Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

PARABENIZANDO O SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA PRONTA DEMISSÃO DO SR. JOÃO ROBERTO LUPION, PRESIDENTE DA ELETROSUL - CENTRAIS ELETRICAS DO SUL DO BRASIL S/A POR ENVOLVIMENTO NA INTERMEDIAÇÃO DE COMPRAS DE EQUIPAMENTOS PARA A HIDRELETRICA DE MACHADINHO, LOCALIZADA ENTRE OS ESTADOS DE SANTA CATARINA E RIO GRANDE DO SUL. CUSTO DAS ESCOLHAS PARA CARGOS ATRAVES DE BARGANHAS POLITICAS.

Autor
Osmar Dias (S/PARTIDO - Sem Partido/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO FEDERAL.:
  • PARABENIZANDO O SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA PRONTA DEMISSÃO DO SR. JOÃO ROBERTO LUPION, PRESIDENTE DA ELETROSUL - CENTRAIS ELETRICAS DO SUL DO BRASIL S/A POR ENVOLVIMENTO NA INTERMEDIAÇÃO DE COMPRAS DE EQUIPAMENTOS PARA A HIDRELETRICA DE MACHADINHO, LOCALIZADA ENTRE OS ESTADOS DE SANTA CATARINA E RIO GRANDE DO SUL. CUSTO DAS ESCOLHAS PARA CARGOS ATRAVES DE BARGANHAS POLITICAS.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 16/07/1996 - Página 12112
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO FEDERAL.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DIALOGO, PUBLICAÇÃO, JORNAL, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), COMPROVAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PRESIDENTE, CENTRAIS ELETRICAS DO SUL DO BRASIL S/A (ELETROSUL), DEPUTADO FEDERAL, ESTADO DO PARANA (PR), PARTICIPAÇÃO, IRREGULARIDADE, AQUISIÇÃO, EQUIPAMENTOS, USINA HIDROELETRICA.
  • NECESSIDADE, APURAÇÃO, FATO, ANULAÇÃO, LICITAÇÃO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • CRITICA, GOVERNO, CRITERIOS, ESCOLHA, DIRIGENTE, ORGÃO PUBLICO, FAVORECIMENTO, TROCA, VOTO, APOIO, EXECUTIVO, ESPECIFICAÇÃO, BANCADA, CONGRESSO NACIONAL, DEFESA, PROPRIEDADE RURAL.

O SR. OSMAR DIAS ( -PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, todos os jornais de circulação nacional, de hoje, noticiam fartamente um fato lamentável ocorrido em nosso País.

Lerei um trecho de um diálogo por telefone, de uma conversa gravada, onde de um lado estava o fornecedor e de outro lado uma pessoa - lendo, parecia que uma das pessoas era o Sr. PC Farias. Mas não era, Sr. Presidente, era um integrante do Governo.

O fornecedor de um lado da linha dizia:

      "Os recebimentos serão feitos aqui fora. Pra proteger, pra que a gente possa pagar os compromissos que se tem. Você receber o seu e eu receber o meu".

      Do outro lado da linha a resposta:

      "Vamos ter um segundo nível de interesse, claro. Não somos crianças. Você sabe que estamos entrando em outros como este aqui. Vamos ter interesses contratados em cada caso".

Outras conversas.

O Deputado irmão do cidadão integrante do Governo também é citado.

      "Cada um faz sua parte. Eu faço os contatos, você administra por dentro e seu irmão", o Deputado, "faz a parte política", diz o fornecedor.

      Aparecem outros interesses ilícitos nos negócios. O fornecedor diz: "O que me assustou foi o teu irmão falar pra gente que queria fazer uma empresa para lavar dinheiro".

Como disse, o empresário não é o PC Farias, é o Senhor João Roberto Lupion, Presidente da Eletrosul, pelo menos até o final da semana passada, e o Deputado não é nada mais nada menos que o coordenador da bancada ruralista, Deputado Abelardo Lupion, ambos do Paraná, terra que conheço.

Sr. Presidente, sempre entendi que os eleitores quando escolhem alguém para ser Deputado, Senador, Prefeito ou Governador, o fazem sem ter acesso a algumas informações importantes. Escolhem sem conhecer o currículo ou o prontuário policial do candidato. Todavia, o Governo quando nomeia tem acesso inclusive ao Supremo Tribunal Federal para verificar se naquele órgão não tramita um processo de grilagem de terras de 9.000h em um município apenas do Paraná, para ver a história do cidadão que está nomeando, pois pode ser que esse cidadão seja um grileiro de terras.

