Discurso no Senado Federal

DOIS ANOS DO PLANO REAL. NECESSIDADE DE INDEPENDENCIA DO BANCO CENTRAL DO BRASIL.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • DOIS ANOS DO PLANO REAL. NECESSIDADE DE INDEPENDENCIA DO BANCO CENTRAL DO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 03/07/1996 - Página 11301
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, SETOR, ECONOMIA, IMPLANTAÇÃO, MANUTENÇÃO, PLANO, REAL, MOTIVO, OBTENÇÃO, ESTABILIZAÇÃO DE PREÇOS, REDUÇÃO, NIVEL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, PAIS.
  • DEFESA, REGULAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, INDEPENDENCIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ORIENTAÇÃO, POLITICA MONETARIA, PAIS, COMPETENCIA, GOVERNO FEDERAL, DIREÇÃO, POLITICA FISCAL, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, FINANCIAMENTO, DEFICIT, SETOR PUBLICO, TESOURO NACIONAL, PROVOCAÇÃO, FALTA, ESTABILIDADE, ECONOMIA NACIONAL.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Real completou dois anos. São dois anos em que muitas vitórias foram conseguidas. Há dois anos os preços estão estáveis e tem havido melhor distribuição de riquezas; há dois anos o Governo vem lutando em várias frentes para fazer modificações.

Elogio essa atitude do Governo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, embora acredite que mais esforço deveríamos ter colocado nessas ações e já deveríamos ter equilibrado, com toda certeza, as contas internas do País. Esforço para equilibrar essas contas deve o Governo Federal fazer com todo o seu élan, porque é necessário que haja equilíbrio e esse é um dos itens que muito nos preocupam.

Mas por que não dizer que tivemos nesses dois anos muitos avanços? Tivemos muitos sucessos, apesar de o Brasil, por todo o caos que vivíamos, principalmente na área pública - seja federal, estadual ou municipal -, exigir ainda muito mais esforço de seus administradores.

Todos sabemos que o sistema financeiro, com a mudança, atravessou grande dificuldade, e, ontem, ouvimos o Presidente da República fazer algumas considerações a respeito desse assunto, dizendo, inclusive, que o Proer é um dos temas que não o deixaram feliz. A nós também não. Mas se é ruim com ele, pior sem ele.

Nossa preocupação é maior com o sistema financeiro. Considero o Plano Real uma anestesia muito boa que permite ao País, pelas âncoras cambial e monetária, fazer com mais calma as intervenções necessárias - reformas administrativa, fiscal, do sistema financeiro e outas -, que, enfim, permitiriam ao Governo adotar uma série de políticas na agricultura, na indústria para exportação e assim por diante. Relativamente à reforma da Previdência, quase empacamos, porque houve muita demora em vir da Câmara dos Deputados para o Senado Federal.

Penso que o Governo precisa, realmente, fazer essa reformulação. E boa parte da culpa desse caos econômico é nossa, do Congresso Nacional. Por quê? Porque há oito anos não regulamentamos o art. 192 da Constituição Federal. Sou um dos que advogam que o Banco Central tem que ser independente; creio que devemos, urgentemente, buscar essa independência, e isso não é algo que se deseje por si próprio.

Quando se fala em independência do Banco Central, deve-se ter em mente que o importante é criar mecanismos para que a política monetária não beneficie diretamente o Tesouro Nacional, uma vez que os instrumentos monetários possuem o incrível poder de criar riquezas a partir do nada, pela capacidade de emissão de moeda. Portanto, quando se fala em independência do Banco Central, na verdade estamos falando em manter independente a política monetária, conduzida pelo Banco Central, da política fiscal, conduzida pelo Governo. Essa é uma das nossas preocupações. Um Banco Central sem independência mistura as duas políticas: a fiscal e a monetária. Todas as vezes que o Tesouro Nacional precisa de socorro, o Banco Central é acionado; e, embora no Brasil tenhamos uma política de emissão de moedas, na realidade, estamos emitindo quando lançamos títulos mobiliários do Tesouro Nacional.

Hoje, o Banco Central tem uma política monetária que sustenta as ações governamentais, mesmo que sejam equivocadas, financiando o déficit público, que somente instabilidade traz ao sistema econômico.

