Pronunciamento de Pedro Simon em 21/06/1996
Discurso no Senado Federal
HOMENAGEM POSTUMA AO SR. RENATO ARCHER. HISTORICO DA VIDA POLITICA DO SR. RENATO ARCHER.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- HOMENAGEM POSTUMA AO SR. RENATO ARCHER. HISTORICO DA VIDA POLITICA DO SR. RENATO ARCHER.
- Aparteantes
- Bernardo Cabral.
- Publicação
- Publicação no DSF de 22/06/1996 - Página 10597
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM POSTUMA, RENATO ARCHER, ESTADO DO MARANHÃO (MA), EX-DEPUTADO, EX MINISTRO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT).
- SOLICITAÇÃO, INSERÇÃO, ANAIS DO SENADO, JUSTIFICAÇÃO, REQUERIMENTO, VOTO DE PESAR, TRANSCRIÇÃO, BIOGRAFIA, RENATO ARCHER, EX-DEPUTADO, EX MINISTRO, ESTADO DO MARANHÃO (MA).
O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi enterrado ontem, no Rio de Janeiro, o ex-Deputado Renato Archer. Eu estava com a passagem marcada, quando soube que o Presidente José Sarney também iria, e S. Exª me convidou para ir em sua companhia. Todavia, vários acontecimentos impediram a ida do Presidente José Sarney, e eu desempenhei a missão de representar o Senado Federal naquela solenidade.
Para mim, foi um momento triste, porque Renato Archer era um amigo particular, com quem convivi longo período. Conheci-o quando eu era Deputado Estadual, Presidente do MDB no Rio Grande do Sul, e nós do MDB do Rio Grande do Sul desempenhávamos, naquela época, um papel muito importante na política nacional, porque, entre outros motivos, ali do lado, no Uruguai, estavam os dois exilados considerados os mais perigosos pelo País: o ex-Presidente João Goulart e o ex-Governador Leonel Brizola.
Conheci Renato Archer quando ele coordenava, junto com Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda e João Goulart, a Frente Ampla. Foi aí que o conheci, nas suas idas e vindas a Montevidéu e nas minhas idas e vindas ao Rio de Janeiro. Nessa época, pude observar todo o seu esforço e todo o seu trabalho na busca do entendimento entre pessoas tão adversárias: João Goulart, que tinha sido deposto por um golpe, cujo grande líder tinha sido exatamente Carlos Lacerda, e Juscelino Kubitschek de Oliveira. Houve uma eleição, elegeu-se Jânio Quadros, da oposição, a quem Juscelino passou o governo. O crime de Juscelino Kubitschek foi estar em campanha, em 1965, para retornar à Presidência da República. Como Carlos Lacerda também estava em campanha à Presidência da República, houveram por bem usar o arbítrio do regime militar para cassar os direitos políticos de Juscelino - triste destino! - e de Carlos Lacerda.
Antes disso, Renato Archer coordenou esse trabalho. Foi um trabalho estafante: Juscelino, na Europa; Jango, em Montevidéu; Lacerda, no Brasil; e Brizola, em Montevidéu, que resistia em sentar-se à mesma mesa com Lacerda. Renato Archer desempenhou seu papel, magnífico papel!
O governo não soube entender a intenção da Frente Ampla, que era fazer um grande esforço pela redemocratização do País. A Frente Ampla não pregava golpe, não pregava violência, não pregava radicalização. A Frente Ampla pregava o grande entendimento nacional para a normalização da vida democrática, pregava que os opostos, aqueles que estiveram radicalmente tão contrários até 1964, entendessem que o momento era para deixar de lado aquelas questões e colocar, acima delas, os interesses nacionais.
