Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A ELABORAÇÃO ORÇAMENTARIA ANUAL, UM DOS PRINCIPAIS ATRIBUTOS DO CONGRESSO NACIONAL. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, DE SUA AUTORIA, EM TRAMITAÇÃO NA CASA, ESPELHADA EM DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO DE 1946, QUE PRORROGA PARA O EXERCICIO SEGUINTE, O ORÇAMENTO DO EXERCICIO ANTERIOR NÃO APROVADO PELO CONGRESSO NACIONAL. VETO E CANCELAMENTO DE DOTAÇÕES ORÇAMENTARIAS, EFETUADOS NO ANO PASSADO PELO SR. PRESIDENTE DA REPUBLICA. NOTA TECNICA DA CONSULTORIA DO SENADO FEDERAL SOBRE A JURIDICIDADE DO CANCELAMENTO DE DOTAÇÕES PROVOCADA PELO DECRETO DE 28.05.96, DO PRESIDENTE DA REPUBLICA.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A ELABORAÇÃO ORÇAMENTARIA ANUAL, UM DOS PRINCIPAIS ATRIBUTOS DO CONGRESSO NACIONAL. PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO, DE SUA AUTORIA, EM TRAMITAÇÃO NA CASA, ESPELHADA EM DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO DE 1946, QUE PRORROGA PARA O EXERCICIO SEGUINTE, O ORÇAMENTO DO EXERCICIO ANTERIOR NÃO APROVADO PELO CONGRESSO NACIONAL. VETO E CANCELAMENTO DE DOTAÇÕES ORÇAMENTARIAS, EFETUADOS NO ANO PASSADO PELO SR. PRESIDENTE DA REPUBLICA. NOTA TECNICA DA CONSULTORIA DO SENADO FEDERAL SOBRE A JURIDICIDADE DO CANCELAMENTO DE DOTAÇÕES PROVOCADA PELO DECRETO DE 28.05.96, DO PRESIDENTE DA REPUBLICA.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Jader Barbalho, José Alves, Lúcio Alcântara, Ney Suassuna, Romeu Tuma, Ronaldo Cunha Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/1996 - Página 11649
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, TRAMITAÇÃO, SENADO, PRORROGAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA, REQUISITOS, ADIAMENTO, LEGISLAÇÃO, ORÇAMENTO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR.
  • CRITICA, EXECUÇÃO, VETO PARCIAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DOTAÇÃO ORÇAMENTARIA, PREVISÃO, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR, VIOLAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REEXAME, REVOGAÇÃO, DECRETO EXECUTIVO, CANCELAMENTO, DOTAÇÃO ORÇAMENTARIA, MANUTENÇÃO, ORDEM JURIDICA, RESPEITO, CUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PAIS.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há dias que estamos para ocupar esta tribuna a fim de tecer algumas considerações sobre um assunto que nos parece de fundamental importância à elaboração da lei orçamentária.

Todos nós sabemos que o Orçamento Anual é uma das principais tarefas, senão a principal, do Poder Legislativo. Tanto assim que autores de alta categoria intelectual, como é o caso de Michel Temer, em Elementos de Direito Constitucional, Revista dos Tribunais, edição de 1987, página 149, diz:

      Tenho para mim que a lei orçamentária não é apenas uma lei formal e estrutural, como é a mais relevante das leis ordinárias, na medida em que a própria origem do parlamento moderno, a partir da Magna Carta Baronorum, deveu-se à discussão orçamentária. Ainda hoje, o momento maior dos debates parlamentares nos países civilizados ocorre por ocasião da apreciação da lei orçamentária.

Por outro lado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também não desconhecemos que o Orçamento Anual é uma lei de caráter meramente autorizativo. Neste sentido, valho-me dos comentários à Constituição de 1988 da lavra de Ives Gandra e Celso Bastos, nos seguintes termos:

      Nos Estados democráticos, o orçamento é considerado o ato pelo qual o Poder Legislativo prevê e autoriza ao Poder Executivo, por certo período e em pormenor, as despesas destinadas ao funcionamento nos serviços públicos e outros fins adotados pela política econômica e geral do País, assim como a arrecadação das receitas já criadas em lei.

      (Uma Introdução à Ciência das Finanças, edição da Revista Forense, 1969).

Refiro-me a esses aspectos da elaboração da Lei Orçamentária Anual, Sr. Presidente, para estranhar que, de uns tempos para cá, o Poder Executivo tenha mudado de orientação.

Lembro-me bem ainda, ao tempo em que era deputado federal, em governos passados, por exemplo, que nos tempos de Juscelino Kubitschek, de Jânio Quadros, de João Goulart e dos próprios governos militares, o que havia eram os planos de economia ou de contenção de gastos, já que cabe ao Governo executar o Orçamento da União.

Como cabia ao Executivo, por meio, sobretudo, de sua área econômica, mais especificamente ao Ministério do Planejamento e ao Ministério da Fazenda, lidar com os números, procurar fazer o equilíbrio das contas públicas, o então Poder Executivo é quem dizia o dia e a hora de liberar essa ou aquela dotação orçamentária constante da Lei de Meios do País.

