba. E, aí, muitos paraibanos devem estar perguntando, também como os brasileiros: - Se temos a décima economia, como podemos estar em 63º lugar? Na Paraíba, sabemos que no Nordeste temos a quarta arrecadação: Bahia, Ceará, Pernambuco e Paraíba. E, no entanto, somos o último colocado entre todos os Estados. Aqui está se buscando ver a qualidade da água que se bebe, o nível da educação, a qualidade da vida. Lamentavelmente, quando esses aspectos são olhados, o Brasil despenca do 10º para o 63º; e a Paraíba, que tem uma posição relativa até boa, cai para o último lugar.

Como eu disse, o Estado de Minas Gerais não entrou porque o norte e o Vale do Jequitinhonha formam uma outra Minas Gerais, pobre, tão pobre quanto o Nordeste, com situação também de miséria. Uma situação onde a qualidade de vida deixa muito a desejar. Diz a matéria veiculada pela imprensa:

      "Indicadores sócio-econômicos das regiões do Vale do Jequitinhonha e do norte de Minas Gerais fazem com que o Estado seja dividido em dois.

      Um é o da estagnação econômica e das desigualdades sociais, e o outro com potencialidades evidentes, como o Triângulo Mineiro e as regiões centro e sul.

      O Vale do Jequitinhonha tem uma população estimada em 1.000.621 pessoas, sendo que 31,8% vivem com renda mensal de até meio salário mínimo e 33,8% com renda de meio a um salário mínimo.

      Assim, 65,6% da população do Vale vive de uma renda de até um salário mínimo. Em todo o Estado, esse percentual cai para 37,2%".

Desta forma, verificamos que o grande Estado de Minas Gerais, que hoje é a terceira economia do País, está dividido em duas grandes regiões. Dos índices, os mais gritantes são a qualidade da água, a mortalidade infantil e a área da educação. Esses índices são vergonhosos. O Nordeste chega a ter 38% de analfabetos. E ai de um país que não investe em educação! Todos os países que se desenvolveram no mundo investiram maciçamente em educação. O Japão e os Estados Unidos somente criaram as condições de sua grandeza quando investiram maciçamente em educação.

No Brasil, qual o homem público, senador, deputado federal, deputado estadual ou vereador, que não sabe que existem escolas que não têm sequer água e luz elétrica? Quantos artigos foram publicados mostrando escolas que não têm sequer sede? Mesmo na Capital Federal, existem 20% de professores leigos.

O Ministério da Educação e do Desporto busca fazer a reversão desse quadro, mas não é fácil, porque a situação é atávica. A educação, lamentavelmente, não é vista pela maioria dos administradores como um elemento de liberdade, de liberação do ser humano. Todos pensam nas necessidades básicas do homem: alimento, vestuário, habitação, saúde, educação - nessa ordem; mas quando se tem educação exponenciam-se as outras. A pessoa que tem educação sabe viver melhor na sua habitação, sabe construir melhor a sua habitação, fazer a melhor opção, sabe se alimentar melhor, sabe se vestir melhor, enfim, cuida melhor da sua saúde, porque sabe das moléstias que são transmissíveis e da necessidade da higiene. As pessoas que não têm educação, lamentavelmente, pagam um preço muito caro por isso. Talvez seja esse o índice mais gritante em nosso País.

Quando observamos a Argentina, aqui do lado, que está passando por uma crise como a nossa, verificamos que eles têm uma escolaridade média duas vezes superior a nossa. A nossa escolaridade média é muito baixa. Há um aspecto ainda pior: aqui existem pessoas que sabem ler; hoje, porém, é outro o conceito de analfabeto; a pessoa pode saber ler e ser analfabeta do ponto de vista da vida moderna.

Portanto, é muito importante que tenhamos esse relatório como um norte, que sirva para corrigir essas distorções. Não podemos ter um país dividido em três segmentos; não podem coexistir no mesmo país aqueles que são apenas um zero à esquerda, os que somente participam, de alguma forma, e os que têm tudo. Isso é uma injustiça e não se constrói uma grande nação dessa forma.

Por isso, alerto todos os que estão ouvindo, seja pela "Voz do Brasil", seja pelas ementas: vamos utilizar esse relatório, não como tristeza.

Hoje, dizia isso ao Governador do meu Estado, que está fazendo os maiores sacrifícios para soerguê-lo. Trata-se de um Estado com uma dívida de 1,6 bilhão para uma arrecadação de 60 milhões/mês; um Estado que arrecada esses 60 milhões e paga, todo mês, 20% dessa dívida gigantesca acumulada; um Estado onde todas as regalias foram cortadas, seja para quem for; um Estado onde impera a austeridade; um Estado que é dos poucos que está pagando em dia os funcionários públicos; um Estado onde a folha de pagamento caiu em 60%; um Estado que está começando a privatizar, mas em que o Governador, primeiramente, teve o cuidado de pôr em ordem; já privatizou o transporte; agora, irá privatizar a eletricidade; também está organizando a Companhia de Águas e Esgotos para a privatização; isso, sem contar as empresas estatais que extinguiu; um Estado que também está pagando em dia as suas contas.

Com todo esse sacrifício, o meu Estado é o último colocado. Dizia ao Governador: não vamos baixar a cabeça; pelo contrário, vamos levantar a bandeira de que temos a obrigação e vamos lutar para que a Paraíba saia desse vergonhoso último lugar. A arrecadação do Estado aumentou, como também a organização administrativa, mas a vergonha permanece: a vergonha do analfabetismo, da má qualidade da água, da má qualidade de vida. Temos que mudar isso.

O Sr. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Nobre Senador, V. Exª tem a palavra.

