Discurso no Senado Federal

DEFENDENDO A CRIAÇÃO DEFINITIVA DO IMPOSTO SOBRE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA - IMF, CUJOS RECURSOS SERIAM DESTINADOS A SAUDE.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS. SAUDE.:
  • DEFENDENDO A CRIAÇÃO DEFINITIVA DO IMPOSTO SOBRE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA - IMF, CUJOS RECURSOS SERIAM DESTINADOS A SAUDE.
Aparteantes
Ernandes Amorim.
Publicação
Publicação no DSF de 23/07/1996 - Página 12865
Assunto
Outros > TRIBUTOS. SAUDE.
Indexação
  • DEFESA, CRIAÇÃO, IMPOSTOS, MOVIMENTAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, AMBITO, REFORMA TRIBUTARIA, SUBSTITUIÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • INCLUSÃO, ANAIS DO SENADO, CORRESPONDENCIA, SINDICATO, SERVIÇO DE SAUDE, ASSOCIAÇÃO MUNICIPAL, HOSPITAL, ESTADO DA PARAIBA (PB), ANALISE, SITUAÇÃO, PRECARIEDADE, SAUDE PUBLICA, REGIÃO, DEBITOS, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), QUALIDADE, ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR, DEFASAGEM, TAXAS, FRAUDE, FISCALIZAÇÃO, APLICAÇÃO DE RECURSOS, SAUDE.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma questão que tem sido ventilada ultimamente no País, dentro e fora do Congresso, notadamente com repercussão na imprensa escrita, televisada ou falada, refere-se aos recursos destinados à saúde interna e, por via de conseqüência, ao esforço que se procura fazer no sentido de resolvê-la adequadamente.

Não foi por outra razão que o Sr. Ministro da Saúde, Adib Jatene, transformou-se num obstinado defensor da criação de uma nova fonte de recursos para custear, pelo menos temporariamente, a saúde pública neste País. Veio daí a lembrança da instituição da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, CPMF, cuja proposta de emenda constitucional foi aprovada nesta Casa e agora está em vias de ser aprovada, em segundo, turno na Câmara dos Deputados.

É bem verdade que ultimamente os jornais têm noticiado que o Governo estaria empenhado em encontrar uma alternativa para a CPMF. Mas não seria agora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que a proposta de emenda constitucional oriunda do Senado Federal, da lavra do Senador Antonio Carlos Valadares, devesse sofrer qualquer obstáculo, uma vez que o Senado já a votou e aprovou em dois turnos, e a Câmara dos Deputados já o fez em primeiro turno e está prestes a apreciá-la em segundo. Naturalmente, quando vier a tão esperada reforma tributária, que deverá ser a solução definitiva do problema para a questão fiscal no Brasil, haverá de se dar uma palavra final a respeito desse assunto.

Desde logo, pronuncio-me, assim como fez desta tribuna o ilustre Senador Roberto Freire, favorável a que se crie em definitivo, dentro do bojo da reforma tributária, como fonte de recursos para custeio das despesas da União, o IMF, isto é, o Imposto sobre Movimentação Financeira, em caráter permanente. Por uma razão muito simples, Sr. Presidente: somente aquelas pessoas mais ricas, mais abastadas são contra esse imposto; essas, além dos recursos próprios que são depositados regularmente nas instituições financeiras, dispõem do célebre caixa 2, como sabemos, o Imposto sobre Movimentação Financeira incide sobre toda e qualquer movimentação, sobre todos os cheques, parta de onde partir. Inclusive a própria economia informal, que hoje não é pequena no País, é atingida. Por outro lado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também não se pode deixar de lembrar que o grande movimento de recursos, por exemplo, que se tem no País por conta de certas atividades marginais, como é o caso do narcotráfico, também pagam o IMF.

Creio que é o imposto certo. Não digo que se chegue a transformá-lo, como queria um deputado do Rio Grande do Norte, em imposto único. Mas, sem dúvida, é um imposto que me parece muito seguro, sobretudo porque não necessita de fiscalização; as próprias instituições financeiras encarregam-se de arrecadá-lo; há economia de recursos, porque não há participação da fiscalização na arrecadação desses tributos. Além do mais, todos sabem qual é o maior montante de movimentação financeira da maioria das pessoas jurídicas e físicas.

