Discurso no Senado Federal

INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DA ADMINISTRAÇÃO E REFORMA DO ESTADO, SR. BRESSER PEREIRA.

Autor
Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA ADMINISTRATIVA. POLITICA SALARIAL.:
  • INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DA ADMINISTRAÇÃO E REFORMA DO ESTADO, SR. BRESSER PEREIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 27/06/1996 - Página 10853
Assunto
Outros > REFORMA ADMINISTRATIVA. POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • INTERPELAÇÃO, BRESSER PEREIRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), RELAÇÃO, INDEXAÇÃO, RECEITA FEDERAL, POSSIBILIDADE, REDUÇÃO, DESPESA PUBLICA, PAGAMENTO, SERVIDOR, SOLUÇÃO, PROBLEMA, INFLAÇÃO, RECONHECIMENTO, DEFASAGEM, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO.

O SR. LAURO CAMPOS (PT-DF) - Exmº Sr. Ministro Bresser Pereira, vejo com satisfação V. Exª responder com tranqüilidade e firmeza a todas as perguntas.

Realmente, V. Exª sabe que tudo muda. Há, de acordo com algumas pessoas, um programa para ganhar eleições e um programa para executar no Governo. O programa para ganhar eleições não fala em 80 mil demissões. Mas no do Governo pode-se falar, adotando uma nova terminologia, o downsizing, a eficiência, a reengenharia e outras terminologias neoliberais, modernas, sobre essas medidas que, independentemente de suas capas verbais, exercem na prática o mesmo efeito maléfico.

Eu gostaria que V. Exª me esclarecesse em qual país - V. Exª se referiu a três - a aplicação do enxugamento, das demissões em massa, conseguiu fazer com que os problemas principais da nossa época fossem resolvidos. O desemprego na Inglaterra? Os 22% de desemprego na Espanha? Os 12% de desemprego na França? O desemprego causado agora não mais pelo Estado reempregador keynesiano que V. Exª conhece e criticou tão bem no passado. Agora não sei mais, mas até 1986 V. Exª se dizia um marxista adepto do método de Marx e de sua terminologia. Naquele tempo V. Exª dizia isso e, obviamente, naquele tempo, o senhor devia perceber que o capitalismo se salvou mediante justamente esse enxugamento, reabsorvendo os 25% de mão-de-obra desempregada nos Estados Unidos em 1935. Na Alemanha de Hitler, fez-se a mesma coisa com mais eficiência ainda, chegando em 1937 com o pleno emprego de Hitler.

Agora temos a seguinte pergunta: nessa revista que se chama Esquerda 21, V. Exª afirma que nos encontramos no caos. No entanto, aqui V. Exª tem todas as certezas.

Também o Presidente da República, Sua Excelência o Senhor Fernando Henrique Cardoso, declara na página 42 da mesma revista: "Este Estado hoje é o caos." De modo que, então, deve haver óculos especiais para se enxergar com tanta clareza através do caos.

Gostaria de saber de V. Exª se os 6% do PIB que o Brasil gasta para pagar regiamente seus funcionários públicos poderiam ser reduzidos a ponto de combatermos, com eficiência, a inflação no País e de alcançarmos uma sobrevida para a estabilidade. Essa importância é realmente significativa para que esses objetivos sejam alcançados?

V. Exª sabe que, nos Estados Unidos, o déficit orçamentário chegou a 40% do PIB em alguns anos e hoje continua elevadíssimo, fazendo com que a dívida pública alcance US$5,9 trilhões, enquanto nós estamos enxugando, demitindo, contribuindo para que os 830 milhões de desempregados no mundo sejam alimentados por essa reengenharia administrativa.

V. Exª fala também que os funcionários públicos não podem ter aquilo que a inflação subtraiu em termos de vencimentos, porque, se tivessem, seria um perigo para o retorno da inflação e para que o déficit orçamentário - o agora sagrado déficit orçamentário - não fosse agravado.

Mas o Governo adota indexadores para sua receita. O Governo cria fundos sociais de emergência. O Governo cria CPMFs. O Governo cria fórmulas de aumentar as suas receitas, esquecendo-se de aumentar os vencimentos dos funcionários públicos.

V. Exª afirma, num momento, que a estabilização é essencial, que seria uma das condições weberianas para que a administração racional fosse adotada. No momento seguinte, afirma que essa estabilização deve inexistir sempre que, por algum critério subjetivo, não esclarecido, não explícito, o Governo considere que exista necessidade de reduzir-se o número de funcionários públicos.

Collor considerou que era necessário demitir 160 mil excedentes. Agora, talvez uma imprensa caluniosa atribui a V. Exª esse propósito, que pode não ser mantido devido à proximidade das eleições ou a algum outro motivo que eu não conheça, mas que agora talvez V. Exª também tenha a respeito disso mudado de intenções. Mas é certo que a imprensa noticiou a demissão de 80 mil funcionários, assim como a FEBRABAN anunciou que era preciso demitir 180 mil bancários.

São essas as perguntas que faço a V. Exª a respeito da indexação das receitas públicas e da criação de novos impostos, de um lado, e, de outro, da contenção de despesa e impossibilidade de reconhecimento de que existe uma defasagem salarial e de vencimentos que deve ser sanada.

Além disso, que segurança V. Exª tem de que o capitalismo realmente poderá sobreviver com essa queda da demanda efetiva, com essa falta de estímulos e incentivos para manter a taxa média de lucro, com todo esse enxugamento do aparelho de Estado ao qual V. Exª agora se mostra especialmente favorável?

Penso que, para a sobrevida do capitalismo, só há uma solução: aquela adotada nos anos 30, que deve ser mantida enquanto o capitalismo não tiver esgotado todas as suas potencialidades.

Essa a minha modesta opinião, e gostaria de ouvir os esclarecimentos de V. Exª.

O SR. LAURO CAMPOS - Pois não, Sr. Presidente. Eu gostaria de dizer que o Professor Edmar Bacha, no prefácio de um livro meu, ressaltou que eu, 17 anos antes de Hicks, havia afirmado a crise desse keynesianismo. Então, isso para mim é de 30 anos atrás, eu sabia que ele ia entrar nessa crise. Contudo, o que perguntei a V. Exª foi onde e como as alternativas a esse capitalismo keynesiano perverso e falido existem, onde ele foi aplicado e onde ele existe. Foi isso que eu havia perguntado. De modo que, devido às múltiplas perguntas, é natural que V. Exª tenha-se confundido em relação àquilo que eu queria saber de V. Exª. Mas não faltará oportunidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/06/1996 - Página 10853