Discurso no Senado Federal

URGENCIA DA APRECIAÇÃO, PELA CAMARA DOS DEPUTADOS E PELO SENADO FEDERAL, DO PROJETO DE LEI 2.249, DE 1991, QUE DISPÕE SOBRE A POLITICA NACIONAL DE RECURSOS HIDRICOS, CRIA O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HIDRICOS, ALTERA A REDAÇÃO DO ARTIGO 1 DA LEI 8.001, DE 13 DE MARÇO DE 1990, QUE MODIFICOU A LEI 7.990. DE 28 DE DEZEMBRO DE 1989, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • URGENCIA DA APRECIAÇÃO, PELA CAMARA DOS DEPUTADOS E PELO SENADO FEDERAL, DO PROJETO DE LEI 2.249, DE 1991, QUE DISPÕE SOBRE A POLITICA NACIONAL DE RECURSOS HIDRICOS, CRIA O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HIDRICOS, ALTERA A REDAÇÃO DO ARTIGO 1 DA LEI 8.001, DE 13 DE MARÇO DE 1990, QUE MODIFICOU A LEI 7.990. DE 28 DE DEZEMBRO DE 1989, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Aparteantes
José Roberto Arruda, Waldeck Ornelas.
Publicação
Publicação no DSF de 22/06/1996 - Página 10609
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • DEFESA, AGILIZAÇÃO, PROJETO DE LEI, POLITICA NACIONAL, RECURSOS HIDRICOS, CRIAÇÃO, SISTEMA NACIONAL, GESTÃO, OBJETIVO, GARANTIA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no início do mês de junho, precisamente no dia 05, em Sessão Especial dedicada ao Dia Mundial do Meio Ambiente, o eminente Senador Osmar Dias ocupou esta tribuna e pronunciou um discurso que, inegavelmente, confirma o lastro do seu conhecimento - sabemos que é profundo - de técnico e administrador.

Enfatizava nosso colega, em seu pronunciamento, que a demanda mundial de água dobra a cada 21 anos, para os diversos usos: social, humano, industrial, energético e tantos outros, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação - FAO, órgão ligado à ONU. Ressaltava também S. Exª que apenas 3,1% da água do mundo é doce. Descontando as geleiras, contamos com apenas 0,6%. No Brasil, 80% da água está na Amazônia, e 95% da população brasileira fica com os outros 20%. Alertava ainda sobre o assoreamento dos reservatórios, sobre a perda de solo e a poluição difusa por agrotóxicos.

Àquela altura, e agora neste instante, cabe fazer a seguinte indagação: o que nós, legisladores, que temos a responsabilidade de criar o sistema legal do País, podemos fazer para dar a nossa contribuição? Elaborar uma lei que disponha sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos e estabeleça o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, conforme preconizado na Constituição Federal, em seu art. 21, inciso XIX. Tal dispositivo preceitua a definição de critérios de outorga de direito do seu uso. Aí está o caminho, logo estabelecido para que o Congresso Nacional faça algo.

Na verdade, Sr. Presidente, de lei sobre direitos de águas não necessitamos. Temos o Código de Águas, estabelecido como verdadeira obra-prima do Direito positivo brasileiro, desde julho de 1934, cujo autor é o Professor Alfredo Valadão, admirado no mundo inteiro.

Ao que estamos assistindo atualmente? À difícil e penosa tramitação do Projeto de Lei nº 2.249, de 1991. Por meio do Decreto nº 99400, de 1990, formou-se um grupo de trabalho que contava com representantes do Poder Executivo e da sociedade e que tinha como objetivo elaborar uma minuta do Projeto de Lei a que me referi. A partir de 1991, em decorrência de uma Exposição de Motivos dos Ministros da Marinha, Exército, Infra-Estrutura, Agricultura e Reforma Agrária, dos Secretários do Meio Ambiente e de Assuntos Estratégicos, tudo isso foi colocado à apreciação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República. Daí resultou uma Mensagem Presidencial; depois, um Projeto de Lei, que tomou o nº 2.249. O então Presidente da Comissão do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias, que foi colega de V. Exª, Sr. Presidente, e meu na Constituinte, Deputado Fábio Feldmann, avocou a si a relatoria, ofereceu substitutivo preliminar, solicitou à Comissão a realização de Audiência Pública e, a partir de setembro de 1993, com ampla participação do Governo, sociedade, iniciativa privada e especialistas de renome, começamos a acenar com um possível caminho.