O eleitor elege sem saber. Não tem meios para descobrir e se tem, muitas vezes, é mal informado e vota errado. Mas, o Presidente da República, ao nomear tem acesso ao currículo, à vida, à biografia, à Folha Corrida.

Felizmente, o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro das Minas e Energia, Raimundo Brito, tomaram uma decisão pronta, vigorosa, correta e que tem de ser elogiada. Sou crítico de algumas medidas, de algumas posições do Governo da República, mas também sei reconhecer quando o Governo corrige um erro. Errou, quando não verificou o passado de quem nomeou, mas corrigiu, quando demitiu prontamente, porque o próprio confessou que esse diálogo que está nos jornais é verdadeiro. Vou até ler mais uma parte dele, para que fique transcrito nos Anais desta Casa.

Isso tem de servir de exemplo. O Governo não pode claudicar, não pode hesitar diante de fatos como esse que têm sido, ao longo da história da Administração Pública de nosso País, um câncer: a corrupção. Alguns pensavam que a corrupção iria morrer com o PC Farias. Ele se foi e a corrupção permanece.

A obra de construção da hidrelétrica de Machadinho, na divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com o valor de R$650 milhões, está sendo licitada, Sr. Presidente. E o que se negociava no diálogo entre o diretor da Eletrosul, João Roberto Lupion, e o fornecedor que estava nos Estados Unidos era a intermediação de recursos na compra de equipamentos para essa hidrelétrica, que será construída entre os Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Lá no Sul, não há dúvida, o Governo deve, além de demitir, instaurar uma comissão de sindicância para apurar se foi apenas esse fato que ocorreu na administração desse corrupto confesso ou se efetivamente outros atos ocorreram durante a sua administração. Evidentemente, este não foi o único realizado durante a sua gestão.

Sr. Presidente, rendo aqui as minhas homenagens ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e ao Ministro Raimundo Brito, que foi apoiado por aqueles que o indicaram para Ministro, e ao próprio Senador Antonio Carlos Magalhães, que, consultado, de pronto respondeu: "Contra a corrupção não há outro remédio senão a demissão e a apuração rigorosa dos fatos".

Além da apuração rigorosa dos fatos, Sr. Presidente, não dá mais para engolir essa licitação. Ela está contaminada. Pois mesmo fora há compromissos assumidos e nós sabemos que bicheiros e corruptos acabam cumprindo seus compromissos. Existe uma espécie de pacto entre o corruptor e o corrupto. É coisa do Satanás, Sr. Presidente, que eu não entendo. Mas eles cumprem entre eles a palavra e, misturando uma certa complacência, uma certa dependência entre eles, acabam guardando segredo, que só vazou porque grampearam o telefone, evidentemente.

E aqui está parte da conversa, transcrita no jornal Zero Hora de Porto Alegre, entre o Diretor da Eletrosul, João Roberto Lupion e o fornecedor:

      Lupion - Eu conversei com o Beca... - Beca é como é chamado carinhosamente pela família e pelos amigos o Deputado Abelardo Lupion - ...e ele disse que tinha combinado com vocês mais ou menos como seria este contrato aí fora.

      Fornecedor - Qual é o pensamento de você e do teu irmão a respeito disto? A cada dia eu vejo teu irmão pensando diferente.

      Lupion - Estamos pensando uma coisa só. Ele quer fechar aí nos Estados Unidos com vocês e não aqui, com uma empresa nacional.

      Fornecedor - Você sugeriu abrir uma empresa aí e colocar em nome do teu irmão Rodrigo. Eu não acho bom, pra preservar vocês. Você como diretor da Eletrosul e teu irmão Deputado, colocar um negócio deste é um perigo. E você, inclusive, concordou comigo quanto a isto.

      Lupion - Quanto a isto, está certo.

      Fornecedor - Eu não recebo dinheiro no Brasil até porque eu não sou burro de receber aí. O que ficou acertado é que a minha empresa no Brasil não toma conta de dinheiro. Os recebimentos serão feitos aqui fora. Por quê? Para proteger, para que a gente possa pagar os compromissos que se tem. Você receber o seu, eu receber o meu. Quando a Eletrosul pagar à empresa americana, vai pagar direto lá e ela distribui. Agora, imagine se isto for feito no Brasil, ficar emitindo nota fiscal por aí?

