Discurso no Senado Federal

SEQUENCIA DE PRONUNCIAMENTOS A RESPEITO DO PROBLEMA DO DESEQUILIBRIO ECONOMICO-FINANCEIRO DA FEDERAÇÃO.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • SEQUENCIA DE PRONUNCIAMENTOS A RESPEITO DO PROBLEMA DO DESEQUILIBRIO ECONOMICO-FINANCEIRO DA FEDERAÇÃO.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Humberto Lucena.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/1996 - Página 11568
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, AUSENCIA, PLANEJAMENTO, SOLUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, NECESSIDADE, DIVERSIDADE, TRATAMENTO, PROBLEMA, REGIÃO.
  • ANALISE, FALTA, COORDENAÇÃO, TRATAMENTO, CRISE, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, JUDICIARIO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DE ALAGOAS (AL), DIVIDA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ELABORAÇÃO, PROGRAMA, REGIÃO NORDESTE, SITUAÇÃO, REDE VIARIA.

SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho tratado, desta tribuna e em artigos de imprensa, sobre o problema do desequilíbrio econômico-financeiro na Federação. Vários ilustres Srs. Senadores o têm feito em oportunidades diferentes.

Ainda, ao fim da última semana, cuidou da matéria, fundado em relatório da Organização das Nações Unidas, o Senador Waldeck Ornelas, que mencionou a particularidade de ali se fazer referência, diante das discriminações existentes no País, à configuração de três Brasis. Não importa saber-se se ainda subsiste a classificação de dois Brasis, de Jacques Lambert, ou a de três a que agora se refere o documento da Organização das Nações Unidas.

Essencial ver é que as desigualdades regionais estão multiplicando os problemas no País.

O SR. PRESIDENTE (Ney Suassuna) - Permita-me interrompê-lo, apenas para prorrogar o Expediente por mais alguns minutos, para que V. Exª possa concluir o seu pronunciamento e para que os dois inscritos para comunicação inadiável também possam fazê-la.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Muito obrigado a V. Exª.

Até há algum tempo, caracterizavam-se regiões ricas e regiões pobres. A Região do Nordeste, ainda hoje, luta pela caracterização de soluções convenientes a seu desenvolvimento. E sempre se assegurou a diferenciação entre o Nordeste e outras regiões, como o Centro-Sul, consideradas mais desenvolvidas.

A verdade, porém, é que a falta de tratamento adequado do problema federativo está estendendo as dificuldades a todas as regiões. A singularidade é extremamente grave, porque revela que os governos sucessivos não têm adotado as providências adequadas à correção das dificuldades econômico-financeiras e das desigualdades entre as diferentes regiões.

Agora mesmo, caracterizam-se situações, no País, nitidamente indicativas da falta de correções planificadas. O Estado de São Paulo, a unidade mais desenvolvida no País, está em sérias dificuldades para pagar dezenas de precatórios. Interessados reclamam e ameaçam de pedir intervenção federal.

Já ocorreu uma crise extensa no Estado de Mato Grosso, em que a Justiça entrou em greve, obrigando o seu Governador a peregrinar por Brasília à busca de recursos para a solução conveniente.

Há dias apenas, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por expressiva maioria, autorizou o seu Presidente a pleitear a intervenção federal no Estado, por falta de transferência dos recursos devidos à manutenção do Poder Judiciário.

Em Alagoas, a Justiça está em greve há meses. Os entendimentos se multiplicam entre o Governador, o Poder Federal e até o Supremo Tribunal Federal, na tentativa de evitar o mal maior da intervenção federal.

O jornal O Estado de S. Paulo, à vista desses fatos, mas sobretudo considerando o que ocorre em Alagoas, ainda ontem, publicou expressivo e sereno editorial que vale ser lembrado desta tribuna. Observa o Jornal O Estado de S. Paulo:

      "O que espanta é que a crise venha sendo tratada como semelhante à do sistema financeiro. Ou com menos atenção, pois nesse último caso criou-se o Proer, que, certo ou errado, na sua concepção ou apenas em sua execução, permitiu se contornasse, ainda que a custos altos, uma situação desastrosa."

