Discurso no Senado Federal

ANALISE DOS PROGRAMAS SOCIAIS DE BOLSA-ESCOLA, ORÇAMENTO PARTICIPATIVO, MEDICO DE FAMILIA E RENDA MINIMA, QUE VEM SENDO IMPLEMENTADOS EM VARIOS MUNICIPIOS BRASILEIROS.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • ANALISE DOS PROGRAMAS SOCIAIS DE BOLSA-ESCOLA, ORÇAMENTO PARTICIPATIVO, MEDICO DE FAMILIA E RENDA MINIMA, QUE VEM SENDO IMPLEMENTADOS EM VARIOS MUNICIPIOS BRASILEIROS.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 19/07/1996 - Página 12683
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • EXPECTATIVA, POPULAÇÃO CARENTE, BRASIL, EXTENSÃO, MUNICIPIO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, ORÇAMENTO, PARTICIPAÇÃO, COMUNIDADE, MEDICO, FAMILIA, INCENTIVO, ESCOLARIZAÇÃO.
  • ANALISE, DEFICIENCIA, ENSINO PUBLICO, ELOGIO, INICIATIVA, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), PROGRAMA, COMPLEMENTAÇÃO, RENDA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, REDUÇÃO, ALUNO REPETENTE, DESISTENCIA, FREQUENCIA ESCOLAR.
  • CRITICA, EXECUTIVO, AUSENCIA, CRITERIOS, LIBERAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, ATENÇÃO, EXPERIENCIA, ORÇAMENTO, PARTICIPAÇÃO, COMUNIDADE, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), DISTRITO FEDERAL (DF), MUNICIPIOS.
  • COMENTARIO, PROGRAMA, SAUDE, FAMILIA, APLICAÇÃO, MUNICIPIO, NITEROI (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, PREVENÇÃO, AGENTE, LOCALIZAÇÃO, MEDICO, PROXIMIDADE, COMUNIDADE.
  • ANALISE, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA, RESULTADO, APLICAÇÃO, MUNICIPIOS, ESTADOS, PAIS, COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, PROJETO.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, escolhi a tarde de hoje para fazer referência a alguns programas sociais que vêm sendo implementados com êxito em vários municípios brasileiros e em alguns Estados. E faço isso com o objetivo de manter viva a esperança de milhões de brasileiros que vivem na pobreza absoluta e que esperam que programas dessa ordem possam também chegar até eles e, assim, minorar as dificuldades por que passam.

Refiro-me a programas exitosos como os da bolsa-escola, orçamento participativo, médico de família e renda mínima.

Começo falando da questão educacional em nosso País e, portanto, sobre esse programa importante, bolsa-escola, que vem sendo adotado em alguns municípios, com o pioneirismo do Distrito Federal, mediante iniciativa do Governador Cristovam Buarque.

Hoje, na avaliação que temos, fica praticamente difícil adjetivar a situação do ensino público no Brasil. Constrangedor - ou vergonhoso - talvez se aproxime do quadro que se delineia aos nossos olhos muitas vezes desatentos. O ensino público, único mecanismo para a mobilidade social e a correção de desigualdades, tornou-se perpetuador da injustiça e da pobreza.

Ensino deficiente, professores mal pagos, índices elevados de evasão escolar e repetência são marcas registradas da nossa escola. Sem contar com a inversão de prioridades que orienta os gastos do Governo.

Nesse quadro de caos e desalento, surgiu uma luz no final do túnel. No princípio, pensou-se ser mais um discurso eleitoreiro, fadado a compor a galeria das promessas utópicas no vale-tudo da disputa por um cargo: "O Governador Cristovam Buarque está tentando quebrar esse ciclo de negligência com um programa inovador, que garante a educação básica."

O programa é simples. O Governo paga para as crianças estudarem. Ele garante a concessão de um salário mínimo por mês a toda família carente que mantiver os filhos de 7 a 14 anos matriculados no ensino fundamental.

Na primeira fase de implantação da bolsa-escola, 1.900 famílias do Paraná tiraram os filhos das ruas e os puseram na sala de aula.