Na outra fita:

      Fornecedor - Mas você está falando de que tipo de contrato?

Prestem atenção na resposta do Diretor da Eletrosul.

      Lupion: É este modelo de licitação que nós temos que dimensionar. Neste caso, a empresa de você tem condições de entrar com o financiamento, para poder matar todo mundo no processo. Aí nós faríamos a licitação de acordo com o que vocês têm a oferecer, as garantias que nós temos para oferecer em troca deste tipo de financiamento, que provavelmente seria do Eximbank - aliás, o mesmo do Projeto Sivam. A gente monta o contrato de baixo para cima para esta licitação, onde nós oferecemos esta garantia.

      Fornecedor - A última vez que nós conversamos você ficou de trazer o pessoal da Camargo Corrêa aqui. Depois, nunca mais ouvi falar nada.

      Lupion - O pessoal da Camargo, nós estamos trabalhando com eles. Hoje, segunda-feira, saiu o edital. Eles ganharam Machadinho, foi a nova obra que nós demos pra eles. Eles estão prontos pra gente conversar. Eles podem vir aqui, mas a gente tem que fazer uma reunião preliminar. Porque, veja bem, eles não têm nem projeto ainda. Eles ganharam a obra sem projeto. No consórcio de Machadinho, entrou a Alcoa, a Camargo, e entrou também a Ivaí.

      Fornecedor - Aquela empresa amiga de vocês?

      Lupion - No consórcio, entrou nossa a Ivaí e a Inepar. Os dois nossos entraram no consórcio, além da Copel. Os três estão no consórcio.

      Fornecedor - Tá. E a Ivaí é aquela amiga de vocês?

      Lupion - Isto. E a Inepar também.

      Fornecedor - E aí estão no consórcio com a Camargo Corrêa?

      Lupion - É. Eles têm 9,95% do consórcio.

      Fornecedor - Então você conseguiu colocar no processo as empresas amigas de vocês?

      Lupion - Consegui. Foi uma grande briga.

Sr. Presidente, Deus que me perdoe, isso é coisa do Satanás. Essa é uma conversa que eu imaginava pudesse ocorrer somente entre o PC Farias e os colaboradores da campanha de Fernando Collor. Mas ainda ocorre, Sr. Presidente. E, graças à Deus, o Presidente da República tomou uma decisão imediata junto ao Ministro Raimundo Brito.

Mas faltam outras providências, como, por exemplo, questionar se o Deputado Abelardo Lupion tem moral para coordenar um bancada chamada ruralista no Congresso Nacional depois de ter sido citado aqui. A não ser que ele comprove ser inocente. Mas aqui no diálogo ele é citado como participante, Sr. Presidente.

Tenho restrições e condeno o comportamento de uma bancada ruralista que possui na sua composição deputados que têm dívidas junto ao Banco do Brasil e defendem o interesse de suas dívidas; uma dívida que chega a ser de metade do valor que está sendo anunciado para atender 5 milhões de pequenas propriedades para a agricultura familiar e sobre o qual se faz festa como se estivessem salvando a pequena propriedade no Brasil. Tem dívidas que chegam a quase 500 milhões de reais e o anúncio feito foi de 1 bilhão para a agricultura familiar. Ora, esses são os interesses que estão sendo defendidos?

Sr. Presidente, sabe como foi nomeado o Diretor da Eletrosul que está sendo demitido agora? Para atender politicamente o coordenador da bancada ruralista, para comprometê-lo nos votos. Isso é barganha e o preço dela está aqui. Porque não se escolhe com critérios de competência, de ética, de moral e de honestidade, mas se escolhe, se nomeia para o preenchimento de cargos da importância desse de que estamos falando, atendendo a apelos políticos e barganhas. Isso tem de ser condenado.

O Presidente Fernando Henrique corrigiu agora e espero que tenha aprendido a lição, para que, enxergando o custo da barganha, endureça, porque o que é bom para o Brasil, aqueles que são sérios neste Senado e na Câmara, votarão, independentes do partido ao qual pertençam.

