Discurso no Senado Federal

COMENTANDO REPORTAGEM DA REVISTA VEJA, DESTA SEMANA, SOBRE O GRAU DE INSEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO AEREA DO PAIS.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • COMENTANDO REPORTAGEM DA REVISTA VEJA, DESTA SEMANA, SOBRE O GRAU DE INSEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO AEREA DO PAIS.
Aparteantes
Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 29/06/1996 - Página 11058
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SEGURANÇA DE VOO, TRANSPORTE AEREO, AVIAÇÃO COMERCIAL, BRASIL.
  • NECESSIDADE, MELHORIA, JORNADA DE TRABALHO, CONDIÇÕES DE TRABALHO, CONTROLADOR DE TRAFEGO AEREO, PILOTO CIVIL, FISCALIZAÇÃO, AERONAVE, DEPARTAMENTO DE AVIAÇÃO CIVIL (DAC), REDUÇÃO, ACIDENTE AERONAUTICO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a revista Veja desta semana publica uma reportagem com dados preocupantes a respeito do grau de insegurança da navegação aérea do País. Não é que a aviação não seja segura; em relação aos demais meios de transportes, ainda é, de longe, o mais seguro de todos. Entretanto, a revista revela uma série de falhas que não são do conhecimento do público a indicarem que muito precisa ser feito para reduzir ainda mais essa margem de insegurança, que, aliás, se assegura em termos absolutos, não em termos relativos.

Segundo um quadro publicado na mesma reportagem, os acidentes no Brasil, por um milhão de operações, é quase dez vezes maior do que nos Estados Unidos.

Sr. Presidente, a matéria mostra coisas, como, por exemplo, a declaração do Presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Sr. Luiz Fernando Collares:

      As companhias aéreas vêm submetendo os pilotos a cargas horárias excessivas e não dão às aeronaves a manutenção devida. Na noite em que se esborrachou contra a serra da Cantareira, o comandante do Learjet dos Mamonas Assassinas trabalhava havia dezessete horas seguidas, seis acima do máximo permitido por lei.

E continua a revista:

      Para cada tragédia como a dos Mamonas, tem acontecido uma exorbitância de sustos que passam despercebidos. No ano passado foram registrados 662 "incidentes graves", como incêndio controlado a tempo ou vôo em que uma turbina parou de funcionar. "Mas a estatística é falha, porque muitas ocorrências não são notificadas", admite o Major Renato Diniz, do Centro Nacional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos.

A declaração de uma autoridade do setor é realmente preocupante.

      Os "quase acidentes", quando a distância entre os aviões chega a menos de 165 metros, são sessenta por ano.

      No Rio de Janeiro, o sistema de radar - vejam bem que se trata do mais importante aeroporto da segunda maior cidade do País - foi apelidado de ""vaga-lume"" porque funciona à moda da usina de Angra I.

Ou seja, acende e apaga; às vezes funciona e outras não. É realmente inacreditável que isso aconteça no aeroporto do Galeão.

      Em São Paulo, o radar que monitora a região de Cumbica, Congonhas, Viracopos, Campo de Marte e Santos tem antenas tão velhas e malconservadas que enchem as telas de interferências.

Isso quer dizer que a tela do radar nem sempre tem limpidez. E sabemos que o radar é indispensável no monitoramento dos vôos.

      Os operadores são insuficientes para tanto avião, e cada um chega a orientar nove aeronaves ao mesmo tempo, embora o máximo admitido pelas normas de segurança seja sete.

Ou seja, há o controle simultâneo de dois aviões a mais por operador do que o máximo permitido.

Diz o Coronel Ney Cerqueira, do Serviço Regional de Proteção ao Vôo:

      "Os controladores estão estressados. Se pousar uma mosca no radar, alguém tem um enfarte - disse ele, evidentemente exagerando, mas mostrando o grau de exaustão, física ou psicológica dos operadores.

      Ao stress somem-se as más condições de trabalho. Os controladores de vôo brasileiros ganham 1.000 reais por mês, metade do que se recebe no Caribe, um quinto do salário de Portugal e um décimo do que é pago nos Estados Unidos.

Citando um caso concreto, individual, informa:

      Ethewaldo Sampaio Júnior, 40 anos, 22 de profissão, acostumou-se a fazer bico para complementar a renda familiar. Vendeu vasos de cerâmica, foi eletricista e hoje dá expediente como marceneiro. - Ele é um operador de vôo. - Quando é escalado para o turno na torre, das 10 da noite às 6 da manhã, só tem tempo de passar em casa para uma soneca antes de pegar no serrote. "Sei que o desgaste pode provocar uma falha humana", admite. "Mas tenho de sustentar minha família", diz Ethewaldo.

      Certa vez Sampaio mandou um Boeing iniciar o pouso sem perceber que havia outro avião logo abaixo. Por sorte, conseguiu corrigir o erro a tempo. Sampaio que só fala um inglês rudimentar, reconhece que não saberia o que fazer no caso de uma emergência com um avião estrangeiro.

O Sr. Nabor Júnior - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Jefferson Péres?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Com prazer, ouço V. Exª, nobre Senador Nabor Júnior.