Com a bolsa-escola, resolveu-se um dos mais dramáticos problemas da educação básica brasileira: a evasão escolar. Para receber o salário, o estudante só tem direito a duas faltas mensais. Os pais, com isso, fiscalizam rigorosamente a freqüência dos filhos.

A cumplicidade da família tem dado certo. O resultado tem sido animador. O programa registrou índices de evasão próximos a zero.

Outro problema sério das nossas escolas - a repetência - também tem sido atacado. O Governo do Distrito Federal instituiu a bolsa-poupança. Os alunos beneficiados pela bolsa-escola que conseguirem passar para a série seguinte recebem um salário mínimo de prêmio. Portanto, a bolsa-escola mantém a criança na sala de aula, e a bolsa-poupança evita a repetência.

O programa do Governo do Distrito Federal mostra que a educação tem jeito. Para deixar de ser a vergonha nacional - com raras exceções, como programas também êxitos implantados sobretudo no Rio de Janeiro, no Governo do ex-Governador Leonel Brizola e com o carimbo do Senador Darcy Ribeiro, na época Secretário de Educação -, a educação não precisa de soluções mirabolantes, mas saídas simples e criativas. A bolsa-escola evita que as crianças pobres do Distrito Federal deixem a escola para trabalhar.

Só com escola democrática e de boa qualidade pode-se assegurar o futuro aos pobres e desamparados da sorte. Fora dela, teremos o quadro que hoje tanto nos deprime e assusta: milhares de menores perambulando pelas ruas, vivendo de biscates, de pequenas infrações ou vendendo drogas.

Qualquer país que tem vergonha na cara obedece a uma verdade elementar: lugar de criança é na escola. Fora dos bancos escolares não há salvação. Condena-se o pobre à pobreza, à ignorância, ao subdesenvolvimento, à estagnação social.

E como nenhuma corrente é mais forte do que seu elo mais fraco, a constatação é inevitável: o país que condena seus filhos está condenando a si mesmo.

Sr. Presidente, passo a fazer alguns comentários sobre o orçamento participiais, outro programa que vem tendo resultados satisfatórios onde tem sido implementado.

Começo fazendo algumas considerações a respeito de dados do Instituto de Estudos Sócio-Econômicos do Distrito Federal - INESC -, que menciona que os recursos escritos no Orçamento de 1995 para o setor educacional sofreram cortes importantes.

O Programa do Ministério da Educação destinado ao ensino básico na Região Nordeste, que deveria aplicar R$250 milhões foi contemplado com apenas R$12 milhões.

Quanto ao Programa Desenvolvimento da Educação da Criança de Zero a Quatro Anos, dos R$799 mil previstos, nenhum real foi colocado à disposição!

O Inesc mostra ainda que o Ministério da Saúde fez investimentos muito modestos nos Programas Nordeste I e II destinados a reduzir a mortalidade infantil na região considerada a mais atrasada do País. Por exemplo, dos R$186 milhões previstos para investimentos no Nordeste II, menos de R$68 milhões foram efetivamente aplicados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a coluna da jornalista Dora Kramer, do Jornal do Brasil do dia 09 do corrente, toda ela dedicada às mazelas do nosso orçamento, assunto muito bem discutido hoje aqui nesta tarde, trazido à pauta pelo eminente Senador Carlos Wilson, faz pesadas críticas ao Governo que manipula, de acordo com suas conveniências, as verbas destinadas a Estados e Municípios. Diz precisamente:

      "O Poder Executivo está devendo uma explicação a respeito dos critérios que vem utilizando para liberar verbas do orçamento da União, notadamente através de convênios com prefeituras(..). Ninguém sabe ao certo se o orçamento está mesmo servindo de mercadoria em balcão de negociatas. Mas o simples fato de o Executivo não vir a público esclarecer quais os critérios para que A ou B e não C receba verbas torna lícito supor que algum arranjo, de natureza ainda não explicada, esteja sendo feito."

Alguns especialistas dizem que no Brasil de hoje existem três formas de acompanhamento do orçamento: o controle interno, realizado pelos próprios Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; o controle externo, realizado pelo Congresso Nacional; e o controle social, exercido pela sociedade.

