Discurso no Senado Federal

APRESENTANDO DADOS SOBRE A DISCRIMINAÇÃO VIVIDA PELA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO. APELO AOS SRS. SENADORES PARA QUE APROVEM O PROJETO DE LEI DA CAMARA 29, DE 1996, DE AUTORIA DA DEPUTADA RITA CAMATA, QUE DISPÕE SOBRE O ACESSO DA MULHER AO MERCADO DE TRABALHO E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • APRESENTANDO DADOS SOBRE A DISCRIMINAÇÃO VIVIDA PELA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO. APELO AOS SRS. SENADORES PARA QUE APROVEM O PROJETO DE LEI DA CAMARA 29, DE 1996, DE AUTORIA DA DEPUTADA RITA CAMATA, QUE DISPÕE SOBRE O ACESSO DA MULHER AO MERCADO DE TRABALHO E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Aparteantes
Edison Lobão, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 17/08/1996 - Página 14228
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • NECESSIDADE, CONSTITUCIONALIDADE, LEGISLAÇÃO, INCENTIVO, IGUALDADE, MULHER, MERCADO DE TRABALHO.
  • ANALISE, ESTATISTICA, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, MULHER, MERCADO DE TRABALHO, REFERENCIA, IDADE, ESTADO CIVIL, COMPARAÇÃO, RENDIMENTO, SETOR, ATIVIDADE, HOMEM, CONCLUSÃO, DISCRIMINAÇÃO.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, CRISTINA BRUSCHINI, SOCIOLOGO, SONIA COSTA NASCIMENTO, PROFESSOR, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), ASSUNTO, TRABALHO, MULHER.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, ORIGEM, CAMARA DOS DEPUTADOS, SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, TRAMITAÇÃO, SENADO, OBJETIVO, CORREÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, ACESSO, MULHER, MERCADO DE TRABALHO, ZONA RURAL, ZONA URBANA, CRIAÇÃO, FUNDO DE APOIO, INCENTIVO, PROFISSIONALISMO.

A SRª EMILIA FERNANDES - Agradeço o aparte de V. Exª e tenho certeza de que com a posição que ora manifesta será mais um Senador a abraçar a causa e auxiliar na aprovação desse projeto.

Trata-se de proposição relevante, na medida em que busca corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho. O projeto consegue, com rara felicidade, enunciar e apontar a ilicitude de práticas e atitudes que prejudicam o acesso da mulher, em igualdade de condições, a oportunidades no mercado de trabalho.

Práticas discriminatórias, como considerar o fator sexo variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional, ficam definitivamente vedadas, o que não obsta a adoção de medidas temporárias que visem ao estabelecimento das políticas de igualdade entre homens e mulheres, em particular as que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho.

A Srª Marina Silva - V. Exª me permite um aparte?

A SRª EMILIA FERNANDES - Ouço V. Exª com muito prazer.

A Srª Marina Silva - Em primeiro lugar, quero cumprimentar V. Exª pelo debate que proporciona em um tema que é de interesse de todos nós. Sabemos que, em que pese a Constituição de 1988, como muito bem colocou o Senador Edison Lobão, ter buscado dar respostas para os problemas de discriminação sob o ponto de vista institucional da revisão das leis discriminatórias do nosso País, trata-se de um processo lento que busca - e é preciso - compatibilizar inúmeras ações. Umas são essas de aperfeiçoamento das leis que temos, como está propondo a Deputada Rita Camata. Outras são de mudança da mentalidade da sociedade brasileira, porque as leis precisam ser incorporadas tanto pelas instituições públicas quanto pelas empresas, pelos diferentes segmentos da sociedade. Talvez a nossa luta maior não seja para conseguir escrever no texto da lei as nossas bandeiras rumo à igualdade, contra a discriminação entre homens e mulheres, mas exatamente para que as leis possam fazer parte da nossa cultura. O problema da discriminação, da concepção dos direitos dos homens em detrimento aos direitos das mulheres é resultado da nossa cultura patriarcal. O Brasil herdou todo esse aparato da cultura patriarcal, em que as mulheres foram consideradas seres incapazes durante muitos anos, durante séculos até. Hoje, a nossa reação, positiva, é no sentido de completar a nossa cultura. E para completar a nossa cultura - insisto sempre nisso - é preciso a outra metade, que são os valores femininos. E os valores femininos, para serem inteiros, têm que estar presentes nas relações trabalhistas, nas relações sociais, nas políticas e em todos os aspectos da vida pública ou privada. Esse é um grande desafio. Talvez a maior contribuição que legaremos para o próximo milênio será a de inteirar a cultura, fazer com ela deixe de ser partida, para que seja inteira. E para ser inteira, é preciso que haja a presença das mulheres. E a nossa presença faz-se da melhor forma possível, que é da forma afirmativa. Não há da nossa parte nenhuma revolta contra os séculos e os milênios de discriminação. Para nós basta a responsabilidade de reparar o erro cometido contra as mulheres durante todos esses anos.

A SRª EMILIA FERNANDES - Agradeço o aparte de V. Exª que enriquece o nosso pronunciamento.

