Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA.

Autor
Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA INTERNACIONAL.:
  • REFLEXÕES SOBRE A INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA.
Publicação
Publicação no DSF de 29/06/1996 - Página 11061
Assunto
Outros > ECONOMIA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, TRANSFORMAÇÃO, CAPITALISMO, AMBITO INTERNACIONAL, AUMENTO, DESEMPREGO, DIVIDA PUBLICA, INTERVENÇÃO, ESTADO, ECONOMIA, ESPECULAÇÃO, BANCOS.

O SR. LAURO CAMPOS (PT-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-me difícil a conjuntura atual, esse processo dito de globalização, esse modo de inserção ou de reinserção do Brasil na economia mundial, neste momento em que se fortalece, em que se reconcentra o poder nos Estados Unidos, no capitalismo cêntrico, enquanto caem os estados nacionais periféricos, destituídos de sua soberania. A capacidade decisória que os governos nacionais periféricos tinham é agora comandada por alavancas externas determinadas pelo FMI e pelo Banco Mundial, por uma legislação que transborda, a cada momento, a fronteira geopolítica dos estados poderosos, para se sobrepor à nossa legislação, à nossa estrutura legal combalida.

Realmente, o que me preocupa sobremaneira, neste momento, é o fato de que as nossas autoridades, aqueles que se situam no Poder Executivo, nos últimos 60 anos, têm mostrado o seu caráter cada vez mais despótico e concentrado o poder. Com isso, o suposto equilíbrio entre os Poderes foi, há muito tempo, rompido evidentemente por essa predominância do Poder Executivo, Poder Executivo que faz grande parte das nossas leis, o Poder Executivo que se imiscui nas decisões do Poder Judiciário, o Poder Executivo que passa por cima da legislação e cria centros de poderes autoritários discricionários.

A burocracia brasileira herdou o poder dos militares, e vemos que órgãos da Administração Pública como o Banco Central, o BNDES e alguns outros organismos terão poder muito maior do que, por exemplo, o Senado Federal. Fazem e desfazem; apertando os botões de comando, são capazes, como estão demonstrando agora, por meio de medidas cambiais, de destruir o mercado interno em nome da concorrência: 1.300 falências apenas em São Paulo; 300 falências por mês em Brasília; 15% de desemprego maquiado em 5% para efeitos externos.

Os sindicatos, no mundo inteiro, estão sendo destruídos, esvaziados. Eles não conseguem nem avançar em direção contrária ao desemprego, tampouco evitar o arrocho salarial, a redução salarial, a dupla jornada, que acontece até mesmo nos Estados Unidos.

O capitalismo mundial se encontra em crise profunda. Comecei a detectar isso em 1968. Preocupa-me que a barbárie poderá se instalar como conseqüência da crise do capitalismo, barbárie essa que resulta de uma série de transformações por que passa o sistema capitalista mundial.

Ninguém duvida hoje de que o capitalismo não desapareceu a partir de 1929. Essa não foi a última crise do sistema capitalista, porque uma série de transformações foi incorporada, criando um pulmão artificial, uma circulação artificial, uma reoxigenação da economia capitalista, que havia esgotado as suas potencialidades enquanto economia de mercado. Naquele momento, todos reconheciam, unanimemente, com exceção de alguns poucos retrógados, reacionários, que a economia de mercado que prometia o pleno emprego automático acabara oferecendo o espetáculo de 30% de desemprego em alguns países; e, nos Estados Unidos, em 1935, seis anos depois do início da crise, ainda 25% de desemprego.

Hitler, quando assumiu o poder, concentrou o seu estado despótico, uma forma monetária nova sugerida por Hjalmar Horace Greley Schacht, o mago das finanças, e, através de obras públicas, através de gastos, através de dispêndios crescentes, conseguiu, em 1937, resolver o problema do desemprego. Mas a dívida pública criada por Hitler foi imensa, praticamente igual à dos Estados Unidos. Contra a dívida pública de Hitler, foi dado um calote pelas tropas de ocupação no dia 21 de junho de 1948.

