Discurso no Senado Federal

INSEGURANÇA DOS SERVIDORES DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS BRASILEIRAS DECORRENTE DE ATO ADMINISTRATIVO DA SECRETARIA DE RECURSOS HUMANOS DO MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO QUE DETERMINA A REVISÃO DE SEUS SALARIOS.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • INSEGURANÇA DOS SERVIDORES DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS BRASILEIRAS DECORRENTE DE ATO ADMINISTRATIVO DA SECRETARIA DE RECURSOS HUMANOS DO MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO QUE DETERMINA A REVISÃO DE SEUS SALARIOS.
Aparteantes
Totó Cavalcante.
Publicação
Publicação no DSF de 27/07/1996 - Página 13310
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, LEGALIDADE, ATO ADMINISTRATIVO, SECRETARIA, RECURSOS HUMANOS, MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), DETERMINAÇÃO, REVISÃO, SALARIO, SERVIDOR, SERVIÇO ATIVO, APOSENTADO, UNIVERSIDADE FEDERAL, DESCUMPRIMENTO, PRINCIPIO CONSTITUCIONAL, RESPEITO, DIREITO ADQUIRIDO.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, servidores das universidades federais de diferentes categorias estão submetidos, neste instante, a uma enorme insegurança com relação a seus direitos de remuneração.

Lamento que, a esta hora, não estejam presentes no plenário os nobres Líderes do Governo, porque desejaria lhes fazer o apelo de que levassem a matéria ao conhecimento do Poder Executivo, na tentativa de uma solução razoável.

Ocupo, entretanto, a tribuna, neste momento, porque o Ofício-Circular nº 30, de 11 de julho corrente, baixado pela Secretaria de Recursos Humanos do Ministério da Administração, deve produzir efeitos a partir do mês de agosto.

Cumpro, portanto, o dever de examinar a matéria, para que não se consuma grave ilegalidade contra servidores em atividade e aposentados.

Em primeiro lugar, o ofício-circular baixado é curioso, porque não é um ato do Ministro. É um ato do Secretário de Recursos Humanos, e que começa por assinalar a necessidade de uniformizar os procedimentos em relação ao pagamento dos proventos dos que se aposentaram - atente bem o Senado - até 31 de outubro de 1991.

Prossegue assinalando que o Tribunal de Contas da União, respondendo a consulta que lhe foi feita sobre os efeitos da Lei nº 8.168, de 1991, assevera dito que "não há mais razão para se utilizar os parâmetros definidos pela Portaria MEC nº 474/87."

Prossegue o ofício: "...a Portaria MEC nº 474/87 não poderia majorar valores remuneratórios e que não existe respaldo legal para as incorporações de Funções de Confiança - FC".

Continua o ofício assinalando que sendo a Função Comissionada - FC, um cargo em comissão, de natureza transitória, não se lhe aplica "o princípio da irredutibilidade de que tratam os dispositivos constitucionais antes citados...".

Por fim, declara: considerando ainda as disposições da Súmula nº 473 do STF e do art. 114 da Lei nº 8.112/90, que determinam - diz o ofício - que a administração reveja os seus atos a qualquer tempo, conclui por esses fundamentos:

      "1 - Tornar sem efeito a orientação contida na letra e - deve referir-se ao Decreto nº 322 de 1991; .

      2 - Acrescentar as seguintes orientações:

      m - Efetuar a correlação da Função Comissionada-FC, exercida à época, com o Cargo de Direção - CD, ou Função Gratificada - FG correspondente.

      n -Proceder à revisão dos valores devidos a partir da folha de pagamento do mês de agosto de 1996."

Como se vê, por um ofício circular, baixado pelo Secretário de Recursos Humanos do Ministério da Administração, foi determinada a revisão de valores salariais concedidos na conformidade da legislação então vigente, e assim fixados segundo orientação ou interpretação estabelecida por portarias, circulares, atos, enfim, do Ministério da Educação, o órgão competente para regular a matéria.

Frise-se bem: o ofício não está determinando a fixação de valores, apenas, a partir da nova legislação, diversamente do que se fazia antes. Está ordenando que, a partir de agosto, se façam as revisões de vencimentos e proventos concedidos de acordo com a legislação anterior, e na forma pela qual o Ministério da Educação interpretou.

Pergunta-se: que decidiu o Tribunal de Contas na deliberação invocada pelo ofício? Aqui está a decisão:

      Decisão nº 322/95-TCU - Plenário

      O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE:

      8.1. conhecer da consulta do Ministério da Administração, na forma do disposto no art. 216 do Regimento Interno, para responder à autoridade consulente que:

      8.1.1 a partir dos efeitos financeiros da Lei nº 8.168/91, não há mais razão mais para se utilizar os parâmetros definidos pela Portaria MEC nº 474/87, referente à remuneração da Função de Confiança-FC;

      8.1.2 efetuada a transformação da Função de Confiança-FC em Cargo de Direção-CD ou em Função Gratificada-FC, é devida a GADF de que trata o art. 14 da Lei Delegada nº13/92 (cf. art. 5º da Lei nº 8.538/92);

