Discurso no Senado Federal

OPORTUNIDADE GERADA PELA MEDIDA PROVISORIA 1.483, DE 1996, QUE CONCEDE INCENTIVOS A INSTALAÇÃO DE INDUSTRIA AUTOMOTIVA. DIFERENÇAS SOCIO-ECONOMICAS REGIONAIS BRASILEIRAS.

Autor
José Roberto Arruda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: José Roberto Arruda
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • OPORTUNIDADE GERADA PELA MEDIDA PROVISORIA 1.483, DE 1996, QUE CONCEDE INCENTIVOS A INSTALAÇÃO DE INDUSTRIA AUTOMOTIVA. DIFERENÇAS SOCIO-ECONOMICAS REGIONAIS BRASILEIRAS.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 31/07/1996 - Página 13344
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, EFEITO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), INCENTIVO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, REGIÃO SUDESTE, INFORMAÇÃO, ESTATISTICA, CONCENTRAÇÃO, RENUNCIA, NATUREZA TRIBUTARIA.
  • RECONHECIMENTO, REIVINDICAÇÃO, COMISSÃO MISTA, ESTUDO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), NECESSIDADE, DIFERENÇA, INCENTIVO, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE, REGIÃO CENTRO OESTE, FAVORECIMENTO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • PROBLEMA, ALTERAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), PREJUIZO, NEGOCIAÇÃO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESTADO DO PARANA (PR), SITUAÇÃO, INICIO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO.
  • INFORMAÇÃO, GESTÃO, ORADOR, ACORDO, RELATOR, PRESIDENTE DA REPUBLICA, BANCADA, CONGRESSISTA, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE, REGIÃO CENTRO OESTE, OBJETIVO, REEDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AUSENCIA, ALTERAÇÃO, COMPROMISSO, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, ORIENTAÇÃO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, gostaria de registrar, com a presença em plenário do Senador Waldeck Ornelas, que, com a autorização do Presidente da República, na semana passada, iniciamos entendimentos com a Bancada de Senadores e Deputados de vários Estados do Nordeste brasileiro, tendo em vista a medida provisória, que tramita nesta Casa, sobre incentivos à instalação de indústrias automotivas no País.

Como esse assunto vem sendo abordado na imprensa de formas diferentes, pareceu-me importante registrar aqui a nossa ótica sobre essa medida provisória e sobre os eventuais incentivos que podem ser dados à instalação de grandes indústrias no nosso País.

Em primeiro lugar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso ficar claro que, em função da medida provisória que está sendo analisada no Congresso Nacional neste momento, algumas grandes indústrias que já operam no mercado internacional com grande sucesso, e que são exportadoras dos seus produtos para o Brasil, ou, em outras palavras, o Brasil importa produtos fabricados por essas indústrias em outros países do mundo; em função dessa medida provisória, repito - e, é claro, em função principalmente das reformas que se produzem no seio da economia nacional, da mudança do papel do Estado na sociedade brasileira, que se redesenha através das reformas constitucionais processadas no Congresso Nacional; em função de tudo isso, essas indústrias têm mostrado interesse e, em alguns casos, já acordaram compromissos de instalação de plantas em território nacional. O Estado de Minas Gerais, o do Rio de Janeiro e o do Paraná, esses três Estados já têm investimentos acertados dessas indústrias internacionais em nosso País.

Isso é bom para o Brasil, em primeiro lugar, porque vai gerar empregos. Em segundo lugar, porque vai internar recursos que antes estavam no mercado especulativo, no mercado produtivo, eventualmente até com taxas de retorno menores, mas, principalmente, com taxas de permanência maiores na economia nacional.

Isso é bom para o modelo de desenvolvimento que nós desejamos, que contempla a continuidade da estabilidade econômica, mas com crescimento, portanto, com a geração de novas fontes de emprego e de renda.

Ocorre que alguns Estados das regiões mais pobres do País, das regiões menos desenvolvidas, e aí eu incluiria Estados do Nordeste, do Norte e do Centro-Oeste brasileiro, reivindicaram - e o fizeram no seio da comissão mista que analisa essa medida provisória, portanto, no fórum competente - que determinados incentivos destinados aos Estados menos desenvolvidos pudessem ter alguma diferenciação.