O Sr. José Eduardo Dutra - Senador Ney Suassuna, peço permissão para participar deste debate, aproveitando o pronunciamento de V. Exª a partir desse quadro da situação dos Estados brasileiros. Como Senador pelo Estado de Sergipe, um Estado do Nordeste, também me entristece profundamente ver que os últimos Estados são exatamente aqueles da Região Nordeste. O Estado de Sergipe está numa posição até relativa, razoável, se comparado aos outros Estados do Nordeste. Parece-me que ele é o primeiro...

O SR. NEY SUASSUNA - É o décimo oitavo.

O Sr. José Eduardo Dutra - ...em relação aos Estados do Nordeste. Gostaria de levantar alguns aspectos sobre o que, a meu ver, pode acontecer se for mantida a atual política econômica. Qual é a grande lógica que orienta hoje a política econômica brasileira? É o afastamento do Estado da atividade econômica. O Estado deixa de ser indutor do desenvolvimento, passando a ser um mero órgão regulador; permite-se que as forças do mercado resolvam os problemas da economia. Sabemos muito bem que, se for mantida essa linha de orientação político-econômica, a tendência do Nordeste será ficar cada vez mais atrasado, porque as forças do mercado vão preferir manter atividades produtivas, econômicas e industriais nos Estados onde já exista infra-estrutura, tais como transportes e comunicação. Esses Estados são os da região Sudeste - Rio de Janeiro, São Paulo, alguns setores de Minas Gerais; na região Sul, um pouco menos, Rio Grande do Sul e Paraná. Existe uma contradição profunda entre a prática da política econômica e a posição política que os Senadores, particularmente da Bancada Nordestina, adotam nesta Casa, de reclamarem da falta de prioridade para o Nordeste, da falta de uma política econômica. Inclusive, todos os Senadores do Nordeste, independente de partido, assinaram um documento que foi encaminhado ao Presidente da República, onde se detecta esse problema e se apresentam soluções. No entanto, o Governo Federal continua na sua lógica neoliberal e o comportamento dos Parlamentares da Bancada nordestina continua sendo de apoio incondicional ao Governo Federal. Avalio que vamos ter de chegar ao ponto, Sr. Senador, de incompatibilidade entre as duas posições. Se quisermos que haja uma política diferenciada para o Nordeste, como também para o Norte - pois a igualdade consiste em tratar de maneira desigual realidades desiguais -, não podemos, a meu ver, continuar com essa posição de dizer amém a todas as iniciativas do Governo Federal na área econômica. Muito obrigado.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, nobre Senador.

O Estado de V. Exª está em 18º lugar dentro da Federação e ocupa a primeira posição dentro do Nordeste; está numa posição confortável, mas é o conforto dentro da miséria.

Realmente, temos que lutar. Já provocamos neste Senado Federal, por muitas vezes, a reunião dos Senadores da Bancada do Nordeste, e até pensamos em algo mais amplo: Norte, Nordeste e Centro-Oeste. É preciso mudar, diminuir as desigualdades. O Norte não aparece tão mal nesse relatório, porque o peixe gera proteínas e, ao mesmo tempo, os grandes rios fazem o esgotamento sanitário. Então, isso melhora a qualidade de vida ao ponto de Rondônia ter a melhor expectativa de vida do País. É surpreendente!

Nós, Senadores do Nordeste, temos que juntar as nossas forças e lutar por uma maior amplitude, uma vez que os Estados do Sul e do Sudeste sempre têm mais força, porque têm mais imprensa e, com toda certeza, mais poder econômico. Ao mesmo tempo em que concordo parcialmente com V. Exª, tenho também uma outra preocupação: os Estados do PSDB conseguem, no cômputo geral, muito mais dados, com exceção do Pará, que não tenho conhecimento.

Mas, ao lado da Paraíba, está o Ceará, que vemos com grande inveja, que recebeu R$300 milhões para o Porto de Pecém; R$400 milhões para a Barragem de Boqueirão; R$97 milhões para o Gasoduto Mossoró-Fortaleza; e pouco mais de R$50 para a reforma do aeroporto do Ceará. Quem dera a Paraíba tivesse essa verba! Quem dera recebesse a verba de R$1 bilhão, como o Ceará; ou vinte e tantos bilhões, como São Paulo; ou antecipação às privatizações, como o Rio de Janeiro; ou a verba que Minas Gerais recebeu para duplicar estradas, metrô e tudo o mais.

O SR. PRESIDENTE (Levy Dias) - Senador Ney Suassuna, a Mesa esclarece a V. Exª que o seu tempo se esgotará dentro de um minuto.

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não.

O Sr. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª, nobre Senador Ney Suassuna um pequeno aparte, apenas para registrar que dentro dessa assertiva de que os Estados do PSDB estão sendo privilegiados, o meu Estado é uma exceção.

O SR. NEY SUASSUNA - É verdade. Para encerrar, Sr. Presidente, Srs. Senadores, o mesmo periódico registra que, para a ONU, o real alterou pouco a miséria e mostra uma distorção mais ou menos próxima a que o Senador lembra, dizendo que a divisão da riqueza ocorreu, mas não em intensidade suficiente para modificar o quadro.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, não temos que lamentar o relatório. Devemos tirar dele a experiência e a orientação para corrigirmos as distorções, dentre as quais enumero a falta de Educação - é preciso investir maciçamente na Educação, apesar de reconhecer que o Ministério está fazendo o que pode -, a baixa melhoria da qualidade de vida, a fim de buscarmos uma melhor divisão de riqueza, inclusive cobrindo as diferenças regionais.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/1996 - Página 10166