      8.1.3. o pagamento de quintos dever ser feito com base no valor do Cargo de Direção-CD ou da Função Gratificada-FG, em que foi transformada a Função Comissionada-FC, e não nos parâmetros da Portaria nº 474/87. Observar, no caso dos servidores ex-celetistas, que os efeitos financeiros da incorporação dos referidos quintos são contados a partir da publicação da Lei nº 8.911/94, sem prejuízo de considerar o disposto na Medida Provisória nº 831 de 18/01/1995 e reedições posteriores;

      8.1.4. os parâmetros de cálculo da GADF são os estabelecidos nos arts. 14 (caput) e 15 da Lei Delegada nº 13/92, com as alterações introduzidas pelo art. 10 da Lei nº 8.622/93;

É evidente, pelo texto dessa decisão, que se está referindo a vantagens que venham a ser deferidas após a vigência das leis mencionadas. Em nenhuma parte dessa decisão se faz menção ao poder de rever o Governo, administrativamente, situações consolidadas no patrimônio dos servidores em atividade ou aposentados.

O Ministro da Administração, inconformado com esse decisório, dele pediu revisão. O Tribunal de Contas, nos termos da Decisão nº 064, de 1996, responde "não conhecer do pedido de reexame, interposto contra a Decisão nº 322/95 deste Plenário, ante a ausência de previsão legal e regimental."

Logo, o Tribunal de Contas, não conhecendo do pedido de revisão, confirmou a decisão que o Ministério da Administração desejava ver modificada.

Apenas se verifica que assessores do Tribunal, ao opinarem, fizeram menção a outro entendimento do Tribunal, que permitiria a revisão de vencimento e de proventos, até invocando o art. 40, § 4º, da Constituição. Mas convém relembrar esse dispositivo que os assessores invocaram:

      Os proventos da aposentadoria serão revistos na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos inativos quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria, na forma da lei.

A quem leia, com olhos de ver, é meridiano que a Constituição quis assegurar aos aposentados todas as vantagens que adviessem da revisão; e não cuidar de reduzir vantagens de aposentados em face de discussão sobre a situação de funcionários em atividade. Apenas saliento, de passagem, essa circunstância, porque, em verdade, o Tribunal não tomou conhecimento desse tipo de informação, porque deliberou não conhecer do pedido de revisão.

Foi mantida, assim, a decisão 322 que, pelas referências que faz a leis de 1991, 1992, etc, somente cuida, claramente, de situações que viessem a ocorrer. Nem poderia ser diferente, porque a lei fundamental, em torno deste assunto, é o novo estatuto, que traça o Regime Jurídico dos Servidores Públicos, a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, a qual declara, em sua parte final, no art. 252:

      "Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, com efeitos financeiros a partir do primeiro dia do mês subseqüente.

Sendo a lei de 11 de dezembro de 1990, evidentemente os seus efeitos financeiros seriam a partir de janeiro de 1991.

No art. 253 declara: "Ficam revogadas as leis nºs. 1.711, de 28 de outubro de 1952" - o antigo Estatuto dos Funcionários Públicos - "e respectiva legislação complementar, bem como as demais disposições em contrário". Logo, essa lei dispôs - e não poderia dispor de outro modo - para vigorar a partir da data de sua publicação e, em seguida, revogou a legislação peculiar preexistente.

Natural é compreender-se que a lei dispôs para o futuro - "a partir da data de sua vigência" - e teve cuidado o legislador de dizer que os efeitos financeiros dela se verificariam a partir do primeiro dia do mês subseqüente, ou seja, 1º de janeiro de 1991.

Não obstante isso, o Ministério da Administração, deslocando para a sua competência assuntos que deveriam ser da jurisdição do Ministério da Educação, está promovendo a alteração ilimitada de vencimentos e proventos concedidos, sob o fundamento de que - e isso está dito no ofício circular que li de início - as leis então vigentes não permitiam a interpretação dada pelas normas que foram baixadas pela própria Administração Federal.

Como isso é possível, Sr. Presidente? Como se há de entender tamanha insegurança, Srªs e Srs. Senadores? Como, se a Constituição, no art. 5º, XXXVI, declara que a lei não pode atingir o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada? Como se há de admitir que funcionários que estão percebendo vencimentos há cinco, seis e mais anos, com fundamento na interpretação que as autoridades federais deram a essas normas, possam ter suas vantagens agora reduzidas, sob o fundamento de ilegalidade? Onde está a garantia do direito adquirido, estabelecido na Constituição?

Mas o autor do ofício circular, ainda invocou a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal, interpretando-a como se ditasse ao Poder Administrativo a revisão daqueles atos. Veja-se o texto da Súmula nº 473:

      "A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a aplicação judicial."

Em primeiro lugar, note-se que a Súmula não ordena, mas autoriza e, ao autorizar, distingue duas situações: a de anulação do ato administrativo e a de revogação do ato administrativo. Quando trata da nulidade do ato administrativo, diz que "a Administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos". Não se trata disso no caso.

