Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO PODER LEGISLATIVO.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO PODER LEGISLATIVO.
Aparteantes
Benedita da Silva, Jefferson Peres, Josaphat Marinho, Osmar Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 27/07/1996 - Página 13282
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • PROTESTO, INJUSTIÇA, CRITICA, OCIOSIDADE, SENADO, ESPECIFICAÇÃO, TRABALHO, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA, ANALISE, RELAÇÃO, LEGISLATIVO, LIBERDADE, DEMOCRACIA.
  • CRITICA, IMPRENSA, AUSENCIA, REGISTRO, ASSIDUIDADE, SENADOR, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, LEGISLATIVO.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente e Srs. Deputados - perdão - primeiro Srªs. Senadoras - farei a justificativa.

Quando Deputado Federal, Sr. Presidente - cheguei, aqui, no Congresso Nacional, muito moço, mal entrava na casa dos 30 - fiz um discurso sobre o fortalecimento do Poder Legislativo.

Depois voltei, em 1986, para a Câmara dos Deputados e aquele discurso que tinha ficado adormecido, reclamando providências - nós estávamos em pleno regime autoritário que fazia com que o Judiciário se enfraquecesse e o Legislativo se desmoralizasse - eu concluía o discurso, conclamando os meus colegas Deputados - vêem V. Exªs o por que da falha inicial -, dizendo que àquela altura se poderia deitar como Deputado e acordar no dia seguinte cassado. Os atos institucionais estavam aí à espreita de todos nós. E, como quem faz uma previsão, acabei tendo o meu mandato parlamentar cassado - eu era Vice-Líder da Oposição - e dez anos de meus direitos políticos suspensos.

Mas nunca me saiu da mente o fortalecimento do Poder Legislativo.

Quando voltei, em 1986, uma das minhas alegrias foi poder ter convívio com vários colegas que tinham sido cassados e com outros que emergiam na vida pública e que hoje são líderes nacionais - refiro-me, com muita alegria, à Senadora Benedita da Silva. E ali fizemos o desenrolar da nossa constituinte que desaguou na Constituição de 1988, imprimindo ao Poder Legislativo aquele fortalecimento com que eu sonhava em 1967/68.

Sempre que alguém quer atirar pedras, é esta Casa, no cenário político da Nação, que recebe sempre as manifestações desairosas.

Pouco se fala do Executivo e, às vezes, se poupa o Judiciário, mas ao Congresso Nacional há sempre uma má vontade; uns dizendo que os Deputados lá na Câmara não comparecem e que aqui os Senadores estão ausentes.

Sr. Presidente, tenho uma estatística em mãos que coloca por terra todos os qualificativos que são pejorativos ao Congresso Nacional. A estatística refere-se apenas ao Senado. Vejam, eminentes Senadoras, que, na convocação extraordinária do Congresso Nacional, o Senado, apenas o Senado tem o seguinte quadro: matérias aprovadas em projetos enviados à Nação, 3; projetos aprovados e enviados à promulgação, 14; acordos internacionais, 7; operações de crédito, 7; projeto aprovado e enviado à Câmara dos Deputados, 1; mensagens relativas a escolha de autoridades, 3; mensagens relativas a escolha de chefes de missões diplomáticas, 2; total de matérias aprovadas, 23.

Ora, Sr. Presidente, se considerarmos os sábados e os domingos, a cada dia, de segunda a sexta, tivemos mais de uma matéria aprovada. Apenas uma, porém, daria à Nação a resposta do Senado Federal do que é um trabalho sério, consistente e que dignifica uma casa legislativa. É o Projeto de Lei nº 63/94, que institui o Código Nacional de Trânsito. Aprovado em primeiro turno, retornou à Ordem do Dia ontem, quando - e V. Exª deve estar lembrado - teve a sua discussão encerrada em turno suplementar e a apresentação de 209 emendas no espaço de cinco dias.