Nesse sentido, quando nós falamos do que de mais sublime a natureza deu às mulheres, que foi a possibilidade da gravidez, sentimos isso como um problema que enseja a discriminação e dificulta a ação da mulher no trabalho.

O projeto, também preocupado com essa questão, abordou a gravidez.

A gravidez, consoante princípio constitucional, passa a ter proteção efetiva, sem que haja para a mulher prejuízo no que se refere ao exercício da função; ficando absolutamente garantido o direito - que não é só seu, mas também do nascituro - do atendimento médico necessário no período da gestação.

Os programas de planejamento familiar serão executados através do Sistema Único de Saúde, ou outro que venha a ser oferecido pelo Estado com o mesmo propósito, proibindo-se as empresas de implantarem, por conta própria, serviços desta natureza, exceto quando sob a supervisão dos conselhos de saúde da respectiva jurisdição.

Coíbe-se ainda no projeto a dispensa do trabalhador, quando decorrente de ação proposta com fundamento na violação dos princípios de igualdade profissional e de oportunidade entre homens e mulheres.

Instituições governamentais dedicadas à formação de mão-de-obra são obrigadas a fornecer vagas para ambos os sexos.

É proibida a celebração de contratos ou convênios de qualquer espécie, no âmbito da administração pública, com empresas, instituições e empregadores em geral, que comprovadamente pratiquem discriminação contra empregado do sexo feminino.

Prevê ainda que empresas com mais de 100 (cem) empregados de ambos os sexos deverão manter programas especiais de incentivos e aperfeiçoamento profissional de mão-de-obra.

A fiscalização das disposições contidas neste projeto - é importante ressaltar - ficará a cargo do Ministério do Trabalho, nos termos fixados pelo Título VII da CLT, sendo as infrações punidas com multas administrativas de cinco vezes a maior remuneração paga pelo empregador.

Prevê ainda que trabalhadores rurais e urbanos são destinatários dos termos fixados na proposição, inclusive os que se candidatam ou ocupam cargos, empregos ou funções públicas.

Também é interessante notar que se institui o Fundo de Capacitação Profissional da Mulher, vinculado ao Ministério do Trabalho, sob gestão paritária do Poder Público e de entidades de representação da mulher.

E ainda, que qualquer pessoa jurídica poderá associar-se, bem como firmar convênios com instituições civis ou públicas com vistas à execução de projetos de incentivo ao trabalho da mulher.

É lógico que, quando este projeto vier a debate, vier à discussão, pretendemos aprofundar estas questões. Mas, em síntese, são estes os principais aspectos do projeto que está hoje sob exame na Comissão de Assuntos Sociais, com parecer favorável de nossa autoria, e que, certamente, logo virá ao plenário desta Casa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sem sombra de dúvida, este projeto avança no sentido de dotar o Brasil de uma legislação moderna, condizente com os princípios constitucionais que asseguram a igualdade de oportunidades para ambos os sexos.

Antes de concluirmos, gostaríamos de registrar ainda um pequeno trecho do artigo publicado pela professora de Direito do Trabalho da USP, Sônia Costa Nascimento, sobre o trabalho da mulher e as tendências internacionais, que se encaixa muito bem na discussão e na reflexão e avaliação deste projeto, que diz o seguinte:

      Os aspectos focalizados inferem que as experiências jurídicas não estão concluídas quanto à posição da mulher nas relações de trabalho, e que algumas modificações ainda devem ser feitas no sentido de promover a igualdade de oportunidades entre o homem e a mulher. Estamos saindo de modelo de normas proibitivas do trabalho da mulher para um modelo de promoção da igualdade de oportunidades entre o homem e a mulher, ainda precários em países da América Latina, conforme ocorre no Brasil e na Argentina em comparação com os países da Europa. Há nos países da América Latina uma escassez de normas promocionais. Importante é a ação brasileira na aprovação da Lei nº 9.029, de 1995, que proíbe o ato discriminatório do empregador ao acesso ao emprego e à manutenção do trabalho, sob pena de sanções administrativas e penais. Sob o aspecto legislativo, algumas medidas ainda devem ser tomadas no sentido de serem eliminadas as diferenças entre o trabalho do homem e da mulher. As normas proibitivas devem ser derrogadas e substituídas por normas que dêem tratamento igual aos trabalhadores de ambos os sexos, com exceção à proteção da maternidade que se justifica por ser absolutamente necessária sob o prisma social. No entanto, a valorização do trabalho da mulher não é, somente, um problema legal, mas, também, cultural. A luta das mulheres em busca de mudanças em sua posição no mundo provocou uma significativa revolução cultural nos últimos 10 (dez) anos.

Em face do exposto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apelamos a todos os integrantes desta Casa para que dediquem uma especial atenção a este assunto, a este projeto, que está tramitando e brevemente virá a plenário, e para o qual aguardamos uma deliberação positiva.

Este projeto, sem dúvida, é um testemunho vivo, e receberá - assim como foi dada pela Câmara a sua aprovação - do Senado a aprovação e a convicção de que não bastam apenas boas intenções, mas é necessário medidas concretas e objetivas para que se busque efetivamente o equilíbrio de oportunidades entre homens e mulheres. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/08/1996 - Página 14228