Acentua, porém, o editorial:

      "A crise da Federação tem sido tratada com mezinhas: um auxílio da Caixa Econômica Federal aqui, uma autorização para ampliar o endividamento mediante descontos de Antecipações de Receitas Orçamentárias ali, um estudo, nunca terminado, sobre como socorrer Bancos estaduais em situação difícil acolá."

Vê-se, assim, por observação em um jornal que não tem caráter de oposição ao Governo, que falta o planejamento apropriado a que se trate do grave problema do desequilíbrio econômico-financeiro na Federação. É sobretudo isso que falta. As providências são isoladas, são circunstanciais, jamais coordenadas e tendo em vista o conjunto do País. Mesmo quando o Governo elabora determinados programas, destinados a uma região, não lhes dá feição de planejamento, de maneira que as soluções previstas sejam entre si coordenadas. É o que ainda recentemente se verificou na apresentação, pelo Ministério do Planejamento, de alguns programas relacionados com o Nordeste.

Não se negou e nem se nega que as medidas propostas sejam convenientes. O que se salienta, e tive oportunidade de dirigir-me ao Ministro do Planejamento, nosso colega José Serra, a esse respeito, o que se verifica é que as medidas são isoladas, ora sobre irrigação, ora sobre agricultura, ora sobre energia; mas não há previsão da correlação das providências e da atividade dos órgãos destinados a executá-las.

Daí se verifica sempre a execução de medidas isoladas, que não produzem os efeitos esperados, para a correção dos problemas de desigualdades entre as regiões do País. Esse problema já levou ao enfraquecimento da Sudene, como de outros órgãos criados para que se enfrentassem problemas relativos à região.

A falta de coordenação permite que, no fim do século XX, a Confederação Nacional do Transporte possa nos dar uma informação tão desalentadora, como essa. Verificando as estradas federais, informa esse órgão especializado que "96,3% dos quilômetros pesquisados estão em estado de conservação regular, ruim e péssimo; e apenas 6,4% em estado de conservação bom e ótimo." A desproporção entre as estradas trafegáveis e as que estão em deterioração é extremamente lamentável.

Ainda ontem, aliás, nesta Casa, o Senador Antonio Carlos Magalhães indicou exemplos de uma dessas estradas, ao tempo em que solicitava que o nobre Ministro do Transporte cuidasse do problema, particularmente quanto àquela rodovia. Mas se está a ver que as providências se impõem no conjunto do sistema rodoviário, que se encontra, como informa a Confederação Nacional do Transporte, em situação de calamidade em 96% de sua extensão.

Ora, Sr. Presidente, providências cabem, então, porém providências que sejam coordenadas no País. Ninguém está exigindo que o Governo elabore um plano rígido. Há muito quem tenha medo de plano, porque o plano nasceu na União Soviética. Não se trata disso. Trata-se, isso sim, de pedir que sejam elaborados programas entre si coordenados, capazes de servir ao conjunto do País. A esta altura, é preciso que se assinale bem isso, já não se cuida apenas de reclamar o que está ocorrendo no Nordeste ou que ocorre em outros pontos. Os fatos que aqui referi no princípio, alcançando São Paulo e o Rio Grande do Sul, indicam que se tornam necessárias providências planificadas, que resguardem a integridade da Federação.

O jornal O Estado de S. Paulo, no mesmo tom de serenidade do princípio do editorial, a que me referi, conclui fazendo esta observação:

      "... no longo prazo, é a União que poderá sofrer pela lenta desaglutinação dos Estados."

Vale salientar essa observação, em benefício do resguardo da integridade da Federação.

O Sr. Humberto Lucena - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª tem o aparte, Senador Humberto Lucena.

