Discurso no Senado Federal

RELATORIO DA ONU SOBRE O INDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL. ANALISE DO DESENVOLVIMENTO DO ESTADO DA PARAIBA.

Autor
Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • RELATORIO DA ONU SOBRE O INDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL. ANALISE DO DESENVOLVIMENTO DO ESTADO DA PARAIBA.
Publicação
Publicação no DSF de 24/07/1996 - Página 12979
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), INDICE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, HOMEM, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), NECESSIDADE, CRIAÇÃO, POLITICA NACIONAL, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REGIÃO NORDESTE.
  • ANALISE, ESFORÇO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DA PARAIBA (PB), DESENVOLVIMENTO SOCIAL.

O SR. RONALDO CUNHA LIMA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o fato que recebe atualmente tratamento de destaque na imprensa nacional é a divulgação do último relatório da ONU/IPEA sobre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) no Brasil. É a face do Brasil que, apesar de vivida e conhecida durante toda nossa história, aflorou com um semblante amargo. Percebemos, por outro lado, uma Nação empobrecida pela situação econômica vivida na década de 80. Os anos 80 deixaram marcas que a política econômica governamental não pode olvidar.

Apesar de não refletir o exato momento em que vivemos, como sói acontecer às análises que envolvem componentes sociais, a pesquisa da ONU suscitou um debate para o qual a grande imprensa chama a atenção do País.

Parece inusitada a reação quando se constata que os índices encontrados nas Regiões Norte e Nordeste mostram a face mais aguda do Brasil. O nosso repertório bibliográfico de muito oferece o cenário que se projetou. Ora somos uma mistura de Bélgica e Índia - a Belíndia -, mostrando a coexistência de regiões capazes economicamente com outras paupérrimas, ora somos "Os dois Brasis", como enxergou Lambert.

Acostumado ao permanente contato com o povo, a atividade política nos deixou legado da observação crítica da realidade em que vivemos. Já na campanha eleitoral de 1990, revelávamos dados do quadro desolador que assistimos em toda a Paraíba. Na oportunidade da posse como Governador do Estado, dizíamos: "Os números do empobrecimento gradativo estão na vida do povo e nenhuma pirâmide, por mais faraônica que seja, conseguirá afastar de nossa gente o travo de suas próprias e crescentes dificuldades: desemprego, fome, miséria e desencanto, agricultura desorganizada, indústria sem apoio, comércio sem estímulo, crianças sem escolas e escolas sem alunos, números inaceitáveis de óbitos infantis - a menor esperança de vida dentro de todo o Nordeste. De cada mil crianças nascidas vivas, 175 morriam antes de completar um ano de vida". Encontrar planos para atenuar esses dados constitui-se numa meta de governo, cujos resultados primeiros apuramos já no ano de 1994, quando esse quadro desolador já havia sido reduzido à metade.

Constata-se agora que os dados mostrados no Relatório não são surpreendentes, mas, de tão insistentes, são aviltantes à nossa convivência comum.

A metodologia utilizada para aferir o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH - adota também critérios que consideram a cidadania, abandonando a ortodoxia até então aplicada, que levava em conta apenas as vertentes estritamente econômicas.

Os números tabulados foram coligidos do censo realizado em 1991, e que refletem o Brasil, o Nordeste e a Paraíba até 1990. O Anexo Estatístico contém 17 tabelas e em todas elas as datas referem-se a anos anteriores a 1991, voltando, em alguns casos, a 1980. Quando trata de anos posteriores a 1991, os dados resultam de estimativas. Tudo isso consta das tabelas em anexo retiradas do Relatório Sobre o Desenvolvimento Humano/1996.

Ao pretender incentivar novos modelos de políticas desenvolvimentistas, a pesquisa revela também o Brasil pecador. As desigualdades regionais afloram de uma forma aviltante, e mesmo elevada à sede constitucional, a implantação de uma política regional não foi levada ainda a efeito. Daí o Nordeste ser parte constante do quadro de miséria.

É certo inferir também, em uma visão diferente da apresentada pelo Relatório da ONU/IPEA, que, como o Brasil, o Nordeste não é um todo homogênico. Algumas ações foram desenvolvidas e já têm resultados práticos, enquanto outras aguardam concretização dos seus efeitos. Não basta estancar um momento como amostragem para explicar a história. Embora não seja possível parar a ação social para examiná-la, a análise dinâmica observará movimentos de longo prazo, e aí o resultado buscará com mais exatidão a verdade. Também é bom que se diga que alguns índices têm resultados relativos favoráveis ao Nordeste, perdendo-se na confecção dos dados gerais.

Malgrada a sorte que mereceram a Paraíba e o Nordeste na década de 80, e respeitados os índices demonstrados pela ONU para uma revisão de políticas públicas para o Nordeste, "não há como escapar a lógica: em qualquer parte do mundo, em um determinado instante de tempo, regiões deprimidas apresentam indicadores sociais e econômicos desfavoráveis relativamente a regiões mais avançadas. E é exatamente por causa dessa inexorável verdade que os países formulam políticas de atenuação de disparidades regionais, buscando maior convergência desses indicadores", como observou o Professor Maurício Costa Romão ao analisar o Relatório.