Sempre foi assim, Sr. Presidente. Todos os Presidentes da República deixavam para o segundo semestre, por exemplo, a liberação dos recursos orçamentários que representavam transferências para Estados e Municípios, quase sempre oriundos de emendas dos Srs. Parlamentares ou mesmo de dotações que já constavam da própria proposta do Poder Executivo enviada ao Congresso Nacional. Nunca se agiu de forma diferente, porque o Orçamento é de iniciativa do Poder Executivo, cabendo, porém, ao Congresso Nacional dar a última palavra a seu respeito.

É bem verdade que, ultimamente, tem havido grande demora na elaboração dos Orçamentos anuais. Houve anos - não faz muito tempo - em que o Orçamento da União chegou a ser promulgado quase que no meio do exercício fiscal, por um erro do legislador constitucional.

Está em andamento nesta Casa uma Proposta de Emenda Constitucional, de minha autoria, que já está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e que restabelece na Constituição de 1988 uma norma que considero da maior importância. Trata-se de uma norma da Constituição de 1946, que estabelecia que, se até o final do ano legislativo o Congresso não aprovasse a proposta orçamentária enviada pelo Poder Executivo, seria prorrogado, para o exercício seguinte, o Orçamento do exercício anterior.

Como nem o Congresso Nacional nem tampouco o Poder Executivo tinham interesse em que isso se verifique, apressava-se de tal maneira a elaboração orçamentária que sempre, no regime da Constituição de 1946, tivemos o Orçamento da União votado e sancionado a tempo e a hora pelo Congresso Nacional e pelo Senhor Presidente da República.

O Sr. Lúcio Alcântara - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouvimos V. Exª com toda atenção, Senador Lúcio Alcântara.

O Sr. Lúcio Alcântara - Senador Humberto Lucena, quero aplaudir o interesse de V. Exª nesta matéria, que normalmente é muito árida e sujeita a muitas interpretações distorcidas, distantes mesmo da realidade. Agora mesmo estamos ouvindo muito sobre essa polêmica de emendas, essa questão de contingenciamento, se foram favorecidos ou não governadores de um partido, se deputados que apóiam o Governo ou que são da oposição teriam sido punidos. Penso que uma das razões para tudo isso é que não se cumprem esses prazos. Nós, do Legislativo, podemos até ter uma parcela de culpa, mas o Executivo tem grande parcela de culpa nisso, porque esses cortes são feitos de última hora. O Congresso não mexeu na receita, a previsão da receita foi a que veio do Poder Executivo. No passado, já houve casos em que a Comissão de Orçamento - e o Congresso depois referendava - recalculava, superestimava a receita. Não é o caso deste ano. O Congresso aceitou a estimativa que o Poder Executivo enviou. Portanto, não nos cabe culpa quanto a este cálculo da receita. Por outro lado, não ouvimos ainda uma explicação concisa, objetiva sobre um contingenciamento, ou seja, por que contingenciar uma emenda e não outra; por que deixar de atender a um pleito e não a outro? Tem que haver uma razão. Acredito que o Governo tenha razões de ordem técnica para isso, mas o Ministro do Planejamento deveria ser mais objetivo nessas informações. V. Exª falou sobre os prazos para elaboração do Orçamento. Por acaso, sou o relator da proposta de V. Exª, que tramita conjuntamente com uma de autoria do Senador Ney Suassuna, que cuidava da LDO, que é a de não interromper a Sessão Legislativa no mês de julho. Adotei um procedimento um tanto diferente - agora, não me recordo exatamente dos prazos. Mas, no meu parecer, estou preconizando um prazo para o qual, se não houver a aprovação do Orçamento, a Sessão Legislativa continuará, inclusive sustando a tramitação de outras matérias. Evidentemente, o assunto irá à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, onde se deliberará sobre ele. Mas, V. Exª adota uma outra sistemática da Constituição de 46, que era a de que, enquanto o Orçamento não fosse aprovado, vigeria o do ano anterior, que hoje se trata da questão dos duodécimos. Já tivemos - e desculpe-me por estar me alongando nisso, mas gostaria de trazer esta questão para debate - casos aqui em que se dizia, como em governos passados, que o Poder Executivo não tinha interesse em aprovar o Orçamento, preferindo ficar com o Orçamento do ano anterior, liberando duodécimos, o que é uma aberração. Então, é preciso colocar um paradeiro nisso. V. Exª fez muito bem quando apresentou, juntamente com outros Srs. Senadores, essa emenda - e meu parecer já foi inclusive entregue à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Assim, tão logo, no mês de agosto, retomemos os nossos trabalhos normais, vamos apreciar a matéria, e o Senado então haverá de tomar uma posição - ou essa que V. Exª preconiza, ou a que estou propondo, ou uma terceira - que ponha termo a isso, ou seja, a uma situação que, geralmente, só vem, pela própria veiculação das notícias, em desfavor do Congresso Nacional. Critica-se muito pouco o Executivo, tanto na elaboração do Orçamento quanto na liberação de recursos. O Senador Jader Barbalho, pelo menos no que tenho lido na imprensa - e S. Exª está acompanhando o meu raciocínio -, tem, inclusive agora, criticado o procedimento de liberação de recursos, bem como vários outros Parlamentares. Então, se queremos essa transparência - e o Legislativo, a meu ver, avançou muito na elaboração do Orçamento -, também temos que exigir do Executivo a mesma coisa. Não podemos ficar aqui perdendo tempo, levantando expectativas de prefeitos, de Governadores, de comunidades para depois vermos essas emendas virarem pó. Então, é melhor não fazer; é melhor não fazer emendas e aceitar a proposta que o Executivo envia, deixando que ele assuma a responsabilidade. Agradeço a V. Exª, já me desculpando por me haver alongado. Todavia, como V. Exª tem inclusive me instado ao debate desta questão, queria dar um contribuição ao seu discurso, lembrando, na oportunidade, que precisamos dar mais atenção a esses problemas do Orçamento.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Agradecemos a intervenção de V. Exª e devemos dizer-lhe - não por ser de nossa iniciativa, porque a nossa Proposta de Emenda Constitucional não é senão uma cópia de uma norma da Constituição de 1946 - que nos parece que outras propostas de emendas apresentadas apenas pretendem que, não sendo votada a proposta orçamentária para o exercício seguinte até o fim da sessão legislativa, ela seja prorrogada. Essa solução não vai resolver, porque há algo em Direito que todos conhecemos: a lei só é eficaz se houver sanção.