Aí cabe uma reflexão de todos nós. O Brasil tem liberdade, tem democracia, tem estabilidade econômica e pretende ter um projeto de país que contemple o desenvolvimento econômico. Será que nós todos, que estamos ajudando a desenhar esse projeto de país, desejamos que esse novo modelo de desenvolvimento seja tão injusto quanto os modelos de desenvolvimento experimentados nas décadas passadas, notadamente nas décadas de 60 e 70?

É inegável que o País cresceu muito naquele período de fabulosas taxas de crescimento econômico. Mas ele cresceu desigualmente, criando diferenças abissais entre as classes sociais e diferenças profundas entre as regiões do Brasil. De sorte que temos hoje, neste final de século, um Sudeste extremamente desenvolvido, produtivo, com renda per capita muito próxima da dos países mais desenvolvidos do mundo, e temos, por outro lado, índices sociais catastróficos no Norte e no Nordeste brasileiro.

Será que é esse o modelo de desenvolvimento que desejamos? Certamente que não. Se queremos um modelo de desenvolvimento menos desigual e menos injusto, é absolutamente próprio que se deseje que o aparelho de Estado - e aí não só do Governo Federal, mas também dos governos estaduais e municipais - produza incentivos, produza motivações para que essa desigualdade diminua, e isso se faz também com incentivos à instalação de grandes indústrias nas regiões mais pobres, para que a diferença do desenvolvimento econômico e da qualidade de vida entre, por exemplo, o Nordeste e o Sudeste possa diminuir.

Uma outra reflexão, Sr. Presidente. Há alguns dias tive a honra de participar do aniversário do Banco do Nordeste, em Fortaleza. Estávamos lá vários Senadores, de diferentes regiões do País, e os dados que discutimos durante oito horas de reuniões de trabalho são extremamente significativos. Um deles mostra que, no mapa de renúncia fiscal de todo o território nacional, 58% da renúncia está concentrada no Sudeste, apenas 12% no Nordeste, 3% no Centro-Oeste e 16% no Norte, basicamente na Zona Franca de Manaus.

Ora, os Estados do Centro-Oeste, do Norte e do Nordeste, juntos, têm apenas 30% de renúncia fiscal, enquanto o Sudeste, sozinho, tem 58%. É claro que esses incentivos produziram um grande desenvolvimento no Sudeste, mas produziram também desigualdades que foram catastróficas para o próprio Sudeste. Ou, afinal, estamos felizes, nós, brasileiros, com São Paulo, uma megalópole de 20 milhões de habitantes, com a sua periferia pobre, miserável, com o caos da vida urbana? Não teria sido mais razoável um modelo de desenvolvimento que privilegiasse por igual as diferentes regiões do País e que tivesse feito com que as taxas de crescimento econômico e, portanto, de melhoria de qualidade de vida, nas diferentes regiões, fossem menos desiguais?

Por todas essas razões, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que estamos convencidos de que há que se fazer alguma coisa para que o modelo de desenvolvimento regional deste País seja mais justo. E é por isso que julgamos que as Bancadas do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste têm razão quando reivindicam tratamento diferenciado, inclusive no âmbito tributário, para que possam alavancar os seus modelos de desenvolvimento.

Por outro lado, se introduzíssemos, como desejou a comissão mista que analisa a medida provisória, modificações nessa medida provisória, a par de toda a argumentação favorável ao desenvolvimento das regiões mais pobres, teríamos pelo menos dois problemas graves. O primeiro problema é que o Brasil estabelece uma relação com a Organização Mundial do Comércio, a OMC, que já se desenvolve há vários meses, que teve a participação dos governos estaduais do Sudeste brasileiro e que está gerando um entendimento internacional que sinaliza para um país que agora tem regras fixas e cumpre compromissos. Ora, modificar essa medida provisória poderia significar um desentendimento com a OMC e também uma sinalização negativa à vinda desses investimentos para o Brasil.