Nos Estados Unidos, para sustentar, para realimentar o capitalismo, fornecendo lucro com uma mão e, com a outra, oportunidades de emprego aos trabalhadores, a dívida pública cresceu e atingiu, em 1945, a 119,9% do PIB norte-americano. Se não tivesse havido o deficit extended, se não tivesse havido o abandono do ouro e a criação do papel-moeda inconversível, que o Poder Executivo pode produzir discricionariamente, aumentando obviamente o seu poder de compra, de comando e de reemprego de trabalhadores desempregados de um lado, e de fornecimento de lucros e de eficiência marginal fictícia do capital, expressão "Novo Nome da Taxa de Lucro" criada por Lord Keynes.

Portanto, naquele momento, todos os países capitalistas do mundo, inclusive o Brasil, passaram a comprar o excedente da produção agrícola. Roosevelt começou a pagar para que os fazendeiros não plantassem, tentando manter a renda do setor agrícola e rural, e, ao mesmo tempo, impedindo que a produção aumentasse, que a sobreacumulação se manifestasse. A produção da indústria automobilística dos Estados Unidos, que era de 5,3 milhões de carros em 1929, caiu para 900 mil em 1931 e para apenas 700 mil em 1943.

Em 1943, o PIB dos Estados Unidos era maior do que o de 1929, mas a produção de carros, a produção de duráveis, a produção de meios de consumo havia decaído. A produção de carros, por exemplo, que são emblemáticos da sociedade norte-americana, decresceu para 700 mil unidades apenas, contra 5,3 milhões quatorze anos antes.

Portanto, se não fosse a presença do Estado, a hipertrofia que o Estado estava realizando, sustentado principalmente na dívida pública, a economia capitalista não poderia ter se soerguido daquele colapso.

E hoje temos uma crise de 1929 majorada. Os setores produtivos, em escala mundial, encontram-se com aqueles mesmos problemas que lançaram a economia capitalista norte-americana e mundial na crise de 29. E esse problema principal, de acordo com Lord Keynes e de acordo com alguns poucos economistas que conseguem perceber o processo contraditório que move a economia capitalista, era uma crise de sobreacumulação de capital.

Essa sobreacumulação de capital foi aliviada não apenas por esse desvio de forças produtivas para os setores improdutivos e destrutivos. Keynes disse seis vezes que apenas a economia de guerra é capaz de justificar o aumento dos gastos do governo em escala suficiente para levar a economia ao pleno  
emprego: "Duvido que tenhamos conhecido um auge duradouro capaz de levar ao pleno emprego, exceto durante a guerra". Keynes repetiu essa frase mais cinco vezes.

O espaço, os gastos no espaço, a dissipação no espaço, o fornecimento de preços especialmente altos aos fornecedores do governo, como reconhece, em 1972, em mensagem para o Congresso, o Presidente Nixon, paga um preço especialmente elevado para manter a taxa de lucro do sistema capitalista.

Agora, não apenas uma crise de sobreacumulação, que faz com que o capitalismo cêntrico de novo procure os mercados da periferia, não mais para transplantar indústrias, como aconteceu no pós-guerra, porque aqui as indústrias transplantadas ocuparam praticamente o mercado. Mas agora as indústrias de carros, as indústrias de duráveis, as indústrias de computadores, as indústrias de celulares, etc., estão necessitando do mercado periférico, do mercado mundial, que já foi anteriormente ocupado pelo próprio capital estrangeiro transplantado e crescido e acumulado na periferia.

Portanto, a crise hoje é muito superior, muito maior, muito mais completa do que aquela de 1929. E o próprio Estado, que sustentou o capitalismo acaba também perdendo sua capacidade dinamizadora, perdendo sua capacidade de fornecer lucro, estímulos e incentivos, doações, isenções tributárias, preços especialmente elevados, juros da rolagem da dívida pública, com uma mão, e emprego com a outra mão. Se até a economia de guerra se justificava para manter o capitalismo, por que não nós, que não podemos desenvolver um departamento que produza guerra e espaço, contratarmos, como foi feito nos Estados Unidos e em todos os países do mundo, funcionários públicos? Se até em guerra justificam-se os investimentos públicos, por que não o Governo fornecer recursos para aquelas despesas que antes pertenciam ao quadro da atividade privada, em pesquisa, em silos e armazenamento, em transporte, em fiscalização do patrimônio, em seguro-saúde para a mão-de-obra, em casas e habitações para os trabalhadores e, como dizia Alvin Hansen, também em merenda escolar e bibliotecas públicas?

