Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNALISTA FRANKLIN MARTINS, PUBLICADO NO JORNAL O GLOBO, DE 15 DO CORRENTE, INTITULADO 'FH E O ESTADO'.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNALISTA FRANKLIN MARTINS, PUBLICADO NO JORNAL O GLOBO, DE 15 DO CORRENTE, INTITULADO 'FH E O ESTADO'.
Publicação
Publicação no DSF de 28/06/1996 - Página 11000
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, CRITICA, ORADOR, DIAGNOSTICO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, ESTADO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, INEFICACIA, SERVIÇO PUBLICO.
  • CRITICA, DETERMINAÇÃO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, RESPONSAVEL, INEFICACIA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, FALTA, RECONHECIMENTO, RESPONSABILIDADE, GOVERNO, PROCESSO, DETERIORAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROVIDENCIA, COMBATE, CRISE, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.

           O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Jornal O Globo publicou no dia 15 do corrente, um artigo do jornalista Franklin Martins, inspirado em diagnóstico que o Presidente da República teria emitido sobre o Estado brasileiro.

           Como tal artigo mereceu a divulgação da Radiobrás, órgão vinculado a Presidência da República, sinto-me autorizado a concluir não só pela autenticidade do diagnóstico, como, também, pelo interesse do Chefe de Estado em torná-lo público.

           Daí por que, Sr. Presidente, considero inevitáveis os comentários que agora farei e os reparos que, certamente, andam a fazer aqueles que, de alguma forma,se sentem envolvidos em responsabilidades concernentes à administração pública e aos negócios do Estado brasileiro.

           Antes, porém, de pronunciar-me a respeito, julgo impositivo, Senhor Presidente, dar conhecimento ao Plenário das passagens mais polêmicas da matéria em questão.

           Diz o autor de "FH e o Estado":

"O diagnóstico do Presidente da República sobre o Estado Brasileiro é que ele está em frangalhos. Nele sobrevivem ilhas de competência e profissionalismo, como o Itamaraty, as Forças Armadas e a Receita Federal, mas fora as exceções, a capacidade operacional da administração federal é baixíssima. Amplos setores do serviço público alimentam aberta desconfiança em relação ao Governo. Jogam contra ele e não a favor.

A situação é tão grave, segundo o presidente, que, se não existissem os DAS - cargos de Direção e Assessoramento Superior que podem ser preenchidos com pessoas de fora do quadro do funcionalismo - seria impossível tocar a máquina. Os vencimentos dos DAS mais altos variam entre R$ 4.000,00 e R$ 6.000,00, o que permite atrair quadros da iniciativa privada, indispensáveis para dar algum oxigênio a uma administração pública que já entregou os pontos.

Mas o que fez até agora o Governo de Fernando Henrique para superar essa situação? Pouco, muito pouco. No fundamental, concentrou seus esforços na aprovação da mudança dos dispositivos constitucionais que regulam a administração pública, na crença de que a revogação da estabilidade do servidor e outras novidades seriam o único ponto de partida possível para qualquer transformação séria nessa área".

           Conforme já afirmei, Sr. Presidente, vários reparos podem e devem ser feitos ao diagnóstico atribuído ao Presidente Fernando Henrique. E é bom que tais comentários críticos partam de políticos que, como eu, integram o grupo de apoio ao seu governo. Primeiro, porque exercer a crítica, quando esta é cabível e construtiva, constitui manifestação de apoio das mais saudáveis, embora, também, das mais espinhosas e mais sujeitas ao risco da incompreensão.

           Em segundo lugar porque, fundadas na boa vontade, assim como no reto propósito de favorecer os acertos e reduzir os erros do Presidente, tais críticas têm chances maiores de serem bem absorvidas, de sorte a surtir os efeitos pretendidos por quem tem a bem-intencionada ousadia de as formular.

           Isso posto, quero fazer sentir ao Presidente que o seu diagnóstico, embora parcialmente correto é, sob vários aspectos injusto e, sobretudo mal enfocado.

           É parcialmente correto quando menciona o esfacelamento do Estado brasileiro ou quando denuncia a reduzida capacidade operacional da administração pública. Mas é deploravelmente injusto e mal enfocado, quando, mais uma vez, intenta inculpar os servidores públicos, responsabilizando-os de forma quase que exclusiva, pelo desmantelo da máquina estatal.

