Discurso no Senado Federal

ASSASSINATO DE UM INDIO POR POLICIAIS MILITARES NO MUNICIPIO DE FEIJO, NO ESTADO DO ACRE.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • ASSASSINATO DE UM INDIO POR POLICIAIS MILITARES NO MUNICIPIO DE FEIJO, NO ESTADO DO ACRE.
Publicação
Publicação no DSF de 17/07/1996 - Página 12160
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • REGISTRO, HOMICIDIO, INDIO, RESPONSABILIDADE, POLICIAL MILITAR, MUNICIPIO, FEIJO (AC), ESTADO DO ACRE (AC).
  • APREENSÃO, IMPUNIDADE, CRIME, DISCRIMINAÇÃO, INDIO, NECESSIDADE, COORDENAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), AMBITO NACIONAL, DEFESA, COMUNIDADE INDIGENA.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, primeiro, quero fazer um registro doloroso: no Município de Feijó foi assassinado um índio pela Polícia Militar, e mais duas pessoas foram vítimas de agressão.

O relato que temos é o de que os PMs estavam fazendo uma pescaria, completamente embriagados, e os índios estavam numa atividade de venda dos seus produtos artesanais.

Quando foram percebidos pelos policiais, os índios, como sempre, ficaram um pouco intimidados, principalmente porque a violência policial no Estado do Acre, em face do problema da impunidade que vem sendo praticada, assume um caráter quase gigantesco da família que tem fugido ao controle das autoridades instituídas.

Sabemos que, nestes últimos dias, o Estado do Acre vem sendo vítima de uma série de episódios envolvendo violência inclusive com assassinatos de pessoas, algo que é bastante lamentável.

Esse episódio tem uma conotação bastante grave na medida em que os policiais, segundo informações que temos, agrediram os índios de forma gratuita. Os homens estavam numa pescaria, e os índios nas suas atividades de comercializar os seus artesanatos, uma das suas ocupações com as quais contam para conseguir algum tipo de recurso. O índio Raimundo Silvino foi morto durante a discussão e os irmãos José Nicolau e José Augustinho Brandão foram feridos quando tentaram correr para uma espécie de matagal.

No caso, a própria Funai ainda não se pronunciou a respeito do fato, mas está me preocupando o fato de que já estão construindo uma versão na qual os policiais agiram em legítima defesa. Registro aqui, de forma inicial, o acontecido, porque não temos ainda o relatório da Funai. O próprio delegado de polícia não fez todo o registro com relação à questão da queixa. Os homens não estão presos pela Polícia Civil, mas no quartel, porque não foram pegos em flagrante.

A minha preocupação é a de que se crie uma versão para isentar os policiais do crime praticado, da irresponsabilidade praticada contra a vida de pessoas indefesas econômica e socialmente e ainda mais no que se refere aos seus direitos elementares, o direito à vida.

Sabemos que, infelizmente, no País todo, há um preconceito muito grande contra as populações indígenas. Quando se trata de policiais inescrupulosos, sem nenhum respeito aos direitos humanos, esse preconceito é muito maior. Existem muitos, não são todos - devo respeitar aqueles que são bons policiais e, graças a Deus, nós os temos em nosso estado -, mas há aqueles que, quando estão de posse de uma arma, fazem questão de mostrar que querem ser valentes duas vezes. Duas vezes porque, para mim, a valentia é aquela cidadão que luta por seus direitos, e não a do cidadão que tenta coibir e massacrar os direitos alheios. Esses, ultimamente, têm realmente mostrado esse tipo de desvio de caráter e merecem toda a punição por parte da justiça.

Gostaria inclusive, Sr. Presidente, de deixar bem clara a minha posição de que a Fundação Nacional do Índio, a Funai, deva, daqui de Brasília, coordenar todo o processo de defesa da família, dos índios, da comunidade, para que não fique apenas na responsabilidade da Funai do Estado do Acre, porque senão, mais uma vez, teremos a impunidade grassando naquele estado, inclusive sendo vítimas essas pessoas que, como já disse, são indefesas, permanecendo assim porque muitos não se importam de a violência acontecer com comunidades indígenas. Inclusive há uma visão preconceituosa de que os índios são responsáveis pelo atraso da Região Amazônica, quando considero serem eles os responsáveis pelo que há de mais avançado: conservar, a duras penas, o seu espaço historicamente determinado por lei.

Faço esse registro com muita tristeza. Da minha parte, envidarei todos os esforços para que sejam feitas as devidas investigações para que os policiais sejam punidos e que a Funai tenha o devido empenho na defesa dos familiares dessa comunidade. Só assim, evitaremos mais um caso em que se cria uma versão do crime, quando os que ceifaram a vida de pessoas inocentes continuam a vagar, impunemente, pela cidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/07/1996 - Página 12160