Discurso no Senado Federal

PROPONDO UMA REORIENTAÇÃO DA POLITICA NACIONAL DE TRANSPORTES, PRIORIZANDO O SISTEMA FERROVIARIO, COMO PARTE DA ESTRATEGIA DE COMERCIALIZAÇÃO, NESTE MOMENTO DE GLOBALIZAÇÃO DA ECONOMIA.

Autor
Ernandes Amorim (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Ernandes Santos Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • PROPONDO UMA REORIENTAÇÃO DA POLITICA NACIONAL DE TRANSPORTES, PRIORIZANDO O SISTEMA FERROVIARIO, COMO PARTE DA ESTRATEGIA DE COMERCIALIZAÇÃO, NESTE MOMENTO DE GLOBALIZAÇÃO DA ECONOMIA.
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/1996 - Página 13785
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • NECESSIDADE, PROGRAMA DE INTERIORIZAÇÃO, INTEGRAÇÃO, REGIÃO NORTE, ESPECIFICAÇÃO, FRONTEIRA, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, PRIORIDADE, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE INTERMODAL.
  • CRITICA, MODELO, DESENVOLVIMENTO, VALORIZAÇÃO, RODOVIA, DEFESA, FERROVIA, REDUÇÃO, CUSTO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, LIGAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), OCEANO PACIFICO, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, SAIDA, OCEANO PACIFICO, AGRICULTURA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DE RONDONIA (RO).

           O SR. ERNANDES AMORIM (PMDB--RO) - Sr.Presidente, Srªs e Srs. Senadores, integrar à Nação o Oeste brasileiro, desenvolvendo suas potencialidades econômicas, deve ser um dos objetivos principais de qualquer governo sensível ao problema das desigualdades regionais. Distante dos centros de decisão e das regiões mais adiantadas, situado, além de tudo, em área de fronteira e de grande riqueza natural, o Oeste pode vir a ser alvo fácil da cobiça das grandes potências planetárias se não lograrmos promover sua prosperidade como parte do Brasil -- melhor forma de assegurar a integridade do território nacional.

           Para este fim integracionista, devemos lembrar que um dos principais instrumentos para a colonização de um território, fixando o homem à terra, é a construção de uma malha de transportes racional, que explore equilibradamente as diversas modalidades -- rodoviária, ferroviária, hidroviária e aeroviária. As vias de transporte constituem as veias e artérias da economia de uma região, levando sua produção para os mercados compradores e trazendo de outras áreas os bens de que necessita e que não pode produzir. Sem transportes não há comércio, não há dinamismo econômico, não há progresso.

           De fato, desde que a humanidade se sedentarizou, há milhares de anos -- deixando o estágio de caça e coleta e passando a se dedicar à agricultura -- a comunicação e o comércio entre diversos agrupamentos humanos se tornaram vitais para a sobrevivência de todos. Essa verdade não se alterou, apesar de todas as mudanças devidas à evolução das técnicas e ao surgimento da indústria. Por tudo isso, o planejamento de transportes é imprescindível para o desenvolvimento do Oeste, que viveu por tanto tempo isolado do resto do País, dependendo, para sua comunicação com o mundo, quase exclusivamente da extraordinária rede fluvial legada pela natureza.

           A integração do Oeste, embora constitua imperativo óbvio da nacionalidade, nem sempre se manifestou claramente nas tendências espontâneas ou dirigidas da civilização nacional. Apesar da saga dos bandeirantes, que empurraram milhares de quilômetros em direção ao poente as fronteiras brasileiras, a população continuou por muito tempo concentrada no litoral. Um feito notável no sentido contrário foi a epopéia da construção desta Capital, capitaneada pelo espírito empreendedor do Presidente Juscelino Kubitschek, que compreendeu bem a necessidade de interiorização da população e dos eixos econômico e político de nossa civilização.

           O inesquecível Presidente dos "cinqüenta anos em cinco", cujo mérito desenvolvimentista é indiscutível, cometeu, porém, um pequeno equívoco ao supervalorizar a modalidade rodoviária como vetor de estímulo à interiorização da economia. Se é verdade que viveu tempos de petróleo barato, e se é também verdade que a indústria automobilística tem um enorme poder de dinamização da economia, pelo desenvolvimento do setor de autopeças, o fato é que a opção quase exclusiva pelo transporte rodoviário tornou capenga a matriz brasileira de transportes, aspecto agravado pelos governos militares, que mantiveram essa diretriz mesmo após os dois choques do petróleo que marcaram os anos setenta.

