Discurso no Senado Federal

REFLEXÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE DO SENADO NA QUESTÃO DA PRIVATIZAÇÃO DA VALE DO RIO DOCE, AO PROTELAR A APRECIAÇÃO DE PROJETO DE SUA AUTORIA QUE SUBMETE AO CONGRESSO NACIONAL TAL PROCESSO.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • REFLEXÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE DO SENADO NA QUESTÃO DA PRIVATIZAÇÃO DA VALE DO RIO DOCE, AO PROTELAR A APRECIAÇÃO DE PROJETO DE SUA AUTORIA QUE SUBMETE AO CONGRESSO NACIONAL TAL PROCESSO.
Publicação
Publicação no DSF de 05/07/1996 - Página 11539
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, SENADO, DEMORA, APRECIAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, SUJEIÇÃO, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, AUTORIDADE, LEGISLATIVO.
  • CRITICA, PARECER, COMISSÃO, DESTINAÇÃO, RECURSOS, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), INFRAESTRUTURA, ESTADOS, SEDE, EMPRESA ESTATAL, EFEITO, REDUÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, APREENSÃO, ENCERRAMENTO, ATIVIDADE, INDUSTRIA, FERTILIZANTE, PREJUIZO, ESTADO DE SERGIPE (SE).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (PT-SE. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, até não ia falar na tarde de hoje, mas não posso deixar de tecer alguns comentários sobre esse assunto, que foi introduzido pelo Senador Jader Barbalho, Líder do PMDB, e que teve continuidade no pronunciamento do Senador Ademir Andrade.

Primeiro, quero registrar que, infelizmente, por omissão desta Casa, a não ser que seja modificada a legislação, vamos ficar vendo a banda passar, um vez que o processo de privatização da Vale do Rio Doce está bastante adiantado, e o Governo já fez um cronograma em que prevê a sua privatização em fevereiro do ano que vem.

Tenho a registar que o nosso projeto, que condiciona essa privatização à autorização legislativa, poderia ter sido votado nesta Casa em agosto do ano passado, quando veio pela primeira vez ao Plenário, depois de ter sido aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos.

Naquela oportunidade, foi remetido à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que não o apreciou; conseguimos aprovar outro requerimento, e, assim, o projeto voltou ao Plenário em 15 de dezembro, tendo sua discussão novamente adiada.

Em maio deste ano, foi novamente incluído na pauta, quando foi aprovado o requerimento para ser ouvida a Comissão de Infra-estrutura. Nessa Comissão, foi votado o parecer do Senador Vilson Kleinübing, que dá como fato consumado a privatização da Vale; ficando estabelecido simplesmente que o dinheiro a ser arrecadado com a sua venda seria aplicado em infra-estrutura, preferencialmente nos Estados onde a Vale do Rio Doce já atua.

Nesta reunião de Governadores, que já foi registrada pelo Senador Jader Barbalho, houve reivindicações de alguns Estados, inclusive de Minas Gerais, que reivindica receber 42% dos recursos oriundos da venda da Vale, pelo fato de esse Estado representar 42% dos investimentos da Vale do Rio Doce no Brasil.

Vemos aí a primeira contradição no parecer que foi aprovado na Comissão de Infra-Estrutura. A argumentação daqueles que defendem a privatização da Vale do Rio Doce é que a Vale vai ser vendida, mas ninguém vai colocar a empresa debaixo do braço e levá-la para a Austrália, para o Japão. Ela vai continuar atuando, vai continuar gerando riqueza no Brasil, vai continuar gerando empregos, etc., etc.

Se for verdadeiro esse argumento - de que a Vale vai continuar gerando empregos, gerando riquezas nesses Estados onde atua -, não tem sentido que o dinheiro a ser arrecadado com a sua venda seja aplicado nestes Estados, uma vez que esses Estados vão continuar com a Vale do Rio Doce gerando neles riquezas.

A não ser que esse discurso seja falacioso - de que a Vale não vai ser colocada debaixo do braço; que não vai desativar atividades; que não vai se afastar de uma série de atividades que para a iniciativa privada não seriam tão atrativas -, a não ser que, de antemão, já se reconheça que a partir do momento em que a Vale do Rio Doce for privatizada ela irá desativar algumas atividades que desenvolve hoje pelo fato de ser estatal, mas que, com certeza, deixarão de ser atrativas a partir do momento em que a empresa seja privatizada.