É importante discordar dessas afirmações tocando em dois pontos fundamentais. Em primeiro lugar, em relação ao Congresso Nacional, malgrado sua participação formal na elaboração do orçamento, somos forçados a reconhecer que o arbítrio ilimitado e os artifícios utilizados pelo Executivo na fase de execução orçamentária transforma aquela participação legislativa em um patético "jogo de cena". Melancolicamente, o orçamento torna-se uma obra de ficção. Os ingentes esforços dispendidos pelos parlamentares para aprimorar a Lei de Meios resultam inúteis, pois o orçamento será cumprido ou descumprido pelo Executivo na exata medida de suas conveniências político-eleitorais. Em segundo lugar, no que tange à sociedade, ela de nada sabe porque não é informada de coisa alguma. Assim, não tem a menor participação no destino do dinheiro, que o Executivo manipula como quer, de maneira autoritária e absolutista, visando a satisfazer apenas aqueles que são seus vassalos. Dessa maneira, explica-se facilmente, segundo a já citada jornalista Dora Kramer, porque, por exemplo, as Prefeituras de Belo Horizonte de Porto Alegre morrem à míngua enquanto o Prefeito de Contagem recebe quase R$2,5 milhões praticamente às vésperas das eleições municipais.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diante desse vícios e dessas práticas clientelistas que ainda perduram em relação ao destino dos recursos inscritos no Orçamento da União e que fazem dele uma grande peça de ficção, creio que atingimos um momento excelente para retomar uma discussão séria sobre a transparência e a participação social na aplicação do dinheiro público.

Nesse sentido, merece ser acompanhada com atenção uma experiência adotada na cidade de Porto Alegre, na gestão do ex-Prefeito Olívio Dutra, do Partido dos Trabalhadores. Experiência, aliás, que está sendo reproduzida em outros municípios, como Betim, Belo Horizonte e também aqui mesmo no Distrito Federal. Trata-se do orçamento participativo. A idéia é simples e tem como objetivo levar a população a participar mais diretamente das decisões sobre a aplicação das verbas públicas.

Por meio do orçamento participativo, qualquer habitante tem o direito de participar de uma reunião plenária que decidirá sobre as prioridades do seu município. Nas reuniões plenárias, são escolhidos, pelo voto, os conselheiros, que, depois, tomarão decisões a cerca da destinação dos recursos previstos para a sua região na proposta orçamentária. Automaticamente, com a participação direta da sociedade no processo de decisão orçamentária, diminui o favorecimento político no âmbito do Legislativo; reduzem-se de maneira importante as manipulações e os artifícios que são criados pelo Executivo; existe uma quase certeza de que aquelas verbas serão realmente aplicadas. Enfim, o orçamento participativo proporciona a fiscalização do povo sobre os recursos nas mãos do Governo. Segundo o atual Prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, o orçamento participativo é uma mistura de democracia representativa com democracia direta. A impressão que temos é a de que, hoje, nas dezesseis regiões que constituem o Município de Porto Alegre, para efeito de orçamento participativo, o clientelismo e os chamados "políticos-despachantes" praticamente não existem mais.

Sr. Presidente, quero também comentar uma nova modalidade de assistência à saúde da população. Não tão nova assim, porque já vem sendo implementada no Brasil e foi trazida, principalmente de Cuba, há alguns anos. Trata-se do programa chamado por alguns de Médico de Família e pelo Ministério da Saúde de Saúde na Família, que consiste na instalação, no seio de um bairro, de um verdadeiro consultório médico para atender às famílias daquela comunidade, por meio dos serviços de um clínico geral e de alguns auxiliares.

Essa equipe básica não só atende aos moradores locais que demandam o consultório, como também atende a domicílio todas as famílias do bairro, visitando-as sistematicamente.