           Em verdade, a crise que vem abalando a sociedade brasileira, é tão aguda e tão generalizada que seus reflexos se fazem sentir em todos os setores, não se sabendo de nenhuma instituição plenamente estável e de todo imune aos sintomas da ineficiência e do conseqüente esfacelamento.

           Constitui, portanto, discriminação descabida e odiosa, indigitar a classe dos servidores públicos como vilã da crise que não temos sabido resolver, ou como alvo preferencial das frustrações governamentais.

           O diagnóstico presidencial é igualmente veraz quando classifica como baixíssima a capacidade operacional da administração pública, mas revela-se omisso e estrábico em sua incapacidade de perceber que a degradação progressiva da máquina estatal, que durante décadas soube dar sustentação ao progresso e ao desenvolvimento do País, chegou ao ponto em que se encontra, graças, em grande parte, às "reformas" frustradas e frustrantes que lhe tem sido impostas por sucessivos governos.

           Junte-se a estas, o tratamento desestimulante que lhe tem sido infligido pelos últimos governos, em conseqüência do qual vem-se acelerando a debandada dos quadros mais qualificados, responsáveis pelos melhores padrões de eficiência que, noutros tempos, já caracterizaram o setor público brasileiro.

           E não há quem ignore que as aposentadorias prematuras, responsáveis pelo empobrecimento dos quadros de servidores da União e dos Estados, vem sendo estimuladas por ineptos administradores que, ultimamente, parecem concentrar toda sua ciência administrativa na assunção do, papel de feitores, destros no manejo da chibata e peritos no recurso reiterado às ameaças e às críticas impiedosas ao servidor Publico.

           Minha sugestão, ou melhor, a exortação que faço ao Presidente Fernando Henrique é, pois, a de que ele promova, o quanto antes, a mudança no discurso negativista e hostil que agentes seus vem endereçando aos servidores públicos.

           Até porque, o ilustre sociólogo e emérito professor presidente já terá colhido em suas copiosas leituras, e comprovado em sua rica experiência, que as diatribes, as ameaças e todo o arsenal de estímulos negativos, a que recorrem com abusada freqüência os líderes autocráticos não conquistam o ânimo dos liderados, não promovem eficiências, não reformam comportamentos nem desencadeiam adesões cooperativas. Pelo contrário, a retórica da prepotência só logra suscitar a resistência passiva e a desconfiança que, por sua vez, levam o servidor a jogar contra os seus líderes eventuais, e não a seu favor, conforme lastima o nosso arguto Presidente.

           O segundo reparo que tenho a fazer ao comentado diagnóstico presidencial é o que diz respeito à tempestividade de seu diagnóstico. É preciso que o Senhor Presidente se aperceba de que a hora apropriada para os diagnósticos, o momento tempestivo para o discurso descritivo das problemáticas é o das campanhas que precedem a chegada ao poder.

           Depois disso, sobretudo, depois de transcorridos quase dois anos no exercício do governo, o que a Nação inteira espera e reclama, de seu acatado governante é a referência objetiva às terapias já aplicadas e às soluções já obtidas.

           E é aqui que cabe a pergunta suscitada por Franklin Martins:

- "Mas o que fez até agora o governo Fernando Henrique para superar esta situação?"

           Para que os fatos não confirmem o "pouco, muito pouco", já antecipado pelo articulista de "O Globo", urge que o Presidente reveja as estratégias até aqui aplicadas na obtenção do apoio parlamentar.

           Mais especificamente, entendo que seria de todo salutar que sua Excelência se aplicasse a definir com maior clareza o modelo e concepção de Estado, susceptível de vigorar em nosso contexto sócio-político, sem risco da ocorrência de indesejável rejeição cultural.

           Recomendável, também, seria o esforço e a habilidade desdobrados por Sua Excelência na obtenção de um campo de convergências mais nítido entre os modelos de Estado acalentados pelas principais correntes políticas que o apóiam - o PSDB e o PFL.

           Um apego menos rígido aos modismos que oferecem sustentação teórica às propostas em curso, nestes tempos de mundo globalizado, também favoreceriam, acentuadamente, a conquista e a manutenção de uma maioria parlamentar, notoriamente habituada a flexibilizar-se diante de propostas polêmicas, a ceder ante a força persuasiva dos consensos negociados, e a permanecer irredutível ante à pressão dos que dão crédito excessivo à eficácia do "rolo compressor" e tentam, fundados nesse pressuposto, fazê-lo avançar nos espaços acarpetados pela prudência e sabedoria política do Congresso Nacional.

           É o que penso, Senhor Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/06/1996 - Página 11000