O Sr. Humberto Lucena - Nobre Senador, venho cumprimentar V. Exª, que, como sempre, ocupa a tribuna para nos brindar com um brilhante pronunciamento. V. Exª tem atuado no Senado, que é a Casa da Federação, justamente em defesa do princípio federativo. Tenho para mim que, a continuarmos nesse diapasão a que V. Exª se refere, sem uma atenção maior justamente para o equilíbrio federativo, vamos ter, dentro de pouco tempo no Brasil, a extinção da República federativa e a instituição da República unitária, tal a concentração de poder que cada vez maior, nas mãos do Senhor Presidente da República. Veja V. Exª que, ultimamente, em relação, por exemplo, ao endividamento dos Estados, se criou, inclusive, uma espécie de FMI no Ministério da Fazenda: comissões vão aos Estados para examinar as contas públicas e verificar se podem ou não ser atendidos determinados pleitos. Na verdade, temos que fazer um apelo ao Presidente da República - Sua Excelência foi Senador - no sentido de que realmente veja o que está acontecendo e procure prestigiar a Federação. V. Exª, há pouco, falava também na questão da falta de planejamento e de certas distorções como, por exemplo, na área de transportes. Ainda hoje, o Sr. Ministro dos Transportes - em entrevista a jornais - enfatizava a imperiosa necessidade de uma liberação urgente de pelo menos R$300 milhões, para que possamos conservar nossas estradas federais. Todavia, Senador, isso vai de encontro, justamente, àquela contenção de gastos que já foi feita pelo Governo Federal; mas, pelo menos, há uma promessa do novo Ministro do Planejamento de atender ao Sr. Ministro Odacir Klein. Quero, então, congratular-me com V. Exª e dizer que estou de pleno acordo com todas as suas considerações a respeito de tão importante matéria.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Agradeço a colaboração do nobre Senador Humberto Lucena, cumprindo assinalar que os Ministros ficam a apontar a necessidade de receber os recursos, exatamente porque não há o planejamento. Se houvesse o planejamento, haveria a distribuição de recursos segundo as prioridades estabelecidas, e os recursos seriam naturalmente transferidos. Porque não há o planejamento: há essa luta, há competição entre os Ministros para o recebimento de verbas que nem sempre atendem, quando deferidas, aos interesses do País.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Antônio Carlos Magalhães.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Nobre Senador, V. Exª, nessa resposta, colocou perfeitamente o sentido da realidade brasileira: é que nem sempre as liberações atendem aos interesses legítimos do País. Agora mesmo, certamente com autorizações - porque o Orçamento é uma autorização - ou extra-orçamentárias, o que é mais grave, têm saído verbas em todos os setores que minimizariam bastante o espetáculo entristecedor das estradas brasileiras, principalmente no território baiano - V. Exª as conhece muito bem e disserta com muita propriedade -, onde estão em verdadeiro estado de calamidade. Nós não poderíamos ouvi-lo sem dar esse apoio às palavras de V. Exª, o que acredito seja o senso comum no Senado e na Câmara. Mas é preciso que o Presidente, que, inclusive, concorda realmente conosco, chame a atenção dos seus Ministros para esses pagamentos, que são até extra-orçamento. E o Presidente, com quem estive, está revoltado com essa maneira de fazer, que depõe contra a sua atuação na vida pública brasileira, ele que é homem sério e decente; mas esse método evidentemente não está à altura da sua responsabilidade e da respeitabilidade que todos nós achamos que Sua Excelência tem perante a Nação. Portanto, quero congratular-me com a oportunidade do discurso de V. Exª, que, mais uma vez, fere um ponto importante, neste Senado. Como faz, aliás, sempre.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Muito obrigado a V. Exª pelo reforço que traz ao meu discurso. Por intermédio de suas observações se confirma exatamente o que reclamo, tenho reclamado sempre, e desde o meu primeiro mandato, sobre a necessidade de planejamento. Se se adotasse planejamento, as soluções seriam normais, as prioridades atendidas, acima das conveniências pessoais e partidárias. Como não há um planejamento, as soluções são inadequadas.

Estamos, então, chegando à situação a que se referiu criteriosamente o jornal O Estado de S.Paulo, ao ponto em que se ameaça a integridade da Federação.

O Governo atente em que as soluções não podem ser isoladas, para essa ou aquela região. As dificuldades, repito, que passam a atingir Estados como São Paulo e Rio Grande do Sul, indicam que é preciso mudar de rumos. O Governo atente - e não pode deixar de atentar - em que não há União forte com Estados enfraquecidos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/1996 - Página 11568