Ora, isso dá bem a idéia de que não é possível se atirar indiscriminadamente pedras àqueles Parlamentares que contribuem para com a Nação. E seria injusto, para não dizer reprovável, que não disséssemos e trouxéssemos para cá o trabalho que a assessoria faz, o que as taquígrafas realizam e o que os contínuos desempenham. Sintetizo tudo em dois companheiros de trabalho aqui, que são o Dr. Raimundo Carreiro Silva e a Drª Claudia Lyra Nascimento. Citando o nome de ambos, estou fazendo a abrangência de todos os que vêm e que trabalham, às vezes com dificuldades - e agora refiro-me às taquígrafas. Tantas vezes a Casa está em uma conversa - quem senta aqui na primeira fila consegue descobrir a todo instante - em que não se percebe o que é dito. Enquanto uma colhe, a outra revisa. Esse trabalho dignifica o Parlamento.

Ora, quando se pega um noticiário, seja de jornal ou de televisão, o que se ouve, o que se lê é simplesmente o bater na tecla de que o Poder Legislativo não trabalha.

Ainda hoje quando vinha para cá, ouvia o rádio e a notícia que se registrava era a de que os Parlamentares tinham saído em revoada e só voltariam no dia 6, o que é absolutamente inverídico. Quando nada, a maioria expressiva das Srªs Senadoras, 40% delas, estão aqui numa manhã de sexta-feira. Só por isso já daríamos a resposta àqueles jornalistas que, em não freqüentando - e aqui faço justiça aos repórteres que colhem aqui e sabem quem trabalha -, apenas buscam matéria para desmoralizar o Legislativo.

E eu digo sempre: infeliz daquele que, em não valorizando o Legislativo, não sabe o que é uma fonte da democracia.

Nunca me pergunto qual é o custo para os cofres da Nação de um Legislativo aberto, mas sei o quanto custa a liberdade de um povo quando este Congresso está fechado, quando aqui não ecoam os seus clamores, quando para cá não vêm os reclamos populares. E quando sinto que alguém diz que um Deputado ou que um Senador está ganhando pouco, eu gostaria que dissesse que os que ganham pouco são aqueles que não estão ganhando à altura do que merecem, porque Lincoln já dizia que "aquele que não produz mais trabalho do que para o qual é pago não merece o que ganha". E eu acrescento: os que ganham trabalhando além daquilo que deveriam fazer, por certo, mereceriam ganhar um pouco mais.

A Srª Benedita da Silva - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço, com muita honra, V. Exª, nobre Senadora Benedita da Silva.

A Srª Benedita da Silva - Senador Bernardo Cabral, estou atenta ao pronunciamento de V. Exª e não poderia deixar de manifestar-me. V. Exª fez alusão a meu nome.

O SR. BERNARDO CABRAL - E com muito prazer.

