Discurso no Senado Federal

DIVULGAÇÃO DO RELATORIO DA ONU SOBRE DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL, EM QUE CITA A REGIÃO NORDESTE COMO A MAIS POBRE DO BRASIL.

Autor
Waldeck Ornelas (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Waldeck Vieira Ornelas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • DIVULGAÇÃO DO RELATORIO DA ONU SOBRE DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL, EM QUE CITA A REGIÃO NORDESTE COMO A MAIS POBRE DO BRASIL.
Aparteantes
José Agripino, José Fogaça, Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 22/06/1996 - Página 10623
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), INDICE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, BRASIL, REFERENCIA, DESIGUALDADE REGIONAL, EDUCAÇÃO, EXPECTATIVA, VIDA, RENDA PER CAPITA, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE POBREZA, REGIÃO NORDESTE.
  • NECESSIDADE, INVESTIMENTO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORDESTE, BRASIL, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO, CONCENTRAÇÃO, RECURSOS, REDUÇÃO, DESEQUILIBRIO, DESIGUALDADE REGIONAL, PAIS.

O SR. WALDECK ORNELAS (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Nação tomou conhecimento esta semana de que somos agora três Brasis.

O Sociólogo francês Jacques Lambert, em um clássico a que deu o título "Os Dois Brasis", falou-nos no dualismo entre um Brasil arcaico e um Brasil moderno.

Já no início desta década, na Comissão de Desequilíbrio Inter-Regional, o Senador Beni Veras, seu Relator, nos fala sempre de um Brasil Um e um Brasil Dois. O Brasil Um abrangendo as Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Agora nos vem o PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, e traz um relatório a partir de um novo índice, o Índice de Desenvolvimento Humano. E o que vem a ser esse índice? Nós, que estamos habituados a tratar e a trabalhar apenas com o PIB e a renda per capita, temos agora um índice mais composto, um índice que inclui, do ponto de vista da educação, a taxa de alfabetização; e, do ponto de vista da saúde, a expectativa de vida, fazendo uma média simples entre a renda per capita, a taxa de alfabetização e a expectativa de vida.

Ora, com base nesses dados, conclui-se que agora somos três Brasis.

Já os cálculos para o Fundo de Participação dos Estados tinham nos mostrado que o Mato Grosso do Sul tem uma renda per capita acima da média nacional, e, por conseguinte, não constitui surpresa que Mato Grosso do Sul tenha sido inserido no Brasil rico.

Tenho alguma dúvida se a Amazônia constitui efetivamente o Brasil Bulgária, como foi chamado. E tenho a minha dúvida exatamente porque não sei se o índice utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio, a PNAD. Porque a PNAD só considera na Amazônia os dados urbanos, não considera o conjunto da população. Sem dúvida que o dado em relação ao Estado do Amazonas, especificamente, estará influenciado pelo efeito da Zona Franca de Manaus. De todo modo, torço para que os números anunciados pelo PNUD incluam o conjunto da população, porque isso mostrará que a Amazônia vem melhorando, e isto é bom para o País.

Não tive oportunidade ainda de examinar o texto do relatório. Falo com base no noticiário do jornal. Já o Senador José Fogaça, que me antecedeu, chamou atenção para o fato de que os dados se referem ao ano de 1991, ou seja, os dados refletem o que o Brasil realizou, desde o seu descobrimento até o ano de 1991, em termos de desenvolvimento humano.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que quero chamar atenção é que qualquer que seja a classificação dos Brasis, dos dois Brasis de Jacques Lambert e dos três Brasis, agora, do PNUD, sempre o Nordeste está na pior situação. E é sobre esse Brasil, o terceiro, que quero falar; é nele que quero me deter, esperando que pelo menos esse relatório cumpra um papel importante. Ele não traz, em relação ao Nordeste, nada de novo, mas é preciso que ele conscientize o País de que o Nordeste é cada vez mais uma questão nacional. Virou moda dizer-se: - É preciso desregionalizar a questão nordestina. Mas não se tomam medidas e providências para equacionar a questão. O Nordeste não é apenas um problema, o Nordeste tem solução, sim, desde que se tenha vontade política e determinação para realizar, para encaminhar a solução dos seus problemas.