E a nossa Proposta de Emenda prevê uma sanção. Se não for votada a proposta de Orçamento para o ano seguinte até o término do sessão legislativa, prorroga-se para o ano seguinte o Orçamento do exercício anterior. Por quê? Porque isso funciona como uma ameaça não só ao Poder Executivo, que pode ter interesse em protelar a elaboração orçamentária, como também ao próprio Congresso, que não tem também interessse em prorrogar o Orçamento do exercício anterior.

Tanto é verdade o que digo, que lembramos o dispositivo que havia, na Constituição de 1946, sobre a proibição de nomeações para cargo público a não ser por concurso público. A Constituição de 1946 dizia claramente que a admissão para o serviço público só poderia se dar mediante concurso público, entretanto não havia sanção, e essa norma era burlada. Então, na Constituinte de 1988, conseguimos aprovar uma emenda de nossa autoria que evitou a fraude, isto é, que esse dispositivo não viesse a ser infringido.

Colocamos na Constituição um dispositivo que estabelece que a infração do disposto neste artigo - isto é, a nomeação de servidores sem concurso público - acarreta a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável na forma da lei. Essa norma está hoje como um dos itens do art. 37 da Constituição Federal. De lá para cá, ninguém mais, neste País, foi nomeado sem concurso, porque o ato passa a ser nulo. Por isso, insistimos nessa nossa Proposta de Emenda Constitucional.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouvimos V. Exª com muito prazer, Senador Ronaldo Cunha Lima.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Senador Humberto Lucena, V. Exª, com sua experiência e espírito público, aborda sempre temas da maior relevância para o Congresso e para o País. O Orçamento - há poucos instantes disse o Senador Lúcio Alcântara - realmente é um tema árido, mas V. Exª o aborda com tal profundidade e atualidade, que essa aridez se transforma até em suavidade numa discussão. Recentemente, fui Relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias e, entre as 1.400 emendas apresentadas, procurei acolher aquelas que pudessem refletir uma transparência maior da Lei Orçamentária, até porque a LDO estabelecia apenas as metas e as prioridades. Um dos pontos que mais se discutiu na Comissão foi exatamente o prazo de aprovação desta Lei, porque se cria um vácuo se, porventura, houver interesse do Executivo ou do Legislativo em não aprovar. Procuramos uma fórmula e a adotamos de forma transitória. Os duodécimos foram adotados por um período de até três meses, de modo a coagir tanto o Executivo como o Legislativo a unirem seus esforços num só sentido: o de aprovar a lei. Naquela oportunidade, Senador Humberto Lucena, tivemos que analisar a emenda que V. Exª apresentou, destacando a sua oportunidade e a necessidade urgente de o Senado dar tramitação a ela, para que já possamos, no próximo ano, tê-la regulamentada com sanção - e V. Exª faz bem, porque a eficácia da lei está exatamente na sua sanção - e estabelecer punições para o fato de, no prazo estipulado, não ter sido aprovado o Orçamento. Por isso, vamos torcer, já que a LDO foi aprovada, que tenhamos esse instrumento complementar, com base na proposta de V. Exª, que é oportuna, é lúcida e vai dar a obrigatoriedade ao Orçamento e vai aplicar sanções na hipótese de o Congresso não votá-lo em tempo hábil. Meus cumprimentos por seu pronunciamento.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Gratos a V. Exª, Senador Ronaldo Cunha Lima. Aproveitamos para cumprimentá-lo pelo trabalho como Relator do Projeto de Lei da LDO para o exercício de 1996.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador Humberto Lucena, V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouvimos o aparte de V. Exª, Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador Humberto Lucena, V. Exª toca numa questão que atinge a fundo as atribuições do Poder Legislativo que, não só em relação ao Orçamento, como em outras questões, têm sido desconsideradas pelo Governo. Tanto Senadores quanto Deputados Federais têm dado uma contribuição enorme aos projetos de reformas - sou testemunha disso. Logicamente não votei em todas as reformas, mas os Senadores, pelo menos os do Bloco do Governo, pela lealdade com que se têm conduzido no atendimento às propostas governamentais, mereceriam uma certa consideração e um certo respeito do Governo, porque as emendas que são apresentadas ao Orçamento, por intermédio de Deputados e Senadores, vêm da necessidade dos Estados que esses Parlamentares representam. São municípios que precisam de obras de saneamento básico, de saúde, de educação, de segurança, enfim, são obras a favor das quais a comunidade exige que o Deputado Federal ou o próprio Senador da República apresente uma emenda. Ora, levando-se em consideração que, em última instância, quem aprova o Orçamento é o Legislativo, o Poder Executivo deveria ter um mínimo de atenção antes de cortar qualquer pretensão neste objetivo, que considero legítima, de Deputados e Senadores. Faz-se necessária uma legislação que discipline essa matéria, para que fatos constrangedores como esses não venham a acontecer de novo. Notadamente quando voltamos aos nossos Estados, as lideranças políticas locais e o povo, de modo geral, querem saber o que faz o Parlamentar em Brasília. Temos de dizer, então, que apresentamos algumas emendas, defendendo seus interesses, mas que o Governo Federal as rejeitou, ou que o descongestionamento das emendas promoveu, vamos dizer assim, a nulidade das nossas propostas. O povo não entende como é que principalmente um Senador ou um Deputado do Governo apresenta uma proposta que é aprovada pelo Congresso Nacional, inclusive a Comissão Mista de Orçamento se debruça sobre o assunto, estuda-o, corta tantas e tantas emendas, como V. Exª sabe, pois foi Presidente do Congresso e é um homem que tem uma enorme bagagem de experiência e grandes lições a nos dar, sabe que o processo legislativo envolve tudo isso. Então, até a cortes somos submetidos no âmbito do próprio Parlamento. Agora, é o próprio Executivo que os faz. Abrimos mão de tantas coisas, fizemos emendas coletivas visando apoiar os Estados e municípios, independentemente de corpo político-partidário, como aconteceu no Estado de Sergipe, e o Governo tira esse propósito, que considero fundamental para o desenvolvimento de nossas regiões, sem nenhuma consideração. V. Exª está certo quando procura debater essa questão de frente e, quem sabe, à procura de uma legislação que não só fortaleça os nossos objetivos - os do Congresso, que são objetivos nacionais - e também possa dar um paradeiro a essa desmoralização, a essa humilhação contra os Parlamentares federais.