A Srª Benedita da Silva - Pude desfrutar da companhia de V. Exª na Câmara dos Deputados. Sempre tivemos uma relação muito cordial, independentemente das nossas siglas partidárias. E V. Exª, não posso negar, acompanhou toda a minha trajetória desde quando eu era praticamente uma caloura na Câmara dos Deputados. Lá, juntamente com o nobre colega, pude introduzir vários artigos à Constituição brasileira que resgatam a cidadania do povo negro, do povo pobre, das minorias em nosso País. Jamais esqueço o papel que V. Exª exerceu como relator, função que pôde extrapolar por conta da sensibilidade que teve diante das propostas novas que provinham do povo brasileiro. E hoje V. Exª nos revela para a mídia como aqueles que produziram, e produziram muito, durante esta convocação extraordinária, ao contrário do que se tem noticiado. V. Exª, mais uma vez, é a testemunha viva da trajetória política não apenas da Senadora Benedita da Silva, mas de tantos outros companheiros nesta Casa, porque V. Exª é um dos Senadores mais assíduos, é um dos que se têm pronunciado acerca de vários temas, e, talvez, seja um dos que mais têm aparteado os seus colegas, entre os quais me incluo. V. Exª falou a respeito do que foi feito por este Senado Federal nesta convocação extraordinária, destacando aqui o trabalho da Taquigrafia, o trabalho do Dr. Raimundo Carreiro da Silva, da Drª Claudia Lyra Nascimento, e eu gostaria de destacar, também, o trabalho da imprensa do Senado. Senador Bernardo Cabral, eu não o vejo manifestar-se somente neste plenário, mas, todos os dias, eu o vejo no Jornal do Senado, uma testemunha verdadeira do que temos aqui produzido. Eu quero parabenizar também o trabalho extraordinário desse jornal, porque ele tem dado a alguns, talvez, o único espaço para projeção e repercussão do que faz aqui. Temos, com o Jornal do Senado - e não falo apenas para o Jornal do Senado -, levado, e também pela TV, informação ao País inteiro, o que acho relevante. Concluindo o meu aparte, quero dizer a V. Exª que incluo, na relação dos projetos relevantes que aqui foram votados, um projeto que imputo de necessidade extrema, que é o projeto da pequena e média empresa, que persigo juntamente com o Senador José Sarney e, quero crer, com V. Exª, porque entendo que com ele criaremos mais empregos, e, com pequenas empresas, grandes negócios. Muito obrigada.

O SR. BERNARDO CABRAL - Eminente Senadora Benedita da Silva, é claro que, neste pronunciamento singelo, o que destaco são os trabalhos deste Poder. Mas nada mais justo do que ressaltar a figura de V. Exª, que, ainda há pouco, acometida de uma hepatite, portanto dela convalescendo, tem comparecido às sessões. E o tem feito eu diria até que de uma forma heróica, porque há algumas pessoas que, com uma simples gripe, já têm desculpa para não comparecer ao trabalho. V. Exª, atravessando um mal que é muito mais forte, não se curvou, não se intimidou e veio para cá dizer "estou presente".

V. Exª relembra a época da Constituinte, ainda há pouco citou as pequenas e médias empresas, cuja inserção na Constituição de 88, através de uma emenda do então Constituinte Afif Domingos, foi aprovada - e teve a minha aprovação, como Relator -, e às quais, ainda ontem, o Senador José Sarney fazia referência no discurso que pronunciou ao final da tarde, sobre a maldade que se comete contra esse projeto, porque ele é oriundo do Senado.

Acolho o aparte de V. Exª e, como nas vezes da nossa Assembléia Nacional Constituinte, podemos divergir na matéria mas, no fundo, temos sempre, no conteúdo, as mãos dadas, lutando em favor da sociedade. Muito obrigado, Senadora Benedita.

O Sr. Osmar Dias - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Quero ter o prazer de ouvir V. Exª, Senador Osmar Dias, antes de prosseguir.