Isso também me faz assinalar a oportunidade com que o Senado acaba de criar, instalada ontem, uma Comissão Especial para o Estudo de Políticas do Desenvolvimento do Nordeste, desaguadouro da ação que a Bancada dos Estados Nordestinos no Senado vem empreendendo desde o segundo semestre do ano passado.

O que há de grave no País, e este sim é um dado atual, é a reconcentração da economia brasileira. É a ela que precisamos reagir. E ela se manifesta na evolução do PIB, tomando-se como referência o Estado de São Paulo, que em 1970 tinha uma participação de 39,43% no PIB brasileiro. Essa participação decresceu até 35,7% em 1990. Mas voltou a crescer em 1995, quando alcançou 35,85%, mostrando que o que antes era apenas uma preocupação acadêmica já é hoje um dado confirmado pelos números da Fundação Getúlio Vargas.

Como se dá essa dinâmica da reconcentração? Como se não bastasse, a tendência espontânea da economia em concentrar-se, ocorre que os órgãos de financiamento coonestam essa reconcentração.

Vejam-se os dados do BNDES: em 1990, o Nordeste teve, em aprovações do Sistema BNDES, uma participação da ordem de 21%. Em 94, essa participação estava em 11%, com uma queda de dez pontos percentuais. Vejam bem, eu não disse 10%, estou falando dez pontos percentuais. E somente em 94 recuperou-se o nível de investimento de 90, da ordem de 677 milhões, sendo que nesse período as aplicações totais do banco cresceram de 3,2 para 5,9 bilhões.

Nós sabemos que este ano o banco tem um volume de recursos para aplicações da ordem de 10,5 bilhões, superior até ao do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Cito um outro dado que nos mostra e nos revela um curioso e trágico paradoxo.

Vejam os Senhores que nas aplicações da Finep, a Financiadora de Estudos e Projetos, - e estamos entrando na era do conhecimento, na era da informação, na era em que o desenvolvimento científico e tecnológico é uma variável estratégica e fundamental para o desenvolvimento - em financiamentos com retorno, o Nordeste tem uma participação de 17,1%; em financiamentos sem retorno, financiamentos a fundo perdido, a participação do Nordeste é de apenas 2,6% - esses são dados de 1995.

Vejam V. Exªs que a região mais carente demanda, em recursos com retorno, recursos a serem pagos, reembolsados, sete a oito vezes mais do que recebe em recursos a fundo perdido. Esses dados já foram levados aos dirigentes de ambas as instituições e, sobretudo, ao Ministério de Ciência e Tecnologia, onde tiveram a melhor acolhida e um compromisso do empenho em corrigir essa distorção.

O Sr. José Agripino - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. WALDECK ORNELAS - Ouço V. Exª, Senador José Agripino.

O Sr. José Agripino - Senador Waldeck Ornelas, lamento que este plenário não esteja repleto para ouvir o pronunciamento substancioso e importante que V. Exª faz nesta manhã. Nós, do Nordeste, padecemos de um cacoete, o da modéstia. Certa vez, conversando com uma autoridade da República, ela me disse: quando vocês vêm aqui, vêm maneirosos, pedem "por favor", dizem "será que não seria possível?", quando parlamentares de outras regiões vêm aqui impondo. Talvez esse seja o nosso erro. Em muito boa hora criou-se a Comissão a que V. Exª se refere e da qual fazemos parte, porque penso que esse é nosso dever perante a região mais pobre do País. Como bem registram os trabalhos expostos pela ONU, a partir de dados estatísticos do Brasil, é no Nordeste que vive o maior contingente de miseráveis; é lá que está o maior problema social do País, seguramente maior que o problema social dos sem-terra, que souberam expor a sua ação, conquistar os meios de comunicação para sensibilizar a opinião pública, que está 61%, segundo pesquisas recentes divulgadas, a favor das invasões de terras, fato contestável, questionável, mas que hoje domina a opinião pública. Penso que é nosso dever multiplicar pronunciamentos como o que V. Exª faz nesta manhã, para sensibilizarmos este Plenário, o Congresso e a opinião pública brasileira para o maior problema deste País, pelo esquecimento, pelo abandono, pelo perigo da concentração de renda e de oportunidades no novo Brasil. E é nosso dever, repito, falarmos e falarmos grosso, multiplicarmos o pronunciamento de V. Exª, para tentarmos sensibilizar a imprensa, a opinião pública e o Congresso Nacional, para que o planejamento do País se volte, em primeiro lugar, para o maior problema social do Brasil, que se chama Nordeste. Quero cumprimentar, portanto, V. Exª pelo importante pronunciamento que faz nesta manhã.