Não é à toa que, em recente reportagem, a revista Carta Capital, ouvindo diversos analistas do mercado da área de indústria, publica matéria segundo a qual a companhia Vale do Rio Doce, apesar de ser uma empresa enxuta, muito eficiente, deveria, depois de privatizada, afastar-se de algumas atividades onde essa energia é pequena, onde o retorno para a atividade privada é pequeno. Cita especificamente o setor de fertilizantes.

Neste caso, quero voltar à reunião dos Governadores, onde foi feito um rateio do dinheiro arrecadado pela Vale do Rio Doce, cabendo ao Estado de Sergipe, o meu Estado, a bagatela de R$90 milhões, valor semelhante ao empréstimo que aquela Unidade Federativa fez junto à Caixa Econômica para arcar com sua folha de pagamentos - e com certeza seria feito esse encontro de contas.

Vale salientar, Sr. Presidente, que Sergipe é o Estado que tem a única mina de potássio do Hemisfério Sul, de propriedade da Vale do Rio Doce; potássio, aliás, que é um produto largamente utilizado na indústria de fertilizantes.

Verificamos, neste momento, Sr. Presidente, que, embora o Brasil esteja aí para fazer sua reforma agrária, para ainda alimentar o seu povo, os analistas da iniciativa privada vêem o setor de fertilizantes como um setor pouco atrativo, indicando que a Vale do Rio Doce, em sendo privatizada, deveria se afastar dessa atividade.

Então, pergunto: qual seria a situação do meu Estado, o Estado de Sergipe, que possui a única mina de potássio do Hemisfério Sul? Fatalmente ela seria desativada, e, como compensação, o meu Estado receberia R$90 milhões, com os quais poderia pagar o empréstimo que foi feito junto à Caixa Econômica Federal.

O Senador Jader Barbalho fez uma comparação entre os R$6 bilhões que seriam arrecadados com a privatização da Vale do Rio Doce e os R$6 bilhões que o Ministro da Saúde espera obter com a CPMF para gastar com a Saúde durante um ano. É uma comparação até nobre, porque eu faria uma outra: R$6 bilhões é o valor que foi investido no Banco Nacional para salvá-lo; quer dizer, a Vale do Rio Doce equivale a um Banco Nacional. A Vale do Rio Doce, que é uma agência de desenvolvimento, que detém o direito de exploração de recursos ainda "inavaliáveis" - para usar mais um neologismo -, é comparada, no Brasil, ao que foi investido no Banco Nacional para salvá-lo: US$6 bilhões ou R$6 bilhões.

Infelizmente, o Congresso Nacional ficará vendo a banda passar. O processo de privatização está indo de vento em popa; possivelmente, no final de julho, o consórcio que está avaliando a Companhia Vale do Rio Doce deverá concluir os seus trabalhos.

Já está-se dizendo que o valor não é mais de R$12 bilhões, mas R$9,5 ou R$10 bilhões. Suponhamos que seja R$10 bilhões. Como a União detém apenas 51% das ações, arrecadaremos não R$6 bilhões, mas R$5 bilhões. Já se reduziu o valor, não dá nem para salvar o Banco Nacional. Seriam, assim, R$5 bilhões. E, segundo proposta apresentada pelo Governo do Estado de Minas Gerais, um pouco mais de R$1 bilhão ficaria em Minas, recursos que, com certeza, serão usados para pagar as suas dívidas com a União; o Pará possivelmente ficará com R$600 milhões; o Maranhão, com mais ou menos R$400 milhões; e Sergipe, com R$90 milhões.

Chegaremos, provavelmente, no final desse processo, sem a Vale do Rio Doce e com as dívidas. Uma situação semelhante à do cidadão que vende a casa para pagar a conta do botequim. Dois meses depois, continua com a conta e sem a casa.

Infelizmente, o Congresso Nacional continua vendo a banda passar.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Muito bem! Palmas)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/07/1996 - Página 11539