A propósito do assunto, quero ler, para conhecimento da Casa e para que fique registrada nos Anais, uma correspondência que recebi do Sindicato de Estabelecimentos de Serviço de Saúde e da Associação Paraibana de Hospitais, nos seguintes termos:

      Erro! A origem da referência não foi encontrada.Diante da grave situação da saúde em nosso País e em nosso Estado em particular, a Associação Paraibana de Hospitais e o Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado da Paraíba vem expor a V. Exª o que segue:

      1 - Com a promulgação da nova Constituição da República Federativa do Brasil foi criado o SUS (Sistema Único de Saúde), com a universalização do atendimento dos anseios de saúde da população brasileira, sendo expresso em nossa Carta Magna que 'saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado';

      2 - Apesar do significativo aumento do Universo a ter direito ao atendimento de suas necessidades de saúde, não houve aumento correspondente dos recursos destinados aos mesmos, sendo que a solução encontrada pelas autoridades do Ministério da Saúde foi aviltar significativamente o valor a ser pago aos prestadores de serviços de natureza médico-hospitalar. Exemplificando:

      Consulta R$2,04

      Parto normal R$55,56

      Diária R$3,21;

      3 - Esses valores, totalmente defasados, são pagos desde julho de 1994, não existindo perspectiva de aumento em função da inexistência de recursos, de acordo com o próprio Ministério da Saúde;

      4 - Os valores foram majorados, a partir do mês de julho de 1995, em 25%, porém, há 08 (oito) meses, alegando absoluta falta de recursos, o Ministério da Saúde vem pagando aos serviços públicos, filantrópicos e privados, sem o aumento concedido, existindo acumulação do correspondente a (02) dois meses de faturamento de cada instituição prestadora de serviços, fato que leva a total insolvência toda a rede que atende à população;

      5. Concomitantemente ao brutal achatamento dos valores pagos pelos serviços de natureza médico-hospitalar, houve na implantação progressiva do SUS erros crassos, que vêm comprometendo tanto a qualidade do atendimento quanto a quantidade dos serviços oferecidos à população;

      6. Esses fatos ocorreram em virtude de apressada e equivocada descentralização, com a progressiva entrega da responsabilidade da prestação de serviços a municípios sem nenhuma capacidade resolutiva e gerencial, provocando desperdícios de recursos com conseqüente diminuição do fluxo financeiro para aquelas instituições públicas, filantrópicas e privadas, que realmente prestavam os serviços de que a população necessitava;

      7. Com a diminuição do seu financiamento, instituições, que, durante décadas, assistiram de maneira satisfatória os anseios de saúde de nossa população, estão sendo obrigadas a reduzir sua capacidade de atendimento, com a diminuição de leitos oferecidos ao Sistema Único de Saúde, prejudicando sobremodo a necessitada população;

      8. Ao mesmo tempo em que o sistema direcionava seus já insuficientes recursos para órgãos e instituições sem capacidade resolutiva, era completamente desmantelado o Sistema de Fiscalização, impossibilitando, dessa forma, o correto acompanhamento de aplicação desses recursos;

      8.1. Vale salientar que, como não existe fiscalização na aplicação dos recursos, existem municípios que estão cobrando mensalmente por serviços não realizados, sendo notório que, mesmo nos meses em que há greve de funcionários nessas entidades, existe a cobrança da produção de atendimentos não realizados;

      9. Queremos enfatizar que não podemos aceitar fraudes sob nenhuma hipótese. Qualquer desvio dos parcos recursos que são destinados à saúde pública significa menos serviços médicos destinados à nossa população. Achar que fraude no serviço público, com o recebimento por serviços não realizados, não é fraude é uma anomalia inaceitável. Fraude é fraude, seja no setor público ou privado, e fraude é crime, que se torna maior na medida que subtrai serviços essenciais à vida de nossa população;

      10. Essa política suicida promovida pelo Ministério da Saúde vem provocando em todo o Brasil brutal desperdício de recursos e, conseqüentemente, quebra da rede de prestadores que efetivamente promoviam o atendimento à população, sem que tenha surgido uma nova rede que tenha condições de bem atender à nossa sofrida população;

      11. Na Paraíba é flagrante a drástica diminuição da oferta de leitos e da capacidade de atendimento ambulatorial dos serviços de melhor qualidade, que se evidenciam com o encolhimento da maioria dos hospitais e a saída do SUS do Pronto Socorro de Fraturas de João Pessoa e do Hospital Samaritano, que foram obrigados a deixar o Sistema Único de Saúde para não serem obrigados a fechar suas portas.