O SR. HUMBERTO LUCENA - As palavras de V. Exª vêm ao encontro do nosso pronunciamento, nobre Senador Antonio Carlos Valadares. Procuramos abordar esse tema, em nível muito alto, do ponto de vista institucional, porque entendo que nesta matéria, como em outras, não deve haver preocupação partidária ou ideológica. O nosso Partido, por exemplo, o PMDB, apóia o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, mas sempre repitimos que não há apoio incondicional. Estamos aqui, inclusive, e dentro em pouco V. Exª vai ver, para criticar alguns atos do Senhor Presidente da República justamente no que tange à execução orçamentária.

E o primeiro deles a que queremos nos referir foi o veto de Sua Excelência, aposto no ano passado por uma infeliz proposta do então Ministro José Serra a várias dotações orçamentárias que consubstanciavam alterações na proposta de Orçamento da União feitas pelos Srs. Congressistas.

Gostaríamos de ler para V. Exªs o que diz o art. 66, § 2º, da Constituição Federal, textualmente:

      "O veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea."

Não se pode, portanto, apor veto parcial às dotações orçamentárias. Foi uma inconstitucionalidade flagrante. Tivemos oportunidade, no ano passado, de registrar esse ato do Senhor Presidente da República, alegando que Sua Excelência teria sido mal assessorado e confessamos a V. Exªs que, por ocasião da apreciação do veto, votamos totalmente contra o veto do Senhor Presidente da República por entender que Sua Excelência havia incorrido num erro grave porque desrespeitou o texto constitucional.

Pois bem, Sr. Presidente, isso ocorreu, no ano passado,justamente porque o Senhor Presidente da República, ao contrário dos seus antecessores a que nos referimos, que sempre preferiram o o plano de economia ou o plano de contenção, porque cabe ao Executivo liberar ou não as verbas. Simplesmente, o Presidente da República, por intermédio do Ministério do Planejamento, libera ou não determinada dotação orçamentária, naturalmente de acordo com as disponibilidades do Tesouro.

E, agora, tivemos também o cancelamento de dotações orçamentárias, também ao arrepio da ordem jurídica, como demonstraremos em seguida.

No entanto, quando chega o final do ano, no segundo semestre, o Governo administra com o quê? Com créditos suplementares. Dezenas e dezenas de créditos suplementares, que são aprovados na última hora no Plenário do Congresso Nacional, justamente porque houve excesso de arrecadação, e o Governo precisa de autorização legislativa para fazer aquela despesa.