Em 1994, o substitutivo foi objeto de Reunião Extraordinária do Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama. E já no final desse ano, o mesmo Deputado Fábio Feldmann encaminhou seu parecer, contendo nova visão, pelas contribuições que havia recebido, do substitutivo. Na atual Legislatura, temos conhecimento de que foi designado novo Relator, o nobre Deputado Aroldo Cedraz. Esse nosso companheiro da Câmara realizou um intensivo trabalho, visitou países como a França, Estados Unidos, México, Argentina, Chile e Alemanha e, a partir daí, apresentou, em maio de 1996, Relatório com um novo Substitutivo.

Devo dizer, Sr. Presidente, que a partir de 1988, até hoje, em termos de legislação, absolutamente nada aconteceu. A grande verdade é que, premido pelas circunstâncias dos conflitos de uso, os Estados, por si próprios, avançaram e elaboraram - alguns ainda o estão fazendo - as suas legislações. Enumero, por exemplo, São Paulo, Ceará, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, que inclusive contou com a participação de V. Exª e da Bancada - aqui vejo dois dos eminentes Senadores: V. Exª, Senador Valmir Campelo, exercendo no momento a Presidência, e o Senador José Roberto Arruda. Mas, e a lei federal para compatibilizar tudo isso? A resposta é que até o presente momento não a temos.

Tive o cuidado, Sr. Presidente, de recomendar à minha Assessoria Técnica, desde o primeiro dia do meu mandato, que acompanhasse o assunto e me mantivesse atualizado a respeito da tramitação do Projeto de Lei nº 2.249. Para isso, contei com a colaboração prestimosa do eminente Professor Arnaldo Augusto Setti, reconhecido não só nacionalmente, mas internacionalmente. Uma das suas sugestões foi que eu fizesse um apelo às Lideranças dos Partidos das duas Casas, Senado e Câmara, para que, em entendimento, elas pudessem estabelecer um regime de urgência - eu diria urgentíssima - na tramitação do Projeto de Lei nº 2.249. Assim, seria possível contar com nova norma legal para o gerenciamento dos nossos recursos hídricos.

Falo isso, Sr. Presidente, porque no nosso Estado não temos essa dificuldade. O Senador Jefferson Péres e eu fomos criados à margem do nosso rio Negro, navegamos muitas vezes pelo rio Solimões e pelo rio Amazonas, e sabemos do volume de água existente em nosso Estado, mas nem por isso, pela nossa riqueza, temos que descurar da pobreza de outros Estados da Federação. E nem é preciso citar os Estados do Nordeste, onde a seca não só motiva a migração para outros Estados como ali mesmo impede o crescimento do seu grande potencial, não só econômico como energético.

Sr. Presidente, digo ainda que, se não for possível isso, não teremos um arcabouço legal que permita o adequado uso dos recursos hídricos nacionais. E em não sendo possível fazer isso, já agora com os atuais e com os futuros investimentos, teremos sempre dificuldades na busca de um desenvolvimento sustentável em nosso País.

O Sr. José Roberto Arruda - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. José Roberto Arruda - Apenas, Senador Bernardo Cabral, para louvar a preocupação de V. Exª, que vem exatamente do Estado das águas, com a questão da água no território nacional. O Brasil, ao contrário de outros países do mundo, não tem problemas sérios de escassez de recursos hídricos; o nosso grande problema é a falta de gerenciamento desses recursos. Há poucos anos tivemos o Programa Nacional de Irrigação que se deparava com o seguinte paradoxo: para fazer funcionarem os pivôs centrais era necessário pequenas quedas d´água e, portanto, de geração de energia elétrica através dos recursos hídricos; só que quando usávamos a água para este fim, não a tínhamos para irrigar a terra. No novo papel do Estado na sociedade brasileira, parece que há um consenso entre todas as correntes políticas de que um papel fatal do Estado dever ser o de regulador. O poder concedente tem que ter também o poder de fiscalização, ou seja, tem que regular o uso dos recursos naturais pela sociedade, ainda que pelo setor privado. No caso da água com muito mais razão. Precisamos da água como meio de navegação, precisamos da água para consumo, precisamos da água como recurso energético, precisamos da água para a irrigação. A água tem múltiplas funções na vida humana. Muito bem. É preciso uma regulação clara, uma legislação específica e moderna, porque o Código de Águas data, parece-me, de 1946.

O SR. BERNARDO CABRAL - Não, antes. Ele é de 1934.