O SR. WALDECK ORNELAS - Agradeço e digo que V. Exª tem plena razão. O desequilíbrio regional do desenvolvimento é, seguramente, a face mais cruel das injustiças sociais do País; é por causa delas que o Nordeste, com 29% da população brasileira, concentra 54,6% da miséria nacional.

Porém, Senador José Agripino, Srs. Senadores, há um desequilíbrio institucionalizado. Além daquela inércia, que faz com que o BNDES não tenha uma ação eficiente em favor do Nordeste, que espere apenas uma demanda de balcão, há um desequilíbrio institucionalizado.

É preciso que se considere que também há uma falta de ação orgânica por parte do Poder Legislativo, que pode, sim, atuar no sentido de corrigir distorções. Ainda nesta sessão, mais cedo, discutiu-se a questão da convergência. É preciso que haja aqui entendimentos em torno de ações convergentes. O papel do Legislativo, que é um órgão colegiado, não pode ser apenas um somatório dos esforços individuais; é preciso ações coletivas.

A Resolução nº 200, de 12 de dezembro de 1995, do Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, estabeleceu critérios para as aplicações dos recursos do FGTS no período 96/99.

Vejam este primor: se tomarmos apenas os dados relativos a abastecimento de água e esgotamento sanitário, o Nordeste tem, de atendimento de água, 78,2%; de esgotamento sanitário, apenas 13,2% em redes domiciliares. No Sudeste, em água, o atendimento já é de 93,5%; em esgotamento sanitário, já é de 70,4%.

Mas o que define a Resolução do Conselho Curador do FGTS? Ao Nordeste destinam-se 28,31% dos recursos e, ao Sudeste, 41,17% dos recursos. Ou seja, quem precisa menos recebe mais recursos e quem precisa mais é punido.

Apresentei, nesse sentido, o Projeto de Lei nº 106, de 1996, objetivando estabelecer que as aplicações dos recursos do FGTS na área de saneamento devem ter sua destinação com base no déficit de serviços de água e esgoto em cada unidade da Federação.

Tomemos um outro exemplo, o salário-educação. Nesse, há uma cota estadual que abrange 2/3 dos recursos. No entanto, a cota estadual é proporcional à arrecadação. Portanto, quem mais arrecada fica com 2/3 da arrecadação, o que causa um tremendo desequilíbrio também nos recursos para a educação.

Vejam que esses dois exemplos incidiriam sobre dois dos componentes de que trata o índice de desenvolvimento humano, educação e saneamento, como melhoria de condição de vida e, por conseguinte, com reflexos na melhoria da expectativa de vida.

Também em relação a esse particular já apresentei a esta Casa o Projeto de Lei nº 79, de 1995, que se encontra em tramitação.

Dentro dessa institucionalização da concentração, queria chamar a atenção de V. Exªs para o crédito educativo. Com relação a esse, em que o estudante toma o dinheiro emprestado para pagar depois de formado, 60% vão para a região Sudeste, porque o critério é de distribuição proporcional a matrículas na rede privada de ensino, e não da renda per capita da população, como deveria ser. Se assim fosse, o Nordeste estaria com uma participação bem mais elevada.

Considerando os incentivos à ciência e tecnologia, verificamos que o Nordeste não tem acesso a eles, porque se apóiam na isenção do Imposto de Renda.

Dos 237 projetos aprovados na área de informática, nada menos do que 145 são do Estado de São Paulo, ficando Minas Gerais com 24 projetos e o Rio de Janeiro com outros 13. Esses três Estados totalizam 182 projetos, representando uma concentração da ordem de 76,8%.

O SR. PRESIDENTE (Artur da Távola) - Perdoe-me interromper V. Exª, mas gostaria de avisá-lo de que o seu tempo está esgotado.