Se há excesso de arrecadação no final do ano, que se contingenciem pois as dotações, e que se faça a liberação dos recursos financeiros quando houver recursos do Tesouro. Será um ou serão dois ou três créditos suplementares a menos, mas estará o Poder Executivo prestigiando as iniciativas dos Srs. Congressistas.

O Sr. Jader Barbalho - V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouvimos, com muita honra, o nobre Líder Jader Barbalho.

O Sr. Jader Barbalho - Senador Humberto Lucena, mais uma vez V. Exª brinda o Senado Federal com um pronunciamento sobre um assunto da maior importância. E neste caso V. Exª traz a debate a questão da execução orçamentária. Devo dizer-lhe que, juntamente com outros Líderes partidários, tanto do Senado como da Câmara, participamos de um encontro, no início do ano passado, com o ex-Ministro do Planejamento, o Senador José Serra. Saímos daquele encontro profundamente gratificados, e o Senador e Ministro, posteriormente, na tribuna do Senado Federal, reafirmou o que havia dito naquela oportunidade, que a partir do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Orçamento da União seria o orçamento da transparência. Não seria mais o orçamento da ilusão, segundo o então Ministro do Planejamento, onde se aprovavam emendas sem que houvesse possibilidade financeira do Tesouro de poder implementá-las. Saímos daquele encontro com a certeza de que estávamos a caminhar efetivamente para um orçamento de transparência. Afinal de contas - e V. Exª já afirmou com muita propriedade -, na administração pública, não creio que exista lei mais importante do que a Lei de Meios, não só para o Congresso, não só para todos os Poderes, mas para a própria sociedade. Em qualquer país onde as coisas efetivamente sejam levadas a sério, a Lei de Meios é a mais importante da administração pública, se pudermos estabelecer hierarquia de importância entre as leis. Verifica-se, lamentavelmente, como diz V. Exª, que o Executivo vem e faz o contingenciamento, um ato de arbítrio. Estamos assistindo agora ao que está ocorrendo com o Ministério dos Transportes. Praticamente estão inviabilizados os projetos do Ministério dos Transportes, mas é o próprio Poder Executivo que faz o contingenciamento e, a partir daí, a seu arbítrio, estabelece o que deve permanecer ou não no Orçamento da União. Passa, na verdade, a ser o árbitro e o juiz do que é fundamental: mantém emenda de quem quer manter, retira, enfim, o que considera inconveniente. Ao final, no segundo semestre, o Governo, que contingenciou no primeiro semestre sob a alegação de que não possui receita para cumprir o Orçamento, vem e diz que já possui excesso de arrecadação e, por isso mesmo, deseja que o Congresso lhe dê os créditos. E faz novo orçamento. De certa forma, quero confessar a minha frustração. Imaginei que aquilo que o Ministro José Serra havia afirmado não só a mim, mas também às outras Lideranças, efetivamente serviria de orientação. Espero que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, homem público da melhor qualificação, que passou por esta Casa, que deseja fazer um bom governo, esteja atento a isso. Acredito, Senador Humberto Lucena, que isso deve ser pedagógico. Recentemente houve episódios relativos à questão do Orçamento profundamente traumáticos não só para o Parlamento, mas para o País como um todo. Estamos novamente verificando que o que o Sr. Ministro José Serra afirmou não se configura como realidade. O pior é que agora houve contingenciamento de determinadas áreas, mas sobrou dinheiro em outras áreas para se aprovar projetos que não estavam contemplados no Orçamento. Na verdade, há duas comissões de orçamento: a que funciona aqui e a que funciona na burocracia, que diz o que deve ser retirado do Orçamento e também tem recursos para aprovar aquilo que não está no Orçamento. Portanto, o pronunciamento de V. Exª é da maior oportunidade. V. Exª procura, com a experiência acumulada ao longo de tantos anos de atividade parlamentar, mostrar que não é possível tratar o Orçamento dessa forma. O Orçamento não pode ser um instrumento a serviço de conveniências; o Orçamento do País tem de estar a serviço do Brasil e tem de ser transparente. Não pode absolutamente ficar nas mãos dos burocratas, que fazem o jogo que bem entendem. Perdoe-me se me alongo neste aparte. Considero o tema que V. Exª traz à discussão da maior importância e lamento que outras atividades paralelas não permitam que no plenário haja maior presença para participar do seu discurso. Em relação à sanção, V. Exª estabelece, com muita propriedade, que o Orçamento deve ser aprovado ou, então, que Executivo e Legislativo terão o poder de ver prorrogado o Orçamento para o exercício posterior. Quero, portanto, Senador Humberto Lucena, em nome da Liderança do PMDB, como seu colega, como seu companheiro, cumprimentá-lo pela oportunidade e pela profundidade do seu pronunciamento, cujo tema deve ser encarado com seriedade.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Muito obrigado, nobre Líder Jader Barbalho. V. Exª nos sensibiliza com o seu aparte. Acreditamos que, na verdade, aqui estamos não apenas emitindo um ponto de vista pessoal, mas o de todos os nossos companheiros de Bancada e, quiçá, da maioria do Senado.

