Pronunciamento de Ronaldo Cunha Lima em 08/08/1996
Discurso no Senado Federal
PRESERVAÇÃO DO DIREITO ADQUIRIDO DOS SERVIDORES PUBLICOS.
- Autor
- Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA SALARIAL.:
- PRESERVAÇÃO DO DIREITO ADQUIRIDO DOS SERVIDORES PUBLICOS.
- Publicação
- Publicação no DSF de 09/08/1996 - Página 13704
- Assunto
- Outros > POLITICA SALARIAL.
- Indexação
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- CRITICA, ATO NORMATIVO, MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), REDUÇÃO, VANTAGENS, PROVENTOS, REMUNERAÇÃO, PROFESSOR, INSTITUIÇÃO FEDERAL, ENSINO SUPERIOR, DESRESPEITO, NORMAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, DIREITO ADQUIRIDO.
O SR. RONALDO CUNHA LIMA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a edição de atos de órgãos governamentais sobre políticas de remuneração de pessoal no serviço público tem recebido muitas críticas da sociedade organizada. Sobre esse assunto recebemos algumas mensagens de preocupações de servidores, notadamente os inativos, com os efeitos danosos que essas medidas provocam em suas estabilidades financeiras.
Somos defensores de uma revisão cultural na forma de condução dos serviços públicos no Brasil, até mesmo porque passamos pela experiência de cargos executivos, ora como Prefeito, ora como Governador de Estado. Com a mesma convicção, defendemos o direito adquirido como uma conquista do processo civilizatório.
São tantas as opiniões doutrinárias e as expressões normativas que consagram a efetividade do direito que podem tornar despicienda qualquer citação. O conhecimento comum o compreende na sua acepção mais exata, para tratá-lo como garantia de situações pretéritas constituídas, que não devem nem podem ser mudadas. A excelência do jurista Vicente Ráo, com o qual tivemos a oportunidade de conviver por alguns anos no exercício profissional da advocacia em São Paulo, ensina que, se o futuro sugere uma incerteza, não podemos mudar o passado que certamente já foi constituído.
Em sede normativa, como se não bastasse o momento magnífico de construção dos direitos do homem, as nossas Cartas Constitucionais têm consagrado esse princípio como uma garantia fundamental. Assim, o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, dispõe que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada", como a legislação infraconstitucional, tendo como melhor exemplo a nossa Lei de Introdução ao Código Civil, que se encarrega de conceituar esses princípios. Já no direito americano é vedada a adoção da lei post facto para assegurar a integridade das situações pretéritas.
A política governamental que busca a estabilidade financeira do País não pode passar ao largo - insistimos nesta tese desde muito tempo - de programas desenvolvimentistas nem dos princípios constitucionais firmados.
Mais recentemente, à guisa de acatar decisão proferida pelo TCU - Tribunal de Contas da União, o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado - MARE, determinou aos dirigentes de recursos humanos de instituições federais de ensino superior que procedessem a revisões nos valores relativos às parcelas dos quintos incorporadas por servidores ativos e inativos. A medida, além de provocar uma redução de grau considerável nos valores pagos a título de remunerações e proventos dos servidores ativos e inativos, vulnera o imaculado princípio do direito adquirido e também desconhece outras normas inscritas no texto constitucional.
Do ponto de vista do servidor, não é considerada a norma pertinente a irredutibilidade de vencimentos e proventos (CF; art. 37, XV c/c 40 § 4º). E, do ponto de vista das instituições, fere-se a autonomia administrativa e de gestão financeira, garantida pelo art. 207 da Constituição Federal.
Na esfera jurisdicional, Sr. Presidente, as decisões dos tribunais do País e, em especial, as do Supremo Tribunal Federal indicam caminhos diferentes dos que são utilizados pelo Governo com a recente atitude.
A redução de vencimentos, mesmo a que é fundada no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que é um caso diferente, não se opera sem o due process of law, isto é, o devido processo legal - assim já definiu o STF. Também nesta instância, dessa sorte apenas referindo-se aos aposentados, sumulou que os proventos são irredutíveis e regem-se pela lei do tempo em que se formaram as condições para a aposentadoria. (Súmula 359-STF)
As vantagens que agora sofrem redução pelo ato do MARE são pessoais, porque obtidas em razão de exercício de cargo ou função de confiança e, por isso, pertencem ao patrimônio do servidor.
Sr. Presidente, nem mesmo os atos de aposentadoria já registrados no TCU, de conformidade com o art. 71, III, CF, e portanto imunes a alterações posteriores, são ressalvados no ofício ordenador. Da mesma forma são tratados os atos postos à jurisdição administrativa e registral do TCU. Há decisão do STF no sentido de vedar alterações, por via administrativa, em atos postos a essa espécie de jurisdição no TCU, porque, enquanto o ato permanecer sob sua esfera de competência, a administração deve aguardar o pronunciamento para tomar as medidas efetivas. E o pronunciamento da Corte de Contas na espécie deve ser casuístico de forma a atender a situação de cada ato de per si.
O que, então, devemos fazer?
Cremos que o ato excede ao poder regulamentar do órgão expedidor, desrespeita autoridade de decisão do STF e invade área restrita ao campo da lei em sentido formal e, portanto, o poder de legislação do Congresso Nacional. Com efeito estudaremos o cabimento, a oportunidade e a conveniência de apresentar projeto de decreto legislativo, tendo como fundamento os incisos V e XI do art. 49 da Constituição Federal, que asseguram, respectivamente, ao Congresso Nacional o poder-dever de sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar e o de zelar pela preservação de sua competência legislativa.
Era o que tinha a registrar, Sr. Presidente, com agradecimento pela audiência.
Muito obrigado.