O Governo, portanto, fez com que o aparelho de Estado fosse incrustado por essas atividades que antes pertenciam ao custo privado. Reduziu, portanto, o lucro das empresas e que passaram para o Governo.

Desprivatizar agora significa voltar para as empresas privadas, para o custo privado aquilo que hoje pesa no orçamento público. Portanto, a desprivatização significa agravar a crise do capitalismo. É uma proposta totalmente equivocada a desprivatização, porque ela significa que atividades que hoje são sustentadas com dificuldade pelo Estado, pelo Executivo, voltariam ao âmbito das empresas privadas e ali constituiriam custo, reduzindo, portanto, ainda mais o lucro já cadente na economia capitalista mundial.

A desprivatização é um equívoco. E o que vemos agora é que esse Estado empregador, esse Estado comprador está aparentemente em crise, porque não existe outra solução. A solução sempre foi o endividamento público ou a solução do capitalismo sempre foi encontrar no Estado capitalista o principal órgão de acumulação. Isso devia ser óbvio para todos, infelizmente não é.

Mas é claro, por exemplo, Gar Alperovitz, economista e Presidente do Centro Nacional de Alternativas Econômicas, dos Estados Unidos, observa que, embora o déficit dos Estados Unidos atualmente seja de aproximadmente de 4,8% do Produto Interno Bruto, a Grã-Bretanha apresenta um déficit de 4,4%.

Diz ele que um estudo recente sobre o crescimento econômico a longo prazo conclui que "não tem havido períodos duradouros de rápida recuperação a longo prazo neste século sem o rápido crescimento dos gastos do Governo."

Concluímos, então, que o capitalismo nunca cresceu nos últimos 400 anos sem que a dívida pública estivesse presente para fornecer os recursos necessários para dinamizar o processo de acumulação.

De modo que se propõe que, dado o fracasso do neoliberalismo, dada a impossibilidade de o capitalismo se sustentar apenas com suas duas próprias pernas: a produção de meios de produção e a produção de meios de consumo e o setor de serviços, a única solução para a economia capitalista é cada vez mais sustentar-se no Governo que hoje se declara falido.

O governo norte-americano encontra-se diante de uma dívida pública de US$5,9 trilhões, e o déficit orçamentário dos Estados Unidos atingiu, em determinado ano, 40% do PIB. O nosso está em cerca de 4% e nós temos medo do déficit. Queremos tapar o déficit, desempregando funcionários, não recompondo as perdas salariais, desmantelando os serviços de saúde pública, de educação, etc., porque temos um perigoso déficit de 4%. O Governo restringe os seus gastos, mas a dívida pública cresce assustadoramente. A taxa de crescimento da dívida pública brasileira é realmente perigosa, porque o crescimento de 10% no mês atrasado e de mais de 13% no mês passado mostra que não é possível sustentar por muito tempo essa taxa absurdamente elevada de crescimento da dívida pública.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não adianta querer reduzir o crescimento assombroso da dívida demitindo funcionários, porque eles representam apenas 6% do PIB. Enquanto o Governo brasileiro quer reduzir gastos com a saúde, a educação e o social, para combater o aparentemente elevado déficit orçamentário, o Governo norte-americano continua a elevar os seus gastos, que ultrapassaram, em alguns anos, US$320 bilhões de déficit.

Agora, como havíamos previsto, os organismos internacionais dizem que vem aí uma nova onda de falências de bancos, não apenas no centro do capitalismo, mas especialmente na periferia, e o Brasil é indicado por esses organismos, conforme os jornais de anteontem publicaram, como o País em que a quebradeira de bancos será, possivelmente, a maior.