Lá estava Jango deposto, e Juscelino e Lacerda, que pretendiam ser candidatos à Presidência da República, lutando por algo que estava acima de todas essas questões. O Brasil estava no regime do arbítrio, e a Frente Ampla desejava introduzir no País o regime democrático. A Frente Ampla acabou da forma que todos sabem: com a cassação de todos os que dela participaram, num ato de arbítrio e de violência. Foi aí que conheci Renato Archer. Foi aí que conheci seu passado. Seu pai foi Governador e Senador pelo Maranhão. Renato Archer foi Vice-Governador do seu Estado; deputado federal, jovem brilhante daquela geração que tanto participou. No Rio de Janeiro, no Palácio Tiradentes, Renato Archer participou daquele extraordinário governo. E o que mais emocionava Renato Archer era ter sido Ministro substituto de San Tiago Dantas, do qual era grande discípulo e por quem tinha uma estima fora do comum. Foi várias vezes Ministro substituto das Relações Exteriores. Participou, com San Tiago Dantas ou em seu lugar, de muitas reuniões internacionais, inclusive da célebre reunião internacional de Punta Del Leste, quando se firmou o princípio da liberdade de livre manifestação dos povos e de não-agressão, onde se estabeleceu o contrário do que até então vigorava neste Brasil - os americanos é que determinavam e orientavam para onde é que se devia ir, e todos tinham que ir atrás. Ele defendeu em Punta del Leste, pela primeira vez e com coragem, a manifestação de que temos que respeitar a livre determinação interna dos países que fazem parte das Organizações. San Tiago Dantas foi um grande brasileiro, que lançou, na época de Jango, como seu Ministro, o célebre Plano Trienal. Foi a primeira vez, no Brasil, que se fez um orçamento que não previa apenas o ano seguinte, mas previa exatamente um plano de organização de trabalho.
Conheci Renato Archer dentro do nosso Partido, desde o início do MDB, na resistência, na luta, desde a primeira hora. Renato Archer, mesmo cassado, sem os direitos políticos, estava presente nas nossas reuniões como se fosse um parlamentar. Tinha rendimento às suas expensas. Não havia reunião do nosso Partido, fosse no Rio Grande do Sul, em Pernambuco, ou onde fosse, em que Renato Archer não estivesse presente. Integrava a Executiva Nacional do Partido e era o nosso eterno conselheiro, o orientador, o balizador. Era o homem que estava, muitas vezes, à margem; não era dos que aparecia, dos que se exibia, mas estava ali permanentemente.
Renato Archer era o braço direito de Ulysses Guimarães. Não passava um dia sem que o Dr. Ulysses Guimarães telefonasse vinte vezes para o Dr. Renato Archer. Para mim, quando eu era Deputado Estadual, Dr. Ulysses telefonava de quatro a cinco vezes por dia.
Quantas e quantas vezes, Renato Archer, que tinha os seus interesses, que tinha o seu trabalho, vinha e ficava dias e mais dias em Brasília. Não havia reunião do MDB, durante a crise político-institucional, sem que Renato Archer, cassado, estivesse presente. Isso durante o AI-1, o AI-2, o AI-5 e na série de reuniões da Bancada do MDB. Foi a ocasião em que Brossard saiu vitorioso e Trancredo foi o grande derrotado. Tancredo só não dizia que eram os militares, mas dava a entender, com toda a clareza, que aquela reforma do Judiciário tinha que ser votada; que nós, do MDB, não podíamos alterá-la, porque ela seria pretexto para muito coisa. Tudo isso naquela semana que passamos, naquela reunião fantástica, em que o Dr. Tancredo foi humilhado, porque defendia que não devíamos votar. E o nosso MDB, com aquela sua mania, aliás, respeitosa, de luta, de garra, de enfrentamento, dizia o contrário. E o Brossard deu um show. O Tancredo se saiu mal, mas a sua tese ficou provada logo depois, quando fecharam o Congresso Nacional e saiu a Constituinte do Riacho Fundo, onde nasceu o Senador biônico e tudo o mais, onde alteraram ao bel-prazer, escandalosamente, a Constituição. Em todo aquele episódio, que durou meses, estava Renato Archer: madrugadas e madrugadas, procurando parlamentares, com eles discutindo.
Houve também o episódio da cassação dos Deputados Amaury Müller e Nadyr Rossetti, dois gaúchos, que fizeram um discurso em Palmeira das Missões, em um comício de madrugada. Lá pelas tantas, teriam eles dito algumas frases mais pesadas que são ditas ao som do improviso. Isso lá no interior. Pinçaram as frases das gravações e as publicaram em manchete nos jornais do País inteiro, exigindo a cassação dos dois.
Diante disso, a Bancada do MDB tomou a disposição de ir um por um à tribuna repetir aquele discurso, para que todos fossem cassados. Logo no outro dia, Lysâneas Maciel falou a respeito da cassação, repetiu o que disseram os deputados gaúchos e, por isso, também foi cassado.