Srªs. e Srs. Senadores, a urgência de formular uma nova política para o Nordeste tem a participação efetiva desta Casa que inclusive já constituiu Comissão Especial para propor alternativas. A imprensa tem dado o destaque merecido ao Relatório. O jornal Folha de S. Paulo dá a interpretação oportuna, na sua edição de 18 de junho último, e afirma:

      "O Relatório sobre o Desenvolvimento Humano no Brasil divulgado ontem é inédito. Nunca havia sido feita uma radiografia tão detalhada da situação no País...Os dados do relatório se referem ao ano de 1991..."

E acrescenta a opinião de um dos responsáveis pelo trabalho:

      "Os investimentos que foram feitos desde 1991 só vão começar a surtir efeito a partir de agora...As estatísticas mais recentes sobre mortalidade materna e mortalidade infantil são de 1989 e 1991."

À ONU e ao IPEA devemos nossas mais escolhidas gratidões pelo trabalho levado a efeito. Os órgãos governamentais, em especial o IBGE, não podem ser excluídos de uma participação mais efetiva. A mensuração de políticas públicas deve atender as conjunturas em estrita obediência aos elementos estruturais.

A modernidade dos meios de informação e captação de dados já nos permite maiores empreendimentos para observação da realidade social. Uma ação conjunta dos entes federativos permitirá a formulação de planos e projetos que combinem todas as regiões em um equilíbrio harmônico e isonômico, onde se respeitem diferenças, que clamam solidariedade, sejam elas resultantes de um dado momento ou de caráter permanente.

A Paraíba, de uma maneira especial, já comporta nos dias atuais melhores atenções. No primeiro quartel da década que vivemos, o Estado empreendeu planos de governo que ainda requerem maior avaliação crítica com relação aos seus efeitos. O ente governamental se comporta, a partir de 1991, e até hoje, com mais acuidade e responsabilidade à conta de uma rígida atuação para obter viabilidade administrativa.

Os índices de miséria que se mostram, mesmo que não reflitam a situação atual - os dados são de 1991 - chamam a atenção para uma atividade conjunta dos poderes públicos. À custa de um esforço ímpar, viabilizamos a abertura do Banco do Estado, como instituição financeira de fomento; para mitigar os efeitos danosos do déficit no ensino fundamental, implantamos um programa de oferta plena de vagas, de maneira a não ensejar falta de oportunidades; medidas de incentivo a pequenos empreendimentos buscavam amenizar o desemprego; na área da saúde pública, ainda são presentes os programas "Chegou o Doutor" e de Agentes Comunitários, aliados à construção de creches em todo o território estadual; a saúde pública mereceu atenção especial com a construção de cerca de 103 sistemas de abastecimentos singelos de água tratada, e das adutoras de Campina Grande, Patos e Cajazeiras, afora outras em povoados. Tudo feito à custa de muitos sacrifícios e inovações criadoras, em um Estado cuja arrecadação se destinava, em sua maior parte, ao pagamento da folha de pessoal.

Dentro da observação do coordenador técnico do programa da ONU/IPEA, Sr. Eduardo Guimarães, de que os investimentos que foram feitos desde 1991 somente vão começar a surtir efeitos agora, aguarda-se um próximo relatório com os efeitos das medidas adotadas a partir daquele ano, seqüenciadas até agora. Não que estas ações se bastem de per si, porque as ações governamentais devem ser dirigidas com base no que foi apresentado - modernizando dados e avaliando resultados de experiências locais - para conseguir tirar o Nordeste deste quadro desolador.

O comportamento moderno da administração pública tomou um rumo diferente das formas tradicionalmente levadas à prática. O modelo paternalista tem - com a globalização - de ajuntar esforços com a iniciativa privada numa forma de parceria que enseje objetivos comuns. Esse prisma deve ser levado em conta sem que sejam escamoteadas algumas considerações localizadas onde ainda são crônicas as mazelas sociais e que, por isso, reclamam atenção específica.

O Brasil do Índice de Desenvolvimento Humano é o mesmo que assistiu ao retorno das endemias antes fadadas a casos esparsos, como a dengue e a cólera. E é o mesmo que admite conviver com graves índices de inanição, aliado a surtos episódicos de tuberculose.

Geraldo Vandré avisava em final da década de 60: "quem sabe faz a hora, não espera acontecer". O Nordeste não será a moldura de nódoa do Brasil quando lhe sejam aplicadas políticas governamentais de efeito concreto, despidas de ranços piegas. O anúncio de uma safra recorde no Nordeste, contra uma queda na produção nacional de grãos este ano, valeu-se menos da ação governamental e mais do compadecimento da natureza. A chuva abundante distribuiu a água certa na hora certa, como a nos ensinar como se faz irrigação.

Da Paraíba, observamos o Nordeste e o Brasil. A miséria também não está restrita ao Nordeste, e o próprio Relatório conclui dessa forma, quando mostra os índices nacionais de todo o mundo e destaca o Brasil em posição considerada vexatória.

Analisar dados pode parecer ofício de cientista, mas viver a realidade é exercício de cada um no dia-a-dia. A história, já se disse, não se repete. Marx a considerava farsa ou tragédia quando parecia semelhante.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/07/1996 - Página 12979