Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO PLANO REAL. COMENTARIOS ACERCA DA SITUAÇÃO DO BRASIL SEGUNDO O RELATORIO DO BANCO MUNDIAL DE 1995.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. JUDICIARIO.:
  • CRITICAS AO PLANO REAL. COMENTARIOS ACERCA DA SITUAÇÃO DO BRASIL SEGUNDO O RELATORIO DO BANCO MUNDIAL DE 1995.
Publicação
Publicação no DSF de 03/07/1996 - Página 11329
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, BRASIL, AMBITO, ECONOMIA INTERNACIONAL, REFERENCIA, DIVULGAÇÃO, RELATORIO, AUTORIA, BANCO MUNDIAL, RELAÇÃO, INDICE, DESIGUALDADE SOCIAL, AUSENCIA, JUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, RESULTADO, DEFESA, NECESSIDADE, MELHORIA, ATUAÇÃO, EXECUTIVO, CONGRESSO NACIONAL, SOCIEDADE, URGENCIA, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA.
  • CRITICA, COMPORTAMENTO, FERNANDO COLLOR DE MELLO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, OPORTUNIDADE, OCORRENCIA, HOMICIDIO, PAULO CESAR FARIAS, EMPRESARIO, ESTADO DE ALAGOAS (AL).
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, JUSTIÇA, JULGAMENTO, FERNANDO COLLOR DE MELLO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESPONSABILIDADE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Joel de Hollanda, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil comemorou dois anos de Plano Real. Infelizmente, também ganha outro bicampeonato que nos deixa entristecidos.

O Senador Joel de Hollanda acaba de proferir discurso em que cita o relatório do Banco Mundial, o BIRD, relativamente às características de desenvolvimento desigual no País. No dia 28, Sr. Presidente, Srs. Senadores, foi divulgado o referido relatório de desenvolvimento do Banco Mundial, de 1996, e este relatório, publicado sexta-feira última, divulga o grau de desigualdade de 85 países para os quais o Banco Mundial reuniu dados.

O relatório do Banco Mundial de 1995 havia colocado o Brasil com a pior distribuição de renda, como o campeão mundial da desigualdade sócio-econômica. Acaba de sair o novo relatório, o de 1996, e o Brasil, infelizmente, acaba de ganhar o bicampeonato da desigualdade sócio-econômica.

Para os 85 países sobre os quais há dados disponíveis, em nenhum outro país, os 10% mais ricos detêm mais da metade da renda nacional. No Brasil, para os 10% mais ricos, foram reservados 51,3% da renda nacional, enquanto que, para os 40% mais pobres, foram destinados - o que é uma proporção pequena - apenas 7% da renda nacional.

Assim, com tais índices de desigualdades, não é à toa que o Brasil é o campeão negativo: possui o mais alto coeficiente de Gini - 63,4 -, o coeficiente que mede a desigualdade. O segundo país, quanto à desigualdade social, é a Guatemala, com 59,6; o terceiro, o Quênia, com 57,5; o quarto, Zimbábue, com 56,8; o quinto, o Panamá, com 56,6. Logo a seguir, está o Chile, com 56,5; Guiné-Bissau, com 56,2; Lesoto, com 56; e a Nicarágua, com 50,3.

Sr. Presidente, seria de se esperar que o Governo Fernando Henrique Cardoso estivesse dando mais energia, dedicando muito maior atenção à questão da desigualdade e da miséria.

Contenta-se, no entanto, o Governo com um levantamento realizado recentemente pelo IPEA, segundo o qual de 1994 a 1995 teria havido uma melhora no poder aquisitivo das pessoas de menor renda no Brasil e também nos índices de desigualdade.

Se analisarmos bem os índices de 1995, publicados pelo IPEA, primeiramente precisaremos fazer uma qualificação. Aqueles indicadores referem-se apenas à renda do trabalho. A desigualdade entre os assalariados é extremamente grande, ainda que de 1994 para 1995 tenha havido ligeira melhora. Será que a distribuição da renda e da riqueza no Brasil está melhorando significativamente?