No Brasil, o Município pioneiro na adoção dessa metodologia foi Niterói, em 1992, durante a gestão do Prefeito Jorge Roberto Silveira, do PDT. Diga-se de passagem que Niterói é um desses Municípios em que, graças à boa administração, o mesmo grupo de dirigentes vem sendo reeleito mandato após mandato, assegurando uma saudável continuidade da gestão municipal. O Programa Médico de Família conta, em Niterói, com uma dezena de consultórios, que foram instalados, dando prioridade a bairros carentes. O programa foi baseado na experiência cubana, de méritos reconhecidos pela Organização Mundial de Saúde.

Em Cuba, o sistema de consultórios públicos de bairro, com um clínico geral atendendo às famílias da área, cobre 92% da população e envolve o trabalho de 19 mil médicos.

O nosso Ministério da Saúde, há cerca de dois anos, adotou a idéia e a vem difundindo e implantando por todo o Brasil, através de convênios, sob o nome de Programa da Saúde da Família.

Lamento que o Ministro da Saúde tenha me comunicado, em audiência na semana passada, que dispõe de recursos mínimos para implementação deste programa, que tão bons resultados vêm trazendo à população carente do nosso País e que, infelizmente, como disse, não dispõe dos recursos necessários para implementação do programa na grande parte dos municípios brasileiros.

De resto, muitos municípios que priorizaram a questão da saúde em suas administrações lançam-se a introduzir o programa por conta própria e, só depois, conveniam-se com o sistema de verbas federais. Essa antecipação e iniciativa demonstram a grande atração que a nova idéia vem exercendo sobre prefeitos e secretários municipais de saúde.

A base do programa é a Unidade de Saúde da Família, instalada geralmente num edifício cedido pela comunidade e adaptado para nova finalidade. A equipe básica que atua nesse consultório é formada, segundo a norma federal, por um médico generalista, uma enfermeira, uma auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde. Os agentes de saúde devem residir na comunidade, e toda a equipe deve residir no município e trabalhar em horário integral: oito horas por dia.

A área de atendimento a cargo da equipe básica é bem delimitada, abarcando entre 600 e 1000 famílias. Os que demandam o consultório devem poder chegar a ele a pé. A equipe atende no consultório e a domicílio. Cadastra todas as famílias e indivíduos da área, examina a todos e cuida de todos. Além da assistência médica a cada caso, a equipe também orienta as ações de prevenção.

Com essa ação bem aderida às realidades e exigências locais, diminui a necessidade de a população buscar ambulatórios especializados e hospitais. Quando necessário o internamento hospitalar, o doente é encaminhado pelo médico da família, que acompanha o caso continuamente. Muitos tratamentos podem ser feitos em casa, com a orientação e apoio da equipe local, com muito menos despesas e dificuldades tanto para os doentes quanto para a rede pública de saúde.

Por último, Sr. Presidente, quero tecer algumas considerações a respeito do tão divulgado Programa de Garantia de Renda Mínima.

      O Programa de Garantia de Renda Mínima, que vem sendo implementado no Distrito Federal e em vários Municípios brasileiros, ganha a cada dia novas adesões, revelando uma preocupação crescente da classe política e de numerosas autoridades com os estarrecedores padrões de miséria de grande parte da população.

      É curioso observar que esse programa vem sendo adotado, em sua proposta original ou em modelos semelhantes, por dezenas de municípios dos mais diversos pontos do território brasileiro.

Vale a pena ressaltar que são dirigidos por Prefeitos ligados aos mais variados partidos.

      Da mesma forma, vem seduzindo Parlamentares e governantes das várias unidades federativas, além do já citado Distrito Federal. No entanto, foi o Programa de Garantia de Renda Mínima proposto, originalmente, nesta Casa legislativa, pelo nobre colega, Senador Eduardo Suplicy, há nada menos que cinco anos.

E este Senador, em várias oportunidades, aqui, expôs e defendeu com brilhantismo os pontos principais desse Programa.

      Aprovado por este Egrégio Plenário, o PLS nº 080, de 1991, foi encaminhado no ano seguinte à Câmara dos Deputados, onde se encontra ainda hoje. Tramitando na Comissão de Finanças e Tributação, a proposta - agora, sob o nome PL nº 2.561, de 1992 - aguarda apreciação do Parecer do Relator, Deputado Germano Rigotto que, em março de 1993, concluiu por sua adequação financeira e orçamentária e, no mérito, pela aprovação.