      A Associação Paraibana de Hospitais e o Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde alertam as autoridades constituídas e a população em geral para o fato de que, com o desmantelamento da estrutura de saúde existente em nosso Estado, a população carente certamente continuará sendo penalizada com a dificuldade de conseguir satisfatório atendimento médico e que certamente novos óbitos por falta de atendimento ocorrerão, pois a capacidade de atendimento daqueles que prestam esses serviços está gravemente comprometida.

      Alertamos ainda que função do desmonte dos serviços de saúde existentes, mesmo aqueles que têm planos de saúde ou que podem pagar, certamente em casos de urgência poderão ser penalizados com a falta de estrutura que lhes permitam seu bom e eficiente atendimento.

      Afirmamos ainda que a responsabilidade pelos fatos acima relatados não são de responsabilidade da rede prestadora de serviço e sim daqueles que provocaram seu desmantelamento.

      O atendimento à saúde da população carente está comprometido e os Hospitais Privados e Filantrópicos não poderão sob nenhuma hipótese serem responsabilizados por essa calamitosa situação.

      Atenciosamente,

Dr. Antonio Eduardo Cunha Dr. Danilo de Lira Maciel

Presidente do Sindicato Presidente da Associação"

Sr. Presidente, como se vê dessa correspondência, há, na verdade, um ambiente muita perplexidade no País devido à falta de recursos do SUS, mas também, por outro lado, devido à continuada prática de fraudes, que não são, do meu ponto de vista, por falata de fiscalização não apenas do Governo Federal, mas também dos governos estaduais e municipais porque, se o Sistema é - frise-se - Único de Saúde, evidentemente que o seu funcionamento deve ser fiscalizado por todas aquelas partes que o integram.

Há falta de recursos. Contudo, há também uma tabela de prestação de serviços ridícula, uma vez que os números que a compõem não correspondem nem de longe à realidade dos fatos, o que de certo modo também estimula a fraude.

Na medida em que os Hospitais e as Casas de Saúde recebem pouco por uma consulta médica - R$2,04 -, como consta aqui; por um parto normal, R$55,56; por uma diária de hospital, R$3,21, evidentemente que o que se vai tentar é multiplicar isso tudo através, sobretudo, da emissão de notas frias.

Claro que se houver uma fiscalização, isso será coibido. Mas é preciso mais do isso, ou seja, aumentar os preços da prestação dos e serviços. Aliás, já consta que houve um aumento de 25%, mas o Ministério não pôde distribuir os recursos por falta de numerário.

É possível que, agora, com a promulgação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, que tudo indica será aprovado em segundo turno na Câmara dos Deputados - a CPMF -, tenhamos maiores recursos para atender à saúde pública. Não há de ser, porém, só por meio da CPMF, essa é uma medida de emergência. Temos, sim, que nos preparar para a reforma tributária e estudarmos de que maneira podemos assegurar os recursos indispensáveis que manterão esses setores sociais imprescindíveis à melhor qualidade de vida da população, ou sejam, a saúde pública, a educação, a alimentação popular etc.

Sr. Presidente, por outro lado, estou inteiramente favorável a que, na medida em que os recursos da saúde pública aumentem, se passe a dar maior atenção aos hospitais públicos e filantrópicos, porque, no momento em que está vivendo o Brasil, há uma espécie de privatização da saúde pública. Apesar de as normas em vigor exigirem que o maior percentual desses recursos devam ser destinados às unidades estatais ou beneficentes, na prática isso não vem ocorrendo. Na verdade, temos hoje um verdadeiro sucateamento da rede hospitalar pública e beneficente.

Cito como exemplo o caso do Rio de Janeiro, onde antigamente havia o Hospital dos Servidores do Estado, um hospital padrão, que, inclusive, foi pioneiro em matéria de cirurgia cardiovascular e, sobretudo, ponte de safena. Antes mesmo de São Paulo, no Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro já se fazia a cirurgia para implantação de pontes de safena e mamária.