Pergunto ainda: é possível constatar-se uma efetiva distribuição da renda e do patrimônio dentre os brasileiros, se a revista Forbes indica que, do ano passado para este ano, aumentou para dez o número de brasileiros entre as pessoas com maior fortuna e patrimônio no mundo? A revista informa que, em apenas um ano, a fortuna da pessoa com maior riqueza no Brasil aumentou R$1 bilhão, passando de R$4,1 para R$5,1 bilhões.

Eis a lista das dez pessoas com maior patrimônio no Brasil: Antonio Ermírio de Moraes, US$5,1 bilhões; Júlio Bozano, US$2,5 bilhões; Roberto Marinho, US$2,1 bilhões; Família Camargo, US$2 bilhões; Roberto e Gabriel Andrade, US$1,2 bilhão; Abílio Diniz, US$1,2 bilhão; Luiz Alberto Garcia, US$1,2 bilhão; Leon Feffer, US$1,1 bilhão; Família Larragoiti, US$1 bilhão; e Família Odebrecht, US$1 bilhão.

É natural que as pessoas aspirem ao progresso, ao bem-estar para todos. Todavia, é preciso perguntar se é saudável para um País com tantas desigualdades ter um número crescente de pessoas que passam a ter patrimônio extraordinário, enquanto grande parte da população brasileira não dispõe de recursos suficientes para sua sobrevivência.

Assim, Sr. Presidente, de acordo com aquilo que o Senador Joel de Hollanda há pouco mencionava, é preciso que o Congresso Nacional tenha como diretriz examinar, averiguar as razões de tantas desigualdades e, ao mesmo tempo, estudar os instrumentos que mais eficazmente colaborariam para modificar este quadro e quais se compatibilizariam com a estabilização dos preços e o crescimento da economia brasileira em ritmo conciliável com as nossas potencialidades, para, pelo menos, atingirmos um crescimento de 7% ao ano. Já crescemos a taxas de 10%, 11%, 14% ao ano. Se o Chile tem uma taxa de crescimento da ordem de 8%, se a China, um país continental como o Brasil, há mais de dez anos vem crescendo a taxas anuais próximas a 10%, é claro que nós podemos e temos também essa potencialidade.

Que instrumentos de política econômica têm caracterizado as iniciativas do Presidente Fernando Henrique Cardoso? Instrumentos tais como o Proer, capazes de, num rápido espaço de tempo, destinar recursos fantásticos para fortalecer a estrutura de Bancos. Diz o Governo que tais medidas destinam-se a assegurar o patrimônio dos correntistas, como se isso não concentrasse mais riqueza nas mãos dos beneficiários de créditos a taxas de juros bem menores do que aquelas que tem o conjunto dos correntistas no País.

Sr. Presidente, com a divulgação desse indicador, é preciso que o Executivo, o Congresso Nacional, todas as forças deste País, examinem alternativas para melhorar a distribuição da renda.

Com respeito à melhor distribuição da riqueza para levar à melhor distribuição do fluxo de renda, a realização mais rápida da reforma agrária é importantíssima.

Em relação à melhoria da distribuição da renda, do fluxo dos rendimentos, portanto, um dos instrumentos mais eficazes que a teoria econômica demonstra, e a prática também tem demonstrado, inclusive nas experiências locais, já experimentadas no Distrito Federal, em Campinas, em Piracicaba e outras localidades, o Programa de Garantia de Renda Mínima constitui-se num instrumento adequado para isso.

Sr. Presidente, gostaria de assinalar o sentimento de indignação que tive e que muitos brasileiros tiveram quando - diante da tragédia havida na praia próxima a Maceió, em Alagoas, onde se encontrava o Sr. Paulo César Farias, onde ele foi assassinado e onde a Srª Suzana Marcolino da Silva também morreu, suicidando-se ou assassinada - algo chocou os brasileiros: o comportamento do ex-Presidente Fernando Collor de Mello. De um lado, registrou a consternação e sua solidariedade à família do falecido, mas de outro, aquele que teve no Sr. Paulo César Farias a pessoa central na coordenação de atividades que hoje são objeto de inquérito policial, presidido por tanto tempo pelo Sr. Delegado Paulo Lacerda, que honrou e dignificou o seu trabalho, a sua profissão, o ex-Presidente Fernando Collor de Mello estava na Polinésia Francesa, no Taiti, comemorando em festa seu casamento, numa situação que era pouco condizente com a morte daquele que foi seu companheiro de trabalho, seu coordenador financeiro de campanha. Segundo as provas coletadas no inquérito-mãe sobre o Sr. Paulo César Farias, há evidências claras de que o Sr. Fernando Collor de Mello vem gastando extraordinariamente recursos que, indevidamente, foram acumulados.