Naquela madrugada em que a Bancada do MDB estava reunida, Renato Archer foi me tirar da cama. Eu era Deputado Estadual, Presidente do MDB do Rio Grande do Sul, e, como participava de todas as crises nacionais, era convocado. Eu tinha de comparecer como Presidente do Partido do Rio Grande do Sul. Chegando aqui de madrugada, Renato, mesmo com os seus direitos políticos cassados, tirou-me da cama para me dizer que uma tragédia iria acontecer, pois a Bancada estava exigindo a leitura da sua nota, e a Executiva do MDB havia lançado uma outra nota que não estava sendo aceita. Disse-me ele: eles cassaram o Deputado Lysâneas Maciel. Já estão designando os que serão cassados a partir de amanhã. Às 4h30min, fomos tirar o Dr. Tancredo Neves da cama. Apertamos a campainha - nunca me esquecerei-, veio ele de pijama de calças curtas, preocupado com o que estava acontecendo. Nós, Renato Archer e eu, relatamos o que estava ocorrendo. O Dr. Tancredo perguntou: "O que se pode fazer?" Respondemos: "Dr. Tancredo, essa nota da Executiva do Partido não está sendo aceita". "E por quê?" Perguntou Tancredo. "Porque eles querem que se retire isso ou aquilo", respondemos. "Ah, é para tirar?" Não vou esquecer nunca a resposta do Dr. Tancredo. Disse ele: "Meu filho, para tirar, tirem o que quiser, não podem é botar. O que quiserem tirar que tirem".
Voltamos - Renato e eu - para a reunião da Bancada do grupo chamado Grupo Autêntico e dissemos: "o Dr. Tancredo disse que podem tirar isso e o que mais quiserem". Claro que não disse que ele tinha dito que "podem tirar o que quiser, mas não podem botar nada". Lá estava o Renato Archer.
O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. PEDRO SIMON - Com prazer, ouço V. Exª.
O Sr. Bernardo Cabral - Senador Pedro Simon, ainda que V. Exª não tivesse condições - o que não é o caso - de ser biógrafo, nesta manhã, V. Exª faz um retrato, ainda que saudoso, do nosso querido companheiro Renato Archer. Primeiro, conheci Remi Archer, seu irmão, quando era Presidente do Banco da Amazônia. Depois, com o Ato Institucional nº 2, que extinguiu os partidos, foi fundado o MDB, do qual fui Presidente do Diretório Regional no meu Estado, e por ele me elegi Deputado Federal pela primeira vez. Nesse interregno, por intermédio do jornalista Hermano Alves, conheci Renato Archer quando era Subsecretário do Ministério das Relações Exteriores, conforme V. Exª assinalou, substituindo, com rara proficiência, esse homem cujo talento ultrapassou, de logo, as fronteiras do Brasil, que foi Francisco Clementino de San Tiago Dantas, o nosso grande San Tiago Dantas. Da conversa com Renato Archer, qualquer um tirava logo a conclusão de que ele era um homem de boa cultura humanística, um causeur, daqueles que irradiam porque não têm opacidade. V. Exª faz bem em lembrar que os homens só são estimados quando, após a sua morte, alguém ocupa a tribuna dos Parlamentos, através de manifestações como essa que V. Exª está a fazer, ou através de escritos, para demonstrar o apreço que tem por aquele que se foi. Em verdade, Senador Pedro Simon - V. Exª disse, com bastante objetividade -, quando Tancredo, ainda no limiar entre a vida e a morte, estava para assumir o seu mandato presidencial, foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia, para que ele fosse o primeiro titular. E é bom que se diga que a sua passagem pelo Ministério da Previdência Social foi absolutamente escorreita. Ele o colocou nos trilhos e demonstrou que a Nação tinha um Ministério da Previdência Social que não era, como se alardeava, deficitário. Só peço a V. Exª que acompanhe meu raciocínio, que está difícil devido ao espírito santo de orelha que está aqui ao lado. Quero concluir o que estava a lhe dizer. A conclusão é que esta Casa deveria estar cheia hoje para ouvir o belo discurso de saudade que V. Exª pronuncia, V. Exª que, como eu, sofreu na pele as agruras do MDB e depois do PMDB. Onde estiver, Renato Archer deverá estar dizendo: "Obrigado, Pedro Simon".