      Enquanto o Congresso Nacional e Poder Executivo - nesse caso, representado pela bancada governista - hesitam em apreciar o projeto, este vem merecendo humilde mas crescente acolhida dos governos estaduais e municipais.

      Até o início de junho, o programa já fora proposto em 62 municípios e 12 unidades federativas - São Paulo, Pernambuco, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Goiás, Paraíba, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além do Distrito Federal.

      Vetado, embora, em 12 municípios, o projeto está sendo apreciado em 29 outras municipalidades e em 11 Estados; encontra-se em execução no Distrito Federal, na capital baiana, Salvador, e em outras oito cidades, entre as quais se destacam Campinas, Santos e Ribeirão Preto. Em quatro municípios, será implementado a partir do ano que vem.

      O Programa de Garantia de Renda Mínima, conforme salientei, apresenta variações em sua concepção e, principalmente, na sua operacionalização. No Distrito Federal, o Governador Cristovam Buarque vem implementando o programa chamado bolsa-escola, que complementa a renda das famílias carentes desde que elas tenham filhos em idade escolar e comprovem sua matrícula e freqüência.

      Em qualquer dos modelos em fase de implementação, ou que venha a ser adotado, o Programa de Garantia de Renda Mínima constitui uma ação emergencial para minorar os efeitos da miséria, não dispensando, naturalmente, a ação de longo prazo, que deveria substanciar-se na geração de empregos, no crescimento econômico e na maior distribuição da renda.

      O Programa consiste, basicamente, em conceder uma suplementação de renda a todos os trabalhadores acima de 25 anos que recebam remuneração inferior a R$240,00, correspondentes aos 45 mil cruzeiros previstos no projeto de lei quando de sua apresentação, em 1991. Essa suplementação deve corresponder, de acordo com o projeto original, a 30% da diferença entre o limite previsto, de 240 reais, e a remuneração efetivamente percebida pelo trabalhador.

      Deve-se observar, ainda, que o projeto do Senador Suplicy, ora em tramitação na Câmara dos Deputados, previa a implementação gradual do Programa a partir do ano passado, quando seriam beneficiados os trabalhadores com mais de 60 anos; neste ano, o benefício seria estendido àqueles com idade superior a 55 anos; em 1997, àqueles com mais de 50 anos e assim sucessivamente, até que, no ano 2002, todos os trabalhadores, acima dos 25 anos, precariamente remunerados, recebessem a suplementação.

      Programas dessa natureza já existem em outros países com resultados satisfatórios. Diante da possibilidade de eventuais críticas ao Programa, no que respeita a suposto paternalismo ou estímulo ao ócio, cumpre observar que esse mecanismo, pelo contrário, torna o trabalho mais atraente que a ociosidade, como destacou em seu Parecer o Deputado Germano Rigotto: "Na medida em que o beneficiário consiga aumentar sua renda, o benefício recebido diminui, mas cresce a sua renda total", salientou o Relator.

      Outro grande mérito do Programa é o fato de eliminar intermediários, freqüentemente responsáveis pela pulverização dos recursos, como conseqüência do custo operacional, quando não pelos desvios de verba, lamentavelmente uma tradição na história de nossos programas sociais. A distribuição direta dos recursos, além disso, apresenta uma vantagem extra se comparado com as cestas básicas e outros programas assistenciais, já que permite ao beneficiário dispor do dinheiro em conformidade com suas necessidades, as quais ninguém pode identificar melhor do que ele próprio.

      É natural, Sras. e Srs. Senadores, e até necessário, que na abordagem do programa se levante a questão do seu custo. Cálculos efetuados quando da elaboração do projeto revelaram que sua implementação a nível nacional exigiria recursos correspondentes a 3,5% do nosso Produto Interno Bruto. Os dispêndios, como se sabe, aumentariam gradativamente, alcançando esse percentual quando o Programa de Garantia de Renda Mínima estivesse totalmente implementado.