O SR. WALDECK ORNELAS - Lamento, porque ainda teria muito o que falar. Dos 93 projetos aprovados na área de indústria e agropecuária, São Paulo, sozinho, concentra 63 projetos, ficando o Rio de Janeiro com 13, Minas Gerais com 16, somando, outra vez, os mesmos três Estados, 82 projetos e 88,2% do total.

No conjunto, todos os projetos originam-se em somente 8 Estados; existe apenas um, já contratado, oriundo do Nordeste, e nenhum do Norte.

Há, por conseguinte, uma concentração muito forte, ajudada pela própria legislação vigente.

Estou preparando, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, projetos específicos em relação ao crédito educativo e aos incentivos para a ciência e tecnologia.

Também chamo a atenção de V. Exªs para a Lei de Irrigação, que tem um aspecto interessantíssimo - permita-me, Sr. Presidente, falar por mais alguns minutos.

A Lei de Irrigação fala em projetos de interesse social. E onde está a condenação do Nordeste? Na regulamentação, que diz, no § 1º do seu art. 14:

      "O interesse social predominante estará caracterizado, entre outros fatores, quando se trate de área sujeita ao fenômeno das secas..."

Ora, isso define que projeto de irrigação no Nordeste é projeto de interesse social e não econômico. Aí está a condenação do Nordeste.

É inacreditável que, dependendo apenas única e exclusivamente de um ato do Executivo, essa regulamentação não tenha sido, até o presente momento, modificada, atualizada.

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. WALDECK ORNELAS - Ouço o Senador Lauro Campos.

O SR. PRESIDENTE (Artur da Távola) - A Mesa solicita aos aparteantes que sejam breves, para que possamos manter o horário, que já foi ultrapassado em quatro minutos.

O Sr. Lauro Campos - Pois não, Sr. Presidente. Eminente Senador Waldeck Ornelas, parabenizo V. Exª pela preocupação, respaldada em dados e indicadores, de que realmente o Nordeste do Brasil continua sendo uma região excluída do processo de crescimento verificado no Brasil. Gostaria de lembrar a V. Exª que os dois Brasis de Jacques Lambert sofreram, ao longo do tempo, uma outra interpretação: que esse desenvolvimento é desigual e combinado; ou seja, na realidade, o Centro-Sul deve seu crescimento ao empobrecimento relativo do Nordeste. Basta lembrar os 4 milhões de trabalhadores nordestinos que se encontram em São Paulo fazendo a riqueza daquele Estado. Parabenizo V. Exª, porque, ao contrário de alguns de seus conterrâneos, a sua preocupação com o social é bastante pronunciada. Celso Furtado, na pág. 47 do seu livro "Perspectivas do Desenvolvimento Econômico", publicado pelo ISEB, em 1957, diz textualmente: A solução para os problemas do Nordeste se encontra no próprio Nordeste. E essa solução resulta da redução do salário monetário - e S. S não diz nominal, diz monetário - dos trabalhadores nordestinos que são, como sabemos, dos mais mal remunerados. Celso Furtado afirma que a solução é reduzir o salário monetário do trabalhador nordestino para atrair capital para o Nordeste. Disso resultou, entre outras coisas, o salário mínimo diferenciado por regiões que constituiu um atrativo ainda maior para o êxodo da mão-de-obra do Nordeste para aquelas capitais onde o salário era relativamente maior. Muito obrigado, Senador Waldeck Ornelas.

O SR. WALDECK ORNELAS - Creio que a tese de Celso Furtado, a que V. Exª se refere, podia ser aplicada em uma época em que o Brasil não se constituía em um mercado unificado de fatores. Cabia, então, uma estratégia de desenvolvimento autárquico para a Região Nordeste. Hoje, na era da globalização, temos de encarar isso de forma diferente.

Por outro lado, devo chamar a atenção de V. Exª - talvez V. Exª não tenha percebido esse movimento - para o fato de que a bancada dos Estados do Nordeste no Senado Federal tem tido uma atuação bastante criteriosa, bastante objetiva, com preocupação acentuadamente social e econômica. Todos os meus conterrâneos estão comprometidos com essa proposta, com esses objetivos. Isso está refletido num documento entregue pessoalmente ao Presidente da República.