Lembramo-nos de que o nobre Senador Antonio Carlos Valadares, no seu aparte, referia-se a que o Governo não deveria deixar de corresponder àqueles que o apoiavam no Senado. Queremos dizer que, do nosso ponto de vista, o Governo não pode deixar de corresponder a todos os Senadores e a todos os Deputados, porque entendemos esse assunto do ponto de vista institucional. Desde que foram fixadas as regras, houve um entendimento entre as Lideranças do Governo e a oposição para reformar o Regimento.

No nossou tempo, por exemplo, na Presidência do Senado, começou essa reforma; depois o Presidente Sarney fez nova reforma, sobretudo diante do que houve após os escândalos da Comissão de Orçamento, tanto que hoje prevalecem as chamadas emendas de Bancada sobre as emendas individuais. E nós preferiríamos até que só houvesse emendas de Bancada.

Mas mesmo assim, com a diminuição do número de emendas, com as emendas de Bancada, que são emendas impessoais, mesmo assim continua o desprestígio do Poder Legislativo por parte do Poder Executivo.

E desejamos chamar a atenção do Senado para um fato mais grave, que o nobre Líder Jader Barbalho referiu-se ali com muita propriedade a atribuição que tem o Governo, já que é ele que executa o Orçamento, de contingenciar verbas para liberá-las oportunamente, isto é, fazer planos de contenção, de economia.

Entretanto, além do veto que houve no ano passado às dotações orçamentárias, que já dissemos, são inconstitucionais, porque não se pode vetar números; só se pode vetar, de acordo com a Constituição, os dispositivos do projeto de lei que capeiam os anexos do Orçamento; há pouco nós tivemos o cancelamento de dotações orçamentárias.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um decreto do Sr. Presidente da República, publicado no Diário Oficial do dia 28 de maio de 1966, cancelou dotações orçamentárias no valor de R$7.662.450.000,00 alegando que suas fontes eram as de número 155 e 110. O Orçamento da União, para 1995, o Projeto de Lei - pasmem, Srs. Senadores! -, já havia sido sancionado pelo Sr. Presidente da República; não foi vetado como no ano passado, embora inconstitucionalmente, mas mesmo assim veio um decreto que cancelou várias dotações orçamentárias, justamente aquelas que provinham das iniciativas parlamentares.

Sobre o assunto, recebemos um ofício, acompanhado de uma nota assinada pelo Presidente da Comissão de Orçamento, o Deputado Sarney Filho, onde se lê:

      "1. O Presidente da República decretou, em 28.05.96, o cancelamento de dotações da Lei Orçamentária no valor de R$7.662.450.000,00 (sete bilhões, seiscentos e sessenta e dois milhões, quatrocentos e cinqüenta mil reais), com fundamento no art.41, § 2º da Lei nº 9.082/95 (LDO), que estabelece o seguinte:

      "Art. 41. Na estimativa das receitas do projeto de lei orçamentária anual poderão ser considerados os efeitos de propostas de alterações na legislação tributária e das contribuições que sejam objeto de: (segue-se a citação).

      2. Os subprojetos/subatividades atingidos tinham como fontes recursos condicionados da Contribuição sobre Movimentação Financeira - CPMF (lembro que esse projeto, essa proposta é de iniciativa do Congresso e não do Presidente da República) e da Contribuição para o Plano de Seguridade Social do Servidor.

      3. Observe-se que não há cancelamentos correspondentes à frustração de receitas da Contribuição de Empregadores e Trabalhadores para a Seguridade Social...

      4. Observe-se ainda que as dotações canceladas nas unidades tais e tais - Governo do Distrito Federal - no valor de R$145 milhões, não eram financiadas, tanto na proposta do Executivo quanto na Redação Final...

      5. Os quadros anexos indicam os códigos e títulos dos subprojetos, os autores das emendas atingidas, etc.

      6. Consta (vejam bem) que o Executivo remeterá ao Congresso Nacional projetos de abertura de créditos adicionais, quando forem aprovadas as propostas das contribuições em discussão pelo Poder Legislativo.

      7. Consta também que os valores cancelados da programação do GDF serão repostos mediante o uso de recursos do Fundo de Estabilização Fiscal,...

Entendemos, Sr. Presidente, data venia, que a Comissão de Orçamento do Congresso Nacional não poderia admitir a idéia de que o Executivo talvez remetesse ao Congresso Nacional projetos de créditos suplementares para compensar esses cancelamentos de dotações orçamentárias.

O Sr. Ney Suassuna - V. Exª concede-me um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Vamos conceder o aparte a V. Exª e depois prosseguiremos.

Com todo prazer, ouvimos V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna - Senador Humberto Lucena, pedi o aparte para congratular-me com V. Exª, porque esta não é a primeira vez, nesta legislatura, que V. Exª traz a esta Casa assuntos importantíssimos. Há alguns dias, V. Exª apresentou um projeto que mudava todo o caminho da negociação da dívida dos Estados, o que permitiu que os Estados sobrevivessem, porque foi reaberta a discussão e houve modificações na postura do Governo. Agora, V. Exª traz novamente um assunto muito importante. Estava ouvindo perplexo o que V. Exª dizia. Nunca vi um decreto modificar uma lei. V. Exª acabou de afirmar que um decreto do Presidente modifica a lei orçamentária.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Cancela dotações orçamentárias.