      Aparentemente, os resultados a serem obtidos justificariam um aporte de tal ordem. É preciso lembrar que o aumento da renda para as famílias mais pobres permitiria eliminar uma série de gastos sociais hoje existentes, que não surtem os efeitos desejados. Além disso, o incremento da renda implicaria significativo crescimento da demanda, ao incorporar ao mercado milhões de famílias que hoje se encontram à margem dos mais reduzidos padrões de consumo.

      O fortalecimento do consumo interno, segundo revelaram projeções então realizadas, seria suficiente para garantir à economia brasileira uma trajetória de crescimento. Os estudos demonstraram que um aumento de 5% do Produto Interno Bruto para os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos faria esse mesmo PIB crescer 8,52%, além de gerar dois milhões e meio de empregos formais e dois milhões de ocupações informais.

      Dados coletados pelo IBGE, na Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio, em 1990, revelaram a existência de 38 milhões 932 mil cidadãos acima dos 25 anos de idade que ganham menos de dois salários mínimos. Desses, 16 milhões 893 mil não tinham rendimento algum.

      O incremento da população por setor, com a incorporação desse contingente ao mercado de consumo, apresentaria os seguintes resultados: leite e laticínios, 24,07%; indústria farmacêutica, 23,61%; saneamento e abastecimento de água, 22,83%, beneficiamento de arroz, 22,51%; indústria de fumo, 22,07%; alimentos diversos, 22%; moagem de trigo, 21,48%; abate e preparação de aves, 19,99%; refino de óleos vegetais, 18,98%; perfumaria e produtos de limpeza, 17,78%; abate e preparação de carnes, 17,75%; aluguel de bens e imóveis, 15,18%. Esses seriam alguns dos setores que obteriam crescimento mais expressivos.

      O Programa de Garantia de Renda Mínima tem equivalentes em outros países, com maiores ou menores variações. Entre outras nações, é adotado pelos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha e Suécia. A França, desde 1988, adota o programa chamado Renda Mínima de Inserção, num sistema bastante parecido com o do programa que aqui se pretende implementar.

A verdade, Srªs e Srs. Senadores, é que os estados e os municípios brasileiros vêm-se mostrando mais determinados do que os Poderes Legislativo e Executivo, no plano nacional, na proposta de atendimento às necessidades básicas do cidadão.

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª permite-me um aparte?

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Com prazer ouço V. Exª.