Hoje, Sr. Presidente, aquele hospital está inteiramente sucateado. Parece que agora está se cuidando de uma reforma. No Rio de Janeiro, hoje, a não ser hospital privado, desconheço qual o hospital público se pode, realmente, procurar. Ao contrário, se São Paulo, onde há o Hospital das Clínicas, sempre bem mantido; o Instituto do Coração, da Fundação Zerbini e a Fundação Pró-Sangue, que também pertencem ao Estado; além de outros centros de atividade médico-hospitalar, que funcionam muito bem, não só na capital, mas em Ribeirão Preto, em São José do Rio Preto e outras cidades mais importantes do interior de São Paulo.

O Sr. Ernandes Amorim - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª, nobre Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim - Nobre Senador Humberto Lucena, a situação da saúde nos preocupa. Fui prefeito de 1989 a 1992 e, naquele período, com os recursos, fiz uma administração boa na área da saúde. No entanto, daquela época até hoje, percebe-se a pulverização dos recursos. Evidentemente, os recursos não aumentaram na área da saúde, mas, se tivessem sido concentrados no serviço público ou, como disse V. Exª, se a rede pública não tivesse sido sucateada, teria sido possível, com aqueles recursos, manter o nível de atendimento à saúde. Mas o dinheiro é pouco e é distribuído para vários setores privados onde, como bem disse V. Exª, há a corrupção e o desvio. Hoje, observa-se o alto custo do atendimento e das cirurgias. Já ouvi diversos comentários de que, no registro de alguns hospitais, existem até partos realizados em homens, com o intuito de carrear recursos. Se há poucos recursos, o Governo Federal deveria fortalecer a rede pública, porque o custo do atendimento seria mais barato e atenderia a um número maior de pessoas. Se os poucos recursos existentes forem destinados às instituições particulares, evidentemente, o custo dos serviços aumentará e o atendimento será menor, provocando a situação que vemos hoje: a população à mercê da sorte no atendimento à sua saúde. Mesmo recolhendo essa contribuição que agora estamos aprovando temos certeza de que os recursos não serão suficientes para atender à área da saúde. Seria melhor que o Ministro voltasse a fortalecer o SUS, que não está funcionando justamente pela escassez de dinheiro e, novamente, fortalecer os hospitais por meio do SUS e, igualmente, o sistema municipalista. Ou seja, a distribuição dos recursos às bases dos municípios, principalmente, na área da saúde preventiva. Assim, a curto prazo, poderemos melhorar a situação da saúde no País. Mas não creio que os recursos a serem carreados por meio da CPMF irão resolver esse problema, até pela metodologia de trabalho. Tenho certeza de que esses recursos não serão suficientes para resolver o problema. Por isso, cabe ao Governo Federal, por intermédio do Ministério da Saúde, destinar maiores recursos ao serviço público de saúde, a fim de tirar o setor da situação de sucateamento em que se encontra. Muito obrigado.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Eu que lhe agradeço, nobre Senador Ernandes Amorim.

Lembro a V. Exª que, ao chegarmos a Brasília, nos idos de 1960, o Hospital de Base, também chamado de Hospital Distrital, era um estabelecimento padrão em equipamento e funcionamento. Hoje, pelo que se sabe, existem muitas dificuldades, justamente porque a atenção do Governo tem-se voltado mais para as instituições privadas do que para as instituições públicas e beneficentes.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de encerrar, gostaria, em face desse documento, de fazer um apelo ao Sr. Ministro da Saúde, no sentido de verificar a possibilidade de resgatar o débito do Sistema Único de Saúde para com as instituições da Paraíba e, inclusive, tentando manter, pelo menos, o reajuste de 25% feito na Tabela de Atendimento Médico Hospitalar.

Ao mesmo tempo, espero que S. Exª redobre esforços e recomendações, para que o próprio Ministério, através de seus órgãos subordinados, juntamente com os Estados e Municípios, procure fazer uma fiscalização cada vez maior, a fim de evitar que a fraude continue campeando no SUS.

Sr. Presidente, era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/07/1996 - Página 12865