O Sr. Ney Suassuna - Não sei onde estamos. O Estado de direito não está sendo quebrado somente quando se permite que a propriedade seja tomada ou invadida. Também do ponto de vista legislativo, estamos vendo uma outra aberração. Em toda a minha vida, nunca vi um decreto cancelar uma lei pronta, acabada, sancionada. Foi o que acabei de ouvir, perplexo. Nós do Congresso Nacional temos que tomar uma providência, senão, em breve, uma determinada lei poderá ser cancelada por meio de bilhetinho, como ocorria na época do Presidente Jânio Quadros.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Senador Ney Suassuna, agradecemos a V. Exª.

Como dizíamos, diante do expediente da Comissão de Orçamento, estudando o decreto baixado e publicado no dia 28.05.96 no Diário Oficial, que, aliás, até prova em contrário, está sem número - deve ter havido algum engano -, logo percebemos que ele era inteiramente injurídico. Pedimos, então, à Assessoria do Senado que nos fornecesse uma Nota Técnica a respeito, a qual passamos a ler para que conste dos Anais do Senado Federal.

      "A JURIDICIDADE DO CANCELAMENTO DE DOTAÇÕES PROVOCADA PELO DECRETO DE 28.05.96, DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

      Prescreve a atual Constituição que a matéria orçamentária é restrita ao âmbito de lei, não impedindo, porém, que essa última possa atribuir ao Poder Executivo a competência subsidiária para tratar de orçamento, vedada, porém, a exorbitação dessa transferência.

      Segundo o art. 84, IV, o Presidente da República pode, com vistas a dar eficácia à lei, expedir decretos que, longe de poderem burlar ou alterar o significado da lei, devem contribuir para tornar jurídica e factualmente possível a aplicação dos objetivos do legislador.

      A Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 1996, de nº 9.082/95, estatuiu regras claras quanto à inclusão, na previsão da receita, dos valores a serem obtidos com a arrecadação de tributos que fossem objeto:

      a. de medidas provisórias que estivessem tramitando no Congresso Nacional à data do envio do projeto de Lei Orçamentária Anual (no caso, 31/08/95), ou

      b. projetos de lei que estivessem em tramitação ou fossem propostos até a data acima.

      Cuidou, portanto, o legislador de oferecer flexibilidade ao Executivo na previsão de receitas cuja normatização estivesse em fase de constituição, com vistas a que não ocorresse erro técnico-jurídico de desequilíbrio superavitário no orçamento.

      Com muito acerto, acolheu, ainda, a lei, a possibilidade de o Executivo cancelar dotações com vistas a adequar o volume de despesa ao de receita, caso a iniciativa de lei ou a medida provisória instituidoras ou elevadoras de tributo não lograssem êxito."

No caso em espécie, não se trata nem de medida provisória nem de projeto de lei.

"In verbis, diz o § 2º do art. 41 daquele diploma:

      "Caso as alterações propostas não sejam aprovadas, ou o sejam parcialmente, de forma a não permitir a integralização dos recursos esperados, as dotações à conta dos referidos recursos serão canceladas, mediante decreto, após a sanção presidencial à lei orçamentária anual, observados os critérios a seguir relacionados, para a aplicação seqüencial obrigatória e cancelamento linear, até ser completado o valor necessário para cada fonte de receitas:..."

      Em 28.05.96 o Executivo expediu Decreto que cancelou 7,6 bilhões de reais de dotações orçamentárias com base no teto legal acima.

É preciso lembrar que não houve nenhum diploma, nenhum projeto de lei enviado pelo Executivo, nem medida provisória que cuidasse de criação de novas receitas. O que havia e há é uma proposta de emenda constitucional oriunda do Legislativo que procura criar a CPMF, para atender, com recursos novos, aos programas de saúde pública.

      O dispositivo carrega consigo dois institutos jurídicos que estão intimamente relacionados entre si e que pouco se utilizam, mas que são de grande expressão no mundo do direito financeiro: a fonte de recursos e a vinculação da despesa à receita.

      Entende-se como fonte o conjunto de parcelas de receitas diversas a que a legislação atribui destino definido. (...) Por exemplo, o Fundo de Estabilização Fiscal é uma fonte em si próprio porque a Emenda Constitucional que o instituiu determinou que certas parcelas do imposto de renda, das contribuições sociais e dos demais impostos seriam destinados aos programas de educação, saúde, previdência, etc.

      É aqui que entra o tema da vinculação: relação jurídica obrigatória entre uma receita e uma despesa, ou seja, o objetivo para o qual existe determinado ingresso de recursos no erário.

      Isso significa que o conhecimento de uma fonte exige, obrigatoriamente, que se conheça o verdadeiro objetivo de existência da fonte, ou seja, se há vinculações ou não, e, em caso afirmativo, para que ou para quem está direcionada.

Prosseguem as considerações do assessor do Senado, as quais solicito ao Sr. Presidente sejam dadas como lidas.

Ao final, temos a seguinte conclusão:

      "A propósito, a pequena história do atual Governo aponta para um completo desprestígio a praticamente todas as decisões orçamentárias do Parlamento brasileiro: em 1995 foram vetados quase todos os subprojetos objeto de emendas do Legislativo e em 1996 foi cancelada mais da metade dos subprojetos de mesma origem.