O SR. PEDRO SIMON - Eu agradeço a gentileza do aparte de V. Exª, que conviveu com Renato Archer e que, por ter convivido com ele, por tê-lo conhecido, sabe da sua profundidade de espírito e da sua sinceridade.
Peço que faça parte do meu pronunciamento a justificativa do Voto de Pesar que entreguei à Mesa e a cópia do trecho do Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro que inclui o nome de Renato Archer.
Como disse muito bem Bernardo Cabral, ele participou da Aliança Democrática; aliás, participou da campanha de Juscelino Kubitschek, de quem era amigo pessoal; foi, como disse V. Exª, subministro auxiliar, braço direito de San Tiago Dantas; associou-se à campanha, já na ditadura, pela Anistia; participou da campanha pelas Diretas Já e, depois, da campanha de Tancredo Neve para Presidente da República.
Tem razão V. Exª quando diz que foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia para ser entregue a Renato Archer, ao Renato Archer cuja indicação teve restrições por parte dos cientistas.
Nunca me esqueço de quando nós, terminando o primeiro ano de Governo do Presidente José Sarney, decidimos que tinha que se fazer com urgência uma reforma ministerial para que o Dr. José Sarney governasse com um ministério dele e não com um ministério de Tancredo. Houve um movimento, e eu dele participei. Todos os cientistas do Brasil reuniram-se e entregaram ao Presidente José Sarney um apelo para que Renato Archer continuasse no Ministério de Ciência e Tecnologia, tal foi a sua competência, a sua capacidade de organizar e coordenar o mundo científico brasileiro - coisa, aliás, que ainda não tinha acontecido. Os cientistas brasileiros eram praticamente órfãos. Não existia o Ministério da Cultura, não existia o Ministério da Ciência e Tecnologia. Nossos técnicos estavam no submundo, num galpão do Ministério da Educação ou nos diversos galpões do Ministério das Minas e Energia, da Petrobrás e da Vale do Rio Doce.
Alguém que coordenasse o mundo da ciência do Brasil nunca tinha existido. E sob o Governo de José Sarney, Renato Archer exerceu esse papel, esse belo, esse grande papel. E as suas posições no plano da ciência e da tecnologia são por demais conhecidas. Até as divergências são por demais conhecidas.
Tem razão o Senador quando cita a sua passagem pela Previdência Social. E vejam que é um ramo que vive sofrendo restrições, críticas, escândalos e tudo o mais. O Renato Archer traçou uma linha de ação na Previdência Social. Lembro-me de que teve participação importante na municipalização da saúde. Lembro-me de que, juntamente com o Presidente Sarney, tirou da Previdência o caráter político-partidário, aquele de dar a uns mais e a outros menos.
Eu, como Governador do Rio Grande do Sul, recebi o que tinha direito, como todos os Governadores de todos os Estados receberam o que tinham direito na municipalização da saúde.
Renato Archer não foi Ministro no Governo Itamar Franco, mas - está vivo Itamar Franco para confirmar o que vou dizer -, se dependesse de Itamar Franco, em mais de uma oportunidade, Renato Archer teria sido seu Ministro das Minas e Energia. Em mais de uma oportunidade, participei - e não foi iniciativa minha - de reuniões em que Renato Archer foi indicado Ministro das Minas e Energia pelo Presidente Itamar Franco. Por questões que não vale a pena analisar, dificuldades na montagem do Governo, divergências que não importa aqui se analisar, sua nomeação nunca foi efetivada. Mas vale apenas salientar este aspecto: se dependesse do Presidente Itamar Franco, ele teria sido Ministro das Minas e Energia. Como não foi possível, recebeu o alto cargo que desempenhou com rara brilhatura exatamente no Governo de Itamar Franco.
Quero destacar a amizade de Renato Archer com o Dr. Ulysses Guimarães. O Dr. Ulysses Guimarães tinha o Renato Archer e o seu amigo, o secretário Osvaldo. O secretário Osvaldo, segundo contam os mais ligados, era um homem espírita, muito crente no espiritismo, que teria recebido uma mensagem de Deus para que fosse o auxiliar, o colaborador, o anjo protetor do Dr. Ulysses Guimarães. Osvaldo continua fazendo isso, mesmo depois de morto o Dr. Ulysses Guimarães. E Renato Archer, o político, o conselheiro, o amigo de todas as horas, o homem das horas dramáticas, o homem das horas trágicas.