Há um segundo problema, Sr. Presidente. Esses grandes grupos multinacionais que já iniciam os seus investimentos em Minas, mais precisamente em Juiz de Fora, no Rio de Janeiro, em Resende e no Paraná, na região metropolitana de Curitiba, já despenderam recursos, já estão finalizando as tratativas com os governos estaduais e vão rapidamente iniciar a construção de suas plantas, gerando empregos e receitas no Sudeste brasileiro, o que, convenhamos, é muito bom para o País, não é bom apenas para o Sudeste. É bom para o País, Sr. Presidente, porque queremos experimentar um novo modelo de desenvolvimento econômico, e esse modelo só será possível se tivermos a atração do capital privado para os setores produtivos da economia.

Foi nesse contexto, então, que, autorizados pelo Presidente da República, mantivemos entendimento com o Deputado José Carlos Aleluia, que é o Relator da medida provisória; com os Senadores Waldeck Ornelas e José Agripino; e com várias outras Lideranças importantes do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste brasileiro, no sentido de buscarmos uma alternativa que privilegie as regiões mais pobres, que sinalize ao mundo que o Brasil deseja um modelo de desenvolvimento regional mais equilibrado. Por outro lado, que não paralise aqueles investimentos que já estão muito próximos de ser concretizados na Região Sudeste.

Foi assim, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que desenhamos um arcabouço de acordo, pelo qual a atual medida provisória deverá ser reeditada nos exatos termos em que está sendo analisada pelo Congresso Nacional, sem, portanto, qualquer tipo de modificação que possa implicar desacerto com a Organização Mundial do Comércio ou desentendimento com os Estados do Sudeste e com esses grupos multinacionais, que estão prestes a aportar recursos por meio de investimentos vultosos dentro do País.

Dentro dessa linha, tivemos alguns encontros, com a presença do Ministro Fernando Catão, do Ministério Extraordinário para Políticas Regionais; com a presença do Ministro Clóvis Carvalho, da Casa Civil; e com a presença de lideranças parlamentares do Congresso Nacional, com o objetivo de desenharmos uma outra medida provisória, um outro instrumento de ação governamental, um outro instrumento de ação política que nos permitisse efetivamente criar inputs, motivações que direcionem investimentos internacionais para as Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Todavia, isso se faria sem modificar a medida provisória em discussão no Congresso Nacional, cujos efeitos já se fazem sentir na economia nacional, exatamente para não prejudicarmos os Estados do Sudeste brasileiro, que, é bom ressaltar, já têm infra-estrutura, parque industrial e de serviços montados; já têm, portanto, todas as condições necessárias para atrair grandes plantas industriais, a fim de que possam produzir.

Sr. Presidente, é preciso registrar que o Senhor Presidente da República tomou também uma outra atitude, tão importante quanto a primeira: abriu as portas da negociação, a fim de que haja vetores de desenvolvimento regional no País. Determinou Sua Excelência ao Presidente do BNDES, Dr. Luiz Carlos Mendonça de Barros, que agilizasse os entendimentos com o Banco do Nordeste e com os Governos Estaduais do Nordeste brasileiro, para que o financiamento das contrapartidas necessárias ao Prodetur - Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste - efetivamente saia do papel e viabilize a construção de estradas no litoral, de hotéis e de uma infra-estrutura de serviços capaz de aumentar a capacidade hoteleira e a capacidade de atração de capitais por meio do turismo nessa Região.

Com tudo isso, Sr. Presidente, esperamos que, já a partir desta semana e com maior velocidade na semana que vem, possam prosseguir os entendimentos democráticos entre as lideranças do Congresso Nacional e as autoridades do Governo Federal, propiciando as condições necessárias para selarmos essa linha de entendimento, mantida, repito, a atual medida provisória nos exatos termos em que está. Com isso, garantir-se-á que esses investimentos internacionais se efetivarão no País, dando tranqüilidade a Curitiba, a Juiz de Fora, a Resende, aos Governos Estaduais do Paraná, de Minas Gerais e do Rio de Janeiro.