Quando o Proer foi instaurado para salvar bancos, é óbvio que novos recursos teriam que ser dados, porque não se mudou nada, não se mudou a taxa de câmbio, não se mudou a taxa de juros, não se mudou o número de falências resultante do enxugamento e do arrocho imposto à economia brasileira. Logo, os bancos teriam que continuar a quebrar, porque os elementos presentes na quebradeira dos bancos, na falência dos bancos, continuaram presentes intactos na economia brasileira. Dar R$20, R$30 ou R$40 bilhões a alguns bancos não evita que outros bancos entrem em falência.

Aquilo que realmente nos preocupa é que o Governo capitalista antes era empregador de trabalhadores e ajudava a minorar a taxa de exploração sobre os trabalhadores, porque passou a fornecer lucro. Durante esse período de keynesianismo perverso, pelo menos os trabalhadores puderam ter um certo alívio, porque o Estado conseguiu produzir um lucro artificial e fornecê-lo aos capitalistas e aos banqueiros.

Agora, com a economia do Estado mínimo, com a economia do enxugamento, com a economia da redução e da modéstia aparente do Executivo, é lógico que a fonte de lucro só pode ser a velha e antiga e tradicional: o trabalhador em ação. E é por isso que a intensificação do processo de trabalho, a robótica e a informática, a nova tecnologia atuam violentamente, de forma selvagem, sobre os trabalhadores, procurando extrair deles o lucro que o Governo não dá mais às empreiteiras, aos fornecedores, ao setor relacionado a esse Governo.

Agora, se esse processo continuar, os trabalhadores terão que sofrer a carga dessa nova tecnologia, que aumentará aquilo que Fernando Henrique Cardoso, com precisão, chamava de mais-valia relativa. A intensificação da jornada de trabalho, a robotização, o downsizing, a reengenharia, tudo fica sobre as costas dos trabalhadores.

Portanto, a dupla jornada e tudo o mais são resultado inexorável desse processo. Isto realmente me assusta, isto e apenas isto me preocupa: a situação daqueles que se encontram no desemprego, resultado do enxugamento do Estado hipertrofiado, resultado do fato de que, também nos setores privados, se desemprega mão-de-obra como técnica, como forma de aumentar a taxa de lucro do sistema. Onde vamos parar?

Em alguns países, como a França, os anciãos, os da terceira idade ainda se encontram no conforto erguido pelo antigo sistema; o sistema de seguro-desemprego, os planos de saúde e a saúde pública ainda funcionam, mas no Brasil nada disso existe. Não existe um seguro-desemprego digno e não existe nenhum amparo ao trabalhador sucateado e desempregado, ao trabalhador vítima da economia neoclássica, vítima do mercado voraz, selvagem e da ditadura do mercado livre.

O que me preocupa é especialmente isto: 830 milhões de desempregados em escala mundial. Diante desse quadro e diante da evidência verificada não apenas por Gar Alperovitz, mas por centenas de pesquisadores e observadores imparciais, faliu a tentativa de retorno à economia neoliberal em escala mundial. O neoliberalismo faliu em escala mundial. Como diz Rubens Ricupero, não deu respostas aos problemas principais da humanidade.

O que fazer? O que fazer se os neoclássicos não conseguiram uma superação para a crise do capitalismo? O que fazer diante do aprofundamento dos nossos problemas, tendo em vista o equívoco do remédio neoliberal aplicado? A única solução me parece ser, ao contrário do que se fez no Brasil, ao invés de salvar bancos, deixar os bancos quebrarem; porque os bancos se converteram num obstáculo ao capitalismo produtivo.

Estou falando isso para mostrar que é preciso minorar a crise do capitalismo, porque ela está se tornando insuportável para os trabalhadores. Os sindicatos estão completamente esvaziados, não conseguem nem deter o desemprego e nem promover conquistas salariais. Portanto, os sindicatos estão falindo em escala mundial.

O que me parece é que, como tem ensinado a história econômica do capitalismo, nos últimos 400 anos, a única solução é e sempre foi a presença do Executivo, do Estado, desde as empresas régias e privilegiadas de Colbert, na França, no século XIV, até as empresas estatais de hoje, até os subsídios e estímulos criados pelo Governo, e até o fato de que o Governo norte-americano, que se neoliberaliza no discurso, gasta mais de US$2 trilhões por ano, mantendo ainda a atividade econômica norte-americana em um nível suportável.