É emocionante lembrar o drama do Dr. Ulysses em sua doença. Não esqueço, pois foi o momento mais trágico da minha vida política. Vi Teotônio Vilela, sofrendo de quatro cânceres, usando duas bengalas, com sua cabeça rapada, assumir a Presidência do PMDB Nacional, porque o Dr. Ulysses estava se afastando por causa de uma doença que ninguém sabia qual era. Para nós, parecia que ele estava à beira da morte. Coisa fantástica, nobre Senador: era estafa. Mas a estafa do Dr. Ulysses o deixou em uma depressão que parecia que ele estava perto do final, principalmente depois de tomar aquele remédio errado.
Foi o Dr. Renato Archer, na sua célebre casa da praia no Rio de Janeiro, foi o Dr. Renato Archer, nos Estados Unidos, o grande protetor, o grande amigo, o grande correligionário, o grande irmão que o Dr. Ulysses Guimarães teve.
Ora, Sr. Presidente, sei que estou ficando velho, mas sofro muito porque vejo partirem as figuras do meu coração, do meu MDB - Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela e, agora, Renato Archer -, grandes nomes do heroísmo, nomes que representam a luta histórica, o messianismo. São os missionários, são os pregadores: Ulysses, Tancredo, Teotônio e Renato.
O Renato era ainda uma das referências que eu tinha dentro do meu Partido, dentro do PMDB. Não tinha mais Tancredo, não tinha mais Ulysses, não tinha mais Teotônio Vilela; o Renato era a referência que eu tinha.
Parece que Deus, nos desafios da vida, está sempre a cobrar de nós atos de resistência, retirando do nosso convívio aqueles que tinham muito a dar. Às vezes me pergunto se Deus pode ser infinitamente justo e infinitamente bom, porque ele é infinitamente justo e, não sei como, infinitamente bom tirando pessoas como essas, que tantos serviços podiam prestar a nós todos. É claro que para quem acredita em uma vida sobrenatural, é claro que para quem acredita que o mundo continua e que haveremos de nos encontrar um dia lá, nem Renato, nem Tancredo, nem Ulysses, nem Teotônio desapareceram. Apenas foram para um outro plano.
Mas, na verdade, essa gente faz falta. Exatamente hoje, meu Presidente, quando temos tantas angústias! Não que tantas pessoas não queiram cumprir o seu dever. A começar pelo Presidente da República, que considero um homem de bem, um homem sério, e a continuar por nós, Parlamentares, vejo muita gente séria. O que não tenho é a certeza de por onde caminhar.
O mundo todo, tenho repetido isso, o universo, a Igreja Católica, o capitalismo, o comunismo - desaparecendo ou não -, a Queda do Muro de Berlim, tudo mostra que estamos vivendo um tempo de incertezas, onde difícil não é cumprir o dever, é saber como se está a cumprir o dever.
Por isso, Sr. Presidente, nesta hora são importantes as referências. É importante olhar para o Senador Bernardo Cabral e dizer: se o Bernardo Cabral fala é porque é, porque eu conheço o Bernardo Cabral. Isso está desaparecendo. As pessoas das quais podemos dizer isso estão desaparecendo.
Quando vemos o Presidente Fernando Henrique, um homem extraordinariamente competente e sério, dizendo o que não dizia ontem, nos perguntamos: É por aí? Longe de mim duvidar da seriedade e da dignidade do Senhor Fernando Henrique Cardoso, mas se Sua Excelência falou uma linguagem com a qual me identifiquei toda a vida, e hoje Sua Excelência fala outra linguagem, não é que duvide, mas tenho o direito de me perguntar: É por aí?
É por isso que fazem falta pessoas com as quais possamos discutir, com as quais possamos nos sentar à mesa e analisar; pessoas como Mário Covas, pessoas como Jarbas Vasconcelos, pessoas como Pimenta da Veiga, pessoas como Euclides Scalco, que são dos mais variados partidos, mas cuja linha de ação nós conhecemos. É por isso que faz falta Renato Archer. Ele era uma dessas referências. Para mim, então, ele era mais do que um amigo, mais do que um companheiro, era o irmão de todas as horas.
Agradeço e encerro, Sr. Presidente, levando à sua mulher, Maria da Glória, e a todos os seus familiares o meu carinho, o meu afeto e o meu muito obrigado.
A ti, Renato Archer, pelo muito que fizestes pelo teu Partido e pela tua Pátria.