Sr. Presidente, quero fazer um alerta ao Supremo Tribunal Federal, que tem a responsabilidade de julgar o ex-Presidente Fernando Collor de Mello. O povo brasileiro está acompanhando de perto - e acompanhou desde 1992 - aquilo que está colocado no inquérito, de responsabilidade do Delegado Paulo Lacerda, o Inquérito Policial nº 1.113/92, Processo nº 9.200.085.059, da 10º Vara Federal do Distrito Federal. (Indiciados: Paulo César Cavalcante Farias e outros. Incidência Penal no art. 288 do Código Penal.)

Abre esse relatório-mãe as palavras de Pedro Collor, em depoimento em 28 de maio de 1992:

      Antes de ser irmão de Fernando Collor, o declarante é um brasileiro que, como tal, se incomoda e se indigna diante das evidências e das denúncias acerca de Paulo César Farias; que, cobrado que tem sido, freqüentemente, e pressionado até, no sentido de que as autoridades tomem providências contra as ações do PC; e que, sendo pessoa de temperamento forte, que tem bem clara na sua forma de ser o sentido de justiça, além de não ser de seu temperamento fugir ao dever, resolveu agora, em momento de emoção, trazer a público tudo o que sabe sobre Paulo César Farias.

Sr. Presidente, um dos trechos diz:

      Por tratar-se de pessoa intimamente ligada ao Presidente Fernando Collor, de quem fora um dos principais colaboradores nas vitoriosas campanhas eleitorais de 1986 ao Governo de Alagoas e de 1989 para a Presidência da República, o empresário Paulo César Farias utilizara toda a sua influência e prestígio para montar um amplo e bem estruturado esquema ilegal de apropriação de recursos, mediante atos criminosos a envolver atos da administração pública federal.

Sr. Presidente, o grave e que está evidenciado neste relatório é que o ex-Presidente Fernando Collor de Melo disso sabia, de toda essa trama estava a par e, na verdade, era co-participante das ações coordenadas por Paulo César Farias junto a autoridades do Governo Federal. Esse procedimento contribuiu para que o Sr. PC Farias acumulasse extraordinária riqueza. Foi mais uma das pessoas que acumulou riquezas em detrimento daqueles que hoje estão ali do outro lado da medalha, no sofrimento, na miséria.

Por essa razão é que a população brasileira requer que se faça justiça, no sentido de que os bens do Sr. Paulo César Farias, hoje em mãos daqueles que o sucedem, sejam devolvidos ao povo brasileiro, sejam achados onde estiverem. Se boa parte da fortuna do Sr. Paulo César Farias estiver no exterior, há que se buscá-la.

Outros países têm conseguido localizar riquezas depositadas no exterior de pessoas que procederam, infelizmente, de forma semelhante. No ano passado, descobriu-se na Suíça parte da fortuna do irmão do ex-Presidente Salinas, que havia acumulado riqueza com procedimentos indevidos junto ao poder. Se o Governo do México pôde tomar tais providências, por que é que o Governo brasileiro demora tanto para saber onde estão tais recursos? O delegado Paulo Lacerda foi capaz de realizar trabalho tão significativo, que detectou inclusive as contas no exterior do Sr. Paulo César Farias. Há que se completar esse trabalho.

Eu gostaria de ressaltar que o povo brasileiro espera que o Supremo Tribunal Federal, responsável constitucionalmente pelo julgamento do Sr. Fernando Collor de Mello, realize um julgamento correto e na profundidade desejada.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/07/1996 - Página 11329