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Osmar Dias?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte ao Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - Nobre Senador Osmar Dias, o pronunciamento e a acusação que V. Exª traz a este Plenário é da máxima relevância e nos leva a seguinte reflexão: parece que a Justiça brasileira interpreta as leis e nós fazemos leis como se fossem feitas para uma sociedade de um nível ético, de um nível de comportamento exemplar e não para coibir os abusos praticados pelos bandidos, pelos marginais que, cada dia mais, são audaciosos e penetram nas estruturas ditas sadias de nossa sociedade. É incrível o que V. Exª traz nesse depoimento e talvez ele tenha o mesmo fim daquela gravação que foi feita pelo Secretário Grazziano, quando detectou conversas a respeito do Presidente da Esca. Também lá, havia um conluio contra os interesses nacionais. O Supremo Tribunal Federal considera que essas gravações não são válidas como prova. Ora, eminente Senador Osmar Dias, parece-me que o Supremo Tribunal Federal está fora do mundo e de época. Obviamente, nesta época da informática e da Internet, nesta época em que os meios de comunicação são tão eficientes, os bandidos estão-se valendo do telefone, porque conversas gravadas ao telefone não valem como prova contra os mesmos. Mas a sociedade brasileira fica estarrecida. Por isso, deve-se salientar a importância de depoimentos como o de V. Exª que trazem ao conhecimento da sociedade fatos dessa ordem, muito parecidos com aqueles que levaram à demissão do Secretário Francisco Grazziano, que gravou conversas do teor a que V. Exª se refere. Muito obrigado.

O SR. OSMAR DIAS - Senador Lauro Campos, agradeço a V. Exª.

Sr. Presidente, estamos diante de um fato gravíssimo, não apenas porque se trata de uma licitação da ordem de 650 milhões de reais, mas também porque esse fato envolve outros interesses.

Sabemos como tem-se comportado o Governo - aqui faço uma crítica -, que cede às pressões da bancada ruralista, a qual, muitas vezes, não defende os interesses de todos os agricultores, mas os interesses de determinados setores e segmentos. Neste ponto, condeno esse procedimento.

Não estou querendo dizer que na bancada ruralista há somente integrantes que devem fortunas ao Banco do Brasil. Essa bancada é composta também por pessoas muito sérias, que defendem os interesses coletivos.

Entretanto, penso que o Presidente da República e os deputados devem refletir seriamente sobre essa representatividade, porque não haverá um agricultor consciente e bem informado neste País que queira ser representado dessa forma. Eles não querem ver o Brasil como vítima de negociatas oriundas da fragilidade do setor agropecuário, porque o próprio Governo não tem planejado de forma adequada a nossa produção primária. A fragilidade do setor primário não pode servir, portanto, de prato feito para trocas por quem não tem, Sr. Presidente, ligações com os produtores rurais de fato que possam ser descritas como legítimas. Não são legítimas essas ligações.

Sr. Presidente, muitas vezes os acusadores acabam sendo penalizados. Neste caso, não há acusadores, as provas estão na imprensa. Existe uma fita gravada, e, embora o Senador Lauro Campos tenha dito que as gravações não valem, pelo menos devem valer para a consciência das pessoas. Se o Supremo não julga, que a consciência das pessoas julgue.

Neste momento em que encerro este pronunciamento - que não gostaria de estar fazendo, Sr. Presidente -, espero que o Presidente da República, que todo mundo diz ser um homem sério, com o que concordo plenamente, aja com o máximo de rigor em relação a quem não tem seriedade, senão, daqui a pouco, vão dizer que o Governo Fernando Henrique está claudicando, está hesitando em relação à corrupção, e o Presidente Fernando Henrique não pode claudicar e nem hesitar.

Quero cumprimentar Sua Excelência pela decisão rápida e sobretudo exemplar que tomou juntamente com o Ministro Raimundo Brito, do Ministério das Minas e Energia. Entretanto, outras providências serão necessárias para que se apure tudo o que aconteceu lá, durante esse período, pois o resultado de barganhas nunca foi bom, nunca foi bom mesmo.

Gostaria de ver, daqui para frente, o Presidente da República - isso é um sonho - dizer não àqueles que barganham. Espero que Sua Excelência valorize o voto independente, o voto da consciência, da convicção. Saí do partido do Presidente porque fui mal interpretado, porque votei contra o Governo, mas aquele meu voto era o voto da consciência, da convicção. Esse é o voto com mérito, Sr. Presidente; o voto da barganha tem valor apenas para os interessados nela, mas não para o País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/07/1996 - Página 12112