Atente-se em que a Administração não anulou nenhum ato, sob o fundamento de ilegalidade. A Administração está tentando modificar atos que foram praticados não pelo funcionário unilateralmente, mas pela Administração que interpretou as leis vigentes.

Dir-se-á: mas não haverá, então, o caso de revogação? Pelo que pude expor, invocando os textos oficiais, o Governo não revogou os seus atos e nem quer revogá-los. Está querendo, por medidas administrativas, alterar vantagens concedidas a funcionários em atividade e a servidores já aposentados. Mas o que a Súmula também permite, é a revogação, de atos por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. E a Administração, por intermédio do Ministério da Administração, não quer respeitar a barreira dos direitos adquiridos.

O que se pretende fazer é violência contra os servidores, é modificação que ofende a garantia do direito adquirido estabelecido na Constituição.

Não quero conduzir o debate para crítica acerba à Administração. Quero concorrer para uma solução adequada. Como disse de princípio, se aqui estivessem os Líderes, eu lhes faria pessoalmente o apelo. Como aqui não se encontram, terei o cuidado de encaminhar-lhes oportunamente, mas com a brevidade possível, o texto deste pronunciamento, pedindo-lhes que assumam a responsabilidade de levar ao Governo as ponderações cabíveis em favor de toda uma comunidade de servidores das universidades federais no País.

Sugiro, então, que os ilustres Líderes proponham ao Ministério da Administração chamar a participar das deliberações o Ministério da Educação, autor de muitas das interpretações consubstanciadas em portarias e circulares e por meio das quais os funcionários tiveram aquelas vantagens asseguradas. Em segundo lugar, que se faça participar da discussão da matéria representante das universidades federais, que pudesse oferecer à administração os subsídios indispensáveis à demonstração de que os servidores não são culpados do que se fez, mas receberam vantagens, e muitos estão recebendo há mais de cinco anos, por efeito de interpretações da administração federal, sobretudo no Ministério da Educação. E, por fim, que, para evitar pareceres impróprios, o Ministério da Administração convidasse a participar desse exame conjunto o Advogado-Geral da União.

Era essa a proposta que faria, ou que faço, e que, com esse pronunciamento, ao ser encaminhado aos Líderes, será levado ao conhecimento do Governo.

O Sr. Totó Cavalcante - Senador Josaphat Marinho, V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª tem o aparte.

O Sr. Totó Cavalcante - Antes de mais nada, Senador e mestre Josaphat, quero cumprimentá-lo pela grande aula jurídica que nesta Casa faz hoje, em especial sobre esse conflito entre o espírito da Lei Mãe e as adaptações, resultantes do jogo de interesses, no disciplinamento da matéria. Acompanhando atentamente V. Exª, vejo que às vezes aqui edificamos, construímos a moldura de uma lei com o sentido de beneficiar a sociedade e autorizamos determinados setores a discipliná-la. A exemplo, a lei de securitização aprovada - ainda anteontem eu debatia isso no meu Estado, Tocantins - determina que seja utilizado o critério da equivalência-produto. No entanto, uma resolução do Banco Central limita a utilização da equivalência/produto apenas para o milho e a soja, enquanto a lei mãe inclui o algodão, o feijão, o arroz, o trigo, o milho e a soja. Ora, aqui aprovamos essa lei dando liberdade ao produtor para que ele exercitasse o livre arbítrio, na sua negociação, de acordo com a sua necessidade de plantio e colheita. No entanto, o Banco Central disciplina que aquelas casas de crédito só façam a securitização, em especial os agropecuaristas, para o milho e a soja. Cumprimento V. Exª por esse alerta em defesa dos professores. Porém, quero aproveitar esta oportunidade para lembrar à Nação que os terminais na aplicação de determinadas leis, que autorizamos determinados setores a disciplinar, vêm contrariar o princípio da lei mãe, que abre em benefício da própria sociedade brasileira. V. Exª está de parabéns com o seu pronunciamento, meu querido mestre!

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Muito obrigado, nobre Senador Totó Cavalcante. O seu aparte, complementando o que acabo de observar, demonstra que o equívoco de interpretações se vai desdobrando dentro da administração noutros aspectos ou noutros setores. É disso que precisamos alertar a administração. O poder de interpretar as leis não envolve o de subvertê-las. O poder de rever atos administrativos não pode contrariar o princípio constitucional do respeito ao direito adquirido.

Daí as ponderações que acabo de trazer, para conhecimento do Governo. Como o ato prevê que os seus efeitos se dêem a partir de agosto, ou seja, que as folhas de agosto já sejam elaboradas com as alterações nele determinadas, é imperioso que os nobres Líderes, atentando nessa violência - como acaba de dizer o Senador Bernardo Cabral -, ponderem ao Ministro da Administração a propriedade de suspender a execução desse ato, até que aquele estudo conjunto seja feito e conclusões razoáveis possam ser elaboradas, em defesa da administração e em respeito também aos direitos dos servidores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/07/1996 - Página 13310