E, uma vez que o capital produtivo precisa de regras fixas, deve-se garantir aos Governos estaduais e ao mercado internacional uma sinalização clara de que este País quer manter estáveis seus entendimentos e suas regras em termos de economia produtiva. Com isso, daqui a pouco tempo, teremos novas montadoras trabalhando e produzindo riquezas neste País.

Por outro lado, na mesma data, teremos outra medida provisória, outra ação política do Governo Federal, no sentido de criar incentivos e, mais do que isso, de criar mecanismos capazes de dar aos Governadores dos Estados mais pobres do País instrumentos de negociação no mercado internacional para a atração de investimentos nessas regiões.

O Sr. Lauro Campos - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Com o maior prazer, Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos - Nobre Senador José Roberto Arruda, esquecer tudo é esquecer a nossa experiência histórica, é esquecer os descaminhos, é esquecer os sofrimentos por que passamos devido a certos desvios que foram impostos à economia brasileira. O Brasil, como V. Exª sabe, é um país que se caracteriza por uma crescente concentração de renda. Enquanto no Japão, dos 20% mais pobres, apenas 3,2% são mais destituídos de renda do que os 20% mais ricos, no Brasil, essa diferença entre os 20% mais ricos e os mais pobres é de 32 vezes. É de 32 vezes, porque há necessidade do capital transplantado, que estava sobrando nos Estados Unidos depois da Segunda Guerra Mundial, veio para Argentina, Brasil, Coréia do Sul, México e outros países e impôs essa concentração de renda, a fim de que aqui se formasse um mercado de 10% da população privilegiada para comprar os carros e bens duráveis. De acordo com Eugênio Gudin, esse capital veio para cá recebendo do governo um estímulo: para cada US$1 trazido por eles, o governo brasileiro doava US$1, seja na forma de doação de terrenos, ou de perdão fiscal durante 15 anos garantido pelos empréstimos a juros negativos do BNDES. Agora, infelizmente, ainda não aprendemos; pensamos que o nosso problema, olhando apenas pelo lado do capital, é de insuficiência de capital, mais dinheiro para banqueiro, mais dinheiro para capitalistas, mais investimentos que vão reconcentrar a renda, porque obviamente continuarão a produzir os artigos de luxo que infelicitaram e infelicitam, há tanto tempo, a economia brasileira, dentro do processo de dinamização tortuoso que se pretende agora fazer avançar. Então, vemos que a história, às vezes, se repete. A história da década de investimentos nesses setores da época de Juscelino agora se repete como tragédia. Muito obrigado, Sr. Senador.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Acolho, com muita honra, o aparte do Senador Lauro Campos. Obviamente, numa outra oportunidade, seria muito saudável discutir o modelo de desenvolvimento que se deseja para o País. Mas, de qualquer maneira, não penso apenas, Senador Lauro Campos -e acredito que assim agem os Governadores e as lideranças políticas deste País-, naqueles que vão comprar automóveis, mas, principalmente, nos milhares de empregos que serão gerados na construção desses automóveis.

Para concluir, Sr. Presidente, há algo que eu gostaria de deixar bem claro desta tribuna: em todos esses entendimentos havidos com os Srs. Senadores e Deputados, representantes desses Estados do Nordeste brasileiro, em nenhum momento, repito, em nenhum momento, houve qualquer outro tipo de interpretação, qualquer outro tipo de solicitação, qualquer outro tipo de sugestão de troca de medidas. Todos os entendimentos foram absolutamente claros, transparentes e públicos, o que é importante.

O que deseja esta bancada de Senadores e Deputados é legítimo: que o Brasil sinalize com vetores favoráveis a um desenvolvimento regional mais equilibrado. O que desejam os Estados do Sudeste também é justo: que não se modifiquem as regras do jogo, para que os investimentos já acordados com esses Estados não sofram nenhum risco. Há, entre a legitimidade dos dois pleitos, um ponto de acordo: manter essa medida provisória e editar outra que crie instrumentos que possibilitem o desenvolvimento mais acelerado das regiões mais pobres do País, que é o que todos desejamos.

Muito obrigado, Sr.Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/07/1996 - Página 13344