É verdadeira a interpretação do estudo de Jacques Lambert. No entanto, é preciso considerar que, no passado, o Nordeste foi o gerador de divisas, que financiou a industrialização do Centro-Sul. Está na hora agora de recebermos de volta o que nos foi apropriado, é preciso que o Centro-Sul também se aperceba disso.

O Sr. José Fogaça - V. Exª me permite um aparte?

O SR. WALDECK ORNELAS - Gostaria de ouvir o Senador José Fogaça, se o Presidente me permite, para, em seguida, concluir meu pronunciamento.

O SR. PRESIDENTE (Artur da Távola) - Srs. Senadores, passaram-se sete minutos do tempo do orador.

Encareço - muito embora tendo em vista a importância do pronunciamento, que realmente é notória - brevidade nos apartes para não ultrapassarmos o tempo estabelecido no Regimento.

Apesar de esta sessão ser bastante informal, ainda há outros oradores inscritos. E, mesmo dentro da informalidade, espero que o fascínio do tema e o talento do orador não excitem mais intelectualmente este Plenário.

O Sr. José Fogaça - Prezado Senador Waldeck Ornelas, V. Exª partiu do relatório da ONU para fazer seu importante pronunciamento. Quero trazer mais algumas informações, seguramente em reforço da tese de V. Exª. A ONU publica dados segundo os quais há dois problemas básicos no Nordeste, são nós, são gargalos: um deles é a qualidade dos postos de trabalho, exatamente ao que V. Exª está-se referindo. Ou seja, são investimentos, cuja qualidade permite haver produção com salários incompatíveis com essa produção. Qualidade dos postos de trabalho quer dizer o seguinte: produtos que tenham mais valor. Na medida em que os investimentos são feitos para a produção, que é inferiorizada no mercado em termos de valor, isso também significa má distribuição na renda. Portanto, essa é uma opção que, muitas vezes, não aparece na soma dos investimentos. V. Exª disse que 29% dos investimentos foram feitos no Nordeste. Mas penso que é preciso fazer uma radiografia da qualidade desses investimentos, porque muitas vezes os investimentos que geram postos de trabalho mais qualificados, como, por exemplo, investimentos em informática, feitos no eixo Sudeste, não contemplam outros Estados do País. Isso é um elemento decisivo, um fator decisivo para a questão da distribuição da renda. Apenas desejava adicionar esse comentário ao importante pronunciamento que V. Exª está fazendo.

O SR. WALDECK ORNELAS - Infelizmente, não há condições de aprofundarmos esse debate. Mas V. Exª sabe, conhecedor do seu Estado que é, que embora o Rio Grande do Sul apareça no IDH - relatório do PNUD - como o de melhor índice do País, na porção meridional do Estado, há um problema bastante grave: é uma região que tem hoje uma economia deprimida e que requer uma atenção especial.

Por outro lado, fala-se da fruticultura irrigada do Nordeste como algo importante, como vetor de expansão da Região, mas não se alocam contrapartidas, não se encaminham projetos novos, quer dizer, são problemas que podem ser resolvidos e que não o são, porque não há determinação para resolvê-los.

A propósito da questão da irrigação, registro que fui Relator do Projeto de Lei nº 229, de 1995, resultado do trabalho da Comissão Especial para o desenvolvimento do São Francisco.

Sr. Presidente, deveria falar sobre as alternativas para o desenvolvimento do Nordeste e, também, sobre o desafio federativo e o papel do Senado na preservação da unidade nacional para enfrentar esses desequilíbrios, no entanto, não há mais tempo.

Ao concluir, quero apenas invocar aqui a lição do Mestre Rui Barbosa, que, em sua "Oração aos Moços", ensinou:

      A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Tratar com desigualdade a iguais ou a desiguais com igualdade será desigualdade flagrante e não igualdade real.

A heterogeneidade do desenvolvimento do nosso País chega a um nível tal, neste momento - e tende a se agravar -, que já não comporta regras homogêneas e uniformes para todo o Brasil. É preciso que, cada vez mais, ao fazermos leis, estabeleçamos as diferenciações necessárias. Ainda há tempo de o Brasil incorporar o Nordeste.

Muito obrigado.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/06/1996 - Página 10623