           Desprezar a opção pela modalidade ferroviária foi um erro pelo qual ainda pagamos e continuaremos a pagar, se não reorientarmos nossa política nacional de transportes. Quando se fala tanto no tal custo Brasil, enfatizando sempre aspectos trabalhistas, previdenciários e tributários, o que se escamoteia é o fato de que boa parte da perda de competitividade internacional dos produtos brasileiros se deve aos custos de um sistema de transportes ineficiente e inseguro. Ineficiente, porque o consumo de combustível é quatro vezes maior transportando-se a mesma carga por caminhão, em comparação com o trem; inseguro, porque, mesmo em condições ideais de conservação de rodovias e caminhões, sobre essa modalidade incidem riscos de acidente bem superiores aos incidentes sobre ferrovias. Esses fatores fazem com que o custo do transporte de cargas no Brasil, segundo o engenheiro Fernando Celso Uchoa Cavalcanti, em artigo publicado no Estado de S. Paulo de 11 de janeiro de 1993, seja "o dobro da média dos países do Primeiro Mundo".

           Falando sobre a integração com o Mercosul, em agosto de 1992, o então superintendente regional da RFFSA de Porto Alegre, Carlos Rodrigues Ribeiro, dizia, em artigo publicado na Gazeta Mercantil: "é tempo e hora de recuperarem-se, com seriedade, os investimentos necessários na ferrovia, (...) e não, como se fala, de construir uma auto-estrada entre São Paulo e Buenos Aires, a um custo astronômico de cinco bilhões de dólares". Mirando-se no exemplo da União Européia, onde as ferrovias constituem a "base confiável" para o sucesso dos negócios dentro da área de integração econômica, Ribeiro criticava a dependência crescente de nossos países do Mercosul às "multinacionais automobilísticas", fabricantes de caminhões e de pneus.

           A mesma idéia que é válida para a integração do Brasil com os países do Mercosul o é para a integração com os do Pacto Andino. É verdade que o futuro do Mercosul será o de integrar todas as nações da América do Sul, se não toda a América Latina. Por ora, no entanto, urgente é nos esforçarmos no sentido de realizar o velho sonho amazônico da saída para o Pacífico, construindo as vias que ligarão os Estados de Rondônia e Acre aos portos peruanos.

           A janela para o Pacífico é uma das mais importantes iniciativas estratégicas para nosso País neste momento histórico de globalização. Analistas políticos e econômicos das mais diversas tendências são unânimes em prever para o próximo século uma mudança do eixo principal do comércio mundial do oceano Atlântico para o Pacífico. A formação do bloco Oriental, liderado pelo Japão e incluindo os Tigres Asiáticos de primeira e de segunda gerações, além da China -- que se encontra em fase explosiva de crescimento econômico --, todos países muito populosos, já seria razão suficiente para considerarmos o mercado do Pacífico com a devida atenção.

           Se considerarmos que, além desses países, o Pacífico conta com países desenvolvidos e ricos, como Austrália e Nova Zelândia, além das costas ocidentais de Estados Unidos e Canadá, seremos forçados a concluir que não podemos desperdiçar a oportunidade de acesso de nossas mercadorias a tão significativo mercado consumidor. Chamo ainda a atenção dos nobres Pares para o fato de que a opção pela saída para o Pacífico reduziria em trinta por cento o trajeto da soja a ser exportada para o Japão, sem contar os problemas de congestionamento das rodovias que ligam Rondônia e Mato Grosso aos portos de Santos e Paranaguá, bem como do próprio congestionamento desses portos.

           Sei bem que a maioria dos adeptos do escoamento da produção do Oeste brasileiro pelo Pacífico defendem a construção de rodovias, para as quais apresentam até mais de uma alternativa de trajeto. Minha sugestão é de que se pense em fazê-lo por ferrovia, e não estou sendo original. Já em 1991, no Jornal do Brasil de 14 de outubro, o embaixador Vasco Mariz, conhecedor profundo do país vizinho, dizia: "é preciso pensar também na alternativa feroviária, uma vez que o escoamento rodoviário da soja utilizaria cerca de cinqüenta mil caminhões, fazendo cento e cinqüenta viagens diárias, índices talvez inexeqüíveis".

           Srs. Senadores, a saída para o Pacífico representa uma possibilidade de redenção econômica do Oeste brasileiro. A agricultura de Estados como Mato Grosso e Rondônia, já altamente desenvolvida, precisa desse mercado para crescer e gerar ainda mais riqueza para o País. Viabilizar-se essa saída para o Pacífico pela modalidade ferroviária é uma opção a se considerar, visto que talvez seja inviável o escoamento por caminhão, tal como apontado pelo embaixador.

           É hora de recolocar as ferrovias nos trilhos, como disse o engenheiro Josef Barat no Estadão, em janeiro do ano passado. Retomando as palavras de Carlos Rodrigues Ribeiro, "é hora da sociedade se conscientizar e olhar a ferrovia não com o saudosismo das marias-fumaças, (...) mas como meio de transporte capaz de conduzir grandes volumes a média e longa distância, de modo mais racional e seguro e, principalmente, a menor custo".

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/1996 - Página 13785