O Sr. Nabor Júnior - Senador Jefferson Péres, o tema que V. Exª está abordando na manhã de hoje merece uma reflexão por parte das autoridades encarregadas de dar segurança e proteção aos vôos das aeronaves que cruzam os céus do nosso País. Há poucos dias, tive oportunidade de endereçar uma correspondência ao presidente da Varig, correspondência essa também assinada pelo Senador Flaviano Melo, reclamando das constantes panes que os aviões que cobrem a nossa região apresentam. Só no curso de duas semanas, mais de quatro aeronaves apresentaram pane no meu Estado, a ponto de terem de transferir os passageiros para outros vôos. O vôo que deveria ir para Cuiabá, sem oferecer condições de conexão para Brasília e São Paulo, ficou retido, por pane, várias vezes. Assim, tiveram que deslocar os passageiros para Manaus, a fim de tomarem um outro vôo às 2h30min. Isso aconteceu inclusive comigo e com outros companheiros que representam o meu Estado aqui no Congresso Nacional. Não existe preocupação das nossas empresas de aviação civil de realizar uma manutenção mais adequada nessas aeronaves, colocando em risco a vida dos milhares de passageiros que transportam através do nosso País. Não há renovação da nossa frota de aviação. São aviões sucateados, que estão voando há mais de 20 anos e são modelos que já não são utilizados em outros países, além de haver um número insignificante de aeronaves sendo utilizadas. Só para se ter uma idéia da precariedade da nossa aviação civil, vou citar um dado de uma empresa de aviação civil dos Estados Unidos, chamada Delta, com sede em Atlanta, que possui mais de 500 aviões. Juntando todas as empresas brasileiras - a Varig, a Vasp, a TAM, a Transbrasil - não se chega a 200 aviões. Juntas, as empresas brasileiras não têm 50% dos aviões que tem a Delta nos Estados Unidos, levando-se em conta que esse é um país cortado por ferrovias e rodovias para todas as localidades. Estamos enfrentando uma crise, e quero parabenizar V. Exª por estar abordando este assunto para chamar a atenção das nossas autoridades e também dos dirigentes das empresas de aviação no sentido de dotá-las de condições que ofereçam mais segurança aos passageiros que elas transportam. Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES - A corroborar o que V. Exª acaba de dizer sobre a frota de aeronaves do País, Senador Nabor Júnior, diz a revista:

      "Nos últimos seis anos, dois terços dos Boeing 727 existentes tornaram-se "geriátricos" - ou seja, ultrapassaram a vida útil prevista pelo fabricante."

      "Dos 164 jatos de grande porte com bandeira brasileira, cinqüenta são considerados geriátricos." 

E continuam voando.

      "As empresas brasileiras estão economizando na manutenção e apelando para peças de qualidade duvidosa", acusa o presidente do Sindicato dos Aeroviários de Porto Alegre, Marco Antonio Justino. Ele diz que a revisão de bloco de um Boeing da Varig, quando se desmonta a aeronave inteira para checar as peças uma a uma, antes era feita em 45 dias. Agora leva quinze, porque a chefia pressiona os funcionários a liberar logo o avião. Justino também acusa o DAC de não ser suficientemente rigoroso ao fiscalizar a manutenção das companhias aéreas, especialmente as pequenas, que fazem vôos fretados. O DAC nunca multou uma empresa por uso de peças irregulares."

Multou por outros motivos, não por esse; ou seja, a fiscalização, quanto às peças, não existe. Existe coisa mais grave do que isso?

      "A pressão para decolar a qualquer custo é um problema grave no Brasil", acusa o comandante José Giupponi França, instrutor de segurança de vôo na Air Berlin."

      "Nas imediações dos aeroportos do Galeão, de Salvador e de Manaus, pairam nuvens de urubus, atraídos pelos lixões próximos. As colisões de aves com aviões aumentaram 75% nos últimos cinco anos - só em 1995 foram registrados 163 casos. A trombada com um urubu a 300 quilômetros por hora produz um impacto de 7 toneladas. Quando o choque afeta apenas a fuselagem, a situação é controlável. Mas quando atinge a turbina há risco de explosão."

E não é apenas a segurança dos vôos, Senador Nabor Júnior: também suas condições sanitárias. Na semana passada, a imprensa de Manaus divulgou o relatório de um professor da Universidade do Amazonas, que estudou, durante quatro meses, os vôos a partir do Aeroporto de Manaus e constatou uma série de irregularidades, como entrada de comida clandestina de empresa não fiscalizada pela vigilância sanitária, transporte de passageiros doentes vindos de áreas de risco no interior, onde é comum o registro de febre amarela, malária e hepatite. Não está sendo cobrado dos passageiros que viajam para o interior atestado de vacina. Existem vôos charters que não são fiscalizados pelos serviços de vigilância sanitária.

Eu próprio, há um mês, fui testemunha, protagonista de um acidente ocorrido no Aeroporto do Galeão. Quando pousava o avião, que saiu de Brasília para o Rio do Janeiro - isso mostra o desaparelhamento das nossas empresas -, dois pneus estouraram. Coisa raríssima de acontecer. Assustamo-nos com o estrondo, que parecia uma explosão. O avião fez uma freada brusca, parou, e nós ficamos uma hora à espera de um reboque no Galeão. O avião era um DC 10 da Varig. O reboque não veio, e o avião teve que taxiar até o setor de desembarque, arrebentando, certamente, os pneus, porque, no Aeroporto do Galeão, não havia um carro-reboque disponível da maior empresa brasileira.

Para não ficar apenas no discurso, Sr. Presidente e Srs. Senadores, na última reunião da Comissão de Assuntos Econômicos, apresentei um requerimento, que foi aprovado, para a convocação do Diretor do Departamento de Aviação Civil -DAC- e do Presidente da Infraero, para darem explicações numa reunião conjunta com a Comissão de Infra-Estrutura. Infelizmente, a Comissão de Infra-Estrutura ainda não se reuniu, e no mês de julho não será possível. Espero que, logo no início de agosto, essas autoridades venham aqui dar explicações, que são indispensáveis, porque se trata, afinal de contas, de um assunto de interesse público da mais alta gravidade, que é a segurança do vôo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/06/1996 - Página 11058