O Sr. Osmar Dias - Senador Bernardo Cabral, eu estava em meu gabinete quando V. Exª iniciou o seu pronunciamento. Imediatamente, vim ao plenário para solidarizar-me com V. Exª, porque, como disse a Senadora Benedita da Silva, não é V. Exª um dos mais assíduos. No ano passado, V. Exª compareceu a 98% das sessão deliberativas do Senado, estando ausente apenas de uma, por compromissos que, sei, teve em seu Estado. A presença de V. Exª na tribuna desta Casa é constante e traz assuntos de relevância para o País. Principalmente por ter sido o Relator da Constituição, em 1988, tem sido fundamental a presença de V. Exª no Senado para nos orientar nas discussões das emendas que estamos votando, aqui, à Constituição, que deve ser, sim, reformada. Pelo menos, eu sigo constantemente a sua orientação, pelo vasto conhecimento que V. Exª tem não apenas da Constituição, mas das leis em geral. Também sou daqueles que acham que o Senado, durante a convocação extraordinária, trabalhou, e trabalhou muito. Não fossem os entraves regimentais, com certeza teríamos avançado mais. No entanto, mesmo destacando apenas três matérias que foram aqui discutidas e votadas, é de se notar que valeu a pena esta convocação. De um dos projetos tive a honra de ser o Relator, na Comissão de Assuntos Econômicos. Aprovamos, aqui, a privatização do serviço de telefonia celular e a sua abertura para o capital externo, o que vai ensejar investimentos da maior importância para o País, não apenas porque vai gerar empregos, mas porque vai tornar a nossa economia mais competitiva. Estudos de consultores internacionais demonstram que a abertura do mercado da telefonia celular permitirá a melhoria da qualidade, a modernização, a equiparação com os países mais desenvolvidos e, assim, um crescimento da nossa atividade econômica em 10%, com crescimento, portanto, de 10% no nível de emprego. Somente este projeto já justificaria, Senador Bernardo Cabral, a convocação extraordinária. Votamos, em primeiro turno, o Código de Trânsito, inclusive com a participação de V. Exª, que fez inúmeras sugestões para o aperfeiçoamento desse código, importante para todos os cidadão brasileiros. Votamos o estatuto e a nova regulamentação das micros e pequenas empresas. Somente esses três projetos já justificariam a nossa permanência aqui em Brasília. Trabalhamos, sim, e trabalhamos muito. Mas há equívocos, Senador Bernardo Cabral, e não costumo perder a ética, mas jamais deixo de ser sincero. Vi uma análise do DIAP e gostaria de aproveitar o momento para fazer um comentário. Nela foram citados 100 Parlamentares como sendo políticos de destaque. Do Paraná apareceu um Senador, e aí sim é que me impressiono, porque a imprensa não enxerga os que não comparecem ao Senado. O meu lado esquerdo, Senador Bernardo Cabral, está sempre vazio! E a imprensa não diz que o meu lado esquerdo jamais foi preenchido, em nenhuma votação importante! E lá está o Senador José Eduardo Andrade Vieira como um dos cabeças do Senado, como grande articulador. Devo concordar com o DIAP. Ele é um grande articulador, sim! Articulador do Proer, articulador do Proer para o seu banco e articulador de bons negócios, que podem resultar na compra da sua carteira imobiliária pela Caixa Econômica Federal; a carteira imobiliária de um banco que não pertence, repito, ao povo do Paraná - desculpem-me os hipócritas: o Bamerindus pertence ao ex-Senador José Eduardo Vieira, e ele é um grande articulador em favor do seu Banco e dos seus negócios. Parabéns, Senador Bernardo Cabral, pelo seu pronunciamento, mas parabéns por defender esta instituição que V. Exª honra e que nos honra a todos.

O SR. BERNARDO CABRAL - Senador Osmar Dias, em primeiro lugar, agradeço o aparte de V. Exª. Em segundo, quero reparar uma omissão que V. Exª faz propositadamente: omitiu que o Parlamentar mais assíduo no ano passado foi V. Exª. O nobre Senador Osmar Dias, Sr. Presidente, ganhou de mim por ter uma presença a mais, porque a minha única falta foi por ocasião do falecimento do meu irmão, quando tive que ir a Manaus para o enterro.

A Imprensa, contudo, não registrou a assiduidade do eminente Senador Osmar Dias, que, agora, faz um registro que não fere a ética, mas que promove um desabafo, que comprova uma assertiva. Não importa se os lá de fora não sabem quais os que fazem presença nesta Casa. Os que estão aqui sabem muito bem quais os colegas que trabalham, que produzem, que emitem opinião, que discutem, que votam, que discordam, que somam e que tantas vezes fazem críticas construtivas.