O Sr. Eduardo Suplicy - Fico contente, Senador Sebastião Rocha, V. Exª realmente demonstra ter estudado muito bem o Programa de Garantia de Renda Mínima, entusiasmando-se pela proposição e aqui registrando o número crescente de municípios interessados em implementar essa proposição. V. Exª citou que sessenta e dois municípios já a adotaram, e, aproveitando a oportunidade, gostaria de dizer que, segundo informações que me chegaram nesta semana, já são sessenta e oito municípios cujas Câmaras Municipais estão debatendo projetos desta natureza. Um fato interessante a registrar é que nessas iniciativas há, por exemplo, a participação de políticos do PT, PSDB, PMDB, PPB, PTB, PFL, PSB e do PDT, o que torna, portanto, esse projeto suprapartidário. Gostaria de informar a V. Exª que o Deputado Germano Rigotto atualizou o parecer que, juntamente comigo, irá apresentar ao Ministro Antonio Kandir no próximo dia 25, às 17 horas, ocasião em que iremos mostrar ao Sr. Ministro as emendas que contêm um aperfeiçoamento do projeto e, sobretudo, as que levam em conta as experiências positivas com resultados bastante alvissareiros, como a bolsa-escola aqui no Distrito Federal e o projeto de renda mínima aplicado em Campinas, em Ribeirão Preto e em outras cidades. No parecer do Deputado Germano Rigotto, as emendas que inovam o projeto atualizam o valor de Cr$45 mil, de abril de 91, para R$240 de hoje, e estabelece o complemento de renda na alíquota de 30%, calculado entre a diferença resultante de R$240 e a renda da pessoa. Além disso, frisa que o Executivo, de acordo com a disponibilidade de recursos e a experiência do programa, poderá aumentar essa alíquota para 50%. Estas as inovações previstas no projeto do Deputado Germano Rigotto: os beneficiários do Programa de Garantia de Renda Mínima que tiverem crianças de até 14 anos, em idade escolar, devem demonstrar que elas estão freqüentando a escola; todavia, não exclui aquelas pessoas muito carentes que, eventualmente, não tenham crianças mas que, se comprovarem carência definida naquele patamar, terão direito ao complemento de renda. A forma de introdução gradual do programa foi modificada: em vez de se iniciar pelos mais velhos, 60 anos ou mais, no primeiro ano; 55 anos ou mais, e assim por diante, até que no oitavo ano de aplicação seriam alcançados todos os adultos acima de 25 anos, incicia-se o Programa, no primeiro ano, atendendo aos três estados de menor renda per capita - Piauí, Tocantins e Maranhão; no segundo ano, os demais estados da Região Nordeste, Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha; no terceiro ano, os estados de menor renda per capita da região Norte; depois, todos os estados da região Norte; progressivamente vindo para o Centro-Oeste, Sul e Sudeste. Vamos supor, no entanto, que o Governo decida, dada a avaliação do desempenho do Programa de Renda Mínima nos dois primeiros anos, universalizar o atendimento às pessoas carentes mais rapidamente por todo o território nacional, em caso afirmativo, ele poderá fazê-lo, conforme proposta do Deputado Germano Rigotto. Anteriormente, o projeto estabelecia a idade como critério para iniciar o atendimento aos carentes; agora resolveu-se implantar o Programa a partir das regiões mais pobres para as regiões de maior renda per capita. Outra modificação importante é a seguinte: dadas as experiências regionais e municipais, a União poderá estabelecer convênios com estados e municípios visando compartilhar administrativa e financeiramente o Programa de Garantia de Renda Mínima. V. Exª mencionou que a França, em 1988, iniciou um programa semelhante ao nosso de garantia de renda mínima, lá denominado de Programa de Renda Mínima de Inserção. Toda pessoa de 25 anos ou mais, cuja renda não atinja dois mil e seiscentos francos mensais, tem direito a um complemento de renda até esse montante, além de mil francos para a companheira e mais 600 por dependente, complemento esse válido por três meses, prorrogáveis por doze, período durante o qual o beneficiário se compromete a se inserir novamente no mercado de trabalho - daí o nome "inserção". E aqui queria propor a V.Exª que fizéssemos uma visita à Guiana Francesa para conhecermos esse trabalho. Nesse país, esse programa também foi implantado em 1988. Já conversei com o Embaixador da França e com uma autoridade da Guiana sobre esse assunto, que me informou que no ano passado dos 150 mil habitantes, aproximadamente, 5,5 mil eram beneficiários do Programa. Ele até me contou uma curiosidade daquela nação: na Guiana não é tão costumeiro as pessoas se casarem, tanto é assim que dizem "sou irmão por parte de pai", "sou irmão por parte de mãe" e assim por diante. Somente um quarto (1/4) da população se casa da maneira tradicional, como nós conhecemos aqui. E, na Guiana Francesa, os beneficiários muitas vezes indicam uma, duas, três ou mais companheiras para receberem esse direito. E elas o recebem. Tenho considerado - quem sabe numa ocasião oportuna - a possibilidade de irmos à Guiana para conhecermos os efeitos do programa de garantia de renda mínima, na forma da renda mínima de inserção. Os dados relativos à França, incluindo os territórios de ultramar, eu os tenho, recebi da embaixada francesa. V. Exª está mais próximo da Guiana Francesa, pelo jeito tem-se que ir ao Amapá para, depois, seguir para aquele país. Quero cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento e pelo interesse que demostra por essa proposição. Gostaria de lhe transmitir que o Deputado Germano Rigotto abraçou de tal maneira esta causa que, agora, candidato a Prefeito em Caxias do Sul, colocou como centro de suas proposições o Programa de Garantia de Renda Mínima em Caxias do Sul. Ele é o candidato do PMDB, resolveu sair candidato porque havia um outro candidato muito forte ali, trazendo preocupação ao Governo Federal. Os partidos da base governista pediram ao Deputado Germano Rigotto, que era Líder do Governo Fernando Henrique no Congresso Nacional, que lá se candidatasse. S. Exª acabou se candidatando e perguntou-me se eu estava de acordo em mostrar-lhe os diversos projetos. Disse-lhe que concordava e dei-lhe diversos projetos: o de Campinas, o de Ribeirão Preto, o do Rio Grande do Sul, o de Santa Catarina, o de Londrina, para que, além do conhecimento que tem do Programa de Renda Mínima, colhesse subsídios para embasar o seu projeto. O candidato com quem S. Exª disputa é o Deputado estadual Pepe Vargas, do PT do Rio Grande do Sul, exatamente o autor do projeto que instituiu o Programa de Garantia de Renda Mínima no Rio Grande do Sul. Então, em Caxias do Sul, hoje, há dois entusiastas candidatos a prefeito que querem introduzir o Programa de Garantia de Renda Mínima. Digo isso com o objetivo de acrescentar uma informação na análise tão completa que V. Exª faz da evolução do Projeto em todo o País. Espero que isso ocorra no Amapá também.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª, na condição de autor desse Projeto, só enriquece o meu pronunciamento e contribui para que as pessoas que nos ouvem dele tomem conhecimento e avaliem sua importância. Espero que prefeitos, vereadores e deputados estaduais e até parlamentares federais, como os deputados que estão apreciando esse projeto, se sensibilizem e lutem pela aprovação do mesmo.