Portanto, os bancos devem ser limitados na sua ganância; os bancos, há muito tempo, têm, na compra dos papéis do Governo - bônus, treasure notes, LTNs, OTNs, RTNs, títulos e papéis - a sua principal fonte de renda, a sua principal fonte de lucro, a sua principal fonte de especulação. Aquelas entidades, que se transformaram em meros mediadores, meros intermediários da dívida pública, perderam a capacidade inicial que tinham de irrigar a economia, de emprestar dinheiro para a produção e para o comércio e são agora única e exclusivamente banqueiros do Governo.

Essa atividade de intermediação no Brasil é insuportavelmente elevada. Todos sabemos disso. É a mais elevada taxa de juros do mundo a que recebe o nosso sistema bancário. E é por isso que o Brasil encontra as maiores dificuldades em reativar a sua economia.

Portanto, é preciso não apenas reduzir a taxa de juros do sistema financeiro, mas eliminar esse mediador, esse intermediário, esse agiota.

Se o Governo, ao invés de pagar os seus 19% de juros ao mês ao sistema bancário para a rolagem de sua dívida pública, eliminasse os bancos e vendesse diretamente aos tomadores, se vendesse nas agências de correio os seus títulos ou em qualquer órgão credenciado para esse fim, é óbvio que o sistema bancário brasileiro, que vive dessa intermediação da dívida pública, faliria. Se quisermos manter esse sistema, ele vai falir, de acordo com os prognósticos feitos pelos mais competentes órgãos financeiros internacionais.

Como dizia Marx, o capitalismo é capaz de superar os obstáculos que se lhe opõem. Se os capitalismos brasileiro e mundial não forem capazes de superar a barreira que é o sistema bancário, que inviabiliza a atividade econômica, esvazia as oportunidades de emprego e encarece a produção e o consumo, o capitalismo vai morrer na praia. O capitalismo neoliberal está fadado a morrer na praia, porque todo sistema dá lugar a um outro superior apenas quando se esgotam todas as suas potencialidades.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy) - Eminente Senador Lauro Campos, embora o diálogo com Karl Marx e John Maynard Keynes esteja tão brilhante para todos nós, lamento dizer que V. Exª já excedeu o seu tempo em 14 minutos.

O SR. LAURO CAMPOS - Agradeço a V. Exª e sei que foi por descuido, e não por partidarismo, que a sua gentileza recaiu sobre mim.

Para terminar, quero enfatizar que o capitalismo morrerá na praia se seguir o modelo que nos está sendo imposto - a nós, periféricos -, mas que não é seguido, porque impossível de ser posto em prática, pelo capitalismo cêntrico, pelo Japão e, principalmente, pelos Estados Unidos.

Portanto, nessa sobrevida difícil do capitalismo, cada vez mais bárbara e desumana, devemos aliviar essa passagem, impedir que não apenas o Muro de Berlim caia sobre o capitalismo, mas que o capitalismo caia sobre os trabalhadores.

Essa preocupação foi anunciada no Brasil há cerca de um mês pelo historiador inglês Lester Thurow, que aqui esteve, autor do livro "Cabeça a Cabeça". Com a queda do Muro de Berlim, ele teme que o capitalismo perca a sua cabeça e seja introduzido um grau maior de desumanidade, porque as conquistas sociais que existiram indubitavelmente, apesar de todos os defeitos verificados no Leste Europeu, eram imitadas e reproduzidas na economia capitalista.

Agora, com a Queda do Muro de Berlim, o capitalismo não tem mais como limitar a sua sede mercadológica de poder e de lucro. A ditadura do mercado livre está exercendo seu poder destruidor sobre os trabalhadores.

Por isso, proponho, modestamente, que se passe um rolo compressor não sobre a humanidade, mas sobre os banqueiros, para que o capitalismo tenha a possibilidade de ter uma morte digna, de ter uma sobrevida menos desumana.

É esse o quadro atual que me aterra e faz com que, pela primeira vez em minha vida, eu procure encontrar algum remédio, alguma solução para amortecer e prolongar um pouco a vida de um sistema que desejo ver definitivamente superado.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/06/1996 - Página 11061