Quando eu me referia ao Código Nacional de Trânsito que está em estudo, eu tinha certeza de que, na concessão dos apartes, eu perderia a chance de abordar dois assuntos sobre os quais eu gostaria de falar, porque há tantos talentos nesta Casa que eles não deixam passar a oportunidade. O primeiro aparte foi da Senadora Benedita da Silva, que lembrou o estatuto das micros e médias empresas; depois, foi o do Senador Osmar Dias, que lembrou, com muita propriedade, o problema das telecomunicações.

É preciso, é necessário, impende reagir contra a forma discriminada com que se pretende destruir o que há de mais forte numa democracia, que é o Poder Legislativo.

Sr. Presidente, tenho dito aqui que precisamos ter a Imprensa como aliada. Observem que, quando uma parte não funciona, a outra é amordaçada; quando uma não reclama, a outra não tem como registrar. No entanto, parece que há uma produção disseminada no sentido de sempre fornecer notícias ou plantar aquelas que não merecem ser chamadas de notícias, como se verdadeiras fossem, o que diminui, reduz a potencialidade daqueles que trabalham.

Digo isso porque não sou um novato no Legislativo. Como dizia no começo do meu discurso - e quero me valer dele para o encerramento -, a cada instante que se constrói passo a passo o edifício da democracia, se um dos pilares, que é exatamente o Poder Legislativo, for dele retirado, o edifício desabará com os outros dois, porque o Executivo tornar-se-á um ditador, e o Judiciário ficará amordaçado.

O Sr. Josaphat Marinho - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Com muita honra, Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador Bernardo Cabral, V. Exª cuida do problema do fortalecimento do Poder Legislativo. Faz bem em situar o problema. Na verdade, o Poder Legislativo, no Brasil, sofre injustiças e justifica críticas. Nem tudo que aqui se faz é devidamente noticiado, essa é a realidade. Os trabalhos permanentes da Casa não são devidamente acompanhados e levados à opinião pública, só os assuntos excepcionais ou os que causam escândalos. Os trabalhos ordinários, constantes, permanentes, das Comissões, por exemplo, são inteiramente desconhecidos da grande opinião. Não se julga, no Brasil, que há um dever de informar independentemente da aceitação das teses defendidas. Isso é grave para o Congresso Nacional. Mas, por outro lado, o Congresso Nacional justifica críticas que não deveriam ocorrer; ocorrem, porém, pela sua falta de autodefesa. Toda vez que é preciso agradar o Governo, o Poder Legislativo cede contra a sua própria autoridade. Esta semana, os jornais noticiaram, quase todos os dias, que os relatores das próximas emendas constitucionais que aqui vão chegar não serão escolhidos pela forma regimental, mas de acordo com os entendimentos entre os partidos, sobretudo com o interesse da posição oficial do Governo. Ora, o que é regulado normalmente pela Casa não pode ser objeto de transações. Pouco importa ao Congresso Nacional que, na forma do Regimento, seja designado relator alguém que não comungue com as práticas do Governo, com a sua orientação. Devem prevalecer as normas regimentais da Casa. À maioria cabe o dever de resistir ao parecer que seja porventura contrário. Mas é preciso assegurar a prática normal. Na medida em que o homem comum lê que as escolhas dos relatores, em relação aos assuntos fundamentais, não obedecem regularmente à disciplina da Casa, mas ao interesse político, sobretudo ao interesse do Governo, descrê da seriedade do Poder Legislativo. Isso precisa ser corrigido. Não é apenas a injustiça que se faça a determinados Parlamentares, o problema não é tanto de natureza individual, mas é de caráter institucional. Uma vez, no exílio, num dos seus longos exílios - foram dois -, Octávio Mangabeira fez uma reflexão e escreveu: "Foi a teoria das acomodações ilimitadas que aluiu no Brasil a política e os políticos." Continua aluindo. Muito obrigado.

O SR. BERNARDO CABRAL - Senador Josaphat Marinho, no início deste despretensioso discurso, eu dizia que aqui chegava muito moço e, portanto, no ano de 1967, eu podia me dar o direito de fazer esse exercício sobre o fortalecimento do Poder Legislativo - lá se vão quase 30 anos!