Aqui há uma preocupação muito séria: sempre que passamos a financiar um déficit público crescente, estamos nos aproximando de uma crise. Em 1994, o déficit público interno era de R$50 bilhões. Neste mês, ele bateu em pouco mais que R$151 bilhões. Vamos terminar o ano com R$200 bilhões em Letras Mobiliárias do Tesouro Nacional. Isso é muito preocupante. É mais preocupante ainda quando verificamos que essa emissão de letras funciona como emissão de moedas. Por quê? Porque, no caso do Brasil, o Banco Central emite, vende e compra títulos públicos sem autorização do Congresso, indiscriminadamente, de tal forma que é como se estivesse emitindo moeda, principalmente porque nossa política é de zeragem automática de posições, ou seja, o Banco Central vende um título a um banco, mas na hora em que este quiser vender ele se obriga automaticamente a comprar.

Então, na realidade, o que tem feito o Banco Central? Ele tem emitido moeda; a guitarra está fechada mas, na prática, a guitarra funciona, lançando Letras do Tesouro Nacional. É isso que precisamos frear na regulamentação do art. 192 da Constituição - e estamos apresentando projeto nesse sentido esta semana, desvinculando o Banco Central do Tesouro Nacional, de forma a que esse banco não possa usufruir da política de zerar posições, ou seja, não possa, na prática, emitir moeda.

Estamos implementando outras medidas nessa regulamentação, uma vez que houve mudanças no cenário da economia. Antes, a preocupação era unicamente com os bancos; mas, com dois anos de Real, os seguros, que representavam apenas 0,8% do PIB, saltaram para 2,3% de nosso Produto Interno Bruto. Então, os seguros também merecem nossa atenção, porque eles vão crescer cada vez mais. Antes, eles eram o primo pobre do sistema financeiro. Hoje, eles já estão com peso três vezes superior à posição que tinham anteriormente. A posição dos seguros está crescendo rapidamente nesse cenário.

Uma outra coisa que temos que analisar é que, à medida que a moeda se estabiliza, as ações também crescem. Então, precisamos de uma melhor regulamentação na Comissão de Valores Mobiliários. Como também vai crescer enormemente a previdência privada.

Urge que a regulamentação do art. 192 cuide do sistema financeiro, principalmente buscando a independência do Banco Central, dando à sua diretoria mandato para fazer a separação da política monetária e da política fiscal - hoje, na teoria, o Banco Central teria uma certa independência, mas, na realidade ele não a tem, uma vez que está subordinado ao Conselho Monetário, de que participam dois Ministros e o Presidente do Banco, todos funcionários do Governo.

Dessa forma, vamos ter, com toda certeza, guardiões da moeda que não se dobrarão às necessidades do Tesouro Nacional. Inclusive retiraríamos do Banco Central também o organismo de fiscalização dos bancos universais, dos bancos privados. Por quê? Porque, dessa forma, evitaríamos essa convivência que hoje é poluidora do sistema.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essas são algumas posições que estamos defendendo na regulamentação do art. 192, mas que, na nossa cabeça, são urgentes, pois temos que fazer, o mais rapidamente possível, essa reformulação. Como também acreditamos que o Governo Federal tem que, com muita urgência, buscar a reforma administrativa, a reforma fiscal e, principalmente, a decisão de ter políticas para a agricultura, de médio e longo prazos, para a indústria, para a exportação, e assim por diante.

No dia em que essas reformas forem feitas e no dia em que o nosso Banco Central for independente, com toda certeza teremos muito mais chances de sucesso e, aí sim, veremos este País crescer numa velocidade maior do que aquela em que vem crescendo.

Estas eram as colocações que eu desejava deixar nesta tarde para a reflexão do Sr. Presidente e dos Srs. Senadores: urge a regulamentação do art. 192; urge que tenhamos um Banco Central independente; urge a coibição da emissão indiscriminada de títulos mobiliários do Governo Federal; urge o controle do crescimento da dívida, porque é assustadora a velocidade em que está crescendo. E, mais ainda, urge que tenhamos o Poder Executivo, em curtíssimo prazo, fazendo políticas de médio e longo prazos para a agricultura, para a indústria e, também, para a exportação, principalmente de produtos dessas duas grandes áreas.

Portanto, Sr.Presidente, isto é o que deixo para reflexão dos Srs. Senadores.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/07/1996 - Página 11301