      Nos sistemas autoritários, como o prevalescente no Brasil anterior a 1986, o Congresso apenas avaliza o projeto de lei orçamentária com o conteúdo proposto pelo Executivo. Em nossa atual democracia o mesmo não acontece: o Congresso pode emendar a proposta, mas as alterações são vetadas ou canceladas, e as que permanecem intactas nesses dois momentos, no mais das vezes, são fontes de créditos suplementares ou não são executadas.

      Urge que o Congresso faça valer o seu poder de representante do Povo e das Unidades da Federação, colocando o Executivo em sua real posição de administrador e executor das decisões a serem tomadas no Legislativo.

      Nesse sentido, pode o Parlamento lançar mão das atribuições que lhe são ofertadas pelo art. 49 da Lei Maior, em especial a estatuída no inciso V, que lhe confere poderes para sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder de regulamentação a este atribuído, sob pena de que permaneça tal característica do autoritarismo, sob o disfarce do cumprimento formal das normas impostas.

      Brasília, 17 de junho de 1996.

      Hipólito Gadelha Remígio

      Consultor-Geral Adjunto da Consultoria de

      Orçamentos do Senado Federal.

O Sr. Romeu Tuma - Senador Humberto Lucena, V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Pois não, Excelência.

O Sr. Romeu Tuma - Nobre Senador, estou prestando muita atenção ao pronunciamento de V. Exª, ilustrado pelo aparte do Senador Jader Barbalho. As considerações que faz tem uma importância muito grande. Queria cumprimentá-lo por isso e até agradecer-lhe por trazer ao nosso conhecimento todas essas explicações. Isso tem um valor imenso para nós, que fomos guindados à Comissão de Orçamento, porque estamos analisando as contas de 1993 e 1994 do ex-Presidente Itamar Franco, e surge uma série de dúvidas sobre a aplicação das verbas definidas na própria Constituição. O Tribunal de Contas, que vinha orientando o Senado para julgamento das contas, traz recomendações e algumas restrições no jogo orçamentário, em que há descumprimento de imposições constitucionais. Assim, têm uma importância muito grande a exposição que V. Exª faz e a sua proposta. Meus cumprimentos, nobre Senador.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Somos muito reconhecidos a V. Exª pelas suas palavras, nobre Senador Romeu Tuma, e pela sua atenção. Devemos dizer que não temos outro interesse neste assunto se não o de debater com o Senado um tema que nos parece, como já dissemos e repetimos, fundamental para a própria sobrevivência do Congresso Nacional como instituição. Temos que levar em conta a nossa responsabilidade perante a Nação, não só os Deputados, que são representantes do povo, mas os Senadores, que são representantes dos Estados.

O Sr. José Alves - Senador Humberto Lucena, V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Com muito prazer, Senador José Alves.

O Sr. José Alves - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouvimos V. Exª, Senador José Alves.

O Sr. José Alves - Senador Humberto Lucena, V. Exª discute, nesta tarde, lastreado na sua larga experiência de homem público, um assunto de grande relevância, referente à Lei Maior do Congresso, que é o trato que tem sido dado ultimamente - e que não é privilégio deste Governo - ao nosso Orçamento. Entendemos que o Orçamento deve estabelecer prioridades - teoricamente o faz no Plano Plurianual - e metas, e a sua execução deve estar contida em um planejamento estratégico do País; deduzimos isso, depois da clara exposição de V. Exª a esta Casa. É lamentável a situação da execução orçamentária, feita pelo atual Governo de maneira até certo ponto desrespeitosa à Nação e ao Congresso. Entendemos que a execução orçamentária deve ser feita dentro de um planejamento estratégico de desenvolvimento do País, não a bel-prazer ou - vamos dizer - de forma vulnerável às pressões de determinados grupos ou técnicos. Parabéns a V. Exª pela clareza da sua exposição.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Agradecemos o aparte de V. Exª, nobre Senador José Alves.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, encerramos dizendo que as nossas palavras não são mais do que uma contribuição para o debate da matéria no Congresso e também um alerta ao Sr. Presidente da República, em cuja pessoa confiamos, tanto assim que o meu Partido apóia o seu Governo. Sabemos que Sua Excelência talvez esteja inadvertido disso, esteja mal assessorado pela área econômica, mas o fato é que Sua Excelência errou duas vezes: quando vetou as dotações orçamentárias, em 1995, e quando cancelou essas dotações orçamentárias, em 1996.

Faríamos um apelo veemente a Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, no sentido de que reexaminasse esse decreto e procurasse revogá-lo, para que mantivéssemos intacta a ordem jurídica neste País. Isso não lhe traria nenhum prejuízo, porque, como Presidente da República, cabe-lhe determinar ao Ministério do Planejamento, a execução do Orçamento da União. Sua Excelência poderia, ao invés de cancelar as dotações, fazer baixar um plano de contenção, para liberar as dotações, no segundo semestre, se houver excesso de arrecadação.

Era o que tínhamos a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/1996 - Página 11649