O Senador Josaphat Marinho era Senador à época. A partir daí, nasceu uma amizade entre mim e S. Exª do tipo suficientemente forte para vencer o tempo, a distância e o silêncio. Ele, como Senador, e eu, como Deputado Federal, fazíamos parte de algumas comissões mistas do Congresso.

Veja V. Exª, Sr. Presidente, que o depoimento do eminente Senador Josaphat Marinho se casa exatamente com o meu. Evidentemente há uma diferença entre a lamparina e o sol; S. Exª, o sol; eu, a lamparina. Mas a lamparina também dá alguma luz, também clareia. Vê-se que ambos defendemos a instituição.

Não importam as pedras que são dirigidas a este ou àquele Parlamentar. O que é preciso é não deixar soçobrar o Poder Legislativo. Parlamento fechado é sinônimo de ditadura, em pleno apogeu.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço V. Exª com muita honra, Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres - Senador Bernardo Cabral, seguindo a mesma linha do eminente Senador Josaphat Marinho e de V. Exª neste pronunciamento, digo que é verdade que a imprensa freqüentemente é injusta conosco: não reconhece, não ressalta o trabalho silencioso e quase subterrâneo das comissões, por exemplo. O que se faz de bom neste Congresso não é enfatizado, mas todas as falhas são divulgadas com enorme estardalhaço. No entanto, Senador Bernardo Cabral, não há dúvida - V. Exª reconhece isto - de que o Congresso também tem pecados.

O SR. BERNARDO CABRAL - Sem nenhuma dúvida.

O Sr. Jefferson Péres - Devemos ser autocríticos; jamais nos rendemos ao corporativismo. O Senador Josaphat Marinho critica, com toda a razão, o fato de que, segundo noticiou a imprensa, os relatores dos projetos foram escolhidos no Planalto. Penso que, dessa forma, o Congresso abdica dos seus poderes e até da sua dignidade. Senador Bernardo Cabral, as medidas provisórias, enxurradas delas, são reeditadas, sem que o Congresso nada faça para pôr cobro nisso, o que realmente depõe muito contra a Instituição. Ontem, li as conclusões, as recomendações da Comissão da CPI do Orçamento a respeito da sistematização que deve ser feita no Orçamento, e até hoje não a fizemos, Senador Bernardo Cabral. Há uma semana estou colhendo assinaturas - e V. Exª foi o segundo subscritor - para a criação de uma comissão parlamentar de inquérito para apurar denúncias não de favorecimento político, mas de intermediações nas liberações de verbas. Esse requerimento encalhou em 23 assinaturas. Os Srs. Senadores concordam com a criação da CPI, consideram-na necessária, mas, como o Planalto não quer, não assinam. Isso significa autocastração do Congresso, Senador Bernardo Cabral. Portanto, embora a imprensa seja muitas vezes injusta, somos muito complacentes com nós mesmos.

O SR. BERNARDO CABRAL - Eminente Senador Jefferson Péres, os que recusam a assinatura apesar de concordarem esquecem-se daquele cidadão que, à época da Monarquia, ao tentarem que ele sucumbisse ao desejo do Imperador, disse: "Tudo ao Imperador, menos a minha consciência". Esses deveriam estar lembrados de que a consciência não se deve dar a quem quer que esteja à frente da Presidência da República.

Ao concluir, Sr. Presidente, em primeiro lugar, agradeço a V. Exª pela paciência, uma vez que meu tempo já terminou há muito, e aos eminentes Senadores que me apartearam e que me ouviram. Finalmente, conclamo que se faça distinção entre o joio e o trigo. Há bons parlamentares, há parlamentares regulares, e pode haver maus parlamentares; o que não se pode é levar a Instituição, o Poder Legislativo, ao descrédito da população brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/07/1996 - Página 13282