Quero aqui ressaltar também o espírito público e a sensibilidade social do Deputado Germano Rigotto, que aceitou conversar com V. Exª e negociar um projeto de consenso que certamente torna mais viável a sua aprovação.

Conheço a Guiana Francesa e também o programa lá desenvolvido e quero, nesta oportunidade, oficializar o convite a V. Exª para ir à Guiana, passando pelo Amapá. No próximo dia 27, a Suriname Airlines inaugura o vôo Macapá-Guiana Francesa, que depois segue até Miami, passando pelo Caribe. Poderemos tomá-lo. Também podemos tomar um vôo direto até Paris a partir da Guiana Francesa. Portanto, agora já é possível fazer Amapá-Paris, com apenas uma escala na Guiana Francesa e a um preço bastante acessível, razoável. A passagem de Caiena a Paris, ida e volta, custa US$800, e a de Macapá a Caiena fica em torno de US$200, ida e volta. V. Exª, que já conhece o Amapá, nos dará mais uma vez o prazer de nos visitar e contribuir, com a sua experiência política, para a implementação de projetos dessa natureza em nosso estado.

Concluo dizendo que é imperativo que o Congresso Nacional pelo menos aprecie o projeto que institui esse Programa, deliberando conforme entender conveniente. Depois das informações prestadas pelo Senador Eduardo Suplicy, aumentam as nossas esperanças de que esse projeto seja aprovado.

Se tal proposta, por qualquer motivo, revelar-se inexeqüível - o que não acreditamos, mas temos que contar com essa possibilidade também -, cabe a nós, parlamentares, procurar outra solução. Acredito que a melhor solução é essa apresentada pelo Senador Eduardo Suplicy. O que não podemos, em qualquer hipótese, é escamotear de nossos compromissos e da existência de milhões de brasileiros, irmãos nossos, que vivem em condições inferiores à chamada linha da pobreza e que aguardam dos seus representantes no Congresso Nacional uma ação efetiva para reduzir as desigualdades e construir uma sociedade mais justa.

Sr. Presidente, era o que eu gostaria de trazer ao Plenário na tarde de hoje, esperando, com isso, estar contribuindo para ampliar o nível de conhecimento desses importantes programas sociais que vêm sendo implementados em nosso País para combater a pobreza.

Sr. Presidente, peço ainda a V. Exª que faça constar nos Anais da Casa a íntegra do meu pronunciamento da forma como o apresento no documento que vou levar à Mesa.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/07/1996 - Página 12683