O Sr. José Roberto Arruda - Antes até, de 1934. É tão distante que até nos confundimos. De qualquer maneira, veja que o erro de 1946 para 1934 é menor que de 1946 para hoje. Quer dizer, é tão antigo e tão defasado que só essa data mostra a necessidade de modernizá-lo. Mais do que isso, Senador Bernardo Cabral, se não tivermos agora o aparelhamento institucional do Estado e estrutural, para que o Estado cumpra a sua missão de regular o uso dos recursos hídricos disponíveis, com certeza a nossa geração ainda vai assistir a problemas em todo o território nacional, tão graves quanto os que já acontecem no Nordeste. Repito: não nascem da escassez, nascem da falta da administração dos recursos disponíveis, de forma compatível com as demandas legítimas da sociedade. Penso que o pronunciamento de V. Exª é lapidar, é sobretudo oportuno, porque no momento em que o Estado brasileiro deseja retirar-se de algumas atividades produtivas e rentáveis da economia ele não pode se ausentar do papel de regulador da atividade econômica.

O SR. BERNARDO CABRAL - Tão lapidar e oportuno como é o aparte de V. Exª, eminente Senador José Roberto Arruda, porque preenche, na qualidade de engenheiro, matéria que V. Exª, já que falamos em água, navega com absoluta tranqüilidade, porque traz à colação exatamente o papel que o Estado deve desempenhar: o de regulador e não de intervencionista, no que se refere à nossa economia. Agradeço a V. Exª pela sua gentileza.

Vejo, para alegria minha, que o Norte fala sobre água, o Distrito Federal intervém, e também o Nordeste, por absoluta maioria dos grandes Líderes, pois vejo no plenário o Senador José Sarney, que representa o Maranhão, juntamente com os Senadores Edison Lobão, José Agripino e Waldeck Ornelas. Vejam só, o Nordeste está em peso aqui, sentindo a importância do problema das águas. Só isso já vale pelos discursos no dia de hoje. A honra é minha.

Vou encerrar, Sr. Presidente, pois V. Exª já está me advertindo de que meu tempo está esgotado. Mas devo dizer que V. Exª também, que veio do Ceará, nordestino que é, sabe melhor que ninguém qual a dificuldade que se tem com esse problema das águas. Por isso mesmo que, a título de colaboração e instrução aos debates que se sucederão, orientei minha Assessoria Técnica no sentido da produção de um Caderno Legislativo que contenha toda a legislação brasileira atual sobre recursos hídricos e assuntos correlatos, a fim de que possamos discutir a matéria com absoluta tranqüilidade e que estou encaminhando ao Cegraf para publicação na próxima semana.

O Sr. Waldeck Ornelas - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Com prazer, Senador Waldeck Ornelas.

O Sr. Waldeck Ornelas - Há um importante projeto que está em tramitação na Câmara dos Deputados que estabelece o novo Estatuto da Água no Brasil. Estou, pessoalmente, acompanhando a tramitação desse projeto na Câmara, que tem como Relator o Deputado Aroldo Cedraz. Já há um substitutivo. E, ainda há pouco, tive oportunidade de participar de um seminário internacional no Ceará, onde se discutiu este assunto: regulamentação de águas, e também a questão de irrigação, que é particularmente importante para o Nordeste. Devo dizer que também temos em tramitação nesta Casa, fruto dos trabalhos da Comissão Especial para o Desenvolvimento do São Francisco, um projeto que institui o Comitê de Gestão dos Recursos Hídricos da Bacia do rio São Francisco, que, sendo a maior bacia hidrográfica do Nordeste, uma região profundamente carente de água, é de fundamental importância. Inclusive, logo mais, terei a oportunidade de me referir a este assunto, porque da tribuna falarei sobre os três brasis, em particular sobre o terceiro Brasil, que é o Nordeste.

O SR. BERNARDO CABRAL - Agradeço o aparte, eminente Senador Waldeck Ornelas. Mas como V. Exª chegou no meio do meu discurso, eu já havia feito referência ao Deputado Aroldo Cedraz, inclusive ao Projeto de Lei nº 2.249. E já que V. Exª vai abordar o assunto daqui a pouco, sinto-me como aqueles batedores que vão à frente com suas motocicletas anunciando que, logo depois, vem a pessoa mais importante. Espero que V. Exª complemente, preencha todas as lacunas, o que, por certo fará, sobre um assunto tão momentoso como este dos recursos hídricos.

Sr. Presidente, agradeço a V. Exª por estar presidindo a sessão momentaneamente e ao eminente Senador José Sarney que me honrou com sua audiência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/06/1996 - Página 10609